A Primeira Seção também decidiu que cabe ao trabalhador provar a eventual ineficácia do equipamento de proteção, mas a conclusão do processo deve ser favorável a ele em caso de dúvida.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.090), definiu que a anotação positiva sobre o uso adequado de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o risco laboral para fins de reconhecimento de tempo de aposentadoria especial.
O colegiado também estabeleceu que cabe ao trabalhador, autor da ação previdenciária, demonstrar a eventual ineficácia do EPI, mas a conclusão deve ser favorável a ele em caso de divergência ou dúvida.
Com a fixação das teses jurídicas, podem voltar a tramitar os processos que discutem a mesma matéria e estavam suspensos na segunda instância ou no próprio STJ. O entendimento definido pela Primeira Seção deverá ser observado pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.
Nos processos representativos da controvérsia, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) entendeu que a anotação positiva sobre o uso eficaz de EPI no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) era insuficiente para descaracterizar o tempo especial. Com isso, o direito do segurado foi reconhecido por falta de provas que demonstrassem claramente a eliminação do risco laboral.
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), por outro lado, sustentou que o PPP atesta se há exposição ao agente nocivo, devendo ser considerado para comprovar a eficácia do EPI. Assim, segundo a autarquia, o uso eficaz do equipamento afastaria a contribuição patronal devida à aposentadoria especial.
Manifestações do STF e da TNU sobre o tema
De acordo com a relatora do repetitivo, ministra Maria Thereza de Assis Moura, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Tema 555 da repercussão geral, já se manifestou no sentido de que a indicação de uso adequado do EPI descaracteriza o tempo especial, salvo se o segurado produzir prova de que o equipamento não era utilizado ou não era eficaz.
Na mesma direção, a ministra citou posicionamento da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) segundo o qual a anotação do uso de EPI no PPP é suficiente para provar a neutralização de agentes nocivos à saúde e a manutenção da integridade física do trabalhador.
“O PPP é uma exigência legal e está sujeito a controle por parte dos trabalhadores e da administração pública (artigo 58, parágrafos 1º e 4º, da Lei 8.213/1991). Desconsiderar, de forma geral e irrestrita, as anotações desfavoráveis ao trabalhador é contra a legislação e causa efeitos deletérios à coletividade de trabalhadores. Dessa forma, a anotação no PPP, em princípio, descaracteriza o tempo especial. Se o segurado discordar, deve desafiar a anotação, fazendo-o de forma clara e específica”, destacou a relatora.
Ônus da prova quanto à eventual ineficácia do EPI
Maria Thereza de Assis Moura disse que, havendo contestação judicial da anotação positiva no PPP, a comprovação da ineficácia do EPI é ônus processual do segurado, por se tratar de fato constitutivo de seu direito, conforme previsto no artigo 373, I, do Código de Processo Civil. Para ela, o caso não se enquadra nas hipóteses de redistribuição do ônus da prova dispostas no parágrafo 1º do mesmo artigo, pois o que autoriza a revisão da regra geral é a assimetria de informações.
“A prova é mais fácil para o segurado do que para o INSS. Foi o segurado quem manteve relação com a empregadora, conhece o trabalho e tem condições de complementar ou contestar informações constantes no PPP”, refletiu. No entanto, a ministra ressaltou que, nessa matéria, o nível de exigência de prova é mais baixo. “Basta que o segurado consiga demonstrar que há divergência ou dúvida relevante quanto ao uso ou à eficácia do EPI para que obtenha o reconhecimento do direito”, concluiu.
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) revogou a prisão preventiva de um homem condenado em primeira instância, por entender que a fundamentação para a manutenção da prisão cautelar se baseou apenas na pena aplicada. Para o colegiado, restou caracterizado o constrangimento ilegal, o que justificou a revogação da medida.
O relator do caso, ministro Og Fernandes, explicou que a única fundamentação utilizada pelo juízo para manter a prisão cautelar foi a quantidade da pena aplicada: nove anos de reclusão. “Como se observa, na sentença condenatória, não há fundamentação concreta para a manutenção da segregação cautelar”, completou.
