Comissão discute remuneração dos conciliadores e mediadores judiciais

A Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados debate nesta quarta-feira (26) a política de remuneração dos conciliadores e mediadores judiciais nos tribunais regionais federais e nos tribunais estaduais.

 
Direito e Justiça - Direito - juiz - magistrado - julgamento - advogado
A mediação e a conciliação são métodos alternativos de solução de conflitos – Depositphotos

O debate foi solicitado pela deputada Rosângela Reis (PL-MG), será realizado no plenário 3, às 16 horas, e poderá ser acompanhado pelo canal da Câmara dos Deputados no YouTube.

Rosângela Reis destaca a importância de o Parlamento aprimorar projetos de lei que têm o intuito de valorizar os conciliadores e mediadores judiciais. “Os conciliadores e mediadores exercem papel fundamental para desafogar o Poder Judiciário”, afirma.

A mediação e a conciliação são métodos alternativos de solução de conflitos. O objetivo é prestar auxílio a qualquer cidadão na tentativa de solução de um problema, sem a necessidade de uma decisão judicial.

O conciliador ou mediador, pessoa capacitada para a função, ajuda os envolvidos na demanda a encontrarem uma solução juntos, dentro da lei.

Fonte: Câmara dos Deputados

Revisão aduaneira e reflexos do precedente formado no REsp 1.826.124

Ato de revisão aduaneira

Nos próximos dias 27 e 28 de junho, terei o prazer de, a convite da OAB de Itajaí (SC), ser um dos expositores no XI Congresso Estadual de Direito Portuário e Marítimo[1] oportunidade em que me aprofundarei no tema objeto da coluna de hoje.

A questão não é nova e o precedente veiculado no REsp nº 1.826.124 visou responder a seguinte dúvida: é possível promover a revisão aduaneira na hipótese de operações submetidas aos canais amarelo [2] e vermelho [3] de conferência aduaneira (artigo 21, incisos II e III da IN RFB nº 680/2006), ou seja, naqueles casos em que há uma efetiva participação do agente público na conferência aduaneira dos bens importados?

Antes de responder esse questionamento, insta registrar que a revisão aduaneira é regulada pelo artigo 54 do Decreto-lei nº 37/66, [4] bem como pelo artigo 638 do Regulamento Aduaneiro [5] (Decreto nº 6.759/09) e tem por escopo permitir que a Administração Pública, exercitando a autotutela dos seus interesses, analise a correição da operação de comércio exterior tanto sob a perspectiva aduaneira quanto também tributária. Daí, inclusive, defendermos tratar-se de um ato administrativo de natureza bifronte, já que submetido tanto a um regime jurídico-tributário quanto também a um regime jurídico-aduaneiro[6]

Assim, embora se materialize documentalmente em um único ato, a revisão aduaneira tem por objetivo rever juridicamente uma operação de comércio exterior tanto sob a perspectiva de cumprimento das obrigações tributárias quanto em relação ao cumprimento das obrigações aduaneiras, lembrado que, embora haja uma intersecção entre esses campos do direito,[7] – [8] há também uma clara autonomia entre eles. [9]

Feitos esses esclarecimentos iniciais, é possível retomar o questionamento a respeito do qual o STJ se debruçou no REsp n. 1.826.124, i.e., quanto a (im)possibilidade de a Administração Pública promover a revisão aduaneira de operações submetidas aos canais amarelo e vermelho de conferência aduaneira.

Caso julgado pelo STJ no REsp nº 1.826.124

O caso julgado pelo STJ em sede de recurso especial é fruto de uma ação anulatória de débito fiscal promovida para anular auto de infração que, por uma divergência de classificação fiscal em relação às mercadorias importadas, exigia valores a título de tributo (II e IPI-importação), bem como multa aduaneira por ausência de licença de importação.

Um dos fundamentos trazidos pelo administrado em sua ação era de que parte das mercadorias analisada em revisão aduaneira tinha sido submetida aos canais amarelo e vermelho de parametrização, i.e., mediante efetiva conferência de agente público, o que, por seu turno, implicaria a validação da classificação fiscal adotada e a impossibilidade da sua revisão sob a perspectiva tributária.

