Para juristas, IA pode agilizar a Justiça, mas supervisão humana deve estar em todas as etapas

 

Especialistas afirmaram nesta quarta-feira (26), em debate na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Câmara dos Deputados, que a Inteligência Artificial (IA) pode facilitar o acesso à Justiça, mas reforçaram a necessidade de supervisão humana em todas as etapas.

Segundo o advogado Luiz Fernando Bandeira de Mello, relator da resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que regulamentou o uso da IA no Judiciário, o Brasil escolheu um modelo mais cauteloso para o uso da tecnologia. Segundo ele, a China usa IA em sentenças judiciais e o controle dos casos é feito por amostragem.

No Brasil, o sistema usado pelo Rio de Janeiro, por exemplo, foi treinado para aprender a maneira como cada juiz pensa e até o seu estilo. Se o juiz pedir para que a IA elabore uma sentença, ela vai pedir a ele que decida sobre vários pontos do processo até que uma solução seja apresentada.

Além disso, durante o processo, a IA pode sugerir perguntas em audiências e comparar respostas de testemunhas.

Segundo Bandeira de Mello, todos os dados são colocados em um sistema fechado, uma nuvem particular. Além de preservar o sigilo dos dados, o mecanismo evitaria as chamadas “alucinações” da IA, ou seja, dados inexistentes criados pela máquina.

“O que o CNJ defende, promove e estimula é que o tribunal desenvolva uma IA personalizada. Não quer dizer que ele vai construir um novo ChatGPT, ele vai ter o ChatGPT no motor. O comando vai ser enviado para a inteligência artificial, já com regras de evitar viés de raça, viés de gênero, viés de endereço do réu”, explicou.

O representante da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário nos Estados (Fenajud), Sérgio da Silveira, reforçou a necessidade de cuidado com a soberania dos dados nacionais. Ele mostrou reportagens nas quais gestores das chamadas “big techs” não garantem que sistemas fechados não possam ser abertos.

Facilidade no acesso
A Defensora Pública-Geral do Estado de São Paulo, Luciana de Carvalho, disse que o atendimento virtual do órgão facilitou o acesso à Justiça, assim que foi implantado, ao permitir 7.600 agendamentos em 48 horas. Mas afirmou que existem barreiras que necessitam da supervisão humana, como dificuldades de interpretação das interações pelo robô.

A representante da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Judiciário Federal e Ministério Público da União (Fenajufe), Sandra Cristina Dias, manifestou preocupação com a substituição de trabalhadores por IA e com o aprofundamento do racismo estrutural nas decisões alimentadas pelos dados atuais.

Para a deputada Maria do Rosário (PT-RS), a dimensão humana tem que estar presente em todos os casos. “Ao contrário de pensarmos na redução de quadros, nós precisamos investir cada vez mais na inteligência humana e na presença humana diante da Inteligência Artificial. Afinal, os poderes dizem respeito à vida das pessoas, à organização da sociedade”.

Fonte: Câmara dos Deputados

Debate sobre agravante em contravenções penais com violência doméstica contra a mulher

Já está no ar o novo episódio do podcast Rádio Decidendi, que aborda a recente decisão da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do Tema 1.333 dos recursos repetitivos.

Por unanimidade, o colegiado definiu que a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal incide também sobre as contravenções cometidas com violência doméstica contra a mulher, salvo disposição contrária na Lei das Contravenções Penais (LCP). No entanto, abriu exceção para a hipótese de vias de fato, prevista no artigo 21 da LCP, quando for aplicada a nova redação do parágrafo 2º, incluído pela Lei 14.994/2024, respeitando os princípios da especialidade e da vedação ao bis in idem.

Em entrevista ao jornalista Thiago Gomide, a defensora pública de Minas Gerais Adriana Patrícia Campos Pereira comenta os impactos da decisão do STJ, destacando os avanços desse entendimento na proteção da mulher em situação de violência doméstica.

Fonte: STJ

Qual o sentido de ‘acabar com o contencioso’?

Um dos mantras usados para lubrificar o caminho para a aprovação da reforma tributária era o de que ela “acabaria com o contencioso tributário”, que no Brasil ultrapassa os limites do razoável.

