Processo de monitoramento da ANPD: tendências da fiscalização

Insights sobre a atuação da Divisão de Monitoramento e o processo de fiscalização-monitoramento

O processo de fiscalização da Autoridade Nacional de Proteção de Dados brasileira (ANPD) envolve atividades de monitoramento, orientação, prevenção e repressão. O Regulamento do Processo de Fiscalização e do Processo Administrativo Sancionador da ANPD estabelece que a autoridade adotará atividades de monitoramento no processo de fiscalização, que consistem no levantamento de informações e dados relevantes para subsidiar a tomada de decisões pela autoridade, com o fim de assegurar o regular funcionamento do ambiente regulado.

No presente artigo, trazemos uma explicação a respeito das fases do processo de monitoramento realizado pela ANPD; e exploramos como determinadas configurações neste processo podem influenciar as atividades de fiscalização-monitoramento desempenhadas pela Divisão de Monitoramento (DIM) da Coordenação-Geral de Fiscalização (CGF).

Processo de monitoramento da ANPD

A ANPD disponibiliza dois tipos de requerimentos para indivíduos: as petições de titulares e as denúncias. A petição de titular é uma solicitação disponível para titulares reclamarem contra controladores sobre dificuldades para o exercício de seus direitos (com comprovante de solicitação não atendida ou resposta insatisfatória). A denúncia, por sua vez, é uma comunicação sobre supostas infrações à LGPD, que pode ser submetida por quaisquer pessoas físicas ou jurídicas.

Após o recebimento e análise agregada de denúncias e petições de titulares, a DIM é a unidade responsável dentro da CGF por determinar as prioridades da autoridade em suas ações fiscalizatórias e institucionais; e por comunicar à sociedade os requerimentos recebidos e eventuais medidas tomadas, através dos Relatórios de Ciclos de Monitoramento e do Mapa de Temas Prioritários.

Neste sentido, o Relatório de Ciclo de Monitoramento de 2023 destacou que, de um total de 1.045 requerimentos no exercício de 2022, os tipos mais frequentes de requerimentos foram relacionadas à exposição de dados pessoais, dificuldade em exercer direito de eliminação de dados, vazamento de dados pessoais, compartilhamento indevido de dados e acesso indevido a dados pessoais. 

Já o Mapa de Temas Prioritários do biênio de 2024-2025, por exemplo, estabeleceu que os temas “direitos dos titulares”, “dados pessoais de crianças e adolescentes no ambiente digital”, “inteligência artificial para reconhecimento facial” e “raspagem de dados e agregadores de dados” devem ter prioridade para fins de estudos e planejamento das atividades de fiscalização pela ANPD.

Processo de fiscalização-monitoramento da DIM

Embora, primordialmente, o processo de monitoramento possua uma função de planejamento, este também visa detectar anomalias e analisá-las rapidamente. Assim, a própria unidade responsável pelo monitoramento (qual seja, a DIM) pode conduzir atividades de fiscalização por meio de orientações e determinação de ajustes aos agentes para garantia de conformidade à LGPD.

Vale ressaltar que o bojo das atividades de prevenção e repressão é conduzido pela Coordenação de Fiscalização (FIS) da CGF no âmbito de processos de fiscalização, que compreende diversas etapas para avaliar a conformidade do tratamento analisado. Enquanto isso, as atividades fiscalizatórias exercidas em processos de monitoramento pela DIM são mais rápidas e conduzidas a nível mais superficial, usualmente relacionadas a análises agregadas de requerimentos.

Exemplo disso é o caso do processo de fiscalização iniciado pela DIM, de forma alinhada ao seu Mapa de Temas Prioritários, voltado a 20 (vinte) empresas que não indicaram o contato do encarregado pelo tratamento de dados pessoais; ou que não disponibilizaram canais de comunicação eficientes para atender aos titulares de dados, dificultando a garantia dos direitos de titulares. 

Além disso, a DIM já instaurou processo de fiscalização contra o banco digital Nubank devido à falta de respostas da empresa a diversos pedidos de manifestação realizados pela DIM, relacionados a petições para o atendimento a direitos de titulares.

O processo foi rapidamente encerrado pela DIM após as respostas e cumprimento do Nubank aos itens solicitados no ofício encaminhado, dentro dos prazos indicados no processo de fiscalização-monitoramento. Na Nota Técnica de encerramento, a DIM também realizou orientações para adequação do Nubank à LGPD. 

Sistema gov.br e aumento no número de requerimentos

Através do lançamento de um novo canal para o encaminhamento de requerimentos por meio de uma plataforma acessível pelo gov.br em julho de 2024, facilitando a interação dos cidadãos com a ANPD, houve um aumento significativo de denúncias e petições de titulares, conforme demonstrado no Balanço de 4 Anos da Atuação da ANPD.

Embora ainda não tenha sido publicado um novo Relatório de Ciclo de Monitoramento desde 2023, é possível analisar tendências dos tipos de requerimentos entre 2023 e 2024 por meio de documento disponibilizado pela ANPD, em resposta a pedido de acesso à informação.

De um total de 5.166 requerimentos, destacam-se aqueles referentes à exposição de dados pessoais ou dados sensíveis, dificuldade em exercer direito de eliminação de dados, compartilhamento indevido de dados pessoais, vazamento de dados e não adequação à LGPD.

Comparando estes resultados com os requerimentos informados no Relatório de Ciclo de Monitoramento de 2023 da ANPD, é possível observar um aumento vertiginoso dos números de requerimentos; e uma continuidade dos principais tipos de denúncias/petições, que demonstram quais tópicos devem continuar na mira da DIM nos próximos Ciclos de Monitoramento e em suas atividades fiscalizatórias.

Número de pedidos de manifestação pela ANPD e respostas pelo controlador

Ao intermediar impasses em que os titulares não conseguem exercer seus direitos perante o controlador, a DIM poderá encaminhar pedidos de manifestação aos agentes de tratamento, possibilitando que estes os atendam; ou informem os motivos para o não atendimento.

É relevante a atenção dos controladores a essas solicitações. A ausência de respostas aos pedidos de manifestação encaminhados pela ANPD é um fator que motiva a abertura de processos de fiscalização-monitoramento, como ocorreu no caso do Nubank mencionado acima. Consequentemente, o atendimento a requerimentos e respostas aos ofícios têm o condão de reverter a ação fiscalizatória proposta no contexto de processos de monitoramento.