Segundo o precedente do STJ aqui analisado, todavia, o tipo de canal de conferência aduaneira não impede ulterior revisão aduaneira, já que inexistiria previsão legal a estabelecer essa vinculação. A ratio decidendi do aludido julgado é muito bem sintetizada no seguinte trecho do voto do Ministro Gurgel de Fariaverbis:

… a legislação que rege a matéria não vincula o direito do Fisco de proceder à revisão aduaneira da regularidade do pagamento dos impostos a determinado tipo de canal de conferência aduaneira ao qual a mercadoria foi submetida, quais sejam, canais de parametrização verde, amarelo, vermelho ou cinza, nos termos da Instrução Normatiza SRF nº 680/2006.

Nesse mesmo sentido são os julgados da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, como se observa, v.g., dos precedentes formados no REsp nº 1.656.572/RS e AgInt no REsp nº 1.467.254/RS.

Tais precedentes, por sua vez, estão em compasso com jurisprudência já consolidada [10] do Carf. A título de exemplo destaca-se o recente acórdão n. 9303-014.439, [11] da CSRF, assim ementado:

REVISÃO ADUANEIRA. POSSIBILIDADE. APURAÇÃO DE REGULARIDADE. IRRELEVÂNCIA DO CANAL DE CONFERÊNCIA.
Conforme entendimento assentado e unânime do STJ, que se encontra em consonância com as melhores práticas internacionais, previstas na Convenção de Quioto Revisada, da Organização Mundial das Aduanas (CQR/OMA), e no Acordo sobre a Facilitação do Comércio, da Organização Mundial do Comércio (AFC/OMC), não há impedimento à realização do procedimento de revisão aduaneira previsto no art. 54 do Decreto-Lei 37/1966, dentro do período decadencial, qualquer que seja o canal de conferência aduaneira.

Em relação ao mérito de tais precedentes, ousamos divergir.

Crítica aos precedentes

Para justificar tal divergência, convém novamente repisar algo que já fora aqui exaustivamente afirmado: apesar de haver uma intersecção, o Direito Aduaneiro e o Direito Tributário apresentam regulações próprias, podendo, por conseguinte, atribuir consequências peculiares para um mesmo fato social.

Nesse sentido, ao importar um bem, o contribuinte promove a declaração dessa importação, oportunidade em que, sob a perspectiva tributária, veicula os tributos pertinentes sob o regime de lançamento por homologação, nos termos do artigo 150 do CTN. [12] Ressalte-se que a declaração e o pagamento do tributo é, inclusive, condição para a internalização do bem proveniente do exterior.

Logo, havendo efetiva conferência aduaneira da operação de importação, seja ela documental (canal amarelo) seja ela física (canal vermelho), o que existe, sob a perspectiva tributária, é a homologação expressa do lançamento perpetrado pelo contribuinte. A conferência efetiva da operação, com a consequente homologação do lançamento realizado, consome o prazo de 05 anos estabelecido no § 4º do já citado artigo 150 do CTN. [13]

Nessas situações, a ulterior revisão aduaneira é perfeitamente válida, desde que ela se restrinja a revisitar a operação de importação então fiscalizada sob a perspectiva exclusivamente aduaneira, imputando, se for o caso, eventuais sanções de caráter aduaneiro.

Diferentemente do que fora decidido pelo STJ, não se trata de limitar o instituto da revisão aduaneira sem previsão legal, até porque a ausência de explicitude de um texto jurídico não significa ausência de norma jurídica, [14] em especial quando se promove uma interpretação sistemática do ordenamento. Também não se trata de burocratizar a conferência aduaneira e, com isso, se contrapor às recomendações internacionais, já que apenas a minoria das mercadorias importadas se submete aos canais amarelo e vermelho de parametrização.

Em todo caso, o que se pretende aqui analisar são os reflexos dos precedentes aqui analisados, partindo do pressuposto que a ratio ali formada é válida.

Discussões reflexas dos precedentes analisados

Uma primeira discussão travada, sob a perspectiva tributária, é se a parametrização submetida à conferência de um agente público impediria a revisão aduaneira para fins de lançamento tributário, com fundamento no artigo 146 do CTN, ou seja, por alteração de critério jurídico. [15]

Quanto a esse ponto, a jurisprudência do Carf já se consolidou no sentido de negar a existência de alteração de critério jurídico, pois parte do pressuposto que a conferência aduaneira não implica homologação do tributo indicado na declaração de importação (DI). [16]

Em todo caso, existe uma outra faceta do problema a ser enfrentada.

