Justiça Digital: encontro aprofunda debate sobre inteligência artificial e letramento no Judiciário

Em continuidade ao projeto Justiça Digital – Saberes para o Futuro, a Rede de Inovação da Justiça Federal realizou, na quarta-feira (8), mais um encontro voltado ao fortalecimento do letramento digital no Judiciário. A palestra “Inteligência Artificial: o que é, como funciona e por que importa?” foi ministrada pelo juiz federal Marcelo Lélis de Aguiar, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), e transmitida pelo canal do Conselho da Justiça Federal (CJF) no YouTube e pela plataforma Teams. 

O evento é promovido pela Rede de Inovação, em parceria com o CJF, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) e o TRF3, reunindo magistradas(os), servidoras(es) e colaboradoras(es). 

Na abertura, a juíza federal Vânila Cardoso André de Moraes, coordenadora da Rede de Inovação e auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça Federal (CG), destacou que o projeto Justiça Digital busca aproximar a inovação do cotidiano institucional e estimular uma cultura colaborativa entre tribunais. “Desde 2024, temos construído espaços de aprendizagem contínua, nos quais o conhecimento técnico e a visão estratégica caminham juntos para preparar nossas instituições para os desafios da transformação digital. A inteligência artificial chegou para ficar, e por isso damos importância a eventos como este”, afirmou. 

Inteligência artificial e o papel humano na Justiça 

O juiz federal Marcelo Lélis de Aguiar apresentou uma visão ampla sobre o funcionamento da inteligência artificial (IA) e seus desdobramentos no campo jurídico, destacando o avanço das tecnologias generativas e a necessidade de domínio crítico dessas ferramentas. O magistrado explicou que a IA não substitui a capacidade de julgamento humano, mas pode atuar como apoio à atividade judicial, desde que utilizada com preparo e ética. 

“O Poder Judiciário foi instituído para que seres humanos julguem seres humanos. Todo o nosso sistema é conformado com essa premissa. A tecnologia pode apoiar, mas nunca substituir a dimensão humana das decisões. Tudo o que for feito com inteligência artificial deve ser feito com supervisão humana”, afirmou. 

Ao longo da exposição, o palestrante detalhou o funcionamento dos grandes modelos de linguagem e chamou atenção para fenômenos como as chamadas alucinações, quando o sistema cria informações inexistentes, o risco de vieses nos resultados e a importância da revisão humana em todo o processo. Segundo ele, “nenhuma tecnologia é boa ou má em essência. Tudo depende da forma como é utilizada e das repercussões que isso traz para a sociedade e para o planeta”. 

O juiz federal também ressaltou o papel da formação contínua e do letramento digital como instrumentos de segurança institucional. “O uso não preparado da inteligência artificial representa riscos, mas também oportunidades para o Judiciário. É preciso compreender seus limites e potencialidades para transformar tecnologia em eficiência e não em vulnerabilidade”, observou. 

Formação para o futuro 

O projeto Justiça Digital – Saberes para o Futuro segue com uma agenda de atividades que inclui palestras, mesas-redondas, miniaulas e workshops sobre temas ligados à transformação digital, ética e inovação no serviço público. A iniciativa busca consolidar uma Justiça moderna e responsável, comprometida com o uso consciente da tecnologia e com a valorização da dimensão humana na tomada de decisões 

Fonte: CJF

Comissão aprova obrigatoriedade da impressão digital da mãe e do recém-nascido na Declaração de Nascido Vivo

 

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que obriga maternidades e hospitais do País a incluírem na Declaração de Nascido Vivo (DNV) impressões digitais do recém-nascido e da mãe. A unidade hospitalar também deverá manter cópias digitalizadas do documento.

O texto aprovado, que altera a lei que assegura a validade nacional da DNV, seguirá para o Senado, a menos que haja recurso para votação no Plenário da Câmara.

A relatora, deputada Bia Kicis (PL-DF), defendeu a aprovação do Projeto de Lei 2611/23, do deputado General Pazuello (PL-RJ), apenas com alterações de redação.

“A coleta das impressões digitais dos recém-nascidos e de suas mães é uma medida de segurança relevante para combater ações criminosas, especialmente as práticas de adoção ilegal e tráfico de órgãos”, destacou a relatora.