Ademais, a partir da resposta a pedido de acesso à informação, de 2.175 requerimentos (realizados entre 2023 e julho de 2024), apenas em 407 casos a ANPD encaminhou pedido de manifestação aos controladores. Contudo, a progressiva adaptação ao sistema gov.br deve facilitar a intermediação da DIM na relação entre indivíduos e controladores, o que, combinado a um maior número de requerimentos, pode levar a um aumento da quantidade de pedidos de manifestação pela DIM aos agentes.

Próximos passos

A ANPD recebeu uma autorização para contratação de novos profissionais para atender à necessidade de formação de quadro técnico qualificado – tendo inclusive aberto uma chamada para novas vagas na DIM em 2024. Tais fatores, em conjunto com os elementos previamente analisados, devem levar a uma otimização das atividades desempenhadas pela DIM, possivelmente gerando novos pedidos de manifestação e processos de fiscalização-monitoramento.

Portanto, há a expectativa de que a DIM exerça um papel cada vez mais ativo, especialmente nos eixos de ação propostos no Mapa de Temas Prioritários – seja por meio da captação de informações, de solicitações de esclarecimentos ou de processos de fiscalização-monitoramento para correção de eventuais irregularidades praticadas pelos controladores. Assim, ainda que a FIS da CGF seja protagonista em processos de fiscalização, é importante que os agentes de tratamento se atentem ao recebimento de requerimentos e às atividades da DIM.

Fonte: Jota

BC lança consulta pública para disciplinar nomes de instituições autorizadas

​O Banco Central (BC) lançou a Consulta Pública 117/2025, referente à proposta de Resolução Conjunta com o Conselho Monetário Nacional (CMN) que tem como objetivo disciplinar a denominação das instituições autorizadas a funcionar, incluindo o nome empresarial, o nome fantasia, a marca e o domínio de internet, além de conferir mais transparência à prestação de serviços financeiros e de pagamento à população.

O BC regulamenta, autoriza e supervisiona mais de vinte modalidades de instituições, entre elas instituições financeiras, de pagamento e outras categorias que integram o Sistema Financeiro Nacional (SFN), o Sistema de Consórcios e o Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).

Algumas dessas instituições estabelecem parcerias com entidades não reguladas para ampliar sua base de clientes, expandir a oferta de produtos financeiros ou servir como “incubadoras” para novos entrantes, a exemplo dos correspondentes no país e dos tomadores de serviços de Banking as a Service (BaaS). Nessas situações, o consumidor de produtos e serviços financeiros muitas vezes não tem a inteira clareza sobre os direitos e as obrigações que envolvem a contratação e a utilização dos serviços que lhe são ofertados.

Um ponto central da transparência na prestação de serviços financeiros, de consórcios e de pagamento diz respeito à denominação utilizada pelas instituições autorizadas ao se apresentarem ao público. A utilização de termos ou expressões que sugiram o exercício de atividades para as quais não possuem a apropriada autorização para funcionamento pode levar o usuário a fazer escolhas inadequadas na contratação desses serviços.

“Nosso objetivo é evitar potenciais consequências danosas para os usuários de serviços financeiros, decorrentes da dificuldade de compreensão acerca dos riscos contidos nos produtos e serviços adquiridos”, afirmou Antonio Marcos Fonte Guimarães, Consultor no Departamento de Regulação do Sistema Financeiro (Denor) do BC.

Como participar
A proposta de ato normativo está disponível no site do BC, no menu do perfil geral “Estabilidade Financeira”, acessando os links Normas > Consultas Públicas > Consultas ativas. Clique aqui para acessar diretamente o sistema. O documento também pode ser consultado no portal Participa + Brasil > Consultas Públicas, do governo federal.  

Os interessados podem encaminhar sugestões e comentários até 31 de maio de 2025, por meio do link mencionado ou para o e-mail denor@bcb.gov.br. As sugestões e os comentários enviados ficarão disponíveis no site do BC.

Propostas
A nova regra propõe que as instituições autorizadas incluam em sua denominação termos que estabeleçam clara referência ao objeto da autorização para funcionamento. Além disso, fica proibido o uso de termos que, literalmente ou por semelhança morfológica ou fonética, em português ou em língua estrangeira, sugiram atividade ou modalidade para a qual a instituição não tenha autorização de funcionamento específica.

No entanto, no caso de conglomerado prudencial, será possível utilizar termo que sugira a atividade, a modalidade autorizada ou a denominação de uma das instituições que o integram. Já as instituições que fazem parte do conglomerado prudencial podem utilizar o nome deste em sua denominação ao se apresentarem ao público, desde que façam clara referência ao objeto da autorização para funcionamento concedida pelo BC.

Pela proposta, as instituições autorizadas também estarão proibidas de firmar contratos de prestação de serviços ou parcerias operacionais para a oferta de produtos e serviços financeiros e de pagamento com entidades não autorizadas pelo BC que utilizem denominações incompatíveis com a regra estabelecida para as instituições sujeitas a autorização.

A minuta de regulação propõe que as instituições adotem, até 30 de junho de 2026, medidas para adequar os contratos de prestação de serviços ou de parcerias operacionais firmados antes da entrada em vigor da norma.

Também foi proposto que as instituições publiquem, de forma clara, em seus canais de comunicação e de atendimento a clientes e usuários, as atividades específicas autorizadas pelo BC; os serviços financeiros, de consórcio ou de pagamento autorizados; e o conglomerado prudencial ao qual pertencem.

Fonte: BC

Grupo Decisório do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal aprova cinco novas notas técnicas

A reunião aconteceu na segunda-feira (10) e contou com a participação de integrantes da Justiça Federal e Estadual

Em reunião realizada na segunda-feira (10), na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), em Brasília (DF), o Grupo Decisório do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal (CIn) aprovou cinco notas técnicas elaboradas pelos Centros Locais de Inteligência e pelo Grupo Operacional do CIn. O encontro, promovido pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ/CJF), objetivou a prevenção de conflitos, o monitoramento de demandas e a gestão de precedentes.

