Como o customer experience pode ajudar o compliance

compliance consumerista funciona como um instrumento de governança e administração capaz de identificar riscos e criar procedimentos e mecanismos que visem a erradicação de práticas que possam ser consideradas infrações [1].

A identificação de tais riscos não é tarefa simples, especialmente considerando-se a alta complexidade da cadeia produtiva e a quantidade de sujeitos envolvidos desde a concepção do produto, extração da matéria-prima, fabricação, desenvolvimento e montagem, até a colocação no mercado de consumo e entrega ao destinatário final. No caso da prestação de serviços, da mesma forma, são inúmeras as etapas desde a elaboração do contrato, precificação e execução até a efetiva conclusão do serviço.

A crescente utilização do comércio eletrônico, impulsionada pela pandemia de Covid-19, igualmente evidenciou a necessidade de endereçamento de desafios importantes que surgiram nas relações de consumo, e aspectos como distribuição e logística de entregas, controle de estoque, cancelamento de compras, trocas e devoluções, entre outros, precisaram ser modificados ou aperfeiçoados de forma rápida e eficaz.

Assim, embora extremamente relevante e imprescindível, não é suficiente apenas o conhecimento jurídico a respeito da aplicação e interpretação das normas, bem como da atuação dos agentes fiscalizadores de seu cumprimento, como Procons, Ministérios Públicos e Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon). Se faz necessário, além disso, um amplo conhecimento do negócio e das constantes alterações de mercado para que seja possível identificar riscos e elaborar procedimentos internos de prevenção e correção de atuações desconformes no cenário corporativo.

Nesse sentido, a área de CX (customer experience) possui mecanismos que podem ser úteis na identificação de problemas que podem, eventualmente, vir a ocorrer, a despeito da existência de Códigos de Ética e Conduta, de políticas e diretrizes organizacionais internas e de processos de auditoria e controle.

Métricas que são utilizadas para aferir e avaliar a satisfação do cliente podem, ao fim e ao cabo, contribuir para a investigação de possíveis falhas antes mesmo que elas sejam objeto de ajuizamento de ações judiciais individuais e/ou coletivas e de aplicações de sanções pelos órgãos de proteção e defesa do consumidor.

Ora, os clientes/consumidores, por serem os destinatários finais dos produtos e serviços, são os que mais rapidamente poderão detectar questões que possam ter passado despercebidas pelo fornecedor, de forma involuntária, e que constituem irregularidades. Assim, por que não utilizar ferramentas já consolidadas na esfera de satisfação do cliente também para controle e supervisionamento de práticas juridicamente desconformes?

Uma dessas ferramentas de customer experience é o NPS (Net Promoter Score). Criado pelo norte-americano Frederick Reichheld e apresentado em um artigo da Harvard Business Review, em 2003, essa métrica visa medir a satisfação de um cliente com base na seguinte pergunta: “Em uma escala de 0 a 10, o quanto você indicaria nossa empresa para um amigo ou conhecido?” [2]

Através das notas, o autor classificou os consumidores em (1) detratores (ou depreciadores), que atribuíram nota de 0 a 6 à resposta; (2) neutros, que atribuíram notas 7 e 8; e (3) promotores, que atribuíram notas 9 e 10.

Os detratores são aqueles clientes que não estão satisfeitos e que poderão, inclusive, migrar para empresas concorrentes, a depender da proximidade da nota 0 ou 6 conferida.

Já os consumidores neutros não podem ser considerados insatisfeitos, mas também não são leais. Eles provavelmente possuem alguma sugestão de melhoria, o que não significa que desejem ou pensem em abandonar a marca — mas a situação pode se alterar caso passem por alguma experiência negativa junto à empresa ou caso percebam vantagens na concorrência.

Por outro lado, os clientes promotores são aqueles que recomendariam a empresa à sua rede de contatos (daí o nome net promoter). Esses consumidores identificam-se fortemente com os produtos/serviços da marca e também com seus valores e posicionamento de mercado, de modo que dificilmente trocariam a empresa por outra. São eles os responsáveis pelo famoso “marketing boca a boca” (ou buzz marketing).

Outra conhecida ferramenta de CX é o CSAT (Consumer Satisfaction), que normalmente é utilizado logo após uma interação, como um atendimento ao cliente por meio do SAC, após a entrega de produtos, a respeito da qualidade do serviço, por exemplo, em que também podem ser atribuídas notas de 0 a 10 [3].

As duas métricas, NPS e CSAT, vale referir, não se excluem, sendo complementares uma à outra. O NPS, de modo geral, tende a ser mais abrangente e envolve a imagem e percepção da empresa como um todo, ao passo que o CSAT possui maior aplicação a questões pontuais e específicas [4].

Após a pergunta relativa à probabilidade de indicação da empresa a um conhecido ou à satisfação quanto a determinada questão, é comum que uma segunda pergunta solicite o motivo da nota atribuída pelo consumidor. A segunda resposta costuma ser opcional, mas complementa a pesquisa e é crucial para permitir a adoção de medidas aptas a alterar ou adaptar procedimentos visando o aumento do nível de satisfação dos consumidores — e que pode ser usado também para investigação e resolução de situações que estejam em desacordo com as normas consumeristas vigentes.

A título meramente hipotético, cita-se a existência de um número excessivo de reclamações de consumidores sobre o tamanho de determinado produto descrito no site, que não corresponde às dimensões reais verificadas quando da entrega e recebimento pelo cliente. A quantidade de reclamações sobre o mesmo tema e a nota conferida à experiência de compra pelo consumidor podem ser interpretadas, nesse exemplo, pelo departamento jurídico como sinais de alerta para possíveis problemas de oferta que, se não corrigidos, poderão acarretar penalidades por infração ao artigo 31 do CDC (que trata justamente da descrição precisa das características do produto no momento da oferta).

Assim, o feedback de consumidores a respeito dos motivos para devolução do produto (inconsistência de tamanho e dimensões, no exemplo acima), além de servir como subsídio para a melhora da satisfação e experiência com a marca, pode ser utilizado para adequação da atuação do fornecedor às normas de oferta – em contribuição ao compliance consumerista.

A utilização de ferramentas que tradicionalmente não seriam jurídicas, mas advêm da área de customer experience, portanto, têm o potencial de tornar mais ágil e efetiva a identificação de falhas e irregularidades, contribuindo para uma análise gerencial e facilitação do processo de tomada de decisão e mudança de procedimentos a serem implementados pelo setor jurídico de compliance.