Tribunal de origem não pode acrescentar fundamento para suprir omissão
O ministro ressaltou que a decisão do magistrado nem sequer indicou que os motivos que levaram à decretação da prisão anteriormente persistiam a ponto de justificar a necessidade da manutenção no julgamento da apelação.
Og Fernandes destacou que a jurisprudência do STJ é no sentido de que o tribunal de origem não pode acrescentar fundamentos inexistentes ao julgar um habeas corpus para suprir omissão do juízo que manteve a prisão. Segundo apontou, o tribunal tentou legitimar indevidamente o ato coator.
Por fim, o ministro salientou que, em razão de o direito de recorrer em liberdade ter sido negado também aos demais corréus pelo mesmo motivo, eles tiveram suas prisões revogadas da mesma forma.
Segundo o colegiado, embora esse tipo de ativo não seja considerado moeda de curso legal, as criptomoedas têm valor econômico e são passíveis de constrição.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, no cumprimento de sentença, o juízo pode enviar ofício às corretoras de criptoativos com o objetivo de localizar e penhorar eventuais valores em nome da parte executada.
O recurso chegou ao STJ após o tribunal de origem negar provimento ao agravo de instrumento – interposto na fase de cumprimento de sentença – em que o exequente sustentava a possibilidade de expedição de ofícios para tentar encontrar criptomoedas que pudessem ser penhoradas.
O tribunal local considerou a inexistência de regulamentação sobre operações com criptoativos. Além disso, para a corte local, faltaria a garantia de capacidade de conversão desses ativos em moeda de curso forçado.
Ativo digital faz parte do patrimônio do devedor
O relator na Terceira Turma, ministro Humberto Martins, lembrou que, para a jurisprudência do STJ, da mesma forma como a execução deve ser processada da maneira menos gravosa para o executado, deve-se atender o interesse do credor que, por meio de penhora, busca a quitação da dívida não paga.
O ministro ressaltou que as criptomoedas são ativos financeiros passíveis de tributação, que devem ser declarados à Receita Federal. Conforme disse, apesar de não serem moedas de curso legal, elas têm valor econômico e são suscetíveis de restrição. “Os criptoativos podem ser usados como forma de pagamento e como reserva de valor”, completou.
O relator comentou que, conforme o artigo 789 do Código de Processo Civil, o devedor inadimplente responde com todos os seus bens pela obrigação não cumprida, ressalvadas as exceções legais. No entanto, em pesquisa no sistema Sisbajud, não foram localizados ativos financeiros em instituições bancárias autorizadas.
Para Humberto Martins, além da expedição de ofício às corretoras de criptomoedas, ainda é possível a adoção de medidas investigativas para acessar as carteiras digitais do devedor, com vistas a uma eventual penhora.
Criptomoedas representam desafios para o Judiciário
O relator lembrou que uma proposta legislativa em tramitação, o Projeto de Lei 1.600/2022, define o criptoativo como representação digital de valor, utilizado como ativo financeiro, meio de pagamento e instrumento de acesso a bens e serviços.
Em voto-vista, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva informou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está desenvolvendo uma ferramenta, o Criptojud, para facilitar o rastreamento e o bloqueio de ativos digitais em corretoras de criptoativos.
Cueva salientou a necessidade da regulamentação desse setor, diante das dificuldades de ordem técnica relacionadas com a localização, o bloqueio, a custódia e a liquidação de criptoativos, o que traz desafios para o Poder Judiciário tanto na esfera cível quanto na penal.
Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o fato gerador do crédito relativo às astreintes é o descumprimento da decisão judicial que determinou a obrigação de fazer. “Tratando-se de obrigações de origem e finalidade diversa, é inafastável a conclusão de que o fato gerador da obrigação principal não se confunde com o fato gerador da multa coercitiva”, afirmou o relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
Na origem, após a Defesa Civil constatar defeitos de construção em um empreendimento residencial, o condomínio ingressou com ação para que as duas empresas responsáveis pela obra – em recuperação judicial – sanassem os problemas.