O que seus idealizadores tinham em mente, por certo, era a redução dos fatores geradores de conflitos. Um IVA de base ampla, que incide sobre tudo, eliminaria as discussões sobre se esta ou aquela operação estaria incluída em sua hipótese de incidência, porquanto tudo estaria nela inserido. O sistema de créditos amplos, por igual, esvaziaria os debates sobre se esta ou aquela operação seria apta a gerar créditos: todas gerariam. A existência de uma única alíquota, sem regimes específicos, na mesma ordem de ideias, retiraria espaço para questionamentos em torno dos requisitos para ter, ou não ter, direito a este ou àquele tratamento diferenciado.

Sabe-se que o resultado aprovado pelo Congresso, na EC 132/2023 e na LC 214/2025, não realiza exatamente esse ideal. Mas avançou-se alguma coisa em sua direção. Discussões sobre se determinada operação se submete ao ICMS, ou ao ISS, por exemplo, não terão mais razão de ser. Tudo se sujeita ao IBS, e pela mesma alíquota, não importa se classificado como mercadoria, ou serviço. Talvez se criem novas dúvidas, e espaço para novos conflitos, mas isso só o tempo dirá.

O curioso é que, com o PLP 108, que dará origem à segunda (e não era “una” a legislação?) lei complementar, responsável pela estrutura do Comitê Gestor do IBS, e pelo processo administrativo referente a esse imposto, e, principalmente, com as primeiras notícias que começam a circular sobre a minuta de projeto de emenda constitucional destinada a tratar do contencioso judicial, parece que o sentido da expressão “acabar com o contencioso” está sendo compreendido de uma outra forma.

De modo preocupante, o citado PLP 108 estabelece que praticamente toda a prova, no processo de impugnação de lançamento, deve ser pré-constituída. Segue-se o viés lastimável de tratar a produção de provas como um favor, ou mesmo um estorvo, como se a busca pela verdade quanto aos fatos sobre os quais incidem as normas jurídicas não fosse ínsita à própria ideia de regra e, nessa condição, de Estado de Direito, de legalidade e de tudo que daí decorre.

Pelo PLP, a autoridade, querendo, pode determinar a realização de diligências de ofício, conforme lhe aprouver, mas o sujeito passivo só tem direito de solicitá-las se o fizer nos vinte dias de que dispõe para apresentar sua impugnação. E isso depois de a fiscalização ter passado semanas, ou meses, ou mesmo anos, examinando sua contabilidade para ao final notificá-lo de lançamento não raro acompanhado de incontáveis documentos. Tudo a ser lido, entendido, e respondido de modo documentado, em apenas vinte dias. Nada depois disso, salvo prova de que não juntado antes por força maior.

Ah, diz-se em defesa de disposições assim restritivas: depois o contribuinte pode socorrer-se do Judiciário…

Outro ponto preocupante: suprime-se dos órgãos de controle interno da legalidade a aptidão de realizar o controle de… legalidade! Diferentemente do que se dá com o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, que possui alguma autonomia relativamente ao órgão cujos atos revisa (a Receita Federal), os órgãos de julgamento do Comitê Gestor serão diretamente subordinados a uma de suas diretorias, a qual é subordinada ao Conselho Superior, inclusive com a possibilidade de revisão ou reforma dos atos por eles praticados por tais instâncias “superiores”.

Além disso, estabelece-se, textualmente, que, além de não poderem fazer o controle de constitucionalidade, o que é correto (visto tratar-se de autocontrole de legalidade), tampouco podem realizar o controle de legalidade dos atos normativos infralegais editados. Ou seja: se a ilegalidade for determinada por Portaria, Instrução Normativa, Parecer Normativo, Ordem de Serviço, ou por qualquer outra norma editada pelas autoridades do próprio Comitê Gestor (cujos atos o órgão de julgamento deveria poder revisar), essa ilegalidade não poderá ser por ele reconhecida e retificada.

Ou seja: além de castrado do controle de legalidade quanto às questões de incorreta determinação do fato, estará impedido de fazê-lo no que tange a questões de direito, quando a ilegalidade for determinada normativamente. Por mais rasa, ou hierarquicamente inferior, que seja a norma. Basta dar caráter geral e abstrato à ilegalidade, em qualquer ato que seja, que ela fica imune ao crivo do órgão de julgamento.

