Nota de Alerta: Prevenção contra fraudes com o nome do escritório Willer Tomaz Advogados Associados

Prezados Clientes e Parceiros,

É com grande preocupação que informamos sobre possíveis tentativas de fraude envolvendo o nome do nosso escritório. Recentemente, recebemos relatos de contatos não autorizados por e-mail e WhatsApp, nos quais pessoas desconhecidas se identificam falsamente como representantes do Willer Tomaz Advogados Associados.

Enfatizamos que o escritório não solicita quaisquer informações confidenciais por meio de e-mails ou aplicativos de mensagens não oficiais. Além disso, não autorizamos qualquer tipo de solicitação de pagamentos ou transferências bancárias fora dos meios oficiais de comunicação do escritório.

Em caso de comunicação suspeita utilizando o nome do Willer Tomaz Advogados Associados, solicitando informações processuais, pessoais ou financeiras, ou, havendo dúvidas sobre a autenticidade de uma comunicação recebida com o nosso nome, pedimos que entrem em contato imediatamente com o escritório, exclusivamente através dos canais de atendimento disponibilizados no site.

Adotamos rigorosos controles de segurança e proteção aos nossos clientes e parceiros, e todas as medidas cabíveis para apurar e combater possíveis tentativas de fraude são aplicadas.

Agradecemos a confiança em nosso escritório, trabalhamos para manter um ambiente seguro e confiável para todos.

Atenciosamente,

Willer Tomaz Advogados Associados.

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Lei nº 14.689: fantástica fábrica do metacontencioso tributário

Recentemente, foi promulgada a Lei nº 14.689/23, decorrente da sanção, com vetos, do PL nº 2.384/23 (PL do Carf), alterando profundamente o processo administrativo e judicial tributário e as multas no âmbito federal. Já apresentamos nossas críticas a ele em outra oportunidade [1]. Entretanto, passada a etapa legislativa, devemos ir além e analisar dogmaticamente alguns possíveis problemas concretos na sua aplicação.

1) O §9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/72  o voto de qualidade e seus efeitos
a) Restrição a cada capítulo da decisão
O §9º-A foi bastante amplo ao determinar a exclusão de multas e cancelamento da representação fiscal “na hipótese de julgamento (…) resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade”, pois, pela sua literalidade, bastaria que qualquer um dos capítulos da decisão fosse resolvido pelo método de desempate para se gozar do benefício.

Entre os capítulos do acórdão, podemos ter questões de admissibilidade, preliminares processuais, preliminares de mérito e as questões meritórias. Trata-se, na lição da doutrina processual, de parcelas da decisão autônomas e independentes entre si [2] — daí causar espécie, à primeira vista, que a existência de empate com voto de qualidade (VQ) em um deles gere efeitos sobre outros, a despeito da inexistência de qualquer prejudicialidade interna entre as questões.

Entretanto, é preciso compreender que os novos efeitos do voto de qualidade são de natureza exoprocessual (de direito material) e não endoprocessual (de caráter processual) [3]. Logo, não afetam o conteúdo decisório do julgamento (proclamação do resultado), mas apenas o efeito da decisão proferida, que se dá em uma etapa subsequente, de liquidação do julgado pela Receita Federal, após o encerramento do processo administrativo.

Caberá a esse órgão analisar o teor da decisão a fazer refletir os seus efeitos diretos (e.g. reforma parcial do lançamento) e indiretos (previstos na Lei nº 14.689/23) sobre o crédito. Em rigor, os efeitos das novas regras exonerativas, de caráter material, e não processual, sequer devem ser objeto de proclamação do resultado do julgamento, pois são decorrência posterior dele.

Nessa linha, não há óbice lógico para que esses efeitos exoprocessuais alcancem parcelas da decisão que não foram julgados pelo VQ.

Tanto que o artigo 25-A, que dispõe sobre a exclusão de juros de mora caso se pague no prazo de 90 dias, quando a decisão se deu pelo VQ, estabelece em seu §7º que ele se aplica “exclusivamente à parcela controvertida, resolvida pelo voto de qualidade”, dando a entender que, aqui sim, o benefício estaria restrito à parcela da decisão resolvida por esse instrumento. Há uma evidente distinção de alcance entre os dois dispositivos (artigo 25, §9º-A e artigo 25-A), a despeito de ambos tratarem de efeitos legais sobre o crédito tributário mantido pelo VQ.

Nessa situação, há dois possíveis caminhos para a Administração: 1) adotar uma regulamentação infralegal restritiva do alcance do artigo 25, §9-A (a exemplo da Portaria ME nº 260/2020) ou 2) aplicar por analogia o disposto no §7º do artigo 25-A. A primeira tentativa esbarraria em um problema de legalidade, ao passo que a segunda encontraria óbice na própria distinção feita pelo legislador, afinal “a lei não contém palavras inúteis”.

  1. b) Processos de cobrança de multas isoladas
    Outro problema é a sua aplicabilidade aosprocessos de cobrança de multas isoladas. Isso se daria porque o artigo 25-A estabelece que, após a resolução do julgamento por voto de qualidade, com avitória da Fazenda Nacional, haveria a opção de pagamento do valor remanescente – que inexistiria na hipótese de multa isolada, já que a totalidade da multa seria afastada.

Por outro lado, na esteira da existência de alcances distintos para o artigo 25, §9º-A e o artigo 25-A do Decreto nº 70.235/72, poder-se-ia sustentar também que não há conexão normativa necessária entre os dois dispositivos, sendo o primeiro compatível com os processos de multas isoladas, ao passo que o segundo, por uma questão lógica, seria inaplicável a esses casos. Em outras palavras, da inaplicabilidade lógica do artigo 25-A a esses casos, não se pode derivar a inaplicabilidade do artigo 25, §9º-A.

Essa distinção, que confirmaria a aplicação do artigo 25, §9º-A às multas isoladas, é corroborada pela rejeição expressa, no âmbito legislativo, da proposta do Senador Otto Alencar de restringir a exclusão às multas vinculadas a tributos.