Em liminar confirmada posteriormente na sentença, o juízo de primeiro grau determinou às empresas que fizessem reparos no muro do condomínio, sob pena de multa diária. Como os reparos não foram realizados, o condomínio ingressou com pedido de cumprimento provisório da sentença, exigindo o valor das astreintes. O juízo, considerando que o fato gerador da obrigação executada foi posterior ao encerramento da recuperação judicial, acolheu o pedido para bloquear o valor em conta bancária, por meio do Sisbajud – decisão mantida pelo tribunal estadual.
No STJ, as empresas sustentaram que a obrigação de pagar as astreintes ainda está em discussão, já que não houve julgamento definitivo da apelação, motivo pelo qual a execução tem caráter provisório, o que não permite o levantamento de valores. Elas pediram que o crédito relativo à multa fosse reconhecido como concursal e habilitado na recuperação judicial.
Segundo esclareceu o ministro, a multa tem natureza processual, diferentemente da obrigação principal do processo; ela serve para fazer com que a obrigação principal seja cumprida, e não para substituí-la. “A multa é obrigação acessória à determinação do juiz, e não acessória ao ilícito contratual”, explicou.
“Diversamente da indenização, que objetiva recompor o dano causado à esfera jurídica da vítima, a multa cominatória objetiva a defesa da autoridade do próprio Estado-juiz”, completou.
Descumprimento da decisão judicial é fato gerador das astreintes
O relator salientou que, por terem finalidades diversas, a obrigação principal e a multa coercitiva não podem ter o mesmo fato gerador. Conforme observou, no caso em discussão, a obrigação tem como fato gerador o cumprimento defeituoso do contrato, que deu origem ao direito de obter reparação direta ou pecuniária.
Quanto ao fato gerador da multa, o relator comentou que ele ocorre com o descumprimento da decisão judicial que determinou o início da obra para sanar os defeitos de construção apontados pelo laudo da Defesa Civil.
Conforme apontou o ministro, o descumprimento da obrigação de executar a reforma começou quando já havia sido encerrada a recuperação judicial. “Diante disso, não há falar em habilitação do crédito ou reserva de valores”, concluiu.
Levantamento de valores está condicionado ao trânsito em julgado
O relator lembrou que, para a jurisprudência do STJ, a multa cominatória somente pode ser objeto de execução provisória quando confirmada por sentença e desde que o recurso interposto não tenha sido recebido com efeito suspensivo.
De acordo com o ministro, a apelação pendente de julgamento não tem, em princípio, efeito suspensivo (artigo 1.012, parágrafo 1º, inciso V, do CPC), o que possibilita o prosseguimento do cumprimento provisório de sentença. No entanto, o levantamento dos valores deve aguardar o trânsito em julgado do processo.
“O fato de a multa cominatória ser passível de mudança não impossibilita sua execução provisória”, ressaltou.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.158), fixou a tese de que “o credor fiduciário, antes da consolidação da propriedade e da imissão na posse do imóvel objeto da alienação fiduciária, não pode ser considerado sujeito passivo do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), uma vez que não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no artigo 34 do Código Tributário Nacional (CTN)“.
Com a definição da tese jurídica, podem voltar a tramitar os processos individuais ou coletivos que discutem a mesma matéria e estavam suspensos na segunda instância ou no próprio STJ. O entendimento definido pela Primeira Seção deverá ser observado pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.
O processo julgado teve origem em execução fiscal proposta pelo município de São Paulo contra um banco, com o objetivo de cobrar o IPTU incidente sobre imóvel que estava em alienação fiduciária. O tribunal estadual reconheceu a ilegitimidade passiva da instituição financeira.
No recurso ao STJ, o município sustentou que a alienação fiduciária implica a efetiva transferência da propriedade para o credor e, se o banco optou por uma modalidade que acarreta a transferência de domínio do bem, deveria se sujeitar ao pagamento das respectivas obrigações.
Instituição financeira não tem intenção de ser dona do imóvel
O relator do recurso repetitivo, ministro Teodoro Silva Santos, ressaltou que, no contrato de alienação fiduciária, o credor detém apenas a propriedade resolúvel, indireta, do bem, para garantir o pagamento do financiamento, sem que haja o propósito de ser efetivamente o dono.