Ah, repete-se: mas o contribuinte pode ir para o Judiciário depois…

Para além da questão de saber para que servirá o contencioso administrativo, nesse cenário, com órgãos de julgamento inchados, cheios de julgadores (e de ônus para a sociedade que os terá de remunerar), a resposta de que ele “pode ir ao Judiciário” suscita ainda outros problemas.

O primeiro deles é o de que haverá um aumento, e não uma redução, de judicialização. O processo administrativo, em vez de servir de instrumento para desafogar o Judiciário, funcionará como mera chancela de qualquer exigência, deixando ao Poder Judiciário a tarefa de efetivamente controlar a legalidade destas.

E é nesta parte, do processo judicial, que vem a pior parte. Além de ninguém fazer ideia, à esta altura do campeonato (e do início da vigência das normas que implementam a reforma), de como será organizado o contencioso judicial, sobre quem terá competência para julgar questões de IBS e CBS, ou de onde sairá o precatório para honrar restituição de valores pagos indevidamente por anos para centenas ou milhares de municípios diferentes etc., o texto da minuta de emenda que cuidará da reestruturação do Judiciário parece sugerir que, além de o uso da esfera administrativa ser obrigatório, o ingresso em juízo ocorrerá diretamente na segunda instância. Isso mesmo: na segunda instância. Isso porque tudo já terá sido apurado na fase administrativa, especialmente no que tange à matéria probatória.

Isso lembra um defensor dativo que meu saudoso pai disse que às vezes atuava pela Justiça Federal, e que por sua atuação deficiente deixou de ser por ele indicado para os pobres réus sem recursos para pagar advogados, em uma época em que não existia Defensoria Pública da União. Nas ações criminais em que atuava, na defesa prévia, aduzia apenas que a inocência do réu seria demonstrada nas alegações finais. Ao cabo, nestas, nas alegações finais, alegava que a inocência do réu havia sido demonstrada na defesa prévia. E a defesa do réu, com argumentos que apontassem a improcedência da acusação, não era feita em lugar algum.

É o que se dá com o IBS: o processo administrativo tem a produção de provas amesquinhada, e o controle de legalidade idem, porque tudo poderá ser feito depois em juízo. E, se o contribuinte entra em juízo, o processo já começa na segunda instância, cabendo ao Tribunal reexaminar a decisão administrativa em sede de recurso, sem produzir mais provas, porque tudo já foi feito na esfera administrativa.

Somando-se isso ao reforço que se deu ao artigo 166 do CTN, cujo exame não se comportaria aqui, pode-se mesmo dizer que a reforma acabou com o contencioso. Não por ter eliminado suas causas, mas por retirar do contribuinte ferramentas efetivas para se insurgir contra elas. Mais ou menos como o secretário de Saúde que acaba com a lotação dos hospitais fechando-os para que os doentes morram em casa. Assim, de fato, pode-se dizer: a reforma vai acabar com o contencioso. E vai mesmo. Ou talvez abra mais este: o contencioso sobre a validade deste pretenso fim do contencioso.

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Ministro autoriza incorporadora a reter 50% de valor pago por comprador desistente

Em imóveis submetidos ao regime de afetação — separação entre o patrimônio da construtora e o do próprio empreendimento —, a Lei do Distrato (Lei 13.786/2018) permite que a incorporadora retenha até 50% dos valores pagos pelo comprador que desiste do negócio.

Com esse entendimento, o ministro Marco Buzzi, do Superior Tribunal de Justiça, validou uma cláusula contratual que autorizou a retenção de 50% dos valores pagos pelo comprador desistente de um imóvel em Caldas Novas (GO), que foi vendido sob o modelo de multipropriedade — em que vários proprietários dividem a posse do bem entre si, em períodos diferentes.

O contrato de compra e venda previa expressamente a retenção de metade do valor pago em caso de desistência do adquirente, em consonância com o parágrafo 5º do artigo 67-A da Lei do Distrato. Em segundo grau, porém, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal havia reduzido este percentual para 25%, com o argumento de que a retenção de 50% penalizava excessivamente o consumidor e acarretava enriquecimento sem causa da incorporadora.

Ao analisar o recurso especial da empresa, o ministro avaliou que o TJ-DF não detalhou em que consistiria o abuso nem demonstrou a falta de razoabilidade da cláusula contratual.