  1. c) Voto de qualidade e recurso especial no Carf
    Na esteira do que sustentamos acima, de que os efeitos previstos pela Lei nº 14689/23 sobre o crédito são denatureza exoprocessual, não afetando o conteúdo decisório do acórdão, entendemos que, à luz do atual Ricarf, não haveria possibilidade de recurso especial fundado em diferentes quóruns de julgamento, pois as decisões seriam convergentes, mudando apenas o tratamento jurídico recebido na etapa de liquidação do julgado.

Por outro lado, caso o contribuinte perca o seu caso no Carf por VQ e opte pela interposição de recurso especial sobre a matéria em que houve o empate, estará sujeito à perda das benesses na liquidação do crédito, caso o julgamento na Carf seja desfavorável por maioria. Não haveria aqui qualquer reformatio in pejus, pois manteve-se integralmente o conteúdo da decisão recorrida, afetando apenas efeitos atribuídos à decisão administrativa final, na etapa de liquidação.

2) Artigo 25-A, §§ 3º a 6º do Decreto nº 70.235/72 — a compensação de prejuízos fiscais
Outra novidade é a possibilidade de compensação de prejuízos de controladas ou controladoras diretas ou indiretas, bem como sociedades sob controle comum, com efeito extintivo sujeito a condição resolutória da sua ulterior homologação (§5º), no prazo de cinco anos (§6º).

A medida gerará a criação de um mercado de empresas inativas com saldos acumulados de prejuízos fiscais, para compensar os débitos mantidos pelo VQ. Entretanto, esse procedimento poderá esbarrar numa dificuldade prática: a comprovação documental da existência do prejuízo fiscal.

O Carf possui jurisprudência no sentido de que o Fisco pode analisar fatos, operações e documentos relativos a períodos já atingidos pela decadência, para fins de verificar a repercussão deles no futuro, como na composição do saldo de prejuízos fiscais (e.g. acórdão nº 1402-003.350 e 1402-006.385), ficando apenas vedado lançar créditos tributários referentes a esses períodos.

Parece-nos razoável esperar que essas compensações passem pelo escrutínio criterioso da Receita, que exigirá a comprovação da formação do saldo de prejuízos para homologar a compensação, demandando documentação de um amplo período, relativo a uma empresa inativa. Na hipótese de não homologação da compensação, parece-nos ser o caso de aplicação do §8º, com a inscrição dos valores já constituídos em dívida ativa da União, para cobrança judicial.

3) Artigo 44 da Lei nº 9.430/96  as alterações no regime das multas qualificadas
a) Multas qualificadas e agravadas
No âmbito federal, as multas poderiam ser majoradas em 50% pela presença de situações agravantes, como não atendimento à fiscalização, reincidência etc., mas eram aumentadas para 150% na hipótese de situações qualificadoras mais graves (sonegação, fraude ou conluio). O PL original, pretendia revogar as hipóteses agravantes e reduzir a multa qualificada para 100% do tributo, mantendo-se na lei apenas a segunda alteração.

Essa situação gerou uma situação esdrúxula, ofensiva à proporcionalidade das penas, que orienta inclusive a aplicação de sanções administrativas, pois situações qualificadoras, mais graves, estarão sujeitas a uma multa de 100%, ao passo que as agravantes, menos graves, serão penalizadas em 112,5%.

Parece-nos, à luz da proporcionalidade que as penalidades devem guardar com relação à gravidade das condutas, que a Administração deverá observar o artigo 2º, parágrafo único, VI, c/c artigo 65, ambos da Lei nº 9.874/99, para promover uma revisão das sanções e adequá-las ao patamar das multas qualificadas. Ademais, parece-nos que não se trata aqui de um afastamento da regra da multa agravada por inconstitucionalidade, mas sim um controle de adequação “in concreto” das sanções aplicadas, considerando a nova moldura normativa punitiva estabelecida, com vistas a manter uma coerência na atuação sancionadora do Estado.

  1. b) A reincidência nas situações qualificadoras
    A lei prevê que a multa qualificada será alçada a 150% nas hipóteses dereincidênciado sujeito passivo, que, nos termos do artigo 44, §1º-A, se dará quando no prazo de dois anos, contado do ato de lançamento em que tiver sido imputada a ação ou omissão tipificada nos artigos 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502/64 e ficar comprovado que o sujeito passivo incorreu novamente em qualquer uma dessas condutas.

Essa condição nova, em nosso entender (com o endosso de outra colunista [4]), fulmina retroativamente todas as multas qualificadas aplicadas, obrigando a sua redução ao patamar de 100%, com fulcro no artigo 106, II, “c” do CTN, incluídas aquelas no âmbito judicial. Não nos parece haver espaço para eventuais diligências por parte dos órgãos de julgamento para verificar a existência de reincidência, sob pena de ostensiva e ilegal inovação dos fundamentos do auto.

O dispositivo traz algumas dificuldades de ordem semântica, pois não deixa claro se basta a repetição de qualquer das circunstâncias dos artigos 71, 72 ou 73, ou se deveria haver uma repetição específica da situação qualificadora, para que se possa aplicar a multa de 150%. Por força do artigo 112, II, do CTN, parece-nos que essa dúvida deve ser resolvida da forma mais favorável ao acusado, com a exigência da reincidência específica.

  1. c) A confusão entre lançamento e processo administrativo
    A exigência da reincidência, por descuido do legislador, é passível de ser burlada pela fiscalização de duas maneiras.

A primeira se baseia no fato de que a reincidência se conecta ao “ato de lançamento” que imputou sonegação ou fraude. O dispositivo foi mal redigido e confunde as coisas, pois conforme o artigo 9º e seu §1º do Decreto nº 70.235/72, cada tributo ou penalidade isolada será objeto de lançamentos distintos, que poderão ser formalizados por meio de um único processo administrativo.

Em suma, pela literal redação do dispositivo, poder-se-ia, em um mesmo processo administrativo, realizar vários lançamentos, imputando fraude ou sonegação a todos, e fazê-los em uma sucessão temporal, para justificar a aplicação de multa de 100% apenas para o primeiro, e 150% aos demais, pois seriam — rigorosamente — lançamentos distintos, e não há regra que condicione a reincidência ao lançamento de um mesmo tributo.

  1. d) Ausência de regra antifragmentação das autuações fiscais
    A segunda falha se baseia na possibilidade de se burlar a exigência do interregno de dois anos por meio da realização de autos de infração fracionados no menor período de apuração possível.