O ministro lembrou que, segundo a jurisprudência do STJ, a posse do bem deve ser acompanhada da intenção de ser o seu dono (animusdomini). Assim, os sujeitos elencados no artigo 34 do CTN são considerados contribuintes do IPTU por terem relação direta e pessoal com o imóvel, ao contrário daquele que apenas detém a posse precária, como é o caso do credor fiduciário.
De acordo com o relator, o artigo 1.367 do Código Civil (CC) estabelece que a propriedade fiduciária não se equipara à propriedade plena. “Em virtude do seu caráter resolúvel (artigo 1.359 do CC), a propriedade do bem adquirido pelo devedor fiduciante é transferida ao credor fiduciário sob condição resolutiva”, completou.
Lei impõe ao devedor a obrigação de pagar o imposto
Teodoro Silva Santos afirmou que o devedor fiduciante é quem deve responder pelo pagamento de encargos que recaiam sobre o imóvel, nos termos do artigo 27, parágrafo 8º, da Lei 9.514/1997. Conforme enfatizou, essa responsabilidade continua até o momento em que o credor fiduciário for imitido na posse, quando o banco recebe a posse do imóvel por falta de pagamento.
Em 2023 – acrescentou o ministro –, a nova redação do artigo 23, parágrafo 2º, da Lei 9.514/1997 impôs expressamente ao devedor fiduciante a obrigação de arcar com o IPTU incidente sobre o bem.
“O credor fiduciário não pode ser considerado como contribuinte, uma vez que não ostenta a condição de proprietário, de detentor do domínio útil nem de possuidor com ânimo de dono, tampouco como responsável tributário”, concluiu.
A Secretaria de Biblioteca e Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atualizou a base de dados de Repetitivos e IACs Anotados. Foram incluídas informações a respeito do julgamento dos Recursos Especiais 1.955.655 e 1.956.946, classificados no ramo do direito do consumidor, no assunto energia elétrica.
Os acórdãos estabelecem a legitimidade passiva da prestadora de serviços de energia elétrica e a ilegitimidade passiva da União e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) nas demandas em que o consumidor final discute parcela dos objetivos e parâmetros de cálculo das cotas anuais da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
A página Repetitivos e IACs Anotados disponibiliza os acórdãos já publicados (acórdãos dos recursos especiais julgados no tribunal sob o rito dos artigos 1.036 a 1.041 e do artigo 947 do Código de Processo Civil), organizando-os de acordo com o ramo do direito e por assuntos específicos.
Criada em 2007 para auxiliar a Presidência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Assessoria de Admissibilidade, Recursos Repetitivos e Relevância (ARP) tem como papel principal identificar processos que, especialmente por razões legais ou por orientação jurisprudencial, são considerados inadmissíveis e não devem seguir tramitando na corte.
Trata-se de uma unidade fundamental para que o tribunal consiga dar vazão à enorme carga de processos que recebe diariamente e possa concentrar seus esforços nos casos que realmente exijam sua intervenção, de acordo com suas competências constitucionais.
A partir de uma análise criteriosa da admissibilidade, a atuação da ARP evitou, apenas em 2024, que mais de 133 mil ações fossem distribuídas aos gabinetes dos ministros – nesses casos, a decisão de inadmissão é da própria Presidência do STJ.
Mesmo quando a Presidência não admite uma ação originária ou um recurso com base na triagem da ARP e a parte recorre, o índice de manutenção das decisões pelos ministros relatores é de 96,27%, ou seja, menos de 4% das decisões são reformadas posteriormente.
Sistema de filtros permite à ARP fazer uma análise criteriosa de processos
O elevado índice de manutenção das decisões originadas na ARP se deve, em grande parte, ao sistema de filtros criado pela assessoria para garantir que a eventual inadmissão do processo só ocorra a partir de um exame criterioso. A ARP não analisa o mérito dos processos, mas apenas se são admissíveis ou não no STJ.