O ministro Luis Felipe Salomão, corregedor-geral da Justiça Federal e coordenador-geral do CIn, conduziu a reunião e destacou a relevância do trabalho desenvolvido pelo grupo. “O Centro de Inteligência tem um papel essencial para a eficácia do sistema judicial. Hoje damos mais um passo significativo ao trazer colegas da Justiça Estadual para colaborar com soluções que impactam diretamente a sociedade”, afirmou.

“A inteligência institucional permite um olhar abrangente sobre questões complexas. Saímos daqui com ideias claras e propostas que contribuirão para uma Justiça mais eficiente”, declarou o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Sérgio Kukina, integrante da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, ao reforçar a importância do trabalho conjunto.

A juíza auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça Federal e coordenadora do Grupo Operacional, Vânila Cardoso André de Moraes, também enfatizou a colaboração entre as(os) participantes. “Temos um compromisso coletivo com a melhoria da prestação jurisdicional. A participação dos colegas da Justiça Estadual enriquece as discussões e amplia as possibilidades de solução”, pontuou.

Notas técnicas

A primeira nota técnica aprovada, CITJSP n. 01/2023, do Centro Local de Inteligência da Seção Judiciária de São Paulo (SP), trata da execução coletiva e da implementação de medidas preventivas para otimizar o recebimento de petições iniciais. O tema foi relatado pela juíza de direito Paula Fernanda de Souza Vasconcelos Navarro e pelo juiz de direito Felipe Albertini Nani Viaro, ambos do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

A segunda nota técnica apresentada, CITJSP n. 02/2024, aborda estratégias para aprimorar o processamento e julgamento das execuções fiscais, considerando o impacto dessas ações no congestionamento judicial. O tema também contou com a relatoria da juíza Paula Fernanda de Souza Vasconcelos Navarro e do juiz Felipe Albertini Nani Viaro.

A Nota Técnica n. 52 foi apreciada em seguida, tratando dos impactos e das sugestões relacionadas à aplicação do Tema Repetitivo n. 1.246 do STJ, referente à admissibilidade de recursos especiais em casos de benefícios por incapacidade. Os relatores foram Marcelo Ornelas Marchiori, assessor do NUGEPNAC/STJ, e Odilon Romano Neto, juiz federal do TRF2.

A quarta nota aprovada, Nota Técnica n. 53, discute a inconsistência jurisprudencial entre os sistemas recursais da Fazenda Pública e da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU). A juíza federal Eliana Rita Maia Di Pierro, do TRF3, foi a relatora da matéria.

A última nota debatida pelo grupo versa sobre o regime inicial de cumprimento de pena, unificação de reclusão e detenção. O tópico teve a relatoria da desembargadora federal Taís Schilling Ferraz, do TRF4, e do juiz federal Jairo Gilberto Schafer, do TRF4, integrantes do Grupo Operacional do CIn.

Homenagens

A reunião foi marcada pela despedida da desembargadora federal Germana de Oliveira Moraes, do TRF5, e do desembargador federal Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, do TRF2, que deixam o Grupo Decisório do CIn.

Na ocasião, o ministro Luis Felipe Salomão exaltou o desempenho de ambos. “O comprometimento e a dedicação dos desembargadores foram fundamentais para os avanços que conquistamos”, afirmou.

Em agradecimento, a desembargadora Germana de Oliveira Moraes destacou a experiência enriquecedora ao integrar o Centro de Inteligência: “Foi um período de muito aprendizado e colaboração. Espero que os magistrados que permanecem continuem fortalecendo essa rede de inteligência”.

O desembargador Aluisio Gonçalves de Castro Mendes acompanhou a colega e elogiou a atuação do grupo: “O CIn nos proporciona um espaço de reflexão e aprimoramento, e essa experiência certamente contribui para uma justiça mais eficiente”.

Sobre o CIn

O Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal (CIn), vinculado ao Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF), é composto por ministros(as) do STJ, desembargadores(as) federais e um Grupo Operacional de juízes(as) federais dos Tribunais Regionais Federais. Conta, ainda, com a colaboração de servidoras(es) do STF, do STJ e do Poder Judiciário federal.

Fonte: CJF

Especialistas afirmam que decisão do STF antecipa pontos da reforma administrativa

 

Especialistas ouvidos em seminário na Câmara dos Deputados afirmaram que decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) do final de 2024 deve colocar em prática dispositivos da chamada reforma administrativa (PEC 32/20) que está em análise na Câmara. O principal deles é a permissão de contratação de servidores públicos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ou outras formas que forem decididas pelos governos.

O debate foi promovido pela Frente Parlamentar Mista do Serviço Público.

No fim do ano passado, o STF decidiu sobre a constitucionalidade de uma emenda constitucional de 1998 (Emenda 19), afirmando que o Regime Jurídico Único não deve ser o único meio de contratação de servidores. Uma das características do RJU é a estabilidade no emprego.

Na decisão, que ainda não foi publicada, o Supremo informou que a medida não afeta os atuais servidores e que as novas formas de contratação não eliminariam a necessidade de concurso público.

Fragmentação
O secretário de Gestão de Pessoas do Ministério da Gestão e Inovação, José Celso Cardoso Júnior, disse que o governo federal não concorda com a fragmentação do serviço público por meio da diversidade de contratação. Segundo ele, isso vai significar um desmonte da atual construção de uma burocracia profissional.

“É a contratação por meio de um regime jurídico estatutário único que vem garantindo ao Estado brasileiro não só a permanência das políticas públicas ao longo dos governos, mas também a previsibilidade e a continuidade dessas políticas e desses serviços à cidadania”, ressaltou.

Luís Fernando Silva, advogado de entidades de servidores públicos, disse que a decisão do Supremo volta com uma situação existente antes da Constituição de 1988, quando existiam categorias contratadas de formas diferentes, o que resultava em desigualdade de direitos e em conflitos. Ele explicou que as entidades devem entrar com recursos assim que a decisão do STF for publicada.

O advogado também alertou sobre o impacto da mudança no regime previdenciário. “Na medida em que há um regime previdenciário hoje vinculado aos servidores estatutários e não vão mais admitir servidores estatutários, ou na mesma quantidade de antes, esse regime vai se tornando deficitário. E vai se tornar insuficiente e insustentável porque só vai ter idosos. Ele não vai ter mais jovens, fazendo contribuições que permitem a aposentadoria daqueles com mais idade”, afirmou.