Mais uma vez partindo da validade das rationes dos precedentes aqui analisados, imaginemos que um contribuinte importe os mesmos bens amparado por diferentes DI’s subordinadas a canais amarelo e/ou vermelho de parametrização, com a liberação dos bens então importados.

Imaginemos ainda que depois de um tempo tais importações são submetidas a um procedimento de revisão aduaneira que culmina no lançamento da diferença de tributos, ao fundamento de que a classificação dos bens importados estava errada.

Nesse caso, as liberações das diferentes DI’s promovidas em conferência aduaneira sob canal amarelo e/ou vermelho configurariam “práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas”, para fins de incidência do artigo 100, inciso III e parágrafo único do CTN, ou seja, para afastar a incidência de multa, juros e correção monetária da exigência tributária[17]

É inegável que a ação de um agente público, investido na função e cujos atos apresentam presunção de validade e certeza, se reveste de valor jurídico a gerar consequências também jurídicas, o que, em princípio, permitiria enquadrá-lo como uma “prática observada pela autoridade administrativa”.

Em verdade, a disposição do artigo 100, inciso III do CTN é uma opção consciente do legislador em prestigiar o costume jurídico como norma indutora da conduta do administrado. E sua diferença em relação ao artigo 146 do CTN é que lá se trata de uma mera mudança interpretativa por parte da Administração Pública, ou seja, fruto de um overruling, enquanto a disposição do artigo 100, inciso III do CTN prevê a existência de um costume equivocado (com status de norma complementar) consolidado pela prática reiterada da Administração Pública.

Daí porque, no caso do artigo 100, inciso III do CTN, a consequência para o crédito tributário é mais branda, resultando apenas no afastamento da multa, dos juros e da correção monetária, mas implicando a manutenção da obrigação principal, enquanto no caso de incidência do art. 146 do CTN a consequência legal é mais rigorosa, já que a exigência tributária só se tornará válida para cobranças futuras. [18]

Feito esse parêntese e partindo do pressuposto que é possível a admissão do artigo 100, inciso III do CTN no caso aqui analisado, remanesce a seguinte dúvida: quantos atos administrativos são necessários para configurarem a reiteração dessa conduta, ou seja, para configurar o costume administrativo? Uma única operação de importação, lastreada em várias DI’s, sendo ao menos duas delas submetidas aos canais amarelo e/ou vermelho, seriam suficientes para configurar essa reiteração?

Não localizamos uma única decisão, seja do Carf seja do STJ, que trate da incidência do artigo 100, inciso III do CTN dentro do específico contexto fático aqui tratado quanto a revisão aduaneira. Todavia, para fins de parâmetro, merece destaque o Acórdão Carf nº 2201-009.227, de relatoria do conselheiro Sávio Salomão de Almeida Nóbrega.

Trata-se do emblemático julgamento do ex-presidente  Fernando Collor de Mello, em razão da cobrança de IRPF de valores percebidos a título de propina. Nessa oportunidade, o tribunal afastou a incidência do artigo 100, inciso III do CTN, ao fundamento de a fiscalização ter se manifestado uma única vez no sentido de que um determinado contrato apresentava natureza de mútuo, o que não seria suficiente para conformar a ideia de prática reiterada, a qual, nas palavras do relator do caso, “deve-se entender como tal uma prática repetida, renovada, bastando que tenha sido adotada duas vezes, pelo menos, para que se considere como reiterada.” (grifos nosso)

Pois bem. As perguntas que surgem com os precedentes do STJ e do Carf aqui analisados em algum momento deverão ser ponderadas por tais tribunais, que deverão partir das rationes já fixadas em tais decisões e em casos análogos em que se debateu a incidência do artigo 100, inciso III do CTN, de modo que haja uma integração entre as respostas a serem então ofertadas e tais precedentes, nos termos do artigo 926 do CPC. [19] Aguardemos, portanto, os desdobramentos dessa nova discussão, tentando contribuir com as reflexões aqui lançadas para esse debate que certamente virá.

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[1] XI Congresso Estadual Direito Portuário e Marítimo e IX Workshop Temas Atuais de Direito Aduaneiro em Itajaí – Sympla.

[2] Hipótese em que ocorre a conferência documental dos bens importados por parte de um auditor fiscal na aduana.