Os filtros são aplicados aos recursos especiais (REsps) e agravos em recurso especial (AREsps), já que as demais classes processuais têm seus próprios critérios de admissibilidade (a exemplo dos embargos de divergência e dos recursos em mandado de segurança).
No caso dos AREsps, por exemplo, existem três filtros principais: a) análise dos pressupostos objetivos; b) admissibilidade cotejada; e c) exame de suficiência. São filtros sucessivos, ou seja, o processo só é examinado sob o filtro seguinte se ultrapassar a etapa anterior.
No filtro dos pressupostos objetivos, a unidade analisa tempestividade, exaurimento da instância de origem, pagamento de custas e existência de procuração nos autos.
Na fase de admissibilidade cotejada, a atenção da ARP é com a correta impugnação dos fundamentos da decisão recorrida. Os procedimentos realizados nessa fase, além de aplicarem enunciados como a Súmula 182 do STJ, usam modelos de trabalho como o questionário processual e a Árvore de Fundamentos de Inadmissão do Recurso Especial, por meio dos quais são analisados, de maneira aprofundada, os elementos sobre a impugnação da decisão recorrida.
A análise de suficiência, por sua vez, é destinada a extrair as controvérsias dos recursos especiais e valorá-las com base nas súmulas de admissibilidade (por exemplo, as Súmulas 5 e 7 do STJ, além das Súmulas 282 e 284 do Supremo Tribunal Federal). Nessa etapa, são examinados pontos como a indicação expressa do permissivo constitucional que autoriza a interposição do recurso especial, o apontamento expresso do dispositivo legal violado e a demonstração concreta da divergência.
Caso o processo supere essas três etapas, a Presidência do STJ determina a sua distribuição. O regimento interno também prevê a distribuição quando a parte apresenta recurso (agravo interno) contra a decisão da Presidência nas hipóteses do artigo 21-E do Regimento Interno e não há retratação.
Triagem reserva aos gabinetes os processos com maior potencial de julgamento de mérito
A participação da ARP no fluxo processual do STJ evita que os gabinetes sejam acionados para analisar recursos inadmissíveis, possibilitando que os ministros atuem apenas nos processos com maior potencial de análise do mérito.
Ao longo de 2024, na Segunda Seção, por exemplo, cada ministro deixou de receber 6.722 processos em média, o equivalente a cerca de 83% do que foi efetivamente distribuído (8.059).
A Primeira Seção, no mesmo período, deixou de receber 3.532 por ministro, ou aproximadamente 52% do volume distribuído (6.722). Na Terceira Seção, deixaram de ser distribuídos 3.057 casos por gabinete, o que representa 24% dos 12.930 enviados efetivamente a cada relator, em média.
O ANPP, acordo entre a acusação e a defesa para não haver processo em troca do cumprimento de algumas condições pelo réu, não tem previsão expressa de cabimento na ação penal privada.
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o Ministério Público (MP) pode propor o acordo de não persecução penal (ANPP) em ações penais privadas. A legitimidade do órgão ministerial, nesse caso, será reconhecida quando houver inércia ou recusa infundada do querelante.
A partir desse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso especial de um homem que pedia a desconsideração do acordo por preclusão e por ilegitimidade do MP.
A queixa-crime por calúnia e difamação não foi recebida pelo juízo, mas o tribunal de segundo grau reformou a decisão e determinou que o processo seguisse. Diante da designação de audiência para homologação do ANPP, o autor da queixa entrou com reclamação questionando o oferecimento do acordo, mas ela foi julgada improcedente.
No recurso ao STJ, o querelante sustentou que a validação do acordo, quando já recebida a queixa-crime, violaria o artigo 28-A, caput, do Código de Processo Penal (CPP). Defendeu ainda que o MP não teria legitimidade para propor o benefício, visto que não é titular da ação penal privada.
Ação penal privada admite aplicação do ANPP por analogia
O ministro Joel Ilan Paciornik, relator, lembrou que o CPP não admite expressamente o ANPP na ação penal privada. Entretanto, em sua avaliação, é possível estender a aplicação do instituto por analogia.