Tais ferramentas originadas do setor de customer experience, assim, não precisam ser utilizadas apenas com a finalidade de aprimorar o índice de satisfação dos clientes, podendo servir também como instrumentos do setor de compliance consumerista para uma gestão estratégica, com efetiva redução de reclamações e consequentemente de penalidades administrativas oriundas dos entes integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC).

Além disso, gastos em litígios judiciais no âmbito individual e/ou coletivo com honorários advocatícios, pagamento de indenizações impostas por condenações e outros custos para adoção de providências relativas a obrigações de fazer ou não fazer poderiam ser evitados por meio do agir preventivo da empresa que está atenta aos relatos e avaliações de seus próprios consumidores.

Da mesma forma, a intersecção entre o setor de CX com o setor de compliance permite uma mitigação significativa de riscos relacionados a possíveis sanções administrativas previstas no artigo 56 do CDC, que poderão ser aplicadas em casos de infrações às normas de consumo vigentes (como multas, apreensão de produtos, suspensão de atividades, interdição de estabelecimentos, entre outros). Tais sanções costumam gerar significativas repercussões, não apenas financeiras, mas também de imagem e reputação [5].

Assim, utilizar no compliance consumerista tecnologias e ferramentas que já são reconhecidas e utilizadas na área de CX, além de gerar uma economia de recursos que poderiam ser utilizados na consecução da atividade-fim da empresa, propicia um aumento da credibilidade, da confiança e da admiração dos clientes, que se tornam peça chave nesse processo de implementação de melhorias contínuas e de realização das adequações que se façam necessárias para a observância das normas do ordenamento jurídico.

Referências Bibliográficas

CARPENA, Heloísa. O compliance consumerista e a criação de um mercado ético e produtivo. Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: <https://eticca.com.br/o-compliance-consumerista-e-a-criacao-de-um-mercado-etico-e-produtivo/>. Acesso em: 5 jul. 2023.

DA SILVA, Vitor Esmanhotto e SCAFF JUNIOR, Michel. Benefícios do compliance consumerista. Santa Catarina, 2023. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2023-abr-21/scaff-jr-esmanhotto-beneficios-compliance-consumerista#author>. Acesso em: 5 jul. 2023

DUARTE, Tomás. CSAT: entenda o Customer Satisfaction Score. Belo Horizonte, 2023. Disponível em <https://track.co/blog/csat/>. Acesso em: 05 jul. 2023.

DUARTE, Tomás. NPS e CSAT: quando devo utilizar o NPS ao invés do CSAT? Belo Horizonte, 2021. Disponível em <https://track.co/blog/quando-devo-utilizar-o-nps-ao-inves-do-csat/>. Acesso em: 05 jul. 2023.

PEREIRA, Flávia do Canto. Proteção Administrativa do Consumidor: Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e a Ausência de Critérios Uniformes para Aplicação de Multas. RT: São Paulo, 2021.

REICHHELD, Frederick. The One Number You Need to Grow. Harvard Business Review, 2003. Disponível em <https://hbr.org/2003/12/the-one-number-you-need-to-grow>. Acesso em: 05 jul. 2023.

[1] CARPENA, Heloísa. O compliance consumerista e a criação de um mercado ético e produtivo. Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: <https://eticca.com.br/o-compliance-consumerista-e-a-criacao-de-um-mercado-etico-e-produtivo/>. Acesso em: 5 jul. 2023.

[2] REICHHELD, Frederick. The One Number You Need to Grow. Harvard Business Review, 2003. Disponível em <https://hbr.org/2003/12/the-one-number-you-need-to-grow>. Acesso em: 05 jul. 2023.

[3] DUARTE, Tomás. CSAT: entenda o Customer Satisfaction Score. Belo Horizonte, 2023. Disponível em <https://track.co/blog/csat/>. Acesso em: 05 jul. 2023.

[4] DUARTE, Tomás. NPS e CSAT: quando devo utilizar o NPS ao invés do CSAT? Belo Horizonte, 2021. Disponível em <https://track.co/blog/quando-devo-utilizar-o-nps-ao-inves-do-csat/>. Acesso em: 05 jul. 2023.

[5] DA SILVA, Vitor Esmanhotto e SCAFF JUNIOR, Michel. Benefícios do compliance consumerista. Santa Catarina, 2023. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2023-abr-21/scaff-jr-esmanhotto-beneficios-compliance-consumerista#author>. Acesso em: 5 jul. 2023

Fonte: Conjur – Por Flávia do Canto e Joana Rosin

Oscilação da Selic é fator para STJ definir correção de dívidas

A oscilação da taxa Selic, o principal instrumento de política monetária para combate à inflação no Brasil, é um elemento chave na análise do Superior Tribunal de Justiça sobre a conveniência de seu uso na correção de dívidas civis impostas em decisões judiciais.

O tema, que por sua importância tem sido alvo de uma longa discussão judicial, está em análise na Corte Especial, que reúne os 15 ministros mais antigos do STJ. O julgamento está empatado em 2 votos a 2 e foi interrompido por pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves.

Para o ministro Luis Felipe Salomão, dívidas civis devem ser calculadas com juros de 1% ao mês e correção monetária cabível
Lucas Pricken/STJ

Até esse julgamento, a posição prevalente no tribunal é de que as dívidas civis devem mesmo ser corrigidas com base na Selic, a taxa fazendária que seria a mencionada no artigo 406 do Código Civil. A posição se baseia em um precedente de 2008 da própria Corte Especial, o EREsp 727.842.

proposta do relator, ministro Luis Felipe Salomão, é de, nos casos de dívida civil, substituir a Selic pela taxa de juros de 1% ao mês, conforme definido no artigo 161, parágrafo 1º do Código Tributário Nacional. Incidiria, ainda, correção monetária conforme o índice praticado em cada tribunal.

Por enquanto, a ideia foi repelida pelos ministros Raul Araújo e João Otávio de Noronha, que não veem margem para que o Judiciário escolha livremente qual índice deve ser usado para aplicar o artigo 406 do Código Civil.

Para o ministro Salomão, o uso da Selic não é o mais adequado porque, entre outros fatores, permite o que tem definido como “oscilação anárquica” dos juros. Em julgamentos passados, ele exemplificou o fato de os juros terem alcançado 12,31% ao ano em 2005 e 1,3% ao ano em 2012, períodos em que a inflação foi praticamente idêntica (5,69% e 5,84% ao ano).