A coordenadora da frente parlamentar, deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), informou que o grupo vai apoiar os recursos contra a decisão do STF e estudar outras formas de barrar as mudanças.

“Como os magistrados, os ministros do Judiciário têm o Estatuto da Magistratura, os servidores públicos têm esse estatuto que foi criado com muita luta para acabar com a impessoalidade, os pistolões. Nós conseguimos criar um regime jurídico único logo após a promulgação da Constituição de 88. E não queremos que ele seja extinto”, disse a deputada.

Qualidade do serviço
A supervisora do escritório regional do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Mariel Lopes, disse que é muito comum funcionários terceirizados ficarem no mesmo serviço público por anos, mas, com a exigência das licitações, eles mudam muito de empregador, o que prejudica direitos como férias. Na educação básica, cerca de 40% das contratações, segundo ela, são temporárias, o que afeta a qualidade do serviço.

Fonte: Câmara dos Deputados

Juízo da execução penal não pode substituir pena de prestação de serviços por prestação pecuniária

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que, tendo sido aplicada pena restritiva de direitos consistente na prestação de serviços à comunidade, é vedada a sua substituição após o trânsito em julgado da condenação. Para o colegiado, só é permitido ao juízo da execução, conforme o artigo 148 da Lei de Execução Penal (LEP), alterar a forma de cumprimento da pena já aplicada, ajustando-a às condições pessoais do condenado e às características do estabelecimento.

O recurso chegou ao STJ após o tribunal de origem indeferir o pedido de substituição da obrigação de prestar serviços comunitários por prestação pecuniária, sob o fundamento de que a sentenciada tem flexibilidade de horário no trabalho e poderia se adequar ao cumprimento da prestação imposta no processo.

Por outro lado, a defesa sustentou que, apesar de não haver previsão legal para isso, algumas decisões judiciais já teriam permitido ao juízo da execução fazer a substituição da pena a fim de viabilizar seu cumprimento e a ressocialização do condenado, quando comprovada a impossibilidade de cumpri-la nos exatos termos da sentença transitada em julgado.

A defesa ainda apontou que o artigo 149, inciso III, da LEP, além de não limitar a substituição da pena, permite ao juízo da execução alterar a forma como ela é executada.

Juízo deu flexibilidade para o cumprimento da sentença

O relator do caso na Sexta Turma, ministro Sebastião Reis Junior, ressaltou que, apesar de permitir excepcionalmente a modificação na forma de cumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade, o artigo 148 da LEP não prevê a substituição de uma pena restritiva de direitos por outra. Segundo observou, cabe ao juízo sentenciante, e não ao da execução, avaliar qual a modalidade de pena que deve ser aplicada em cada situação.

O ministro apontou que, embora tenha mantido a pena de prestação de serviços à comunidade fixada na sentença condenatória, o juízo da execução ofereceu à reeducanda – dona de uma imobiliária – a possibilidade de seu cumprimento nos fins de semana e feriados, para não prejudicar o trabalho.

Sebastião Reis Junior observou, por fim, que, além da prestação de serviços, a sentença impôs à condenada outra pena restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária. Assim sendo, caso fosse atendido seu pedido de substituição de uma das penas, de prestação de serviços por prestação pecuniária, isso “implicaria a imposição de duas penas de prestação pecuniária”, o que não é permitido pelo artigo 44, parágrafo 2º, do Código Penal.

Leia o acórdão no AREsp 2.783.936.

Fonte: STJ

Projeto impede acordo de não persecução penal para tráfico de drogas

O Projeto de Lei 14/25, em análise na Câmara dos Deputados, impede o Ministério Público de propor acordo de não persecução penal para pessoas presas por tráfico de drogas. O texto insere a medida no Código de Processo Penal.

O acordo de não persecução penal é feito entre o Ministério Público e o investigado para crimes sem violência e com pena inferior a quatro anos. Ele substitui a prisão por uma medida consensuada entre as partes, como a renúncia dos bens do crime ou a prestação de serviço à comunidade.

O deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES), afirma que, em tese, esse instrumento não se poderia ser aplicado ao tráfico de drogas, crime punido com pena de reclusão de 5 a 15 anos, superior à pena prevista no acordo de não persecução penal.

No entanto, segundo ele, os juízes e os tribunais vêm admitindo a homologação de acordos em que o Ministério Público reconhece, de antemão, a figura do tráfico privilegiado (quando o acusado tem bons antecedentes, é réu primário e não integra organização criminosa).

Discordância
Melo discorda desse posicionamento. “Ainda que em sua modalidade privilegiada, a conduta não deixa de ser considerada tráfico de drogas, razão pela qual devem ser avaliadas, também, a relevância do bem jurídico afetado e a dimensão social do dano causado”, disse.

“Assim, propomos a inaplicabilidade desse instituto quando se tratar da prática do referido delito, ainda que em sua modalidade privilegiada”, concluiu Melo.

Próximos passos
O projeto será analisado nas comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Depois seguirá para o Plenário.

Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados

Nova audiência pública sobre Lei Geral de Direito Internacional Privado será em 17 de março

Na próxima segunda-feira (17), a partir das 10h, a Comissão de Elaboração do Anteprojeto da Lei Geral de Direito Internacional Privado vai realizar nova audiência pública para debater a proposta. O encontro, que terá formato exclusivamente virtual, é organizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

As inscrições para participar da audiência pública, bem como as sugestões sobre o anteprojeto, podem ser encaminhadas para o email rodrigo.portella@presidencia.gov.br.

A Comissão de Elaboração do Anteprojeto da Lei Geral de Direito Internacional Privado foi instituída pela Portaria CDESS/SRI/PR 1 e é integrada pelos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, Moura Ribeiro e Paulo Sérgio Domingues. O grupo também conta com outros magistrados, professores, advogados, membros do Poder Executivo e representantes de setores econômicos.

A primeira audiência pública sobre o anteprojeto aconteceu em fevereiro deste ano, na Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam). Os debates reforçaram a importância de o Brasil ter a sua legislação atualizada para enfrentar os novos desafios globais, além da necessidade de investir em desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo.

Fonte: STJ

O Imposto Seletivo sobre fantasy sports é constitucional?