Citando o caráter restaurativo e desjudicializante da política criminal atual, o ministro destacou que o acordo busca garantir uma justiça penal mais eficiente e menos punitivista, com foco na reparação do dano e prevenindo o encarceramento desnecessário.
“Se há espaço para essa abordagem na ação penal pública, com maior razão deve ser admitida na ação penal privada, que, por sua própria natureza, confere ao ofendido um juízo de conveniência sobre a persecução penal”, afirmou Paciornik.
Atuação do MP deve ser supletiva e excepcional
O relator observou que, embora o ofendido seja o titular da ação penal privada, esse poder deve ser exercido com razoabilidade. Dessa forma, ele não pode negar arbitrariamente o oferecimento do ANPP, usando a persecução penal como “instrumento de vingança”.
A atuação do MP – prosseguiu o ministro – não se confunde com a titularidade da ação penal. “Sua atuação ocorre de forma supletiva e excepcional, apenas para garantir que o instituto do ANPP seja aplicado de maneira justa e eficaz”, declarou.
De acordo com o relator, a resistência quanto à legitimidade supletiva do MP decorre da posição do STJ segundo a qual, em ações penais privadas, a transação penal só pode ser proposta pelo querelante. Porém, ele explicou que o ANPP tem natureza distinta, pois pressupõe confissão negociada e uma solução baseada na suficiência e na necessidade da pena.
Não haveria razão para impedir o querelante de propor ANPP a qualquer tempo
Em relação ao momento adequado para oferecer o ANPP na ação privada, Paciornik ressaltou que o seu titular tem liberdade de desistir da queixa a qualquer momento ou mesmo conceder perdão ao querelado. “Não haveria justificativa lógica ou principiológica para restringir a possibilidade de formalizar um ANPP em momento posterior ao recebimento da queixa”, completou.
Quanto ao MP, Paciornik ressaltou que a sua atuação na ação penal privada se limita à fiscalização da ordem jurídica, devendo se manifestar na primeira oportunidade em caso de inércia do querelante, sob pena de preclusão.
No entanto, no processo em análise, o ministro verificou que não houve preclusão, pois somente após o recebimento da queixa-crime é que se consolidou a persecução penal, “estabelecendo-se para o custos legis o momento crucial para a manifestação sobre o acordo, ante a inércia do querelante. Assim, não se pode cogitar preclusão, seja temporal, seja consumativa”, concluiu o relator.
O 1º Congresso STJ Brasil-China de Direito Meio Ambiente & Inteligência Artificial, iniciado nesta terça-feira (11) na sede do tribunal, discutiu desafios jurídicos comuns aos dois países.
O Superior Tribunal de Justiça deu início, nesta terça-feira (11), ao 1º Congresso STJ Brasil-China de Direito Meio Ambiente & Inteligência Artificial, evento bilateral inédito promovido pelo Programa STJ Internacional.
O presidente do tribunal, ministro Herman Benjamin, disse que é fundamental que ambos os países estabeleçam diálogo qualificado em diversas áreas, inclusive no universo jurídico. “Nós, brasileiros, não conhecemos o sistema jurídico chinês, e isso é inaceitável”, comentou o ministro ao reforçar a importância do diálogo bilateral.
Ele destacou grandes invenções chinesas para a humanidade, como o papel, a imprensa, a bússola, a pólvora e uma outra de especial relevância para a administração: “Foi a China que inventou o concurso público. Quem vai até lá deve visitar os centros de exame. Por mais de 1.500 anos, os chineses estiveram à frente de todos nós na organização meritória do serviço público”.
O embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, comentou que a conexão jurídica entre os países é uma necessidade urgente, e o evento colabora para o entendimento mútuo de questões relevantes sobre meio ambiente e inteligência artificial.
Zhu Qingqiao mencionou a mais recente orientação político-administrativa da China, com ênfase na construção de um país socialista moderno, calcado no Estado de Direito, considerado por ele a salvaguarda que fortalece a sociedade.
“As questões tratadas no congresso são importantes para a comunidade internacional. Há urgência para a ação global nesses temas”, declarou, citando iniciativas como a descarbonização da economia e a promoção da inovação.