O problema é agravado pela introdução de duas formas de uso da taxa fazendária. Na terça-feira, em voto-vista regimental, o ministro trouxe novos dados, acompanhados de pedidos de consideração aos nove colegas que ainda poderão votar.

Juros composto x acumulado mensal
A Selic foi idealizada pelo Banco Central em uma fórmula de juros compostos — os chamados “juros sobre juros” —, com capitalização feita a cada dia útil. Ou seja, a cada dia a dívida é acrescida de juros, e no dia seguinte esse montante atualizado serve de base de cálculo para a incidência de novos juros.

No caso de uma dívida civil, para se obter a variação da Selic, bastaria multiplicar todos os fatores diários contidos entre o termo inicial e o termo final a ser corrigido. Essa é a forma que a Fazenda Nacional usa para cobrar as dívidas da qual é credora.

Selic é o instrumento usado pelo Banco Central para combate à inflação no Brasil
Marcello Casal Jr./Agência Brasil

A partir de 1995, leis federais editadas criaram uma segunda forma de usar a Selic, desta vez para corrigir os valores que a Fazenda deve pagar como devedora. Esse formato foi alçado à Constituição pela Emenda Constitucional 113/2021.

A fórmula envolve a Selic acumulada mensalmente. Isso significa que o fator diário é multiplicado dentro do período de um mês para saber o acumulado mensal. Para fazer a correção da dívida, basta somar os acumulados mensais no período a que ela se refere.

Esse desvirtuamento criou dois cenários bastante distintos. O voto-vista do ministro Salomão usou como exemplo a variação da Selic no período de 20 anos, entre 1º de janeiro de 2002 e 31 de dezembro de 2021.

Nesse recorte temporal, a Selic calculada pelos juros compostos resultou em variação de 786%. Já a inflação medida pelo IPCA foi de 237%. A diferença de 549%, distribuída entre os 240 meses do período, representaria juros mensais de 2,29% ao ano — um índice bastante alto.

Se no mesmo período o cálculo for feito a partir do método do acúmulo mensal, a variação da Selic cai para 219%. Isso significa que ela sequer alcança os 237% de inflação medida pelo IPCA. Ou seja, ela sequer recomporia a desvalorização da moeda. Não haveria juros de mora a cobrar.

“Distorções assim são passíveis de ocorrer quando se adota Selic para corrigir dívidas civis”, destacou o ministro Salomão, no voto-vista. Em sua análise, o STJ nunca se debruçou sobre qual dessas duas formas deve ser usada ao aplicar a Selic.

Compensa dever?
No recorte temporal do caso em julgamento, o uso da Selic traz um cenário ainda distinto. Ele envolve uma mulher que ganhou na Justiça o direito a ser indenizada por danos morais por causa de um acidente de ônibus que sofreu.

O acidente ocorreu em março de 2013, data a partir da qual começam a correr os juros. A sentença condenatória foi proferida em outubro de 2016, marco inicial da correção monetária. O valor da indenização foi fixado em R$ 20 mil. Até o momento, não houve pagamento.

Até julho de 2023, dez anos depois, qualquer das formas de cálculo envolvendo a Selic se mostraria mais benéfica ao devedor do que o uso de juros simples de 1% ao mês e correção monetária pelo IPCA (Veja a tabela). “Compensa dever em juízo”, resumiu o relator.

Correção da dívida
Indenização a ser corrigida a partir da data do fato, em 2013 R$ 20 mil
Em 2023, corrigida pela Selic pelo método de juros compostos R$ 46,7 mil
Em 2023, corrigida pela Selic pela soma dos acumulados mensais R$ 37 mil
Em 2023, corrigida com juros simples de 1% ao mês e correção pelo IPCA R$ 51,4 mil

O voto-vista fez menção a manifestação a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e do Conselho Federal da OAB, que atuam como amici curiae (amigos da corte) no julgamento. Ambas indicaram que, pela variação da Selic, há mês em que os juros pode ser negativos.

“Isso significa que há uma flutuação enorme e que o devedor pode ficar à espera de um mês que seja bom pra ele pra pagar dívida. É loteria. Não é efetivamente o que se espera que o tribunal forneça. O tribunal tem que fornecer segurança”, disse o ministro Salomão.

Para ele, a adoção de juros de 1% ao mês calculados de forma simples, nos termos do Código Tributário Nacional, representa uma solução intermediária quando comparada aos dois métodos que usam a Selic.

“Qual é a maneira mais razoável para corrigir dívidas civis? É aquela que permite juros negativos? Não. É melhor ter uma oscilação tão grande a ponto de prejudicar o devedor, para que ele não consiga pagar divida? Não. É o equilíbrio. É o que se propõe”, encerrou.

Advocacia
Para o advogado Leonardo Amarante, que representa a vítima do acidente no caso em julgamento, a confirmação da Selic representaria a destruição de um sistema jurídico em vigor no Brasil há 100 anos. “E substituir por um outro sistema que é muito pior e não tem nenhuma segurança jurídica, beneficiando o calote e o não pagamento das dívidas”, criticou.

O advogado Luiz Fernando Casagrande Pereira, que representa a OAB, destacou que os dados econômicos que o ministro Salomão usou revelam a improbidade de usar a Selic como parâmetro de juros e correção das dívidas civis, sobretudo em razão de sua volatilidade.

“Em todos os outros lugares do mundo se usa uma taxa fixa de juros para desincentivar a litigância. Tem que custar ficar em juízo. E a Selic não garante isso. Além da insegurança da volatilidade do índice, que é usada como instrumento de política monetária e nada tem a ver com o índice de correção e juros das dívidas judiciais”, apontou.

Fonte: Conjur

CCJ aprova criação de sistema com informações sobre investimentos na primeira infância

Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
Apresentação dos planos e agenda estratégica. Dep. Laura Carneiro(PSD - RJ)
Laura Carneiro, relatora do projeto na CCJ

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (1º) o Projeto de Lei 6524/19, que cria o Sistema Nacional de Informações da Primeira Infância (Snipi), com o objetivo de sistematizar e dar amplo acesso às informações e aos indicadores das políticas públicas direcionadas às crianças de até 6 anos de idade.