Por exemplo, ao invés de lavrar o auto de infração de IRPJ relativo a vários exercícios, o auditor realizaria vários lançamentos baseados no menor período possível para configurar a multa qualificada no primeiro e lançar a multa de 150% nos demais.

Esse possível ardil poderia ser barrado pelo estabelecimento de uma regra específica que vedasse uma fragmentação artificial de autos de infração em períodos menores, ou estabelecimento de períodos mínimos de autuação. A própria Portaria RFB nº 48/2021, que dispõe a respeito da formalização de processos relativos a tributos administrados, nada dispõe a esse respeito.

  1. e) Reflexos do processo penal tributário sobre a multa
    O artigo 44, §1º-C, II, traz uma previsão bastante interessante: nas hipóteses em que haja sentença penal de absolvição com apreciação de mérito em processo do qual decorra imputação criminal do sujeito passivo, deve ser afastada a qualificação da multa. A lógica do dispositivo é a de que a multa qualificada e os crimes tributários possuem condições comuns de incidência [5].

Esse dispositivo, por uma questão de lógica, destina-se aos casos em que a multa qualificada é objeto de inscrição em dívida ativa e eventual ajuizamento de execução fiscal, tendo em vista que não há tipificação de crime material contra a ordem tributária antes do lançamento definitivo do crédito, inclusive com o encerramento do processo administrativo, nos termos da Súmula Vinculante nº 24 do STF.

Entretanto, a redação do dispositivo levanta questões importantes.

A primeira delas é saber se bastaria a mera prolação de sentença penal de absolvição, sem a necessidade de trânsito em julgado, para que gere seus reflexos sobre a execução fiscal, na forma como dispõe literalmente a lei. Poderia ocorrer, por exemplo, da sentença ser reformada em apelação, e já ter sido afastada a multa qualificada na execução.

A segunda consiste em saber se, a partir da edição da Lei nº 14.689/23, o encerramento do processo penal passa a ser causa de prejudicialidade externa do processo de execução fiscal, impondo a sua suspensão, nos termos do artigo 313, V, “a” do CPC/2015, considerando que o seu desfecho impactará na extensão da relação jurídica discutida.

A terceira é saber se o dispositivo seria aplicável na hipótese de eventual desclassificação do crime contra a ordem tributária para crime comum, que sequer tenha sido imputado pela Receita ou pelo Ministério Público (MP), como falsificação de documentos ou falsidade ideológica, com a subsequente condenação do agente. Nessa situação, pela lógica do dispositivo, parece-nos que a desclassificação do delito teria como efeito secundário afastar então a multa qualificada em execução.

A quarta, na esteira da anterior, é saber se os efeitos do referido dispositivo seriam aplicáveis na hipótese em que o MP, tendo acesso ao lançamento e à representação fiscal para fins penais, entender que não há materialidade delitiva e, na condição de titular da ação penal, deixar de denunciar os contribuintes autuados. Ora, se na hipótese em que houve denúncia e absolvição, a multa deveria cair, parece-nos que, a fortiori, a ausência de denúncia deveria gerar os mesmos efeitos.

Conclusões
Como defendemos em nosso outro artigo, discordamos substancialmente da forma como a nova lei afetou a estruturação do contencioso administrativo e as multas federais.

Deixando de lado nossas vênias e indo além, parece-nos que os problemas redacionais são ainda mais graves. Essa má redação gerará intensas controvérsias a respeito da aplicação de seus dispositivos, estimulando um metacontencioso que prorrogará indefinidamente litígios tributários. Nesse artigo, tentamos antecipar apenas algumas delas.

[1] https://www.conjur.com.br/2023-set-06/direto-carf-pl-carf-analise-critica-alteracoes-paf

[2] DINAMARCO, Candido Rangel. Capítulos de Sentença, p. 42-43.

[3] O §9º do artigo 25 é que apresenta essa característica.

[4] https://www.conjur.com.br/2023-set-27/direto-carf-lei-1468923-voto-qualidade-multas-retroatividade

[5] Premissa essa que não nos parece inteiramente correta, como já falamos em outro artigo: https://revista.ibdt.org.br/index.php/RDTA/article/view/1102

Fonte: Conjur

CPF nas farmácias para descontos fictícios e uso de dados sensíveis

Nos últimos anos, todo consumidor de medicamentos ou produtos vendidos nas farmácias brasileiras viu-se diante da seguinte situação: ao fazer a compra de um produto ou medicamento, era coagido a informar o CPF sob pena de não obter altos descontos nos preços dos produtos adquiridos. Essa prática bastante comum na maioria dos estabelecimentos farmacêuticos chamou a atenção dos consumidores, e principalmente, das autoridades.

Diante disso, a Drogaria Araújo S/A foi condenada a uma pena de multa no valor de quase R$ 8 milhões por condicionar descontos ao fornecimento do CPF do consumidor no ato da compra, sem oferecer informação clara e adequada sobre abertura de cadastro do consumidor.

CRF-MS

A decisão condenatória é do Procon-MG, órgão integrante do Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG), e ocorreu após investigação dos fatos e recusa da empresa em ajustar a conduta.

Afirmou o órgão que a prática viola o direito do consumidor à informação clara e adequada sobre o serviço ofertado e sobre os riscos à segurança de dados, especialmente por capturar informações pessoais sem informação prévia ao consumidor. Além disso, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

Em processo administrativo, Fernando Ferreira Abreu, promotor de Justiça de Defesa do Consumidor de Belo Horizonte, concluiu que “o escopo principal do suposto programa de fidelidade é o de captar e capturar os CPFs dos consumidores e não desenvolver, em si, um programa de vantagens ou fidelidade”, o que configura prática abusiva, pois a concessão de descontos não pode estar condicionada ao fornecimento de dados pessoais.

O promotor ainda destacou na decisão que as palavras “capturar” e “captar” os CPFs dos consumidores constam inclusive de documentos internos da empresa [1]. Nessa decisão, ele explica que “a captura constante dos hábitos de consumo do consumidor de forma oculta e sem informação prévia representa severo risco à intimidade e vida privada do consumidor, além de sujeitá-lo a riscos das mais variadas espécies”. Em caso de vazamento de dados, os registros de aquisição de medicamentos, por exemplo, podem ser utilizados por uma operadora de plano de saúde ou seguradora para negar cobertura, seguro ou indenização.