“Os crimes que o projeto busca coibir são de extrema gravidade e se tornam facilitados principalmente nos casos de partos não hospitalares, que permitem que criminosos aproveitem a falta de registro oficial praticar atos ilegais”, acrescentou.

O texto prevê que a DNV conterá impressões digitais dos pés do recém-nascido e dos dedos indicadores e polegares da genitora.

O que é a DNV
A DNV é o documento usado para a lavratura da certidão de nascimento pelos cartórios de registro civil. Segundo a Lei dos Registros Públicos, a DNV deve ser entregue aos pais ou responsáveis pelo bebê logo após o nascimento, sendo válida como documento de identificação provisória em todo o território nacional.

Segundo o Ministério da Saúde, os dados da DNV servem ainda para a produção de estatísticas sobre nascidos vivos e características do pré-natal, da gestação e do parto.

Fonte: Câmara dos Deputados

Banco Central consulta mercado sobre prazos de ciclos de liquidação

O Banco Central do Brasil abriu consulta pública para avaliar os custos e benefícios da redução dos prazos de ciclos de liquidação das operações financeiras no Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB). A iniciativa, formalizada por meio da tomada de subsídios nº 125/2025, busca promover maior solidez e eficiência no SPB, alinhando o país à tendência que vem sendo adotada ou investigada por importantes jurisdições financeiras. 

Hoje, operações com ações, cotas de fundos e moedas estrangeiras são liquidadas em até dois dias úteis (D+2), enquanto ativos financeiros em geral seguem o prazo de D+1. A proposta considera a migração da liquidação dessas transações para D+1 conforme já adotado por países como Estados Unidos, China, Índia, Canadá e México. Jurisdições como União Europeia, Reino Unido e Austrália também iniciaram o processo de transição.

“Queremos ouvir o mercado para garantir que qualquer mudança nos prazos de liquidação seja segura, eficiente e compatível com a realidade das instituições”, disse Nilton José Schneider David, Diretor de Política Monetária do Banco Central.

Ciclos de liquidação mais curtos reduzem a exposição a riscos de crédito e liquidez e diminuem a necessidade de garantias e margens, sem impactar a segurança das câmaras de compensação e de liquidação dos prestadores de serviços. No entanto, a mudança exige maior eficiência nos processos de pós-negociação, como alocação de operações para investidores não residentes, empréstimo de ativos e câmbio, o que pode gerar custos operacionais e aumentar temporariamente o risco de falhas.

O edital destaca a importância de o Banco Central dialogar com os participantes do mercado para entender o impacto de eventual alteração normativa. A consulta está estruturada em 22 questões, divididas em quatro blocos: pós-negociação, custos operacionais, benefícios esperados e impactos internacionais. As contribuições podem ser enviadas até 30 de dezembro de 2025, pelo site do Banco Central ou pelo portal Participa + Brasil​.​

Fonte: BC

Ministra propõe dar aos TJs a palavra final sobre cálculo do ITCMD

A ministra Maria Thereza de Assis Moura, do Superior Tribunal de Justiça, propôs deixar nas mãos dos Tribunais de Justiça a definição sobre a possibilidade de cada Fisco arbitrar a base de cálculo do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

 

A proposta foi feita em julgamento da 1ª Seção sobre o Tema 1.371 dos recursos repetitivos, iniciado nesta quarta-feira (8/10) e interrompido por pedido de vista do ministro Marco Aurélio Bellizze.

O ITCMD é o imposto cobrado pelos estados quando há a transmissão não onerosa de bens ou direitos, como ocorre na herança ou na doação entre pessoas vivas.

A base de cálculo do tributo é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos, como prevê o artigo 38 do Código Tributário Nacional. Mas cada estado tem o poder de editar normas sobre como esse valor deve ser apurado.

Ainda assim, há hipóteses em que o Fisco estadual entende que poderia ele próprio fazer a apuração do valor, graças à aplicação do artigo 148 do CTN.

A norma diz que cabe à autoridade lançadora do tributo arbitrar o montante sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo.

Para a ministra Maria Thereza de Assis Moura, a discussão sobre o cabimento do arbitramento da base de cálculo do ITCMD em face da existência de valor de referência é fundada no direito estadual.

Assim, não pode ser analisada pelo STJ, porque não cabe recurso especial para discutir interpretação do direito estadual.