[3] Caso em que há a conferência física e documental dos produtos importados por parte de um auditor fiscal na aduana.

[4] Art.54 – A apuração da regularidade do pagamento do imposto e demais gravames devidos à Fazenda Nacional ou do benefício fiscal aplicado, e da exatidão das informações prestadas pelo importador será realizada na forma que estabelecer o regulamento e processada no prazo de 5 (cinco) anos, contado do registro da declaração de que trata o art.44 deste Decreto-Lei.

[5] Art. 638.  Revisão aduaneira é o ato pelo qual é apurada, após o desembaraço aduaneiro, a regularidade do pagamento dos impostos e dos demais gravames devidos à Fazenda Nacional, da aplicação de benefício fiscal e da exatidão das informações prestadas pelo importador na declaração de importação, ou pelo exportador na declaração de exportação. 

  • 1oPara a constituição do crédito tributário, apurado na revisão, a autoridade aduaneira deverá observar os prazos referidos nos arts. 752 e 753.

[6] Defendendo tratar-se de um instituto tipicamente aduaneiro: MINEIRO, Rodrigo. P. Introdução ao direito aduaneiro. São Paulo: Intelecto, 2018. p. 70. SEHN, Solon. Reclassificação aduaneira e proteção da confiança. In: Direito aduaneiro e direito tributário aduaneiro. BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. SILVA, Paulo Roberto Coimbra (orgs.). Belo Horizonte: Casa do Direito, 2022. p. 325.

[7] Tratando do assunto: TREVISAN, Rosaldo. O imposto de importação e o direito aduaneiro internacional. São Paulo: Aduaneiras, 2018. p. 42 e s.s.

[8] Essa intersecção se deve por um mesmo fato social (v.g., o ato de importar bens) ser objeto de tratamento jurídico tanto sob a perspectiva tributária como também aduaneira.

[9] Embora nem sempre isso seja respeitado, o que já abordei no seguinte texto: Morte e vida da autonomia do regime jurídico aduaneiro (conjur.com.br).

[10] Ainda que com base em alguns precedentes formados por maioria de votos ou por voto de qualidade.

[11] De relatoria do Conselheiro Rosaldo Trevisan.

[12] Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

[13] Art. 150 (…).

  • 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

[14] Vale aqui lembrar que norma jurídica é juízo de valor e que, por conseguinte, está sempre presente implicitamente nos textos jurídicos. Nesse sentido: CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 23.

[15] Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.

[16] Nesse sentido: Acórdãos CARF n. 3402-011.262 (Conselheira Relatora Cynthia Elena de Campos; 3301-013.893 (Conselheiro Relator Laercio Cruz Uliana Junior); 9303-014.438 (Conselheiro Relator Rodrigo da Costa Possas).

[17] Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos:

(…).

III – as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas;

(…).

Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.

[18] Promovendo essa distinção entre os dispositivos legais citados: MACHADO, Hugo de Bruto. Comentários ao Código Tributário Nacional. Vol. II. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 69.; TROIANELLI, Gabriel Lacerda. Interpretação da Lei Tributária: Lei Interpretativa, Observância de Normas Complementares e Mudança de Critério Jurídico. InRevista Dialética de Direito Tributário nº 176, mai./2010. p. 82-83.

[19] Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

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Nova modulação do caso ICMS-ST na base de PIS e Cofins alivia contribuintes

A alteração feita pelo Superior Tribunal de Justiça na data a partir da qual o ICMS por substituição tributária (ICMS-ST) poderá ser excluído da base de cálculo de PIS e Cofins representa um alívio para os contribuintes, por favorecer aqueles que não haviam contestado a questão judicialmente.

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A tese foi firmada pela 1ª Seção do STJ em dezembro de 2023 e marcou a primeira vez que o tribunal modulou os efeitos temporais de uma questão tributária.

Modular os efeitos de uma decisão significa restringir sua eficácia temporal. Ou seja, ela passa a ter efeito a partir de uma determinada data, de forma prospectiva — dali para frente —, de acordo com as especificidades de cada caso.

marco escolhido inicialmente foi a data da publicação da ata do julgamento no veículo oficial de imprensa — o Diário da Justiça eletrônico (DJe) —, o que ocorreu em 14 de dezembro de 2023.