Os conceitos de ‘bens’ e ‘serviços’

Como já sustentamos, a delimitação da materialidade constitucional do Imposto Seletivo mostrou-se mal redigida desde o disposto no inciso VIII do artigo 153 da Constituição, incluído pela Emenda Constitucional nº 132/2023 (EC 132).

Em primeiro lugar, a EC 132 incorreu no evitável erro de trazer um texto cheio de conceitos sem a devida definição, o que certamente gerará debates sobre a constitucionalidade de alguns fatos econômicos que pretende tributar.

O exemplo mais claro dessa deficiência é o fato de o IS incidir sobre bens e serviços, sem que o artigo 153 da Constituição esclareça o que são bens e serviços para fins deste imposto, adotando uma abordagem distinta daquela que foi utilizada em relação ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Com efeito, o § 8º do artigo 156-A delegou a definição de bens e serviços para o legislador complementar, já prevendo a possibilidade de se estabelecer que o conceito de serviços seria residual, de modo que qualquer fato econômico que não fosse considerado uma operação com bens poderia ser uma prestação de serviços. Veja-se a redação deste parágrafo:

“§ 8º Para fins do disposto neste artigo, a lei complementar de que trata ocaput poderá estabelecer o conceito de operações com serviços, seu conteúdo e alcance, admitida essa definição para qualquer operação que não seja classificada como operação com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos.”

Não existe dispositivo semelhante para o IS. Ou seja, a definição de bens e serviços para este imposto será feita via interpretação.

É possível imaginar que algumas pessoas vão argumentar que as regras constitucionais do IBS sobre o tema poderiam ser utilizadas por analogia para o IS. De certa forma, esta parece ter sido a tentativa do legislador complementar ao estabelecer, no inciso I do artigo 3º da LC 214, que as definições de bens e de serviços ali previstas deveriam ser consideradas “para fins desta lei complementar”.

Contudo, é igualmente possível pensar em uma interpretação em sentido oposto, argumentando que, se o legislador constitucional não quis prever para o IS definição semelhante, não cabe à LC 214 pretender estender o regime constitucional do IBS para o IS.

Chamei a atenção para este “defeito” na redação da EC 132 antes de ela ser publicada. Em um texto veiculado nesta ConJur, comentei que, “diferentemente do que ocorre em relação ao IBS, que expressamente prevê que o conceito de bens inclui intangíveis, inclusive direitos, o IS parece um imposto do século 21 que tem como referencial a economia industrial do século 20. O futuro — talvez  já o presente — é dos intangíveis. Se é mais difícil antever a possibilidade de intangíveis que sejam danosos ao meio ambiente — embora seja surpreendente o que não conseguimos prever —, certamente intangíveis danosos à saúde já são uma realidade”.

Portanto, temos uma primeira questão a ser enfrentada em relação ao Imposto Seletivo. Uma matéria antiga que o legislador constitucional deveria ter evitado que se tornasse controvertida: O que são bens e serviços para fins da materialidade constitucional do IS?

Produção, extração, comercialização ou importação

Outra opção da EC 132 que talvez venha a se mostrar equivocada foi a delimitação dos tipos de operações com bens e serviços que estariam sujeitos à incidência do IS. Estamos tratando apenas da sua “produção”, “extração”, “comercialização” ou “importação”.

A crítica mais óbvia a essa redação do inciso VIII do artigo 153 da Constituição é que, de regra, serviços não são “produzidos” nem “comercializados”, sendo certo que não são “extraídos”. Essa evitável deficiência redacional pode não chegar a tornar inconstitucional a incidência do IS sobre a prestação de serviços, mas já mostra que a técnica redacional falhou em questões mais elementares. Também já havíamos chamado a atenção para esse detalhe em texto publicado antes da promulgação da EC 132.

Nada obstante, não pode haver dúvidas quanto ao fato de que o teste de constitucionalidade das hipóteses de incidência do IS definidas pelo legislador complementar terá como base a interpretação desses conceitos previstos na Constituição. Voltaremos a este tema em colunas futuras, ao comentarmos, por exemplo, a pretensa incidência do IS sobre “da transferência não onerosa de bem produzido”.

Prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente

 Este talvez seja um dos temas mais polêmicos do IS, o fato de os bens e serviços só poderem ser tributados se forem prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

Prejudicialidade à saúde ou ao meio ambiente não são conceitos teóricos, mas questões de fato. Em outras palavras, há que haver evidências concretas de que certo bem ou serviço de fato prejudique a saúde ou o meio ambiente.

Segundo vimos defendendo, este é o único teste a que se submete o IS, o que podemos chamar de teste da prejudicialidade efetiva. Como não vemos neste imposto uma finalidade indutora, mas sim uma finalidade arrecadatória, caso a incidência concreta ocorra sobre bens e serviços que efetivamente causem prejuízos à saúde e ao meio ambiente, será constitucional a incidência do IS, independentemente de qualquer relação causal entre a tributação e uma redução de comportamentos individuais considerados nocivos.

Ora, “prejudicialidade efetiva” é uma expressão indeterminada. Certamente ela tem uma enorme zona de penumbra, de modo que podem surgir aqui interpretações diversas. É possível que se sustente, como o fez o professor André Folloni em artigo recente sobre o IS, uma prejudicialidade efetiva “forte”. Em suas palavras:

“Somente podem sofrer a incidência do Imposto Seletivo, em primeiro lugar, aqueles bens e serviços que sejam especial e gravemente prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Considerando que nem todos os bens e serviços prejudiciais podem ser tributados, mas apenas alguns, o critério de escolha de quais sofrerão essa incidência só pode ser o grau de impacto desses bens e serviços na saúde ou no meio ambiente. Por isso, entre todos, são os bens e serviços mais fortemente prejudiciais aqueles que devem ser selecionados para sofrer a incidência do Imposto Seletivo.”[1]

É bastante compreensível a preocupação veiculada por André Folloni. Suas ponderações estão diretamente vinculadas à interação entre o IS e o princípio da isonomia. A provocação do professor paranaense é: como justificar, considerando o referido princípio, que algumas atividades prejudiciais à saúde e ao meio ambiente sejam oneradas pelo IS e outras atividades, igualmente ou mais prejudiciais não o sejam?