De autoria da deputada licenciada Leandre (PSD-PR), a proposta tem como coautoras a deputada Daniela do Waguinho (União-RJ), a deputada licenciada Carmen Zanotto (Cidadania-SC) e a ex-deputada Aline Gurgel. A proposta tramita em caráter conclusivo e ainda será analisada pela Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados.

Pelo texto, a União informará à sociedade o total de recursos aplicados anualmente nos serviços para a primeira infância e o percentual que os valores representam em relação ao respectivo orçamento. Também colherá informações sobre os valores aplicados por estados e municípios.

A relatora, deputada Laura Carneiro (PSD-RJ), foi favorável à constitucionalidade do projeto principal e do apensado (Projeto de Lei 167/21) na forma de um substitutivo aprovado pela antiga Comissão de Seguridade Social e Família.

A parlamentar fez ajustes de redação para incorporar em um único texto a versão original e o projeto apensado, mas que não alteram o conteúdo da iniciativa.

O projeto apensado prevê um relatório anual exclusivo sobre informações orçamentárias, que apresente, de forma clara e objetiva, os investimentos na primeira infância. O relatório deverá ser encaminhado para análise do Congresso Nacional.

Fonte: Câmara Notícias

O que o jogo de cartas Uno ensina sobre a reforma tributária?

Nesta onda de filmes que remetem a brinquedos clássicos, já se cogitam de películas sobre a boneca PollyPocket e sobre o jogo de cartas Uno. Não desejo aqui discutir os filmes, ou a mensagem subjacente à postura da Barbie ou do Ken no mais recente filme deste naipe, algo que, conquanto interessante, transbordaria em muito os limites formais e materiais desta coluna. Mas um livro, relacionando o jogo de cartas Uno à Teoria do Direito, este ainda precisa ser escrito.

O Direito é uma realidade institucional (John Searle), tal como o jogo Uno, compondo-se de regras que constituem realidades novas, que só existem porque se pactua sua existência. Também preveem hipóteses e prescrevem condutas a serem atendidas se e quando essas hipóteses acontecerem, suscitando dúvidas sobre se as regras são aplicáveis a esta ou àquela situação, sobre qual o sentido das regras, o que efetivamente prescrevem, sobre se incidiram etc.

Ocorreu a hipótese de incidência? O fato efetivamente ocorrido se subsume a ela? É o que se discute quando alguém, diante de carta com o número sete sido lançada sobre a mesa — e que obriga todos a permanecerem em silêncio — produz leve ruído com a boca, e se inicia uma discussão sobre se aquilo foi, ou não, uma “fala”. A pessoa ia começando a falar, percebeu o deslize, e transformou a fala em um bocejo, uma tosse ou um espirro, para disfarçar. Ou, diversamente, espirrou mesmo, mas de forma ruidosa. Incide a regra? Você, leitora, se já brincou de Uno, certamente conhece alguma história — e talvez uma briga — em torno do sentido, do alcance e da aplicabilidade das regras deste jogo.

Qual o sentido do texto normativo? Quando se coloca uma carta com o sete, que, já se disse, obriga todos a ficarem em silêncio, o silêncio deve ser mantido por uma rodada completa, ou até que algum jogador coloque outro sete? Surge aí mais espaço para discussão, que pode ser acalorada ao ponto de pôr em risco amizades ou namoros.

Já curioso sobre as relações entre o jogo e a Teoria do Direito, e usando o primeiro como recurso didático para ensinar aos meus alunos institutos da segunda, chegou-me uma inusitada história, vivida por uma amiga durante sua juventude, quando fez intercâmbio no exterior: uma criança da qual ela eventualmente era baby-sitter gostava muito do jogo (que minha amiga levara consigo do Brasil), mas não conhecia bem suas regras nem falava português. Minha amiga, jogando com a criança, quando estava perdendo, mudava um pouco as regras, dando-lhes interpretação peculiar e “inovadora”. Se questionada, lia com toda a autoridade as instruções constantes do manual em português, traduzindo-as ao seu gosto para o idioma da criança. Com um sorriso levemente maligno, alegou ser essa sua suave e inofensiva vingança pelas muitas peraltices que tinha de aguentar. O episódio me remeteu à Igreja Católica na Europa Medieval, quando as bíblias estavam todas escritas em latim, idioma que a imensa maioria da população, analfabeta, sequer conhecia. A Igreja então dizia que a bíblia determinava o que ela, sua autorizada intérprete, queria. Lembra-nos, ainda, da importância da transparência e da cognoscibilidade das leis e demais atos normativos. Quando as leis são escritas de modo não facilmente compreensível, incrementa-se o risco de interpretações arbitrárias e manipulativas.

Pode-se com jogo, ainda, ilustrar a discussão sobre as fontes do direito, quando se discute a legitimidade de uma interpretação dada a uma regra, em momento de conflito, e se vai buscar a caixa, o manual de instruções, ou algum site na internet onde estão as “verdadeiras” regras, se recorrem a terceiros para dirimi-lo, consultam-se amigos versados e considerados autorizados no jogo etc.

Os exemplos são muitos, e talvez fiquem para o livro a ser escrito. Por enquanto, hoje nesta coluna, pretendo examinar apenas a necessidade de as regras serem claras, e previamente conhecidas por todos, para que com isso se evitem manipulações, ou mesmo se frustre a dignidade e a liberdade de quem precisa conhecer previamente as consequências de suas condutas para poder decidir autonomamente como se conduzir. E pretendo fazê-lo tendo em mente o texto aprovado pela Câmara dos Deputados da Proposta de Emenda Constitucional 45/2019, da “reforma tributária”. Sobretudo porque, em se tratando de projeto ainda em gestação, a clareza do texto é indispensável também ao devido processo legal legislativo, e à própria democracia, com reflexos sobre a legitimidade do que se aprova.

Há inúmeros aspectos que podem e merecem comentário e exame profundo, quanto ao texto da PEC. Mas pontuo apenas dois, nos quais a falta de clareza pode fazer com que depois se leia o que se quiser na caixa do jogo escrito em língua enigmática, ou na Constituição, se aprovado o texto da proposta: (1) o imposto seletivo será não cumulativo? (2) IBS e CBS se poderão sobrepor a outros impostos, como o ITBI ou o IOF?

Nenhum desses pontos parece claro, e depois será possível ler na Constituição o que se quiser ler. Melhor deixar claro agora, para que as decisões sobre o que está sendo aprovado sejam conscientes.