“Ora, se o percentual de retenção fixado no contrato encontra-se dentro do limite estabelecido pela lei, não há que se falar em sua ilegalidade, notadamente quando o Tribunal de origem não traz qualquer fundamento apto a afastar a cláusula contratual, cingindo-se a afirmar genericamente que a multa seria abusiva pois onera em demasia os adquirentes,” afirmou o ministro.

Os advogados Pedro Henrique Schmeisser de Oliveira, Mariana MussiLuciano Pereira de Freitas Gomes e Mathews Cunha Borges, do escritório STG Advogados, atuaram em defesa da incorporadora.

Clique aqui para ler a decisão
REsp 2.903.050

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Nota de Alerta: Prevenção contra fraudes com o nome do escritório Willer Tomaz Advogados Associados

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É com grande preocupação que informamos sobre possíveis tentativas de fraude envolvendo o nome do nosso escritório. Recentemente, recebemos relatos de contatos não autorizados por e-mail e WhatsApp, nos quais pessoas desconhecidas se identificam falsamente como representantes do Willer Tomaz Advogados Associados.

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Adotamos rigorosos controles de segurança e proteção aos nossos clientes e parceiros, e todas as medidas cabíveis para apurar e combater possíveis tentativas de fraude são aplicadas.

Atenciosamente,

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Telefone de contato: (61) 3366-5000
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Direito real de habitação e comprovação de integridade de documentos eletrônicos

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) divulgou a edição 871 do Informativo de Jurisprudência. A equipe de publicação destacou dois julgamentos nesta edição. 

No primeiro processo em destaque, a Terceira Turma, por unanimidade, decidiu que o direito real de habitação do cônjuge sobrevivente deve recair sobre o último imóvel em que o casal morou antes do óbito, salvo situações excepcionais devidamente comprovadas. A tese foi fixada no REsp 2.222.428, de relatoria do ministro Humberto Martins. 

Em outro julgado mencionado na edição, a Quarta Turma, por unanimidade, definiu que os documentos eletrônicos podem ter sua autoria e sua integridade comprovadas, ainda que utilizados certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que a certificação seja admitida pelas partes como válida ou aceita pela pessoa a quem for oposto o documento. O REsp 2.205.708 teve como relatora a ministra Isabel Gallotti.

Fonte: STJ

TNU fixa tese sobre cômputo do período de gozo de benefício por incapacidade

Pedido de uniformização foi julgado pelo Colegiado durante a sessão de 12 de novembro

Durante a sessão ordinária de julgamento realizada em 12 de novembro, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu, por maioria, negar provimento a pedido de uniformização relativo ao benefício por incapacidade. Nos termos do voto divergente do juiz federal Ivanir César Ireno Júnior, o Colegiado firmou a seguinte tese: 

“Não é possível o cômputo do período de gozo de benefício por incapacidade intercalado entre contribuições para fins de aferição das mais de 120 contribuições mensais exigidas para a prorrogação do período de graça, nos termos do art. 15, § 1º, da Lei n. 8.213/91” – Tema 365. 

Na ocasião, ficaram vencidas a relatora do processo na TNU, juíza federal Lílian Oliveira da Costa Tourinho, e a juíza federal Monique Marchioli Leite.  

O pedido de uniformização foi interposto contra acórdão da 3ª Turma Recursal de Pernambuco, a qual manteve sentença que julgou improcedente a concessão do benefício por incapacidade permanente em razão da ausência da qualidade de segurado no início da incapacidade.  

No voto divergente e vencedor, o juiz federal Ivanir César Ireno Júnior defendeu que o caso não comporta interpretação ampliativa, mas sim “interpretação literal, lógica e teleologicamente adequada”, compatível com os princípios da contributividade, do equilíbrio financeiro e atuarial, da preexistência da fonte de custeio e da proteção social. “Tais princípios impedem que se compute, no total de 120 contribuições exigidas para a prorrogação do período de graça, o período de percepção de benefício por incapacidade intercalado”, explicou. 