Devemos refletir sobre esta provocação de forma detida. Penso que foi exatamente este tipo de questão que me levou, em texto anterior, a defender que o IS deveria simplesmente ter sido excluído da PEC 45 (aqui).

Ou o IS é simplesmente inconstitucional — que parece ser uma tese possível de ser construída a partir do estudo de Folloni, mesmo que o autor não vá nessa direção — ou temos que reconhecer, como vimos sustentando, que ele está baseado em uma prejudicialidade efetiva “fraca”, no sentido de que o bem ou serviço tributado pelo IS deve ser inequivocamente prejudicial à saúde ou ao meio ambiente, sem que a Constituição exija que exista uma prejudicialidade “especialmente grave”.

Essa linha interpretativa torna o IS bem mais abrangente, de fato, e nos obriga e refletir sobre como esta nova tributação interage com o princípio da isonomia. Contudo, ao que nos parece, foi o que a EC 132 introduziu no texto constitucional.

O presente debate sobre o grau de prejudicialidade à saúde ou ao meio ambiente que legitime a incidência do IS está só começando, e certamente não se encerrará com a incidência prevista na LC 214. Afinal, a competência outorgada pelo inciso VIII do artigo 153 da Constituição não se exaure com a edição desta lei complementar, de modo que a qualquer momento o legislador da vez poderá trazer novas hipóteses de incidência para o IS.

Como mencionamos no início deste texto, temos, na LC 214, uma excelente situação para o teste desses debates: a previsão de incidência do IS sobre fantasy sports.

O que são os Fantasy Sports?

Considerando os comentários acima, vamos analisar a incidência do IS sobre os fantasy sports. Devemos começar trazendo a definição legal de fantasy sport, que está prevista no artigo 49 da Lei nº 14.790/2023. Vejamos:

“Art. 49. Não configura exploração de modalidade lotérica, promoção comercial ou aposta de quota fixa, estando dispensada de autorização do poder público, a atividade de desenvolvimento ou prestação de serviços relacionados ao fantasy sport.

Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, considera-se fantasy sport o esporte eletrônico em que ocorrem disputas em ambiente virtual, a partir do desempenho de pessoas reais, nas quais:

I – as equipes virtuais sejam formadas de, no mínimo, 2 (duas) pessoas reais, e o desempenho dessas equipes dependa eminentemente de conhecimento, análise estatística, estratégia e habilidades dos jogadores do fantasy sport;

II – as regras sejam preestabelecidas;

III – o valor garantido da premiação independa da quantidade de participantes ou do volume arrecadado com a cobrança das taxas de inscrição; e

IV – os resultados não decorram do resultado ou da atividade isolada de uma única pessoa em competição real.”

Essa definição deixa bastante claro que, em primeiro lugar, o fantasy sport não pode ser confundido com “exploração de modalidade lotérica, promoção comercial ou aposta de quota fixa”. Estamos tratando, isso sim, de disputas realizadas em ambientes virtuais, a partir do desempenho de pessoas reais.

Por outro lado, a definição legal também evidencia que não se trata de jogos baseados eminentemente ou exclusivamente na sorte, dependendo a performance dos jogadores “de conhecimento, análise estatística, estratégia e habilidades dos jogadores do fantasy sport”. São exemplos de fantasy sports o Cartola e o Rei do Pitaco.

Seria a incidência do IS sobre fantasy sports constitucional?

Tendo em conta os comentários anteriores, devemos voltar nossa atenção para o artigo 409 da LC 214, que tem a seguinte redação:

“Art. 409. Fica instituído o Imposto Seletivo, de que trata o inciso VIII do art. 153 da Constituição Federal, incidente sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

§ 1º Para fins de incidência do Imposto Seletivo, consideram-se prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente os bens classificados nos códigos da NCM/SH e o carvão mineral, e os serviços listados no Anexo XVII, referentes a:

I – veículos;

II – embarcações e aeronaves;

III – produtos fumígenos;

IV – bebidas alcoólicas;

V – bebidas açucaradas;

VI – bens minerais;

VII – concursos de prognósticos e fantasy sport.

§ 2º Os bens a que se referem os incisos III e IV do § 1º estão sujeitos ao Imposto Seletivo quando acondicionados em embalagem primária, assim entendida aquela em contato direto com o produto e destinada ao consumidor final.”

caput do artigo 409 basicamente repete a regra de competência prevista no artigo 153, VIII, da Constituição. A seu turno, o seu § 1º pretende listar bens e serviços que sejam prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, tendo incluído entre eles, em seu inciso VII, o fantasy sport.

Não é preciso muita reflexão para concluirmos que esse tipo de atividade não tem externalidades negativas para o meio ambiente, de forma que se presume que a sua inclusão na lista do referido § 1º deveu-se à presunção de que o fantasy sport seria prejudicial à saúde.

A maioria das pesquisas sobre os efeitos dos fantasy sports sobre a saúde dos praticantes aponta efeitos positivos (cognitivos, socializantes, ou como meio de distração) e eventuais efeitos negativos, como estresse e impactos emocionais, além de, principalmente nos casos de fantasy games diários, a possibilidade de desenvolvimento de alguma forma de vício no jogo. Se pesquisarmos, vamos encontrar também estudos sobre os riscos para a saúde, inclusive mental, de exercícios físicos como a corrida, que podem levar, inclusive, à dependência e ao vício.

O setor de fantasy sports é muito pequeno no Brasil de modo que não é possível dizer que temos uma crise de saúde pública relacionada a esse tipo de prática. A inclusão dos fantasy sports juntamente com concursos de prognósticos é estranha, afinal, como estabelece a Lei nº 14.790/2023, de concursos de prognósticos não se trata.

Se levarmos esse raciocínio adiante, a própria inclusão de concursos de prognósticos entre bens e serviços prejudiciais à saúde requer uma reflexão. Afinal, se os dados apontam que vivemos uma crise decorrente dos jogos online, não me parece que a aposta nos jogos explorados pela Caixa Econômica Federal, por exemplo, esteja prejudicando a saúde da população.

Nessa linha de ideias, parece-nos que, se partirmos de uma exigência de prejudicialidade efetiva forte, como a defendida pelo professor André Folloni, a incidência do IS sobre fantasy sports e algumas formas de concursos de prognósticos simplesmente não passaria no teste de compatibilidade constitucional.