Quanto à não cumulatividade do imposto seletivo, o texto da PEC não é explícito em afirmar se ela será, ou não, adotada. Mas estabelece que o imposto poderá incidir na produção, na importação ou na comercialização de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, deixando espaço para que o legislador estabeleça sua incidência em todas essas etapas, cumulativamente. Se um produto prejudicial ao meio ambiente for importado, usado como insumo para a fabricação de outro igualmente nocivo, depois revendido e passando por dois ou três intermediários até seu consumo final, haverá inúmeras incidências? Será possível abater em cada uma delas, o montante incidente nas anteriores? Caso não seja possível o abatimento, o ônus do tributo será maior não porque o produto é mais nocivo, mas só porque se submete a mais operações antes de ser consumido? Serviços nocivos poderão abater créditos do imposto seletivo já incidente sobre insumos nocivos? Nada disso está claro, e minha amiga, lendo as instruções na caixa do Uno para a criança que jogava com ela e não falava português, vai poder dizer que as regras significam o que ela quiser que signifiquem.

O mesmo pode ser dito do âmbito de incidência do IBS e da CBS. Estabelece-se que incidem sobre qualquer operação com bens e serviços, sendo os primeiros tangíveis ou intangíveis, materiais ou imateriais. Abrangerá operações com bens imóveis, em duplicidade com o ITBI?

Não satisfeito com a amplitude da noção de “bens”, o texto, ao tratar da definição de serviço, estabelece que “a lei complementar de que trata o caput poderá estabelecer o conceito de operações com serviços, seu conteúdo e alcance, admitida essa definição para qualquer operação que não seja classificada como operação com bens” (§ 7º do artigo 156-A). Qualquer operação que não seja classificada como sendo “com bens”, poderá ser uma operação com serviços, de sorte a ser abarcada pelo IBS? E se se tratar de operação relativa a títulos ou valores mobiliários? Operação de seguro? De câmbio? E se se tratar de qualquer outro fato? Toda e qualquer situação que não se enquadre como “operação bom bens” pode ser classificada como “operação com serviços”? Coçar a cabeça? Escrever um artigo para a ConJur? Ler esse artigo? TUDO o que não for enquadrável como operação com bens, poderá ser definido como serviço! Isso tornará não apenas sem sentido a competência impositiva residual prevista no artigo 154 da CF/88, mas levará a uma sobreposição indevida — porque vedada pela intepretação conjunta do artigo 154 e do artigo 146 — de competências impositivas, que poderão mesmo perder o sentido. Alguém pode dizer que está implícito, no caso, que não será assim. Mas a obscuridade poderá levar a que, como crianças que não falam português, sejamos enganados pela babysitter que domina o indecifrável idioma constante da caixa do jogo.

Em última análise, o caráter lacônico e confuso de algumas disposições da PEC 45/2019 leva a incerteza quanto à cumulatividade do imposto seletivo e ao âmbito de incidência do IBS e CBS. Abre-se espaço, com isso, para interpretações e manipulações que podem corroer a justiça e a equidade do sistema tributário. Tal como no jogo, onde as regras precisam ser entendidas por todos os participantes, o Direito deve ser formulado de maneira que seus destinatários possam compreendê-lo, garantindo um campo de jogo equilibrado. Evitar a linguagem enigmática é assegurar que o jogo seja disputado de forma justa, com todos os participantes cientes das regras, podendo assim exercer sua liberdade e autonomia de forma informada e consciente. Até porque, em se tratando das regras constitucionais de contenção do poder tributário, as consequências do conflito podem ir muito além de uma mera briga entre amigos, dos quais eles mesmos riem depois. No caso da PEC, talvez não seja engraçado.

Fonte: Conjur – Por Hugo de Brito Machado Segundo

A reforma está saindo, mas como fica o comércio exterior?

Já estávamos conversando sobre os impactos da reforma tributária no comércio exterior [1], mesmo ainda sem a expectativa de que o assunto tivesse um desenvolvimento tão rápido. Assim, depois de tantas propostas, tantos anos ou décadas de discussão, tanto ceticismo… subitamente, saiu uma proposta aprovada pela Câmara dos Deputados, que deve ser analisada pelo Senado no segundo semestre deste ano. Nada como a força de um novo governo para enfrentar grandes desafios do país. Provavelmente, ainda veremos algumas alterações no texto, mas não em aspectos essenciais.

Olhando para o texto aprovado, a Proposta de Emenda Constitucional nº 45-F/2019 [2], verificamos muitos pontos com potencial impacto sobre o comércio exterior, como os novos princípios constitucionais tributários da simplicidade, da transparência, da justiça tributária e do equilíbrio e da defesa do meio ambiente, a nova regra de IPVA (o imposto passa a incidir sobre veículos aquáticos e aéreos, como jatinhos, iates e lanchas, inclusive na importação), as desonerações tributárias de alimentos, medicamentos e outros.

Contudo, diante de tantos aspectos, proponho ao leitor hoje refletirmos sobre as alterações na tributação do consumo que, em decorrência do princípio do tratamento nacional, vão impactar a importação. Vamos discorrer especialmente sobre as seguintes dúvidas: se haverá aumento da carga tributária na importação; se serão alterados os procedimentos na importação; se haverá impacto no âmbito concorrencial.

Atualmente são exigidos na importação tributos concebidos para incidir especificamente sobre o comércio internacional e outros que normalmente oneram a produção interna e são replicados na importação [3].

Os primeiros, denominamos tributos aduaneiros, englobam o imposto sobre a importação e a taxa cobrada pela utilização do sistema de comércio exterior (a taxa Siscomex, exigida somente na importação). Em relação a estes, a reforma tributária não propõe mudanças.

Como tributos niveladores, exigidos também na importação com base no princípio do tratamento nacional, nossa lista é maior: IPI, ICMS, Contribuição para o PIS/Pasep, Cofins, Cide-Combustíveis, ISS. Incidem ainda na importação pelo modal aquaviário o adicional ao frete para renovação da marinha mercante (AFRMM) e a taxa Mercante. Aqui a reforma tributária traz impactos. Todavia, para entender essas mudanças, faz-se mister retomar alguns pontos mais gerais da reforma tributária.

Conforme a Proposta de Reforma Tributária aprovada pela Câmara dos Deputados, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) substituirá o IPI, a Contribuição para o PIS/Pasep e a Cofins; ao passo que o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) substituirá o ICMS e o ISS.