Ao pedir vista, o ministro Marco Aurélio Bellizze deu indícios de que deve divergir para admitir que o STJ entre na análise sobre a correta interpretação do artigo 148 do CTN.

Cálculo do ITCMD

Para justificar a proposta feita, a relatora apontou que a lei federal estabelece a base de cálculo do ITCMD — o valor venal — e prevê o arbitramento como uma das possíveis causas de sua apuração.

“O direito estadual tem amplo espaço para definir em que hipótese deve ser feita a avaliação administrativa do imóvel, bem como a prerrogativa de reservar a apuração por arbitramento para a hipóteses determinadas”, afirmou.

Assim, a discussão sobre se cabe ou não o arbitramento diante das normas estaduais para calcular o imposto trata da forma de apuração, não da base de cálculo.

Assis Moura ainda propôs tese que expressamente veda a admissibilidade do recurso especial fundado do arbitramento do ITCMD com base na Lei Estadual 10.705/2000, do estado de São Paulo.

Teses

1. O direito estadual estabelece a forma de apuração do valor venal, base de calculo do ITCMD;

2. A discussão sobre o cabimento do arbitramento da base de cálculo do ITCMD em face da existência de valor de referência é fundada no direito estadual;

3. Não cabe recurso especial contra decisão que aplica os artigos 9 e 13 da Lei 10.705/2000 de São Paulo para afastar o arbitramento da base de cálculo do ITCMD.

Tema relevante

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, parte dos estados define que o cálculo do ITCMD partirá de valor coincidente com a base de apuração do IPTU ou do ITR.

Para o contribuinte, a adoção da base de cálculo a partir do valor de referência é mais interessante porque evita a necessidade de avaliação do bem e porque índices como o IPTU costumam ser mais modestos do que o real preço de mercado.

No STJ, a jurisprudência vem indicando que o Fisco pode arbitrar a base de cálculo do ITCMD quando o valor declarado pelo contribuinte se mostrar incompatível com os preços usualmente praticados no mercado.

REsp 2.175.094
REsp 2.213.551

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Juiz derruba uso do termo ‘desembargador de Contas’ no DF

O juiz substituto Carlos Fernando Fecchio dos Santos, da 1ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, anulou a Decisão nº 99/2024 do Tribunal de Contas do DF, que havia determinado a mudança da nomenclatura de “conselheiros” para “desembargadores” de Contas. A decisão foi tomada em Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Distrito Federal.

Na ação, o MP-DF argumentou que a mudança viola o princípio da simetria federativa, previsto no artigo 75 da Constituição Federal e na Lei Orgânica do Distrito Federal. De acordo com o Ministério Público, a Constituição determina expressamente que os Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal devem ser compostos por sete conselheiros, nomenclatura que não pode ser alterada por ato administrativo.

Parquet destacou ainda que o título “desembargador” é reservado aos membros do Poder Judiciário que exercem jurisdição de segundo grau, enquanto os conselheiros dos Tribunais de Contas exercem função de controle externo, sem atribuições jurisdicionais.

Falta de clareza

Em contestação, o Distrito Federal sustentou que a decisão foi editada dentro dos limites constitucionais e que os membros dos Tribunais de Contas possuem garantias e prerrogativas equiparadas aos desembargadores. Argumentou também que a alteração terminológica expressa a autonomia constitucional do tribunal, e não compromete o equilíbrio federativo.

Ao analisar o caso, o juiz ressaltou que “a norma constitucional é clara ao determinar que os Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal devem ser compostos por Conselheiros, nomenclatura que não pode ser alterada por ato administrativo”.

A decisão enfatizou que os Tribunais de Contas são órgãos auxiliares do Poder Legislativo, incumbidos da fiscalização contábil e financeira, e não exercem jurisdição típica do Poder Judiciário.

O magistrado concluiu que a adoção do título “desembargador de Contas” compromete a clareza institucional e pode induzir à falsa percepção de que a corte exerce função jurisdicional, o que não lhe é atribuído constitucionalmente. A sentença reforçou que a valorização dos Tribunais de Contas deve ocorrer pela qualidade técnica e efetividade na fiscalização, não pela adoção de títulos incompatíveis com sua natureza jurídica. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-DF.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0707626-32.2025.8.07.0018

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Projeto proíbe fiança em casos de acidentes de trânsito que resultem em morte

O Projeto de Lei 826/25 altera o Código de Processo Penal para proibir o pagamento de fiança nos crimes de trânsito que resultem em lesões corporais graves ou morte. O texto está em análise na Câmara dos Deputados.