Esta incidência é interessante para evidenciarmos como a exigência do IS pode se chocar com o princípio da isonomia, na medida em que uma atividade econômica com baixas externalidades negativas em relação à saúde estaria sendo tributada, enquanto atividades econômicas mais prejudiciais ficaram fora do âmbito objetivo do imposto.

O IS é o primeiro imposto na Constituição cujo aspecto material não requer só a ocorrência de um fato presuntivo de capacidade contributiva exigindo também a agregação de um elemento consequencialista, isto é, o fato de o bem ou serviço produzido, comercializado, extraído ou importado ser prejudicial à saúde ou ao meio ambiente.

A prejudicialidade, como vimos, tem que ser efetiva e não meramente presumida, sendo ônus do legislador comprovar que ela está presente quando pretender instituir uma hipótese de incidência do IS.

Seguindo esses entendimentos, a incidência do IS sobre fantasy sports somente será constitucional caso a Constituição exija apenas uma prejudicialidade efetiva fraca, ou seja, caso qualquer prejudicialidade à saúde ou ao meio ambiente seja suficiente para legitimar o incidência do imposto. Sendo este o caso, as possibilidades de incidência do IS serão muito abrangentes.

Conclusão

Este artigo pretendeu demonstrar as deficiências das regras constitucionais sobre o IS e como elas certamente gerarão muitas dúvidas e potenciais litígios sobre situações concretas de incidência deste imposto. Veja-se que nem tratamos neste texto da celeuma sobre a fiscalidade ou extrafiscalidade deste tributo, o que certamente geraria outros debates complexos sobre a constitucionalidade do IS em certos casos.

Usamos como paradigma a incidência sobre os fantasy sports para demonstrar que, no melhor cenário, a incidência do IS neste caso é de constitucionalidade duvidosa e que, dependendo da posição que se tome sobre a inter-relação entre este imposto e o princípio da isonomia, ele será sempre inconstitucional já que, por mais que certa atividades econômicas tenham claras externalidades negativas em relação à saúde e ao meio ambiente, certamente haverá outras tão ou mais prejudiciais, o que transformaria o IS em uma forma de discriminação inconstitucional. O citado artigo do professor André Folloni é um bom ponto de partida para o estudo deste tema.


[1] FOLLONI, André. Competência Tributária do Imposto Seletivo: o Texto e seus Contextos. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo, v. 57, 2024, p. 638.

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Desafios da reforma tributária para o setor do gás natural

O gás natural é uma das principais fontes energéticas em ascensão no país, com papel fundamental na transição para uma matriz energética mais sustentável, sendo certo que sua versatilidade e eficiência tem impulsionado sua adoção em diversos setores, como industrial, residencial, comercial e de transporte.

Nos últimos anos, o Brasil tem implementado uma série de políticas e programas destinados a ampliar e modernizar o mercado de gás natural, como por exemplo o programa “Gás para Crescer”, com o objetivo de promover a competitividade do setor, incentivando a entrada de novos agentes e a criação de um mercado livre. A iniciativa busca destravar investimentos em infraestrutura, diversificar os fornecedores e ampliar o acesso ao gás natural, fortalecendo sua relevância na economia nacional.

No entanto, a reforma tributária trazida pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e a Lei Complementar nº 214/2025 levanta desafios significativos para a cadeia do gás natural. Tais mudanças exigem atenção para evitar distorções no mercado e assegurar que o gás natural continue a desempenhar papel estratégico na transição energética e no fortalecimento da matriz energética brasileira.

A implementação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) pela reforma tributária do consumo tem como objetivo principal a simplificação de um sistema reconhecidamente complexo, ao mesmo tempo em que busca mitigar conflitos e corrigir distorções existentes na tributação.

Por sua vez, o Imposto Seletivo (IS) foi implementado com o objetivo de onerar bens e serviços que causam impactos negativos à saúde e ao meio ambiente, buscando desestimular o consumo de produtos prejudiciais e incentivando práticas mais sustentáveis e saudáveis.

Regime monofásico para combustíveis

A Emenda Constitucional nº 132/2023 determinou a instituição do regime monofásico da CBS e do IBS para os combustíveis, aplicando alíquotas uniformes específicas por unidade de medida e diferenciadas por produto em todo o território nacional, vedada a apropriação de créditos relacionados às aquisições destinadas à distribuição, comercialização ou revenda desses produtos.

Nesse sentido, a Lei Complementar nº 214/2025 incluiu o gás natural processado e o gás natural veicular no rol de combustíveis sujeitos ao regime de tributação específico da CBS e do IBS. A responsabilidade tributária foi atribuída às unidades de processamento de gás natural, responsáveis pelo refino e adequação do produto ao consumo, cabendo a elas o recolhimento dos tributos incidentes na cadeia.

Atualmente, o gás natural está sujeito ao regime de tributação plurifásico do ICMS e não cumulativo do PIS e da Cofins, desde a extração, passando pelas fases de transporte e distribuição, até o consumidor final.

Portanto, com a vigência da reforma tributária, a lógica de tributação do gás natural será substancialmente alterada, passando a anteceder a prestação de serviços de transporte e distribuição.

Desafios na transição tributária

A mudança trará desafios significativos na implementação do novo regime durante o período de transição, em que o setor operará sob o regime plurifásico e, simultaneamente, sob as alíquotas ad rem na sistemática monofásica, considerando as características específicas da cadeia de circulação do gás natural.

Após a implementação, o regime monofásico será aplicado apenas para venda da molécula do gás natural, mas a cadeia de circulação do produto inclui etapas de transporte entre as unidades de processamento e de distribuição, que permanecerão sujeitas ao ICMS e futuramente ao IBS e CBS no regime normal de crédito e débito. Todavia, os créditos gerados na operação de transporte não poderão ser utilizados na operação subsequente, em razão de vedação legal e pela lógica operacional do regime monofásico, que recolhe os tributos da venda do produto na etapa inicial.

A impossibilidade de aproveitamento de créditos tributários na sistemática monofásica pode resultar em um aumento efetivo da carga tributária ao longo da cadeia do gás natural.