A CBS e o IBS constituirão um Imposto sobre o Valor Adicional (IVA) Dual, substituindo, portanto, cinco tributos e com incidência ampla sobre bens, serviços e direitos, legislação única e aplicação ampla da não cumulatividade.

Ainda não está definida a alíquota desses novos tributos, mas a previsão é que seja, para ambos os tributos somados, entre 25 a 28%, de modo a manter o nível atual de arrecadação. A alíquota somente será definida em 2024, por meio de lei complementar. Portanto, até lá, mesmo aprovada a reforma tributária, permanece o suspense.

A alguns setores foi atribuída alíquota reduzida em 60%, são eles: serviços de educação; serviços de saúde; dispositivos médicos e de acessibilidade para pessoas com deficiência; medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual; serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário, ferroviário e hidroviário, de caráter urbano, semiurbano, metropolitano, intermunicipal e interestadual; produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura; insumos agropecuários, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal; produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais; bens e serviços relacionados a segurança e soberania nacional, segurança da informação e segurança cibernética. Essa redução estava prevista como de 50%, mas nos momentos finais, foi aumentada para 60%.

A cesta básica, cujos produtos devem ser definidos por lei, ficou com alíquota zero pela na proposta aprovada, ou seja, receberá imunidade tributária. Além disso, foi previsto um cash back para as pessoas com menor capacidade econômica, com o objetivo de reduzir as desigualdades de renda (na verdade, esse instrumento deve servir para compensar parte da regressividade da tributação sobre o consumo); no entanto, as regras, especialmente beneficiários e limites desse cash back, ficarão por conta de lei complementar, ou seja, para futura determinação.

Especialmente a redução de 60% tem sido objeto de intensas críticas, pois se o objetivo é manter a arrecadação, quanto mais imunidades, reduções ou isenções mais alta será a alíquota geral. Inclusive há alguma pressão política para que o Senado reveja esses benefícios.

De todo modo, confirmada a alíquota prevista entre 25 a 28%, conforme já se observou, a ideia é que haja neutralidade em termos gerais de arrecadação. Contudo, em termos específicos, deve haver redução da carga tributária em energia elétrica e telecomunicações e nos produtos industrializados. Por outro lado, deve ocorrer aumento de tributação no setor de serviços, streaming e transporte por aplicativo, mesmo considerando a não cumulatividade plena. Esse aumento não alcança os serviços prestados sujeitos ao sistema do Simples Nacional.

Além da CBS e do IBS, consta da Proposta aprovada pela Câmara dos Deputados um novo tributo: o Imposto Seletivo Federal, apelidado de “Imposto do Pecado”. Trata-se de um imposto indutor ou extrafiscal, cujo objetivo é desestimular o consumo de produtos que sejam prejudiciais à saúde, ao meio ambiente, ou tragam outros malefícios, como cigarros, bebidas, alguns insumos agrícolas com impacto ambiental e também armamentos. O Imposto Seletivo Federal tem similares no exterior, como o denominado “sin tax” dos Estados Unidos.

Interessante mencionar que o IPI atualmente ostenta duplo papel, por um lado, serve como um IVA federal que alcança os produtos industrializados, por outro, mediante uma alíquota bem mais alta para certos produtos como cigarros, bebidas, armas e munições, já exercia o papel do imposto seletivo.

Apresentado o panorama, como a reforma Tributária atinge a importação?

Primeiramente, o IPI, a contribuição para o PIS/Pasep, e a Cofins serão substituídas pela CBS; e o ICMS e o ISS serão substituídos pelo IBS. Ou seja, como regra, as importações de bens e serviços estarão sujeitas à CBS e ao IBS, IVA dual, com a alíquota estabelecida (entre 25 e 28%). Além disso, na importação de bens como cigarros e bebidas, incidirá o Imposto Seletivo Federal. Nos denominados tributos aduaneiros na importação (imposto sobre a importação e Taxa Siscomex), no AFRMM e na Taxa Mercante, não há mudanças corolárias da reforma.

Dessa forma, a importação de bens e serviços estará sujeita aos seguintes tributos: imposto sobre a importação, CBS, IBS, Imposto Seletivo Federal, taxa Siscomex, AFRMM, taxa Mercante e Cide-combustíveis. Ainda parecem muitos, mas houve não apenas redução no número, como também simplificação, tendo em conta que não será necessário para o importador (da mesma forma que para o operador interno) conhecer a legislação de ICMS dos diferentes estados e nem, no caso de importação de serviços, conhecer a legislação do ISS dos municípios.

Por sua vez, verifica-se que, em respeito ao princípio do tratamento nacional, os bens importados sofrerão o mesmo impacto que ocorrer na produção e consumo internos, não alterando o aspecto concorrencial.

No que concerne aos regimes aduaneiros especiais, não há alteração direta relacionada à reforma tributária. Entretanto, por um lado, os regimes ficarão menos complexos, pois serão menos tributos “suspensos” para serem controlados e eventualmente pagos; por outro lado, a desoneração das exportações deve ficar mais simples e efetiva, diminuindo a dependência dos regimes para a competitividade das exportações brasileiras [4]. Em relação aos regimes aduaneiros aplicados em áreas especiais, há um dispositivo específico da proposta com o objetivo de garantir a preservação da competitividade da Zona Franca de Manaus e das Áreas de Livre Comércio.

No aspecto procedimental, haverá simplificação em decorrência da diminuição do número de tributos e também da padronização das alíquotas. Vale notar que a aduana controla e fiscaliza a importação de bens ou mercadorias, não de serviços e essa situação assim deve continuar.

Na nova sistemática trazida com a reforma tributária, como regra, as discussões sobre classificação de mercadorias na importação vão se restringir ao imposto sobre a importação, facilitando a aplicação das normas tributárias e diminuindo as lides e o contencioso administrativo e judicial. Nesse sentido, com menos conflito, pode-se esperar um incentivo às importações.

Desse modo, respondendo às questões propostas, não haverá aumento na carga tributária da importação em termos gerais, porém, da mesma forma que ocorre nas operações internas, alguns setores como produtos industrializados, energia elétrica e telecomunicações deverão ter redução da carga tributária, ao passo que outros, como serviços deverão ter aumento.

Continuando nas questões propostas, os procedimentos na importação, devido ao menor número de tributos incidentes e à diminuição de litígios na classificação de mercadorias, devem ser simplificados, tornando, neste aspecto, mais atrativas as importações.