O magistrado acrescentou que o texto legal é restritivo e unívoco, ressaltando que a prática previdenciária demonstra que a prorrogação do período de graça, na forma do § 1º do art. 15 da Lei n. 8.213/1991, constitui exceção e não regra: “Não se pode, portanto, afirmar que a não obtenção dessa prorrogação – que representa a situação comum da maioria dos segurados – configure desproteção social ou proteção deficiente capaz de justificar a intervenção ampliativa e contra legem do Poder Judiciário para sua correção.” 

Leia o representativo completo no Portal do CJF

Processo n. 0500120-68.2021.4.05.8311/PE 

Fonte: CJF

O ‘Dies irae’ de quem traiu a Constituição e conspurcou a República

Há, na História política das nações, um traço inconfundível que singulariza a figura do tirano: a sua essencial mediocridade moral.

Os grandes demagogos — ainda que travestidos de falso heroísmo — revelam, cedo ou tarde, a pequenez de seu espírito, a incapacidade de compreender o valor da ordem constitucional e democrática e a renúncia deliberada à ética republicana.

O tirano, diferentemente do estadista, não edifica; corrompe. Não*serve à pátria; *serve-se dela. Não respeita a Constituição; profana-a, seja por atos diretos, seja por palavras que insuflam o desrespeito à legalidade democrática.

É nesse cenário que se torna impossível não recordar comportamentos indignos que o Brasil testemunhou em anos recentes: ofensas inaceitáveis, em tom sedicioso e em caráter recorrente, ao Supremo Tribunal Federal e a seus Juízes, com particular destaque aos injustos agravos perpetrados contra o eminente Ministro Alexandre de Moraes, ataques reiterados às instituições republicanas, agressões à imprensa, incitações criminosas contra o próprio processo eleitoral — pilar do constitucionalismo moderno — e a tentativa de solapar a confiança pública no sistema que legitima o poder político.

Tais atitudes não traduzem grandeza; revelam, ao contrário, a pequenez do espírito autoritário, que teme a liberdade e que despreza a democracia , porque não é capaz de compreender nenhuma das duas.

O grande historiador Plutarco, em sua obra “Vidas Paralelas” — particularmente sobre as vidas de “Dion” e de “Timoleonte” — ensinava que os tiranos “vivem cercados de temor, porque precisam destruí-lo nos outros para sobreviver”.

Platão, em sua reflexão sobre a degenerescência da alma tirânica, advertia, na “República”, que o tirano nasce da corrupção interior e se sustenta pela mentira e pela violência; Aristóteles, na “Política”, revelou que o poder tirânico se exerce sempre contra o bem comum, regido pelo medo e pelo capricho; Cícero, em “De Re Publica” e “De Legibus”, denunciou a tirania como o mais vil atentado contra a “res publica”, afirmando que nenhum poder é legítimo se dissociado das leis e da moralidade; e Tito Lívio, por sua vez, em sua monumental obra “Ab Urbe Condita” (cuja parte relativa a esse período conhecemos pelas “Periochae”), ao narrar uma das crises da República Romana , registrou — ainda que de modo preservado apenas em resumo — a violência, as proscrições e a ambição devastadora de figuras que submeteram Roma, como Lúcio Cornélio Sula, a um dos capítulos mais sombrios de sua história.

Todos esses autores, de tempos e tradições diversas, convergem na mesma lição perene: a tirania é a ruína moral do governante e a degradação política da comunidade que ele pretende dominar.

E foi assim, sob o signo dessa mediocridade clássica, que certas práticas políticas recentes em nosso País se afastaram da nobreza da vida republicana, expondo ao mundo um dirigente político, como Bolsonaro, que fez da retórica do ódio, da intolerância , da mentira e da desinformação um método de governo e um instrumento de poder.

A tradição da Humanidade — dos gregos e romanos a nossos dias — jamais se curvou diante dessas figuras sombrias. Não é por acaso que, ao longo dos séculos, o brado “Sic semper tyrannis” ecoou como grave advertência política e moral: assim sejam rejeitados pela consciência histórica os tiranos, assim se repudiem suas pretensões de subjugar povos livres e de violentar suas Constituições democráticas.

A sentença

Essa sentença, longe de significar vingança, traduz um imperativo ético: o tirano — por sua própria conduta — termina vencido pela força histórica da liberdade, pela resistência das instituições e pela consciência moral do povo. Nenhum autocrata sobrevive quando tenta aprisionar a nação no estreito círculo de sua vaidade e de sua desmedida ambição pelo poder.