Mesmo com essa multa aplicada à Drogaria Araújo, em Minas Gerais, a prática continuou a ocorrer na mesma empresa e em outras pelo país. É o que aponta a notícia publicada em 1º de setembro de 2023, no UOL, por Amanda Rossi [2].

A jornalista apresenta uma reportagem inédita na qual ela fez uma investigação jornalística nas empresas do Grupo RaiaDrogasil, a maior rede de farmácias do Brasil. Segundo a reportagem, o grupo possui um banco de dados com 15 anos de dados acumulados de 48 milhões de consumidores. A jornalista usa seu caso pessoal como exemplo e descobre que, desde 2009, a rede armazena dados sobre ela, compondo um conjunto de 39 páginas de documentos, com todos os tipos de compras realizadas nesses anos.

Segundo a reportagem, os dados são usados por uma empresa da mesma rede, a RD Ads, para ganhar dinheiro com anúncios. A reportagem afirma que o anunciante entra em contato com a RD Ads, escolhe qual público quer atingir e a empresa faz a busca no banco de dados da RaiaDrogasil.

A publicidade então é direcionada a depender dos hábitos de consumo dos consumidores. Segundo a jornalista, o procedimento para se abrir o banco de dados da empresa é o mesmo utilizado pela Drogaria Araújo, ou seja, o fornecimento do CPF dos consumidores. A promessa é que se o consumidor fornecer o CPF, o cliente terá descontos de 70% no preço dos produtos. Todavia, esse preço sem desconto é meramente fictício.

A título de exemplo, a reportagem apresenta o preço de uma caixa de um anti-inflamatório genérico (Nimesulida) que sem o referido desconto sai por R$ 31,78, sem CPF e com o CPF, o preço cai para R$ 8,50, isto é, um desconto de 73%. Segundo a reportagem o preço de R$ 31,78 não existe, já que esse medicamento é bem mais barato. É necessário ressaltar que o preço dos remédios no Brasil é regulado pela Câmara de Regulação de Mercado de Medicamentos (CMED), ligada à Anvisa, e esse preço apresentado pela rede de farmácias é o preço máximo autorizado pela planilha da agência [3].

Segundo Caroline Miranda, pesquisadora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), farmácias se aproveitam dos elevados valores da tabela da CMED que são fictícios, e concedem descontos sobre eles, fazendo com que os consumidores tenham a falsa impressão de que estão pagando muito menos [4].

A reportagem é uma denúncia muito grave contra essas empresas, pois os dados armazenados nelas empresas são extremamente pessoais. No banco de dados de uma farmácia você pode, por exemplo, saber que um consumidor possui doença crônica, doenças sexualmente transmissíveis, doenças degenerativas, qual a orientação sexual dele, se toma medicamentos controlados, se compra medicamentos para impotência sexual, preservativos, anticoncepcionais, se possui problemas de hemorroidas, vaginite, se é depressivo, suicida, além de inúmeras outras informações, já que as drogarias hoje vendem de quase tudo.

A Lei nº 12.414/11, Lei do cadastro positivo, dispõe no seu artigo 3º, §3º, II, que ficam proibidas as anotações de informações sensíveis, assim consideradas aquelas pertinentes à origem social e étnica, à saúde, à informação genética, à orientação sexual e às convicções políticas, religiosas e filosóficas. Da análise desse dispositivo, percebe-se que as informações constantes em um cadastro de uma farmácia são uma informações sensíveis de acordo com a lei, já que lá estarão informações sobre a saúde, genética, orientação sexual, além de outras.

A Lei Geral de Proteção de Dados apresenta como fundamentos, em seu artigo 2º, o respeito à privacidade e a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem, bem como à autodeterminação informativa e também define, em seu artigo 5º, II, dados sensíveis como “dado pessoal sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural”.

Ademais, o artigo 11, I, da Lei nº 13.709/08, dispõe que o tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, para finalidades específicas, o que não ocorre nas farmácias, já que o CPF é concedido para a obtenção de descontos e, em momento algum, o consumidor é informado de que se está criando um banco de dados a seu respeito.

A referida lei também estabelece que a comunicação ou o uso compartilhado de dados pessoais sensíveis entre controladores com objetivo de obter vantagem econômica poderá ser objeto de vedação ou de regulamentação por parte da autoridade nacional, ouvidos os órgãos setoriais do Poder Público, no âmbito de suas competências. Ainda, em seu artigo 11, §4º, a lei dispõe que é vedada a comunicação ou o uso compartilhado entre controladores de dados pessoais sensíveis referentes à saúde com objetivo de obter vantagem econômica, exceto nas hipóteses relativas a prestação de serviços de saúde, de assistência farmacêutica e de assistência à saúde.

O CDC estabelece que é direito básico do consumidor a informação clara e adequada sobre qualquer aspecto que envolva a relação de consumo. Ainda dispõe que a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele, artigo 43, §2º.  Outro ponto importante da discussão é que a reportagem do UOL apresenta um registro de 15 anos, um prazo muito extenso para se manter um cadastro ou banco de dados. Quanto a isso a LGPD não diz nada a respeito e o CDC impõe um limite de cinco anos para os arquivos de consumo.

Em suma, várias práticas abusivas são realizadas por esse setor empresarial que guarda informações sensíveis dos consumidores. A exigência de CPF para obtenção de desconto fictício, o próprio desconto fictício, a abertura de um cadastro de consumo sem conhecimento prévio ou consentimento do consumidor somente com o seu CPF, o uso desses dados sem que o consumidor tenha conhecimento, a obtenção de vantagens econômicas com dados sensíveis dos consumidores e a manutenção desses arquivos de consumo por um período tão longo. Falta informação e transparência, princípios basilares do direito do consumidor.

O que se espera é que com a denúncia dessa reportagem e dos próprios consumidores essa prática se torne proibida ou mais transparente para todos os envolvidos.

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[1] Drogaria Araújo deverá pagar multa de R$ 7 milhões por capturar CPF dos consumidores. Disponível aqui. Acesso em 03.09.2023.