Por sua vez, no que concerne à concorrência relacionada à carga tributária, as mudanças serão similares àquelas do mercado interno, de forma que não é impactado o equilíbrio concorrencial. Quanto aos procedimentos, há uma simplificação que deve se refletir no mercado interno. Contudo, o ganho em competitividade dos produtos nacionais para exportação certamente compensa com sobra esse impacto.

Dessarte, resta-nos agora acompanhar possíveis alterações pontuais e aguardar a aprovação da reforma tributária pelo Senado — com provável retorno para a Câmara dos Deputados —, sustentando a expectativa de que a nova sistemática traga simplificação e sirva não só para estimular a economia brasileira, mas também para nos tornar mais competitivos e fomentar nosso comércio exterior.

[1] Sugiro remissão aos seguintes artigos sobre o tema são: “A reforma tributária: impactos da bala de prata no comércio exterior” (Disponível em <https://www.conjur.com.br/2023-abr-11/artx-territorio-aduaneiro-reforma-tributaria-impactos-bala-prata-comercio-exterior>. Acesso em: 29 jul. 2023) e “Reforma tributária e impactos da bala de prata nos regimes aduaneiros especiais” (Disponível em < https://www.conjur.com.br/2023-mai-16/territorio-aduaneiro-impactos-bala-prata-regimes-aduaneiros-especiais https://www.conjur.com.br/2023-mai-16/territorio-aduaneiro-impactos-bala-prata-regimes-aduaneiros-especiais>. Acesso em: 29 jul. 2023)

[2] Disponível em <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1728369&filename=PEC%2045/2019>. Acesso em: 29 jul. 2023

[3] Sobre a tributação da importação, sugere-se ao artigo “Um Carnaval tributário na Aduana” (Disponível em <https://www.conjur.com.br/2022-mar-01/territorio-aduaneiro-carnaval-tributario-aduana-abre-alas-eu-quero-passar>. Acesso em: 29 jul. 2023).

[4] Lembrando que há um artigo específico sobre essa questão: “Reforma tributária e impactos da bala de prata nos regimes aduaneiros especiais” (Disponível em < https://www.conjur.com.br/2023-mai-16/territorio-aduaneiro-impactos-bala-prata-regimes-aduaneiros-especiais https://www.conjur.com.br/2023-mai-16/territorio-aduaneiro-impactos-bala-prata-regimes-aduaneiros-especiais>. Acesso em: 29 jul. 2023 )

Fonte: Conjur

Comissão vai discutir vetos à Lei Geral do Esporte

Bruno Spada/Câmara dos Deputados
Luiz Lima discursa na tribuna do Plenário
Luiz Lima: reunião busca corrigir falhas que o esporte poderá enfrentar por falta de norma jurídica

A Comissão do Esporte da Câmara dos Deputados realiza na quarta-feira (2) reunião para discutir os vetos do governo federal a trechos da Lei Geral do Esporte, sancionada em junho passado, com 397 dispositivos rejeitados, o equivalente a 40% do texto.

O governo justificou sua decisão dizendo haver “insegurança jurídica e vício de iniciativa” em alguns dispositivos, como a previsão de criação de órgãos do Executivo, entre os quais a Autoridade Nacional para Prevenção e Combate à Violência e à Discriminação no Esporte (Anesporte).

A Lei Geral do Esporte (14.597/23) tinha como objetivo substituir todas as leis que tratam do tema. Contudo, com os vetos, dispositivos da Lei Pelé (Lei 9.615/98) e da Lei de Incentivo ao Esporte (Lei 11.438/06) continuam valendo.

Segundo o autor do requerimento para a realização da reunião, deputado Luiz Lima (PL-RJ), o debate “é o meio mais eficaz para corrigir falhas e possíveis injustiças que o esporte poderá ter que enfrentar, devido a falta de uma norma jurídica adequada”, disse. “Entendemos a importância da articulação entre os gestores do esporte, seja na esfera federal, estadual ou municipal, e entendemos que esse debate será um passo importante para promover essa interação”, acrescentou.

O debate ocorre às 15 horas no plenário 4.

Fonte: Câmara Notícias

Proposta prevê punição para publicidade de produto ou serviço ilegal em sites hospedados no exterior

Câmara dos Deputados
Deputado Mauricio Neves, autor da proposta

O Projeto de Lei 1507/23 prevê pena de seis meses a dois anos, mais multa, para quem fizer, permitir ou promover publicidade de produto ou serviço ilegal em sites hospedados em servidores localizados fora do Brasil. A pena será válida ainda que o produto ou serviço oferecido seja autorizado no país de origem.

Em análise na Câmara dos Deputados, o texto insere a medida no Código de Defesa do Consumidor . O autor da proposta, deputado Mauricio Neves (PP-SP), argumenta que o Código de Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária estabelece que “os anúncios não devem conter nada que possa induzir a atividades criminosas ou ilegais ou que pareça favorecer, enaltecer ou estimular tais atividades.”

Ele ressalta ainda que o aumento de negócios on-line no mundo fez com que produtos e serviços ilegais no Brasil sejam facilmente ofertados em sites hospedados em servidores localizados fora do País.

“Um bom exemplo dessa realidade são as apostas em jogos esportivos, cada vez mais populares. A despeito dessas apostas estarem proibidas no País, são possíveis de serem realizadas em sites que sejam registrados e licenciados em outros países que as permitam”, citou. A proposta visa coibir essa prática.

Tramitação
O projeto será analisado pelas comissões de Defesa do Consumidor; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Em seguida, pelo Plenário. 

Fonte: Câmara Notícias

Projeto altera Código de Processo Civil para prever prescrição processual por inércia da parte

Pablo Valadares/ Câmara dos Deputados
Proposições Remanescentes do Dia Anterior. Dep. Kim Kataguiri(UNIÃO - SP)
Kim Kataguiri, autor da proposta

O Projeto de Lei 454/23 altera o Código de Processo Civil para estabelecer que ocorrerá a prescrição do direito sempre que a parte interessada deixar de movimentar o processo por prazo superior aos já previstos para prescrição no Código Civil, os quais, conforme o caso, podem variar entre 1 e 5 anos. A proposta tramita na Câmara dos Deputados.

Segundo o texto, a contagem do prazo será feita independentemente da demora relacionada ao próprio serviço judiciário.