Também no Brasil, a República demonstrou — e continuará a demonstrar — que a Constituição de 1988 não se dobra às tentações e aos delírios autoritários. A democracia brasileira sofreu ataques, sim; mas resistiu, porque não há mediocridade tirânica capaz de suplantar a grandeza de um povo que defende o Estado Democrático de Direito.

O que se viu recentemente, portanto, não foi a ascensão de um grande líder, mas a tentativa falha de um político medíocre e menor que, ao desprezar em seu projeto autoritário de poder a ordem constitucional e democrática, revelou sua verdadeira dimensão: a baixeza política, a insuficiência moral e a incapacidade de compreender que, sem respeito incondicional à Constituição, à República e à Democracia, nenhum governo é legítimo.

A História registrará, com lúcida severidade, que aqueles que intentam degradar a República terminam por degradar apenas a si mesmos. E a Nação aprenderá , mais uma vez, que a democracia vive da palavra, mas pode morrer pela palavra irresponsável e criminosa — , razão pela qual devemos reafirmá-la , diariamente, com coragem, com firmeza e com a serenidade que distingue as grandes nações.

A condenação criminal imposta a Jair Bolsonato pelo Supremo Tribunal Federal — 27 anos e 3 meses de reclusão em regime fechado — não constitui apenas um legítimo pronunciamento jurisdicional, mas uma proclamação moral da República, a afirmar, com voz firme e inquebrantável, que a democracia não tolera a profanação de seus princípios nem a afronta ao veredicto soberano das urnas.

Ao reconhecer que Jair Bolsonaro atentou contra a ordem democrática, intentou usurpar o poder e buscou submeter a Nação ao arbítrio de sua vontade pessoal, a 1ª Turma do STF reafirmou o postulado que sustenta as grandes democracias: ninguém está acima da autoridade da Constituição e das leis da República!

Tal condenação, alcançada por expressiva maioria, em julgamento que garantiu a Bolsonaro o amplo exercício das prerrogativas inerentes ao “devido processo legal”, não traduz vindita, mas a reafirmação da majestade da Justiça, que se ergue serena, imparcial e altiva para proteger o Estado Democrático de Direito contra seus adversários mais internos e mais perigosos.

A iminente execução da pena — expressão necessária da autoridade do Direito — não humilha o condenado; humilha, sim, o abuso que ele praticou, o desprezo que demonstrou pela legalidade republicana, a deslealdade com que feriu o voto popular. Pois é próprio das democracias maduras reafirmar, nos momentos mais críticos, que a liberdade só subsiste quando a responsabilidade prevalece, e que o poder, quando transfigurado em despotismo, reclama, com urgência, a reação inflexível das instituições.

É sob essa luz que resplende , com força simbólica incomparável, a antiga expressão “Dies irae”. A tradição moral da Humanidade jamais a invocou como o dia da cólera, mas como o dia do juízo, o instante decisivo em que a verdade histórica se impõe e em que nenhuma evasiva subsiste.

Para aquele que violou a Constituição , o Dies irae não é o nome de uma ameaça: é o nome da verdade, o momento em que a República exige contas, em que as máscaras caem, em que a justiça — imparcial, serena, majestosa — recolhe o tributo que lhe é devido.

Para Bolsonaro, o Dies irae assinala a hora em que o Estado democrático de Direito revela a definitiva falência moral do projeto golpista e consagra a supremacia da Constituição sobre a tirania. É o dia em que a democracia, com grandeza e dignidade, pronuncia a palavra que libertará o país da sombra que o ameaçou.

E é precisamente diante dessas lições da História, do Direito e da razão republicana que se impõe recordar, como advertência perene aos que pretendem subjugar a Nação pela força ou pelo engano, a sentença imortal de Cícero, formulada em sua obra mais nobre sobre a ética pública: “Cedant arma togae.” — “Cedam e submetam-se as armas à toga.” (“De Officiis”, I, 77).

Essa expressão, que atravessou pouco mais de vinte séculos, não é apenas um enunciado literário: é a própria essência do governo civil, o axioma que consagra a primazia da lei sobre a violência, do poder civil sobre o poder militar , da República sobre o caudilhismo, da Constituição sobre qualquer projeto pessoal de poder.