[2] ROSSI, Amanda. O que a farmácia sabe sobre mim? Disponível em: https://noticias.uol.com.br/reportagens-especiais/o-que-a-farmacia-sabe-sobre-mim/#cover. Acesso: em 03.09.2023.

[3] Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/medicamentos/cmed. Acesso em: 03.09.2023.

[4] ROSSI, Amanda. O que a farmácia sabe sobre mim? Disponível em: https://noticias.uol.com.br/reportagens-especiais/o-que-a-farmacia-sabe-sobre-mim/#cover. Acesso em: 03.09.2023.

Fonte: Conjur

Projeto permite recurso contra decisão que indeferir medida protetiva de urgência

O Projeto de Lei 982/23 permite que a vítima de violência doméstica e familiar apresente recurso contra decisão judicial que indeferir o pedido de medida protetiva de urgência.

Essas medidas são determinadas pelo juiz e impõem condutas ao agressor, entre elas: o afastamento do lar, a proibição de se aproximar da vítima e a restrição de acesso a determinados locais.

Deputado Delegado Palumbo fala ao microfone
O autor da proposta, deputado Delegado Palumbo – MyKe Sena/Câmara dos Deputados

Em análise na Câmara dos Deputados, a proposta insere a possibilidade de recurso no Código de Processo Penal e na Lei Maria da Penha.

“Na prática, quando a vítima sofre violência e busca uma medida protetiva de urgência no Judiciário, se esse pleito é indeferido, ela simplesmente não pode recorrer da decisão, pois não há previsão legal”, explica o deputado Delegado Palumbo (MDB-SP), autor do projeto. Segundo ele, alguns advogados insistem em apresentar recursos, mas muitos são negados por causa de previsão legal.

A impossibilidade de recorrer, afirma o parlamentar, fere o duplo grau de jurisdição, princípio na Constituição.

“Por outro lado, o autor da violência, quando se vê impedido de fazer algo em decorrência do deferimento de uma medida protetiva de urgência, pode impetrar habeas corpus”, compara Palumbo.

Tramitação
A proposta será analisada em caráter conclusivo pelas comissões de Defesa dos Direitos da Mulher; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

 
Fonte: Câmara dos Deputados

Incidência de IOF não se limita a empréstimos no mercado financeiro

O Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas operações de empréstimo entre empresas e pessoas físicas ou entre pessoas jurídicas que não sejam instituições financeiras. Por unanimidade, o Plenário, em sessão virtual, desproveu recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida (Tema 104).

Incidência do IOF não se restringe a operações entre instituições financeiras
Reprodução

Uma fabricante de autopeças questionou no Supremo decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que manteve a exigência de IOF nos contratos de mútuo (empréstimos) entre empresas pertencentes ao mesmo grupo empresarial. De acordo com o TRF-4, a Constituição não limita o âmbito de incidência do imposto às operações de crédito praticadas por instituições financeiras.

No STF, a fabricante alegou que o artigo 13 da Lei 9.779/99, que prevê a incidência do IOF nas relações particulares, é inconstitucional, pois alargou a base de cálculo do imposto para alcançar o mútuo (empréstimo de coisas), desvirtuando a função regulatória do IOF, de modo que sua incidência deveria estar restrita a operações do mercado financeiro.

Restrição
Ao votar pelo desprovimento do recurso, o ministro Cristiano Zanin, relator da matéria, lembrou que o STF, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.763, já firmou entendimento de que não há na Constituição Federal, ou no Código Tributário Nacional, nada que restrinja a incidência do IOF às operações de crédito feitas por instituições financeiras.

Ainda na avaliação do ministro, não há dúvida de que o mútuo de recursos financeiros se caracteriza como operação de crédito, pois se trata de negócio jurídico promovido com a finalidade de obter, junto a terceiro e sob vínculo de confiança, a disponibilidade de recursos que deverão ser restituídos após determinado prazo, sujeitando-se a riscos.

Também não procede, para o relator, o argumento de que a incidência sobre operações de empresas não financeiras extrapolaria a função regulatória do imposto, pois, no caso, o caráter arrecadatório do imposto se sobrepõe à exclusividade da função regulatória do IOF.

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte:

É constitucional a incidência do IOF sobre operações de crédito correspondentes a mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física, não se restringindo às operações realizadas por instituições financeiras”.

Com informações da assessoria de imprensa do STF.

RE 590.186

Fonte: Conjur

Projeto determina instalação de órgãos de proteção aos consumidores nos aeroportos

O Projeto de Lei 1859/23 determina a oferta de atendimento especializado em defesa dos consumidores nos aeroportos comerciais localizados em capitais e regiões metropolitanas. O texto em análise na Câmara dos Deputados insere a regra no Código de Defesa do Consumidor.

Luciano Azevedo discursa na tribuna do Plenário
Luciano Azevedo é o autor do projetoBruno Spada/Câmara dos Deputados

O Projeto de Lei 1859/23 determina a oferta de atendimento especializado em defesa dos consumidores nos aeroportos comerciais localizados em capitais e regiões metropolitanas. O texto em análise na Câmara dos Deputados insere a regra no Código de Defesa do Consumidor.

“É razoável a presença de entidades e órgãos de proteção aos consumidores nos aeroportos, uma vez que os usuários, como regra, estão fora do domicílio, algo que os colocam em fragilidade diante da execução precária de serviços contratados”, disse o autor da proposta, deputado Luciano Azevedo (PSD-RS).

Tramitação
O projeto tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Viação e Transportes; de Defesa do Consumidor; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Fonte: Câmara dos Deputados

Projeto cria delegacia especializada para atuação em conflitos agrários

O Projeto de Lei 3763/23 institui delegacias específicas para atuar em conflitos agrários. Elas deverão atuar na repressão e exercer a atividade de polícia judiciária em casos de crimes patrimoniais, violência ou grave ameaça no campo.

Delegado Fabio Costa discursa na tribuna do Plenário
Delegado Fabio Costa é um dos autores do projeto – Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O texto em análise na Câmara dos Deputados define o conflito agrário como as divergências entre pessoas físicas ou jurídicas, detentoras de imóveis e trabalhadores rurais sem terra.

O projeto permite ainda que os estados usem recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para criar essas delegacias especializadas. A Lei 14.541/23 traz determinação semelhante no caso das delegacias da mulher.