“O objetivo é dar mais segurança jurídica à sociedade por meio da disciplina de uma modalidade de prescrição processual que incide nos casos em que a parte interessada deixa de tomar as medidas necessárias para movimentar o processo por prazo superior ao disposto no Código Civil”, explica o autor, deputado Kim Kataguiri (União-SP).

Segundo o Código Civil, a prescrição é a extinção do direito em razão do tempo de ingressar com uma ação para assegurar o direito violado.

Tramitação
A proposta será analisada, em caráter conclusivo, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Fonte: Câmara Notícias

Projeto proíbe órgãos públicos de usar bens apreendidos durante a investigação

Divulgação
Deputado Marcos Tavares (PDT-RJ)
Marcos Tavares: um dos objetivos do projeto é “enaltecer o direito à propriedade privada”

O Projeto de Lei 1453/23 altera o Código de Processo Penal para proibir o uso de bens apreendidos durante investigação criminal por órgãos da administração pública, como as forças policiais, desde que esse uso não seja autorizado pelo proprietário do bem. O texto, que está sendo analisado pela Câmara dos Deputados, inclui a determinação no CPP e revoga artigo da Lei de Drogas (11.343/23).

Atualmente, a Lei de Drogas estabelece que, existindo interesse público que justifique o uso do bem apreendido, a autoridade judicial poderá autorizar o seu uso, especialmente em favor de órgãos de segurança pública que atuam na prevenção e na repressão de crimes ligados ao tráfico de drogas. Esse trecho é revogado pelo projeto.

Autor da proposta, o deputado Marcos Tavares (PDT-RJ) afirma que o objetivo da alteração é “enaltecer o direito à propriedade privada” e “preservar o princípio da presunção de inocência”.

“Imagine-se que um veículo venha a ser objeto de medida assecuratória, sendo utilizado pelo Estado, e, posteriormente, o sujeito é absolvido. Haveria, então, um significativo prejuízo para o proprietário em razão do desgaste do bem”, disse o deputado.

Tramitação
O projeto será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) em caráter conclusivo.

Fonte: Câmara Notícias

Projeto do governo regulamenta processo administrativo envolvendo fraudes em apostas esportivas

alphaspirit/Getty Images
 Apostas online e análises e estatísticas para o jogo de futebol
Proposta foi encaminhada junto com medida provisória sobre o tema

O Projeto de Lei 3626/23 regulamenta o processo administrativo envolvendo irregularidades e fraudes ligadas a empresas do mercado de apostas esportivas, as chamadas “bets”, que se baseiam em situações de eventos esportivos reais. O texto enviado pelo governo federal com pedido de urgência faz parte, juntamente com a Medida Provisória 1182/23, do esforço para regulamentar a chamada “aposta de quota fixa” – modalidade lotérica criada em 2018 pela Lei 13.756.

O governo argumenta que o prazo para regulamentação previsto na referida lei expirou em dezembro de 2022 e que há necessidade de incorporar à legislação mecanismos de segurança e integridade na realização das apostas, incluindo regras protetivas sobre o pagamento de prêmios e a publicidade.

O PL 3626/23 altera a legislação para prever expressamente que empresas que explorarem o mercado de “bets” deverão adotar procedimentos e sistemas de controle interno para prevenir a lavagem de dinheiro, o financiamento do terrorismo e a proliferação de armas de destruição em massa, além da manipulação de resultados e de outras fraudes.

O texto permite que o Ministério da Fazenda, como órgão autorizativo e fiscalizador, aplique sanções cautelares antes ou durante a tramitação de processo administrativo quando houver similaridade com outro caso e risco de demora que resulte em impunidade ou em prejuízo aos cofres públicos e a terceiros.

Entre as medidas estão:

  • desativação temporária das operações;
  • suspensão temporária de pagamento de prêmios;
  • recolhimento de bilhetes emitidos, entre outras.

O não atendimento dessas medidas implica ao infrator multa de até R$ 100 mil por dia.

No caso de evidências de manipulação de resultados ou outras fraudes semelhantes, o Ministério da Fazenda poderá determinar, também cautelarmente, a imediata suspensão das apostas e a retenção do pagamento de prêmios, entre outras medidas.

Termo de compromisso
O projeto prevê, no entanto, a possibilidade de suspensão do processo administrativo antes da decisão em primeira instância caso o investigado firme termo de compromisso obrigando-se a cessar a prática sob investigação; a corrigir as irregularidades apontadas, indenizando os prejuízos; além de cumprir outras condições acordadas no caso, como, por exemplo, o recolhimento de valores à conta única do Tesouro Nacional.

Distribuição de prêmios
O Projeto de Lei 3626/23 também altera a Lei 5.768/71, que regulamenta as promoções comerciais, para atualizar em 25% a taxa cobrada pelo governo para autorizar empresas a promoverem campanhas de distribuição gratuita de prêmios mediante sorteio, vale-brinde ou concurso.

Um exemplo dessas campanhas é o incentivo à compra de determinado produto com a possibilidade de receber prêmios futuros mediante sorteio, como ocorre em datas especiais, como Dia dos Pais, Dia das Mães e outras comemorações.

Pelo texto, a atual taxa de fiscalização, prevista na Medida Provisória 2158-35/01, passa a se chamar taxa de autorização e deixa de incidir sobre a distribuição gratuita de prêmios de valor igual ou inferior a R$ 10 mil relacionados a promoções comerciais.

Segundo o governo, a ideia é eliminar o procedimento de autorização de atividades de pequeno valor, mantendo a obrigatoriedade da prévia comunicação ao Ministério da Fazenda.

“O intuito é atender, de um lado, a defesa dos consumidores e assegurar mecanismos de prevenção contra a lavagem de dinheiro, e de outro, a eficiência do setor de propagandas via promoções comerciais”, diz a justificativa do governo.

Punições
A proposta, por fim, prevê expressamente a pena de advertência como mecanismo de sanção para casos de nítida boa-fé dos agentes promotores, desde que não haja danos aos consumidores ou ao Erário. A advertência poderá ser aplicada em vez de sanções mais graves já previstas, como multa e proibição de realizar promoções.

O projeto não aborda a efetiva criação da Secretaria Nacional de Jogos e Loterias, vinculada ao Ministério da Fazenda, para tratar dos processos de licenciamento e outorga das casas de apostas esportivas.

Fonte: Câmara Notícias