A autora, deputada Silvye Alves (União-GO), explica que o objetivo é reforçar a responsabilização penal dos condutores que, ao adotar condutas imprudentes e perigosas no trânsito, provocam a morte de terceiros.

“A legislação processual penal permite a concessão de fiança para crimes de trânsito que resultam em morte, o que na prática pode ser um incentivo à impunidade”, afirma Silvye.

A parlamentar acrescenta que o motorista que dirige sob efeito de álcool e outras drogas, participa de rachas ou adota condutas perigosas assume o risco de causar a morte de alguém. “Nessas situações, há manifesta negligência e, em muitos casos, dolo eventual, quando o condutor assume conscientemente o risco de provocar um acidente fatal.”

Crimes inafiançáveis
Atualmente, são inafiançáveis:

  • os crimes de racismo;
  • os crimes de tortura;
  • o tráfico de drogas;
  • o terrorismo;
  • os crimes hediondos; e
  • os crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

A lei também define outros casos em que não será concedida fiança, conforme a gravidade e o perigo para a sociedade.

Próximos passos
O projeto será analisado pelas comissões de Viação e Transportes; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, antes de ser votado pelo Plenário da Câmara. Para virar lei, precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados

Sinais de Justiça, o projeto estratégico que valoriza os colaboradores surdos do STJ

Em abril de 2025, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) instituiu o projeto Sinais de Justiça, que trouxe uma série de ações voltadas à valorização de seus colaboradores surdos e à criação de novas oportunidades para esses profissionais.

A parceria com os surdos começou em 2009, com o propósito inicial de atender às exigências da Lei 11.419/2006 – ocasião em que foi confiada a eles a tarefa de digitalizar os processos judiciais em papel que chegavam e os que já estavam no tribunal.

A estratégia precursora e bem-sucedida contribuiu para reduzir o tempo e o custo da tramitação dos processos, e foi fundamental para transformar o STJ em uma corte totalmente digital. Os operadores surdos revelaram uma aptidão singular para o desafio de digitalizar mais de um milhão de processos, tarefa que exigiu alto grau de concentração, e a equipe alcançou expressivos índices de produtividade e excelência no trabalho.

Além dos resultados para a corte e o jurisdicionado, a iniciativa teve grande impacto na vida desses profissionais e se tornou referência nacional de inclusão no setor público.

Projeto prevê prestação de serviços em novas frentes

Segundo o titular da Secretaria Judiciária do STJ, Augusto Gentil, uma das diretrizes do projeto estratégico Sinais de Justiça é a ampliação da atuação dos colaboradores surdos para novas frentes de trabalho. Conforme explicou, a revitalização do espaço destinado à digitalização de processos já foi concluída, o que ajudará no desenvolvimento das novas atividades da equipe – entre elas, a virtualização de documentos e processos das áreas administrativas, além de livros, periódicos e obras raras da Biblioteca do STJ.

O secretário acrescentou que outras atribuições estão incluídas no planejamento, como a digitalização de prontuários do serviço médico e dos Diários de Justiça que compõem o acervo da corte. “Estamos com praticamente todos os itens do projeto já executados ou em execução”, comentou.

Com esses novos trabalhos de virtualização, o tribunal espera que as unidades administrativas envolvidas possam aperfeiçoar suas rotinas e migrar para operações totalmente em meio digital.

Augusto Gentil informou que o projeto também prevê a celebração de parcerias com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), por meio de acordos de cooperação técnica, para apoiar o processo de transformação digital das duas autarquias.

Participação coletiva cria um ambiente de trabalho inclusivo

Com o objetivo de promover maior integração social e profissional no ambiente da corte, foram concebidas, ainda, iniciativas para habilitar o corpo técnico do STJ na Língua Brasileira de Sinais (Libras) e ampliar seu conhecimento em relação a temas como acessibilidade e combate ao capacitismo.