“Os conflitos agrários têm aumentado, e a falta dessas delegacias especializadas favorece a impunidade de organizações criminosas”, afirmaram os autores da proposta, o deputado Delegado Fabio Costa (PP-AL) e outros 40 parlamentares.

Tramitação
O projeto tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Fonte: Câmara dos Deputados

Para Quinta Turma, in dubio pro societate não resolve dúvida sobre dolo eventual na pronúncia

Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), havendo dúvida sobre a submissão do réu ao tribunal do júri, é possível aplicar o preceito in dubio pro societate em relação à materialidade do crime e aos indícios de autoria; tal preceito, porém, não deve prevalecer quanto ao elemento subjetivo – ou seja, à definição sobre a conduta do réu ter sido dolosa ou culposa.

Com esse entendimento, o colegiado confirmou decisão monocrática do relator, desembargador convocado João Batista Moreira, que desclassificou para a forma culposa um crime de trânsito pelo qual o réu havia sido pronunciado, sob a acusação de homicídios consumado e tentado com dolo eventual.

De acordo com os autos, dirigindo após ingerir bebida alcoólica, o réu invadiu a contramão e colidiu com dois motociclistas – um deles morreu e o outro ficou ferido.

Ao ratificar a sentença de pronúncia, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afirmou que, na primeira fase do procedimento júri, eventual dúvida sobre o caráter doloso da conduta não deve favorecer o acusado, devendo prevalecer, nesse caso, a regra in dubio pro societate. No entendimento do tribunal, bastam a prova de materialidade e indícios suficientes de autoria – além de uma compreensão preliminar sobre a ocorrência de dolo eventual – para que o processo seja julgado pelo júri popular.

No entanto, segundo o relator no STJ, mesmo que não se conclua pela aplicação do princípio in dubio pro reo – que tem amparo constitucional – na fase de pronúncia, “no mínimo deve-se entender que o interesse maior da sociedade é a realização da justiça. E não será a melhor maneira de promover justiça a remessa, ao tribunal do júri, do julgamento de questão relacionada à configuração, ou não, de dolo eventual, com tantas nuances fáticas e teóricas”.

Embriaguez não leva ao reconhecimento automático de dolo

O desembargador João Batista Moreira destacou que, segundo o artigo 28, inciso II, do Código Penal, a embriaguez não exclui a imputabilidade penal, mas isso não significa que o dispositivo leve, necessariamente, ao reconhecimento do dolo.

“Entender que a conduta de embriagar-se implica, em todos os casos, assunção do risco e a aceitação (remota) da possibilidade do cometimento, em seguida, de atos criminosos seria levar a indevido extremo a teoria da actio libera in causa. À luz desse pressuposto, deve ser examinado, pois, se mesmo que reconhecida a presença de prova ou indícios de embriaguez, as demais circunstâncias fáticas autorizam concluir que o réu, no momento imediatamente anterior, assumiu o risco de produzir e assentiu no resultado criminoso”, declarou.

O relator apontou que algumas informações do processo precisariam ser levadas em conta, como o fato de que chovia na hora da colisão, o local – onde já houve acidentes semelhantes – era uma curva inclinada, a pista era autorizada para 40 km/h e o réu dirigia entre 43 e 48 km/h. Além disso, ele prestou socorro às vítimas e entrou em contato com a polícia, “o que denota, salvo a desarrazoada hipótese de imediato arrependimento, ausência de prévio consentimento com o resultado”.

Na opinião de João Batista Moreira, o artigo 419 do Código de Processo Penal leva à conclusão de que não bastam as provas de crime contra a vida e os indícios de sua autoria para que o caso vá ao júri. “Do contrário, todos os crimes contra a vida, evidenciada a respectiva materialidade e autoria, independentemente da forma dolosa, deveriam ser remetidos ao tribunal popular, competindo a este e só a este, pois, a eventual desclassificação para a forma culposa”, ponderou.

Para o relator, cabe ao juiz, em relação ao elemento subjetivo, “sopesar as provas e circunstâncias e decidir, fundamentadamente, quanto à hipótese de desclassificação para a forma culposa”.

Fonte: STJ

Recuperação do crédito e métodos adequados de solução de conflitos

Recentes alterações legislativas reforçaram a importância da negociação e do uso de métodos adequados de soluções de conflitos para aprimoramento da recuperação do crédito e utilização ordenada e racional da via judicial.

Nesse sentido, a Lei nº 14.181/21 alterou o CDC (Código de Defesa do Consumidor — Lei nº 8.078/90) para esclarecer que um dos objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo é a prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor. Para tal finalidade, instituiu por meio do artigo 104-A do CDC o procedimento coletivo de repactuação de dívidas, o qual objetiva a negociação e aprovação de plano de pagamento em audiência de conciliação, como etapa prévia e necessária ao procedimento subsequente, previsto no artigo 104-B, para revisão e integração dos contratos e repactuação de dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório.

O Tribunal de Justiça de São Paulo
ConJur

Por outro lado, a Lei nº 14.112/20 inseriu a Seção II-A na Lei nº 11.101/05, declarando nos artigos 20-A a 20-D que a conciliação e a mediação devem ser incentivadas em qualquer grau de jurisdição, reconhecendo, assim, sua compatibilidade com os procedimentos de recuperação judicial e falência. Mais especificamente, em seu artigo 20-B, IV, previu a possibilidade de mediação em caráter antecedente ao ajuizamento de pedido de recuperação judicial, para negociação de dívidas, inclusive com suspensão das execuções e atos de constrição, antecipando em parte os efeitos do stay period, justamente para se fomentar a busca pela via autocompositiva como tentativa para se evitar utilização do procedimento de recuperação judicial, sabidamente mais oneroso.

As legislações supra referidas evidenciam a contribuição que a conciliação ou a mediação podem representar para situações notoriamente conflituosas existentes na recuperação de crédito de devedores com alto grau de endividamento. Isso porque, ao estruturarem e organizarem as negociações coletivas entre devedor e seus credores em ritos específicos, recorrendo a normas que visam assegurar transparência quanto à situação financeira do primeiro e que vinculam a participação dos credores a meios autocompositivos, proporcionam a estes últimos melhor dimensão sobre a capacidade global de pagamento do devedor e fomentam interlocução e maior aproximação entre ambos.