No entanto, neste mês o colegiado reavaliou essa posição ao julgar os embargos de declaração e decidiu alterar a data de corte. Ela retroagiu em mais de seis anos e passou a ser 17 de março de 2017.

‘Tese do século’

Trata-se do dia em que o Supremo Tribunal Federal fixou a chamada “tese do século” no Tema 69 da repercussão geral, segundo a qual o ICMS não compõe a base de cálculo de PIS e Cofins. Os efeitos temporais dessa decisão também foram modulados.

A adequação do STJ faz sentido porque o tema do ICMS-ST na base de cálculo de PIS e Cofins é uma das chamadas “teses-filhote” da “tese do século”.

Com isso, o ICMS-ST pode ser excluído da base de cálculo de PIS e Cofins a partir de 17 de março de 2017, exceto nos casos em que o contribuinte já tinha feito esse pedido administrativa ou judicialmente.

Contribuintes que entraram com ações após o julgamento do STJ podem obter a devolução dos valores pagos indevidamente pelos cinco anos anteriores.

Coerência e segurança jurídica

Para Leticia Michellucci, sócia da área tributária do escritório Loeser e Hadad Advogados, os ministros da 1ª Seção do STJ acertaram ao alterar a data da modulação e foram coerentes com o que o Supremo decidiu na “tese do século”.

“Isso demonstra um cuidado com a coerência e a segurança jurídica. A decisão favorece os contribuintes que não contestaram o tema da substituição e tiveram seu direito reconhecido desde 15 de março de 2017, bem como aqueles que ingressaram com ações judiciais e pleitos administrativos até essa data, podendo retroagir seu direito por mais cinco anos a partir do ajuizamento.”

Fernanda Martins, tributarista do Dalla Pria Advogados, considera “nada mais lógico” que o dia 15 de março de 2017 seja adotado como marco para a modulação dos efeitos da tese derivada definida pelo STJ.

“Isso porque, considerando que a modulação dos efeitos das teses estabelecidas pelos tribunais tem como escopo precípuo a observância ao princípio da segurança jurídica, a partir da definição do Tema 69 do STF, já era esperado que teses dele derivadas pudessem vir a ser definidas sob a mesma ratio decidendi (razão de decidir).”

João Vitor Prado Bilharinho, sócio da área tributária do escritório Diamantino Advogados Associados, concorda que a data não foi escolhida por acaso e tem relação com a fixada pelo STF quando do julgamento do Tema 69.

“A medida foi sensata, pois garante uma segurança jurídica sobre o tema e seu alcance temporal, uma vez que ambas as teses se referem à impossibilidade de o tributo estadual compor a base de cálculo do PIS e Cofins, seja ele ICMS próprio ou substituição, diferenciando-se apenas quanto à técnica de arrecadação (recolhido pelo contribuinte ou responsável tributário).”

REsp 1.896.678
REsp 1.958.265

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Juiz, de ofício, pode converter em arrolamento simples o inventário proposto pelo rito completo

Segundo a ministra Nancy Andrighi, apesar de certa flexibilidade procedimental da legislação, o rito continua sendo, em regra, questão diretamente relacionada à jurisdição e, como tal, de ordem pública.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que, uma vez proposta a ação de inventário pelo rito solene ou completo, é lícito ao juiz, de ofício, determinar a sua conversão para o rito do arrolamento simples ou comum, desde que preenchidos os pressupostos do procedimento simplificado.

No caso dos autos, uma mulher propôs uma ação de inventário pelo rito completo, tendo o juízo de primeiro grau, em decisão interlocutória, determinado a conversão do rito do inventário para o arrolamento simples.

Após o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro confirmar a decisão de primeira instância, a autora da ação recorreu ao STJ alegando violação ao artigo 664 do Código de Processo Civil (CPC), pois, segundo ela, embora o arrolamento seja um procedimento simplificado e mais célere em relação ao de inventário, não cabe ao magistrado, de ofício, ordenar que os sucessores optem por esse procedimento.

Escolha de rito mais completo não impede reconhecimento de sua inadequação

A ministra Nancy Andrighi, relatora, destacou que, embora a legislação processual tenha superado a regra da absoluta rigidez procedimental e migrado para um modelo mais flexível, o rito continua sendo, em regra, questão diretamente relacionada à jurisdição e, como tal, de ordem pública. Dessa forma, segundo a relatora, “presentes os pressupostos previstos em lei, descabe à parte, em princípio, adotar unilateralmente procedimento distinto”.