“O projeto Sinais de Justiça consegue unir a participação ativa dos servidores e dos colaboradores, abrindo as portas para que todos se capacitem e se comuniquem com independência”, afirmou a servidora Daniele Azevedo, da Coordenadoria de Acessibilidade e Inclusão do tribunal. De acordo com Augusto Gentil, a humanização do ambiente de trabalho dos colaboradores surdos é uma das diretrizes do projeto.

Fonte: STJ

A nova Lei de licenciamento ambiental e os desafios para os municípios

O licenciamento ambiental, previsto na Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981), consolidou-se como um dos principais instrumentos de gestão para compatibilizar desenvolvimento socioeconômico e proteção ambiental. A Constituição de 1988 reforçou esse papel ao exigir licenciamento para atividades potencialmente poluidoras (artigo 225, §1º, IV), cujas competências administrativas da União, estados e municípios foram detalhadas pela Lei Complementar nº 140/2011.

Historicamente, a regulamentação do licenciamento ambiental se apoiou em normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), como a Resolução nº 01/1986 (que instituiu o EIA/RIMA), a Resolução nº 237/1997 (que estabeleceu procedimentos gerais de licenciamento) e a Resolução nº 09/1990 (sobre audiências públicas). Essas regras formaram a base até a recente aprovação da Lei nº 15.190/2025, chamada de Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA).

Aprovada em 8 de agosto de 2025, a LGLA só entrará em vigor em 4 de fevereiro de 2026, em razão da vacatio legis de 180 dias prevista em seu artigo 67, sendo a única exceção: a Licença Ambiental Especial (LAE), cuja aplicação foi antecipada pela Medida Provisória nº 1.308/2025. Assim, os aspectos discutidos neste artigo projetam-se a partir dessa futura vigência.

Regra de transição

Para contemplar o princípio da continuidade e eficiência no serviço público, o artigo 60 da LGLA estabelece que os processos de licenciamento em curso, quando da entrada em vigor da lei, não precisarão reiniciar suas etapas. As obrigações e cronogramas já estabelecidos serão respeitados. Entretanto, as etapas subsequentes terão de se ajustar à nova lei.

Em termos práticos, pode-se exemplificar que um processo que em fevereiro/2026 já tenha concluído o termo de referência e esteja em fase de EIA/Rima seguirá sob as regras antigas até concluir essa etapa. Mas a partir da análise técnica, audiências públicas ou emissão de licença deverão observar integralmente a LGLA.

Competência municipal: retrocessos em sua autonomia

A LC 140/2011 já previa o licenciamento de impacto local pelos municípios (artigo 9º, XIV, ‘a’), além de sua manifestação obrigatória em processos conduzidos por estados e União (artigo 13, §1º). Nesse contexto, a LGLA deveria seguir na linha do respeito a autonomia municipal. No entanto, a retirada da Certidão de Uso do Solo como requisito do licenciamento (artigo 17 da LGLA) apresenta grave retrocesso, eis que fragiliza a integração entre licenciamento ambiental e planejamento urbano e políticas públicas a ele relacionadas como a ambiental, ignorando competências constitucionais municipais (CF, artigos 30 e 182; Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257/2001).

A título ilustrativo, em cidades com Planos Diretores e legislação ambiental robustas, como São Paulo, Belo Horizonte e Curitiba, diretrizes urbanísticas podem ser sobrepostas por decisões de órgãos licenciadores estaduais ou federais, gerando insegurança jurídica e potencial conflito entre políticas de uso do solo e licenciamento ambiental (FARIAS, 2019; MACHADO, 2017).

Modelos simplificados: risco de fragilização

A LGLA introduz mecanismos de simplificação, como o licenciamento ambiental por adesão e compromisso (LAC) e o licenciamento ambiental especial (LAE) para projetos estratégicos.

Embora voltados à celeridade, esses modelos reduzem a análise técnica e a participação social. O LAC, por exemplo, permite autodeclaração para atividades de médio impacto, como obras viárias e empreendimentos agropecuários, sem avaliação prévia de riscos. O licenciamento especial, ao centralizar a decisão em rito monofásico, pode ser capturado por pressões políticas[1].

Neste sentido, trazemos à baila vários alertas como da Comissão Tripartite Nacional [2], da Associação de Municípios e Meio Ambiente (Anamma) [3] e do e do Ministério Público Federal, em Nota Técnica de 2025 recomendando veto a mais de 30 dispositivos da LGLA[4], ainda durante a tramitação legislativa e nas decisões de eventuais vetos presenciais, que já apontavam riscos de violação ao princípio da precaução (CF, artigo 225), além do aumento da judicialização — riscos que permanecem atuais com a aprovação da LGLA.