Contribuem, também, para trazer maior clareza quanto à perspectiva de recuperação do crédito, sobretudo quanto se aventa às consequências que serão coletivamente impostas a todos os credores em caso de fracasso das negociações, que é a possibilidade do procedimento subsequente de revisão e repactuação por plano judicial compulsório, no caso do superendividado, ou da falência, no caso do empresário ou da sociedade empresária. Desse modo, ao concentrarem em um único procedimento devedor e credores, além de reduzir os custos de manutenção e gerenciamento de diversos processos individuais, resultam, também, na substituição da lógica individual da recuperação do crédito em execuções individuais pela perspectiva coletiva.

Por fim, a busca da solução autocompositiva dos conflitos envolvendo o superendividado, seja pessoa física ou pessoa jurídica, também proporciona maior otimização e racionalização do uso do Poder Judiciário.

A situação do superendividamento — pessoa física ou jurídica — traz como consequência, em regra, a distribuição de diversas ações individuais no Poder Judiciário, seja para discussão e revisão de contratos, por parte do devedor, seja para cobrança de dívidas ou execuções de títulos, por parte dos credores. Em qualquer um dos cenários, o resultado esperado pode ser frustrante para todos os envolvidos, em virtude do tempo e da incerteza quanto à efetiva revisão do contrato ou ainda da também incerta recuperação do crédito nos procedimentos executivos individuais, em vista da insuficiência de ativos. 

A concentração de todos esses conflitos — ou ao menos a maioria —, em um único procedimento, em momento inicial e a critério do devedor, proporciona utilização mais racional e focada da estrutura do Poder Judiciário, a qual estará comprometida para auxiliar as partes a encontrarem solução possível, ao invés de atuar de forma pulverizada em procedimentos individuais com resultados possivelmente frustrantes e insatisfatórios, dado ao alto grau de endividamento. Possui, também, função preventiva de futuros litígios, na medida em que concentra desde o momento inicial em um único procedimento todos os credores afetados, os quais, em caso de sucesso da via autocompositiva, não precisarão ajuizar ações individuais para a tutela de seus interesses.

Nesse contexto, evidencia-se a importância da atuação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejucs), os quais tem por função a realização de sessões de conciliação e mediação no âmbito do Poder Judiciário.

A negociação coletiva inerente à recuperação de crédito de devedores com alto grau de endividamento, estruturada pelas legislações acima referidas, possui alguns desafios. Exige atenção à capacitação de conciliadores e mediadores, os quais necessitam treinamento específicos para atuação nessa espécie de litígios, e, também, organização própria da estrutura dos Cejuscs, que precisa ser capacitada e dimensionada para conseguir atender a essas demandas.

Para permitir a melhor organização e institucionalização da atuação dos Cejucs no âmbito da recuperação do crédito de devedores com alto grau de endividamento, foi publicado o  Provimento CSM do E. TJSP nº 2717/23, o qual instituiu o “Núcleo de Conciliação e Mediação de Conflitos oriundos do Endividamento”, com o intuito de fomentar, o âmbito dos Cejucs, a maior capacitação pretendida para mediadores e conciliadores, e, também, iniciativas para aprimoramento da política pública de consumo no âmbito do Superendividado, conforme preceitua o artigo 104-A do CDC.

Para regulamentação do Núcleo de Conciliação e Mediação de Conflitos oriundos do Endividamento, foi editada a Portaria Nupemec TJ-SP nº 4/23, a qual congregou, na fase processual, o rito do superendividamento previsto no CDC, e, na fase pré processual, além das pessoas naturais superendividadas, também as pessoas jurídicas, em especial comerciantes individuais e microempresários.

O novo núcleo criado no âmbito do Nupemec do TJ-SP  contribuirá para melhor organização da atuação dos Cejuscs na área do tratamento de conflitos envolvendo devedores com alto grau de endividamento, na medida em que permitirá a identificação de mediadores e conciliadores com interesse específico em atuar nessa área, e, desse modo, a sua orientação para capacitação focada nessa matéria. Além disso, permitirá, também, a padronização dos ritos procedimentais que serão adotados em cada um dos Cejuscs do Estado de São Paulo no tratamento dessa espécie de conflitos, mediante orientações do Nupemec divulgando boas práticas.

A importância da criação do Núcleo de Conciliação e Mediação de Conflitos oriundos do Endividamento transborda a simples organização das práticas cartorárias no âmbito do TJ-SP e a estruturação do Poder Judiciário em si nessa área. Isso porque, a sua existência se mostra crucial para que o Nupemec possa exercer suas competências de implementação da Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesses nessa área, conforme preceitua o artigo 7º, I, II e VI da Resolução CNJ nº 125/10, na medida em que permite que sejam fomentadas parcerias com entes públicas e privados comprometido com esforços na adoção de práticas adequadas de solução de conflitos focadas nessa matéria.

Nesse contexto, será lançado no próximo dia 16 de outubro no TJ-SP o Programa Estadual de Combate ao Superendividamento, que objetiva divulgar a existência de estrutura própria do Poder Judiciário para atuação na área do tratamento dos conflitos envolvendo os devedores com alto grau de endividamento, buscando, assim, fomentar o comprometimento de entes públicos e privados na adesão aos esforços para a utilização da via autocompositiva como solução de litígios.

O objetivo precípuo de se lançar um Programa Estadual de Combate ao Superendividamento é divulgar aos cidadãos, especialmente aos credores e devedores em situação crônica de endividamento, que a utilização dos Cejucs para a adoção da lei de combate ao superendividamento não só encurtará o caminho para a solução de inadimplência e de quitação de valores devidos em favor dos credores, como permitirá uma aproximação entre os personagens desses conflitos econômicos, que poderão se comunicar diretamente durante a sessão de conciliação, intermediados por conciliadores habilitados pelo Nupemec e devidamente capacitados para atuarem nos conflitos de tratamento dos endividados — e para tanto, registre-se, já há aproximados quatrocentos conciliadores aptos para iniciar este trabalho a partir do lançamento do programa — bem como, diminuir os custos das infindáveis cobranças judiciais, restabelecendo a vida civil do devedor e devolvendo-lhe a dignidade pessoal e a viabilidade financeira, inclusive com a suspensão da negativação de seu nome, indo ao encontro da tão buscada efetividade na resolução do conflito.