A ministra também ressaltou que a adoção de um procedimento mais amplo e profundo do ponto de vista da análise do caso e da produção de provas, por si só, não impede que seja reconhecida a inadequação do rito escolhido pela parte, já que, ainda assim, poderá haver prejuízo às partes ou uma verdadeira incompatibilidade procedimental.

“A tramitação de uma ação em procedimento distinto daquele previsto pelo legislador está condicionada ao exame do interesse da jurisdição, verificando-se se a adoção de procedimento distinto provocará prejuízo à atividade jurisdicional, inclusive quanto à celeridade e à razoável duração do processo, e ao interesse dos réus, pois a adoção de procedimento distinto não poderá lhe causar indevidas restrições cognitivas ou probatórias”, declarou.

Utilização do rito completo não atende aos interesses da jurisdição e das demais partes

Nancy Andrighi ainda explicou que, no caso dos autos, a tramitação da ação de inventário pelo rito solene ou completo, quando cabível e adequado o rito do arrolamento simples ou comum, não atende aos interesses da jurisdição, uma vez que provocará um alongamento desnecessário do processo e uma provável prática de atos processuais que seriam dispensáveis, causando prejuízo na atividade jurisdicional.

“De outro lado, o procedimento eleito pela autora também não atende aos interesses das demais partes, pois, embora a adoção do rito mais completo não lhes cause, em princípio, restrições cognitivas ou probatórias, terão potencialmente prejuízos à solução da controvérsia em tempo razoável em decorrência do alongamento injustificado do processo”, concluiu ao negar provimento ao recurso.

Fonte: STJ

30 anos do Plano Real: entre DRU e sistema de metas de inflação

O Plano Real completa 30 anos em 2024. Institucionalmente, sua origem coincide com a edição da Medida Provisória nº 542, de 30 de junho de 1994.

A MP nº 542/1994 foi reeditada e alterada diversas vezes até ser formalmente convertida na Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, que “dispõe sobre o Plano Real, o Sistema Monetário Nacional, estabelece as regras e condições de emissão do Real e os critérios para conversão das obrigações para o Real, e dá outras providências”.

Entre os diversos instrumentos normativos que lhe subsidiaram a consecução ao longo dessas três décadas, destacam-se os institutos da Desvinculação de Receitas da União (DRU) e o Sistema de Metas de Inflação (SMI).

A desvinculação de receitas foi estabelecida e redesenhada sucessivas vezes nos artigos 71, 72, 76, 76-A e 76-B do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) ao longo dos seus 30 anos de vigência. O Sistema de Metas de Inflação, por seu turno, foi fixado pelo Decreto 3.088, de 21 de junho de 1999, onde persiste há 25 anos de forma relativamente estável, sem maiores alterações.

Originalmente, a desvinculação de receitas foi concebida como Fundo Social de Emergência (FSE), com posteriores redesignações para Fundo de Estabilização Fiscal (FEF) e desvinculação de receitas da União, a qual foi estendida ulteriormente aos estados e aos municípios, donde a tríade DRU, DRE e DRM.

O FSE foi instituído pela Emenda Constitucional de Revisão nº 1, de 1º de março de 1994, para viger até 1995, “com o objetivo de saneamento financeiro da Fazenda Pública Federal e de estabilização econômica”. Supostamente os recursos parcialmente desvinculados seriam “aplicados no custeio das ações dos sistemas de saúde e educação, benefícios previdenciários e auxílios assistenciais de prestação continuada, inclusive liquidação de passivo previdenciário, e outros programas de relevante interesse econômico e social”.

O decurso do tempo comprovou que a alegada finalidade de desvincular parcela significativa das receitas destinadas à seguridade social supostamente para custear as ações de saúde, previdência e assistência social era falaciosa. A bem da verdade, a razão estrutural dos instrumentos de desvinculação FSE/FEF/DRU era mitigar a relação de instrumentalidade entre as contribuições sociais e o Orçamento da Seguridade Social previsto nos artigos 165, §5º, III, 195, §2º, 198, §1º e 204, todos da Constituição de 1988.