Participação social enfraquecida

A nova lei reduz a participação da sociedade civil no processo ao prever no artigo 36 apenas uma audiência pública obrigatória, ficando a realização de mais encontros a critério da autoridade licenciadora. Além disso, a lei não menciona os conselhos municipais de meio ambiente, instâncias fundamentais de controle social e gestão democrática nas cidades.

Esse silenciamento contraria o artigo 225 da Constituição, que assegura à sociedade o direito de participar das decisões ambientais. O resultado é a perda de legitimidade social e de efetividade do licenciamento.

Desvinculação com a agenda climática

Outro ponto crítico é a ausência da variável “clima” na LGLA, ao ignorar a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009) e compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, como a Agenda 2030 da ONU e o Acordo de Paris.

Ao desconsiderar os impactos das atividades licenciadas sobre emissões e adaptação climática, o texto legal distancia o país de sua própria estratégia de transição ecológica.

Perspectivas para os municípios

Para os municípios, a LGLA apresenta um paradoxo. De um lado, amplia responsabilidades administrativas; de outro, retira instrumentos essenciais de integração com políticas urbanas e ambientais.

Sem fortalecimento institucional — equipes técnicas capacitadas, fundos ambientais estruturados e mecanismos de cooperação intermunicipal —, a lei pode ampliar desigualdades regionais. Municípios mais preparados tem maior chance de gerir os novos procedimentos; os demais ficarão dependentes das decisões estaduais ou federais, perdendo protagonismo e enfraquecendo a gestão de seus territórios.

Conclusão

A Lei nº 15.190/2025 marca um divisor de águas no licenciamento ambiental brasileiro. Mas ao priorizar a simplificação em detrimento da análise técnica, da participação social e da integração com agendas urbanas e climáticas, a lei fragiliza justamente os pilares que sustentam a gestão ambiental democrática e eficiente.

Sua efetiva aplicação, a partir de fevereiro de 2026, exigirá esforço conjunto de municípios, órgãos ambientais e sociedade civil para reconstruir, na prática, os mecanismos de proteção previstos pela Constituição.

Se o objetivo declarado é oferecer segurança jurídica ao setor produtivo, o risco é paradoxal: a judicialização pode aumentar diante de uma lei que reduz salvaguardas técnicas e sociais.

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Referências

Constituição Federal de 1988, arts. 225, 30 e 182.

Lei nº 6.938/1981 – Política Nacional de Meio Ambiente.

Lei Complementar nº 140/2011.

Resoluções CONAMA nº 01/1986, nº 237/1997 e nº 09/1990.

Lei nº 15.190/2025 – Lei Geral de Licenciamento Ambiental.

Medida Provisória nº 1.308/2025 – Licença Ambiental Especial.

ANAMMA – Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente. MANIFESTAÇÃO INSTITUCIONAL DA ANAMMA SOBRE A LEI FEDERAL15.190/2025 (LEI GERAL DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL), 2025.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Nota técnica recomendando veto a dispositivos da Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Reportado em: LEXLEGAL. “MPF pede vetos a trechos da nova Lei de Licenciamento Ambiental.” Publicado em 4 ago. 2025. Disponível aqui.

FARIAS, Talden. Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos. Belo Horizonte: Fórum, 2019.

BURMANN, Alexandre; STRUCHEL, Andréa; ANTUNES, Paulo de Bessa. A necessária municipalização do licenciamento ambiental. ConJur, 20/03/2024.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2017.


[1]  Embora a Medida Provisória nº 1.308/2025 não utilize expressamente o termo “monofásico”, o art. 2º dispõe que a LAE é um único ato administrativo que autoriza a localização, instalação e operação de empreendimentos estratégicos, substituindo, portanto, as fases de Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação.

[2]  Disponível aqui.

[3]  Disponível aqui.

[4]  Segundo notícia do portal LexLegal, o MPF enviou à Presidência da República, em agosto de 2025, nota técnica recomendando veto a mais de 30 dispositivos da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, por considerar que diversos trechos poderiam fragilizar a proteção socioambiental e gerar insegurança jurídica. Disponível aqui.