Para o embaixador Eduardo Paes Saboia, secretário para Ásia e Pacífico do Ministério das Relações Exteriores, Brasil e China são hoje fontes de estabilidade no mundo.
Segundo o embaixador, os planos de ambos os países demonstram pragmatismo em busca do desenvolvimento econômico e social. “Brasil e China possuem experiências bem-sucedidas de desenvolvimento e uma ampla agenda de cooperação com resultados concretos para ambos. Os países são incansáveis na construção de saídas, e não poderia ser diferente no mundo jurídico”, finalizou.
Particularidades do sistema jurídico brasileiro
A conferência de abertura do congresso foi proferida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luís Roberto Barroso.
Ele apresentou um panorama do sistema jurídico brasileiro para os representantes chineses, destacando três pontos básicos: o fato de o Brasil fazer parte da família romano-germânica do direito (civil law); ser uma federação com três níveis de poder, porém com uma legislação predominantemente federal; e ter uma estrutura de Justiça complexa, incluindo a Justiça Federal, a estadual e a especializada.
“No Brasil, a maior parte dos casos é tratado na Justiça estadual, totalizando 75% do total do país. Esses juízes decidem aplicando uma legislação federal para casos locais. Cabe ao STF o papel técnico de interpretar a Constituição, e como ela é muito abrangente, muita coisa vai para lá, o que se traduz no protagonismo da corte suprema em questões que, em outros países, seriam locais”, resumiu Barroso.
O presidente do STF destacou a particularidade do sistema brasileiro com um número significativo: 83,8 milhões de processos em tramitação, frente aos 45 milhões de processos na China. O Brasil registra quase o dobro de processos, com um sexto da população.
A conferência de abertura foi presidida pelo reitor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), professor Vidal Serrano, e pela diretora do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), professora Anne Augusta Alencar Leite.
Educação como ferramenta de justiça
O ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou que a justiça começa na infância e que um país que não olha pelas crianças não garante o seu futuro: “Não há injustiça maior do que negar o direito à educação. A miséria intelectual é a pior que existe. Avançar em questões como meio ambiente e inteligência artificial exige antes a garantia dos direitos básicos”.
Camilo Santana elogiou a escolha dos temas do congresso e disse que, em ano de COP 30 no Brasil, construir cidadãos conscientes sobre o meio ambiente é um dever de todos, e a escola é o grande motor para essas transformações sociais.
O ministro lembrou que o governo federal trabalha na definição de regras e diretrizes para o uso da inteligência artificial nas escolas, de forma a tornar as novas possibilidades democráticas e inclusivas.
O evento contou com a participação de diversos ministros do STJ, do presidente a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), juiz Caio Marinho, e do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), juiz de direito Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho.
Direito comparado Brasil-China
Os painéis acadêmicos tiveram início com um panorama comparativo entre o direito brasileiro e o chinês. O primeiro painel foi presidido pelo vice-presidente do STJ, ministro Luis Felipe Salomão, e contou com a participação do diretor da Escola de Direito da FGV, Oscar Vilhena, e do professor Shi Jianzhong, vice-presidente da Universidade de Ciência Política e Direito da China.
O professor Vilhena destacou a abordagem diferenciada do evento ao tratar do desenvolvimento econômico do ponto de vista institucional, colocando lado a lado modelos distintos com suas peculiaridades: “É um passo acertadíssimo que estamos dando em um mundo cada vez mais instável – promover uma discussão sobre regras”.
O professor Shi Jianzhong discursou sobre o processo de abertura da China, com início em 1978 e consolidação em 2021. Nesse período, explicou, houve o desenvolvimento e a consolidação de um sistema jurídico adequado ao país, com ênfase em uma lei igual para todos. “Antigamente tínhamos um corpo de leis, mas com a evolução da sociedade era necessário buscar uma aplicação científica dessas leis, adequada à realidade”, declarou.