Com ela, o grande Advogado, tribuno e pensador romano ensinou que a força do Estado não reside nas armas, mas no Direito; que a verdadeira autoridade não se impõe pelo medo, mas pela legitimidade; que nenhuma nação é digna de si mesma enquanto admitir que a espada se sobreponha à Justiça.

Ao invocar , neste grave momento histórico , o antigo preceito de Cícero , reafirmo a convicção mais profunda do constitucionalismo democrático: a toga — símbolo da razão, da juridicidade , da legitimidade constitucional e da liberdade — deve sempre prevalecer sobre as armas, sobre a turbulência e sobre a tirania.

Assim se conclui, com a solenidade que a República exige, a lição final deste grave capítulo histórico de nosso País, protagonizado, entre outros, por Jair Bolsonaro: a Constituição triunfa, a Justiça permanece, e a tirania — qualquer tirania — se dissolve diante da força moral da lei!

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Jurisprudência em Teses traz novos entendimentos sobre cobertura dos planos de saúde

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) disponibilizou a edição 271 do Jurisprudência em Teses, sobre o tema Planos de Saúde V. A equipe responsável pelo produto destacou duas teses.

A primeira mostra que é devida a cobertura, pelo plano de saúde, de órtese craniana para o tratamento de braquicefalia e plagiocefalia posicional.

O segundo entendimento aponta que o sistema de infusão de insulina é classificado como dispositivo médico e não pode ser excluído da cobertura dos planos de saúde.

A ferramenta

Lançada em maio de 2014, Jurisprudência em Teses apresenta diversos entendimentos do STJ sobre temas específicos, escolhidos de acordo com sua relevância no âmbito jurídico.

Cada edição reúne teses identificadas pela Secretaria de Jurisprudência após cuidadosa pesquisa nos precedentes do tribunal. Abaixo de cada uma delas, o usuário pode conferir os precedentes mais recentes sobre o tema, selecionados até a data especificada no documento.

Fonte: STJ

Médica que atuou no combate à Covid-19 tem direito a abatimento no Fies

A atuação médica no Sistema Único de Saúde durante a pandemia de Covid-19, mesmo para residentes, dá direito ao abatimento mensal de 1% do saldo devedor do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). A exclusão do profissional da lista de beneficiários por esse motivo é violação de direito líquido e certo.

Esse foi o entendimento do juiz Ávio Mozar José Ferraz de Novaes, da 12ª Vara Federal Cível da Bahia, para assegurar o benefício a uma médica que atuou como residente em pediatria em um hospital de Salvador durante a pandemia.

A médica comprovou 26 meses de serviço entre abril de 2020 e maio de 2022, período que abrange a emergência sanitária. Ela havia pedido o abatimento, mas continuava sendo cobrada pelo valor integral do financiamento.

O juiz considerou que a residência médica se enquadra no direito ao abatimento previsto no artigo 6º-B, III, da Lei 10.260/01, alterado pela Lei 14.024/2020. A norma garantiu benefícios para médicos que atuaram na linha de frente do combate à Covid-19.

A atuação da médica residente em hospital público, com nítido caráter laborativo, corrobora o direito alegado, segundo o julgador. A sentença citou a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que já reconhecia a viabilidade do abatimento do Fies para profissionais em residência médica que participaram de atendimentos na pandemia.

A decisão liminar determinou que as autoridades coatoras (presidente do FNDE, diretor presidente da CEF e secretário de atenção primária à Saúde do Ministério da Saúde) promovam a inclusão da profissional na lista de beneficiários em até dez dias. O descumprimento pode acarretar multa diária de R$ 500, limitada a R$ 30 mil.

“A análise dos documentos anexados à inicial demonstra inequivocamente que a médica cumpriu o requisito legal, atuando como residente em Pediatria no Hospital Geral Roberto Santos (HGRS), unidade pública de saúde de referência, comprovando a essencialidade de seus serviços prestados no contexto da crise sanitária”, afirmou o juiz.

Os advogados Elimar Paixão Mello e Gilberto Raimundo Badaró de Almeida Souza atuaram em favor da médica.

Clique aqui para ler a decisão
Mandado de segurança cível 1056407-61.2025.4.01.3300

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