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Depósito parcial em execução invertida não afasta multa nem honorários de sucumbência

A Terceira Turma entendeu que o depósito espontâneo e parcial feito pelo devedor não dispensa a multa de 10% sobre o valor remanescente nem os honorários, ainda que a diferença seja depositada depois.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão por maioria da Terceira Turma, definiu que o depósito espontâneo e parcial feito pelo devedor não afasta a incidência da multa de 10% sobre o valor remanescente nem dos honorários de sucumbência previstos no Código de Processo Civil (CPC), ainda que a diferença seja posteriormente complementada.

O caso envolveu uma execução invertida, quando o próprio devedor inicia o cumprimento de sentença. O valor depositado espontaneamente pela parte devedora foi considerado insuficiente pela credora, que instaurou o cumprimento de sentença para cobrar a diferença, já acrescida de 10% a título de multa e dos honorários sucumbenciais no mesmo percentual.

A executada, porém, impugnou a cobrança, alegando, entre outros pontos, que o depósito antecipado demonstrava boa-fé e deveria afastar penalidades. O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu a favor da devedora, mas a exequente recorreu ao STJ.

Devedor pode agir com má-fé para retardar o cumprimento da obrigação

A ministra Nancy Andrighi, autora do voto que prevaleceu na Terceira Turma, afirmou que a execução invertida, embora moralmente aceitável, não garante automaticamente a boa-fé do devedor. Ela pode ser utilizada – exemplificou a ministra – como uma forma de beneficiar o inadimplente, impedindo o ajuizamento da execução por falta de interesse processual, já que o artigo 526, parágrafo primeiro, do CPC dispõe que o depósito voluntário por parte do devedor deve ser sucedido pela intimação do credor para se manifestar acerca da suficiência do valor depositado.

Ela explicou que, quando o valor do depósito é insuficiente, o devedor ganha tempo no cumprimento da obrigação, uma vez que nesse intermédio, enquanto é processada a liquidação incidental, o credor não pode promover a execução e o devedor evita todas as consequências do inadimplemento, como os juros de mora e a correção monetária incidentes sobre o valor principal da condenação.

Além disso – continuou Nancy Andrighi –, a possibilidade de complementar o depósito sem penalidades representaria vantagem indevida frente ao credor, o qual, na execução direta, fica sujeito a sofrer sanção por excesso de execução. Para ela, a insuficiência do depósito na execução invertida também viola o princípio da adstrição e, se não for aplicada a sanção prevista no artigo 526, parágrafo segundo, do CPC, permite ao devedor quitar o débito de forma parcelada e sem ônus, mesmo após reconhecido o erro apontado pelo credor.

A ministra também destacou em seu voto a impossibilidade de ser aplicada a norma do artigo 545 do CPC, que permite a complementação do depósito sem ônus, pois “a denominada execução inversa apresenta distinção relevante com a ação de consignação em pagamento. A execução inversa não pressupõe a recusa do credor em receber a prestação, ao contrário do que ocorre na consignação em pagamento”, observou.

Leia o acórdão no REsp 1.873.739.

Fonte: STJ

Rede de Inovação da Justiça Federal promove novo encontro sobre letramento digital no Judiciário

Palestra será dia 8 de outubro, com transmissão ao vivo pelo canal do CJF no YouTube

Em continuidade ao projeto Justiça Digital – Saberes para o futuro, a Rede de Inovação da Justiça Federal realizará, no dia 8 de outubro, às 17h, mais um encontro para aprofundar o tema. A palestra “Inteligência Artificial: O que é, como funciona e por que importa?” será transmitida ao vivo pelo canal do CJF no YouTube. 

A iniciativa é uma realização em parceria com o Conselho da Justiça Federal (CJF), o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) e o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3). O projeto contempla uma série de atividades, incluindo palestras, mesas-redondas, miniaulas e workshops. 

Destinada a magistradas(os), servidoras(es) e colaboradoras(es), a capacitação será ministrada pelo juiz federal Marcelo Lélis de Aguiar, do TRF3. O encontro abordará assuntos como transformação digital, inteligência artificial, ética e inovação, ampliando a compreensão sobre letramento digital no Judiciário. 

Acesse a palestra aqui:

Fonte: CJF