Outro aspecto relevante é que o gás natural processado e o gás natural veicular são essencialmente a mesma molécula, diferenciando-se apenas pelo uso final. O primeiro é voltado para aplicações industriais, residenciais e comerciais, enquanto o segundo é comprimido para uso como combustível automotivo. A Lei Complementar nº 214/2025 trata ambos como produtos distintos. Tal distinção pode gerar inconsistências no regime monofásico, caso se sujeitem a alíquotas ou políticas tributárias distintas, pois a tributação ocorre antes da definição do uso final do produto.

Ou seja, a unidade de processamento de gás natural será responsável por recolher o tributo sem saber qual a destinação final será dada ao produto, que poderá ser diferente para o gás natural processado e o gás natural veicular.

Devolução de impostos

Além destes pontos, a tributação monofásica também apresenta desafios para a operacionalização de políticas de cashback no fornecimento de gás canalizado para famílias de baixa renda. A Lei Complementar nº 214/2025 prevê a devolução integral da CBS e parcial de IBS para essas famílias. A operacionalização desta devolução se dá por meio da concessão de desconto no momento da cobrança pelo serviço de fornecimento de gás natural. Contudo, devido ao recolhimento antecipado do tributo, a concessão destes descontos será de difícil aplicação, de modo que a operacionalização terá que observar procedimentos especiais.

Ademais, em relação ao IS, a Emenda Constitucional nº 132/2023 determinou a incidência sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, tendo a Lei Complementar nº 214/2025 incluído o gás natural no rol dos bens e serviços sujeitos ao tributo, hipótese em que o fato gerador do imposto ocorre na extração do bem, sendo contribuinte o produtor-extrativista que realiza a extração.

A despeito disso, a lei beneficiou o gás natural destinado à utilização como insumo em processo industrial e como combustível para fins de transporte. Todavia, no momento da extração o produtor não tem conhecimento de qual destinação será dada ao produto ao final da cadeia, o que dificulta a aplicação do benefício concedido em função da destinação dada ao gás natural.

A cobrança do IS tal como previsto na Lei Complementar nº 214/2025, que equipara o gás natural aos óleos brutos petróleo, deixa também de observar a importância da utilização do produto para a transição energética, pois, apesar de ser um combustível fóssil, pode ser usado como alternativa a combustíveis mais poluentes na indústria, contrariando o princípio da defesa do meio ambiente estatuído pela Emenda Constitucional nº 132/2023.

Risco de litígio

Por fim, destaca-se que, caso não seja bem estruturada, a reforma tributária tem grande potencial de alta litigiosidade, especialmente devido ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da legitimidade do consumidor final para ajuizar ações tributárias nas relações jurídicas que envolvem concessões de serviço público, tal como ocorre no setor de gás natural.

Como se vê, as alterações tributárias trarão diversos desafios para a implementação das regras da reforma tributária em relação ao gás natural. É fundamental que o novo modelo tributário preserve o equilíbrio econômico e a eficiência do mercado, garantindo que o gás natural continue contribuindo de maneira efetiva para os objetivos de transição energética do País.

Considerando que o gás natural desempenha um papel estratégico no processo de transição energética, por ser uma fonte menos poluente e altamente versátil, é importante a conformação da legislação tributária para evitar possíveis inconsistências e aumento da carga tributária para o setor.

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Prêmio Boas Práticas em Rede: iniciativa vai disseminar e reconhecer projetos eficientes e inovadores da Justiça Federal

Corregedorias Regionais poderão enviar até cinco projetos. Prazo vai até 17 de março

Tribunais Regionais Federais de todo o País terão suas melhores iniciativas reconhecidas e compartilhadas. O Prêmio Boas Práticas em Rede (Replicabilidade, Eficiência, Desenvolvimento Conjunto e Excelência), lançado em fevereiro pela Corregedoria-Geral da Justiça Federal (CG), vai identificar e premiar ações eficientes, inovadoras e que tiveram impacto positivo no Judiciário.

As inscrições para o prêmio estão abertas até 17 de março, e as Corregedorias Regionais poderão submeter até cinco iniciativas que tenham impacto positivo nas atividades judiciais e administrativas. Em entrevista para o Portal do CJF, o juiz federal auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça Federal Otávio Henrique Martins Port explica que o prêmio foi criado a partir de quatro pilares: replicabilidade, eficiência, desenvolvimento conjunto e excelência.

“A Justiça Federal tem realidades diversas nos seis Tribunais Regionais Federais. O que funciona bem em um lugar pode ser útil para outros, desde que adaptado às suas particularidades. O prêmio vem exatamente para identificar essas práticas e criar essa ponte entre as Regiões”, explica.

Um dos diferenciais do certame é a estrutura pensada para facilitar a disseminação desses projetos. Para o juiz federal, não basta premiar, é preciso garantir que as ações selecionadas possam ser aplicadas em diferentes contextos. “A equipe da Corregedoria tem um papel ativo na identificação dessas boas práticas, já que acompanha de perto o funcionamento das unidades da Justiça Federal. Já vimos várias iniciativas interessantes em nossas visitas nas inspeções, mas o tempo que passamos em cada Tribunal é curto. Com o prêmio, queremos abrir espaço para que mais práticas cheguem até nós e possam ser compartilhadas”, reforça.

As iniciativas selecionadas serão apresentadas em 14 e 15 de maio, durante o 1º Encontro Nacional de Inovação e Boas Práticas da Justiça Federal. A vencedora receberá o Selo Boas Práticas em Rede, um reconhecimento nacional pela sua relevância e impacto. “O Selo representa um diferencial importante. Ele chancela a qualidade e a eficiência da prática vencedora e reforça o compromisso da Justiça Federal com a inovação e a transparência”, destaca o juiz.

Seleção

As Corregedorias Regionais da Justiça Federal devem reunir as boas práticas de suas unidades e encaminhá-las para a Corregedoria-Geral da Justiça Federal, acompanhadas da documentação comprobatória e das explicações de objetivos, metas, resultados e benefícios alcançados. As ações serão avaliadas por uma comissão do Conselho da Justiça Federal (CJF), que escolherá uma proposta por Região como finalista.

Para quem tem projeto a ser apresentado, o recado do juiz federal Otávio Port é claro: “Essa é uma grande oportunidade para dar visibilidade a projetos que fazem a diferença no dia a dia da Justiça Federal. Queremos receber muitas inscrições e contar com a participação ativa de quem busca aprimorar nosso sistema”.

Fonte: CJF