Convém destacar que em grande parte das vezes, após o longo trâmite, o processo judicial não resulta em nada, pois devedores inadimplentes em situação crônica não contam com capital ou bens para solverem suas dívidas, ainda que condenados judicialmente. Assim, o que se vê no cenário da Justiça, após a condenação de devedores, é o não recebimento dos valores a que fazem jus os credores e, por via de consequência, a manutenção da situação do cidadão endividado e negativado, que não consegue, por esta razão, resgatar melhores condições de vida e de sua dignidade humana, por não lograr atingir a sua solvência financeira. Ou seja, permanece condenado e devedor.

A conciliação realizada com qualidade, sob a supervisão do Poder Judiciário pela via dos Cejuscs, com a capacitação dos conciliadores, bem como, com o preparo dos demais profissionais que atuarão na audiência, qual seja, prepostos e advogados que compareçam tendo absoluto conhecimento do conflito em si, além das peculiaridades dos trabalhos consensuais, resultará em absoluta diferença em relação ao resultado de um processo judicial com decisão imposta.

Aliás, é oportuno esclarecer que as conciliações poderão ocorrer tanto nos casos em que as dívidas já tenham sido judicializadas, suspendendo-se o processo em qualquer fase em que ele se encontre, como e, principalmente, ser utilizada a chamada fase pré processual prevista na Lei de Mediação e na legislação processual, a partir da qual poderá o devedor formalizar o seu pedido, inclusive virtualmente (será disponibilizado um simplificado formulário digital para preenchimento), em face do que serão convidados todos os seus credores ali indicados, através de convite virtual e rápido, para que todos compareçam à audiência de conciliação que será agendada pelo Cejusc competente (territorialmente, pelo endereço do devedor), audiência na qual serão intermediados pelo conciliador habilitado. Havendo êxito na conciliação, o acordo será formalizado e homologado pelo Juiz do Cejusc em questão.

O lançamento oficial do Programa Estadual de Combate ao Superendividamento, com a presença do i. Presidente do Tribunal de Justiça, e de diversos entes da sociedade civil nas áreas público e privada, advogados, representantes de setores financeiros, empresariais e comerciais, além de representantes do Ministério Público, da OAB, da Defensoria Pública e de instituições de defesa do consumidor, demonstra a importância do projeto pioneiro do Tribunal de Justiça de São Paulo, que concederá a chance à sociedade de fazer uso das regras dessa importante e ousada lei, em vigência desde 2021, mas ainda timidamente utilizada, para que se evite que a oportuna e necessária legislação caia no esquecimento pelo desuso, e se torne mais uma a fazer parte do estranho fenômeno brasileiro da lei que não pegou.

Por isso o Núcleo de Conciliação do Tribunal de Justiça Paulista está capitaneando esse urgente programa de trabalho focado na chamada desjudicialização de conflitos e na busca da recuperação de crédito com a consequente retirada do cidadão superendividado dessa dificílima situação, aproximando-o, conjuntamente a todos os credores, para a solução das suas dívidas e tratamento financeiro vindouro, o que também fomentará a economia em vista do intolerável número de mais de setenta milhões de brasileiros endividados, e persuadirá a sociedade a adotar, cada vez mais, os melhores métodos de solução de conflitos que são os consensuais.

Fonte: Conjur

Debatedores cobram mudança na moderação de conteúdo das plataformas digitais

Em seminário sobre tecnologias digitais realizado pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, nesta quinta-feira (5), foi cobrado das plataformas digitais moderação maior das publicações, além da simples retirada de conteúdo.

O procurador que atua na área de direitos do cidadão, Yuri Corrêa da Luz, defendeu que as plataformas impulsionem conteúdos oficiais de ministérios, como o da Saúde, e sobre o funcionamento das instituições em períodos críticos, como de eleições.

Segundo ele, com a disseminação da internet, há cada vez mais gente produzindo conteúdo, diferente de quando predominavam jornais, TVs e rádio. Com essa descentralização, o procurador considera não ser mais possível que a moderação seja feita por quem emite o conteúdo. Ele defendeu que a atribuição fique com quem faz a intermediação, ou seja, com as plataformas digitais.

Impacto
O diretor-executivo do Instituto Vero, Caio Machado, destacou o impacto que as plataformas exercem hoje sobre a vida das pessoas. O Instituto é uma organização que trabalha com combate à desinformação.

Ele destacou que, a depender dos termos inseridos para a pesquisa no Google sobre a evolução da vida, as primeiras páginas indicadas podem direcionar o cidadão a uma teoria criacionista ou a teoria evolucionista, a partir dos dinossauros. “No uso de um serviço que tem um status de estrutura pública, a gente precisa exigir um grau de legitimidade e controle maior”, declarou.

O que diz o Google
Apesar das críticas, o gerente de Políticas Públicas do Google no Brasil, Luiz Moncau, afirmou que a internet não é “terra sem lei” e já existem boas regras a serem seguidas. Como exemplo dessas normas, ele citou o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

“Gostaria de enfatizar a forma como essas legislações foram construídas: com debate super amplo com a sociedade, com a sociedade civil, com as empresas, com os representantes de governo”, disse.

Moncau acrescentou que a Google não se opõe à regulação e adota iniciativas que promovem os direitos humanos. Como exemplo, ele citou que, para evitar informações falsas em período eleitoral, quem faz busca por esse tema é primeiramente direcionado para as páginas dos tribunais eleitorais. Outro exemplo trata de pesquisas relativas ao termo “suicídio”, em que o mecanismo de busca oferece como primeira resposta como buscar ajuda.

Diversas plataformas não compareceram
Autora do pedido de realização do debate, a deputada Luizianne Lins (PT-CE) destacou que outras plataformas digitais foram convidadas (Telegram, Instagram, Twitter, Facebook e TikTok), mas não compareceram.

“Em algum momento, vamos querer a participação deles nesses seminários.  Não tem sentido empresas que desenvolvem os aplicativos não estarem presentes num debate tão fundamental para todo o Brasil, para a democracia brasileira”, definiu.

Fonte: Câmara dos Deputados