Novos desafios com a regulamentação da inteligência artificial
O segundo painel focou nas discussões sobre leis para regulamentar a inteligência artificial, tanto na China como no Brasil. A mesa teve como presidente a ministra Nancy Andrighi, e os expositores foram a professora Cláudia Lima Marques, ex-diretora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o professor Shi Jianzhong e o professor Carlos Affonso Souza, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Autoridades e especialistas participaram de três painéis acadêmicos no primeiro dia do evento.
Cláudia Lima Marques frisou a importância dos dispositivos da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) na regulação das novas funcionalidades da inteligência artificial. “O marco regulatório da IA prevê a aplicação de várias leis e dispositivos em conjunto para dar conta do assunto. A reforma do Código Civil já prevê um capítulo específico para o direito digital”, comentou.
Sobre esse assunto, o professor Shi Jianzhong disse que é preciso achar um equilíbrio entre desenvolvimento e segurança. Ele falou sobre algumas leis editadas recentemente a respeito do tema, que está em destaque atualmente, sobretudo após o lançamento da ferramenta chinesa de IA Deepseek.
Já o professor Carlos Affonso Souza avaliou que há várias propostas legislativas sobre temas polêmicos no Brasil, como a regulação de redes sociais em conjunto com a IA. “Há uma tendência global de transformação do debate em torno da IA”, comentou, ressaltando a multiplicidade de temas inseridos no contexto dessa regulação, especialmente quando se fala de proteção de dados pessoais.
Caminho jurídico para a ecocivilização
O último painel do dia, sobre o caminho jurídico para a ecocivilização, foi presidido pelo professor Carlos Bolonha, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e teve como palestrantes o ministro Herman Benjamin e os professores Yu Wenxuan, vice-reitor da Faculdade de Direito Civil, Comercial e Econômico da Universidade de Ciência Política e Direito da China, e Qun Du, da Faculdade de Direito da Universidade de Beihang, em Pequim.
Em sua fala, o ministro Herman Benjamin relembrou o histórico da legislação ambiental no Brasil. Segundo o presidente do STJ, a Lei 6.938, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981, é o marco do início efetivo do direito ambiental no país.
“É uma lei curta, mas realmente revolucionária. Ela transformou o paradigma que tínhamos até então e estabeleceu objetivos, algo que não era comum em países do civil law. Além disso, trouxe princípios jurídicos e instrumentos novos, como, por exemplo, o estudo de impacto ambiental e a responsabilidade objetiva pelo dano ambiental”, comentou.
O professor Yu Wenxuan discorreu sobre a evolução legislativa ambiental na China. Ele explicou que a primeira lei é de 1979 e foi revisada periodicamente, sendo a última vez em 2014. “Hoje temos o que chamamos de linha vermelha para a proteção ambiental e o desenvolvimento da sociedade. O conceito de civilização ecológica é recente e tem reflexo nas leis sobre meio ambiente”, concluiu.
A professora Qun Du falou sobre o conceito de ecocivilização sob o ponto de vista do plano de desenvolvimento chinês. Dessa forma, civilização transcende o conceito de desenvolvimento sustentável e há a fusão de civilização cultural e política com o meio ambiente. “Utilizando conceitos filosóficos e a visão de país, temos o conceito de ecocivilização. Acreditamos que a ecologia forte é um pressuposto para uma civilização forte”, afirmou.
Além do presidente e do vice-presidente do STJ, o evento contou com a participação dos seguintes ministros e ministras: Nancy Andrighi, Humberto Martins, Maria Thereza de Assis Moura, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Isabel Gallotti, Ricardo Villas Bôas Cueva, Sebastião Reis Junior, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Sérgio Kukina, Moura Ribeiro, Rogerio Schietti Cruz, Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Antonio Saldanha Palheiro, Messod Azulay Neto, Paulo Sérgio Domingues, Teodoro Silva Santos e Afrânio Vilela.
STJ Notícias: reportagem especial explica diferença entre curatela e tomada de decisão apoiada
A mais nova edição do programa STJ Notícias traz uma reportagem especial que aborda a diferença entre os institutos jurídicos da curatela e da tomada de decisão apoiada, a partir de julgamento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em que os ministros decidiram não ser possível substituir curatela por tomada de decisão apoiada sem melhora na saúde do interditado.
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Fonte: STJ
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