Desde sua instituição até os presentes dias, foram 12 Emendas Constitucionais, que cuidaram — direta ou indiretamente — da desvinculação de receitas, prevendo-a, redesignando-a, ampliando-a e, sobretudo, prorrogando-a no ADCT. A tabela abaixo contempla os respectivos dados basilares:

Como se não bastassem tantas alterações, começa a ser aventada a 13ª emenda constitucional sobre a desvinculação de receitas, vez que o governo federal tem buscado alternativas de ajuste fiscal que mitiguem a necessidade de uma revisão imediata da Lei Complementar 200/2023 (Regime Fiscal Sustentável, alcunhado vulgarmente de “Novo Arcabouço Fiscal”) já em 2025.

A pauta que começa a ser ventilada na imprensa seria não só a de prorrogar a DRU para além de 31/12/2024, como também de estender seus efeitos sobre a sistemática dos pisos em saúde e educação. Tal proposta de ampliar o escopo da DRU para mitigar o alcance do dever federal de gasto mínimo em saúde e educação trata-se de um inconstitucional e incoerente retrocesso em relação ao artigo 5º da Emenda 59/2009 e artigo 2º da Emenda 103/2019, que, respectivamente, acrescentaram ao artigo 76 do ADCT os §§3º e 4º, visando a excluir tais recursos vinculados da incidência daquele instituto.

Aliás, a redação atualmente vigente dos artigos 76, 76-A e 76-B é contrária à inserção dos pisos em saúde e educação nas hipóteses de desvinculação de receitas da União, dos estados e dos municípios:

“Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2024, 30% (trinta por cento) da arrecadação da União relativa às contribuições sociais, sem prejuízo do pagamento das despesas do Regime Geral de Previdência Social, às contribuições de intervenção no domínio econômico e às taxas, já instituídas ou que vierem a ser criadas até a referida data.

[…]

§ 2° Excetua-se da desvinculação de que trata o caput a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o § 5º do art. 212 da Constituição Federal .

[…]

§ 4º A desvinculação de que trata o caput não se aplica às receitas das contribuições sociais destinadas ao custeio da seguridade social.

 Art. 76-A. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2032, 30% (trinta por cento) das receitas dos Estados e do Distrito Federal relativas a impostos, taxas e multas já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais, e outras receitas correntes.

Parágrafo único. Excetuam-se da desvinculação de que trata o caput:

I – recursos destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde e à manutenção e desenvolvimento do ensino de que tratam, respectivamente, os incisos II e III do § 2º do art. 198 e o art. 212 da Constituição Federal;

[…]

Art. 76-B. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2032, 30% (trinta por cento) das receitas dos Municípios relativas a impostos, taxas e multas, já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais, e outras receitas correntes.

Parágrafo único. Excetuam-se da desvinculação de que trata o caput:

I – recursos destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde e à manutenção e desenvolvimento do ensino de que tratam, respectivamente, os incisos II e III do § 2º do art. 198 e o art. 212 da Constituição Federal;

[…]”

Segundo José Roberto Afonso [1], “[…] vale criticar um pouco mais a ideia da desvinculação, que as autoridades federais enxergam como o caminho necessário para se racionalizar o gasto [público] e implantar políticas fiscais anticíclicas”, porque “[…] não há relação de causa e efeito — isto é, nem vincular, muito menos desvincular, por si só, asseguram boas ou más performances do gasto”. Embasam a afirmação em pauta as constatações feitas pelo citado autor (2004, p. 19-21) de que:

a) “num exemplo extremo, se as contribuições para a seguridade social fossem convertidas em impostos de livre aplicação, por si só, isso não significaria desobrigar a previdência social de pagar aposentadorias e pensões, nem mesmo aos que ainda trabalham, mas têm direitos adquiridos”; embora seja sempre “alegado que, sem tal processo [de desvinculação], seria impossível cumprir as metas fiscais, porém, as mais duras firmadas com o FMI, inclusive após a elevação da meta de superávit primário para patamar nunca observado na história recente, foram sucessiva e plenamente cumpridas”;

b) “após a implantação do caixa único do Tesouro Nacional, sempre há opção de simplesmente contingenciar as dotações orçamentárias e manter entesourado os recursos, como atalho mais curto para assegurar a geração do superávit”;

c) “no âmbito estadual e municipal, o atendimento das metas de superávit primário tem sido fruto justamente de uma vinculação: de proporção da receita corrente para pagamento mensal do serviço da dívida renegociada com o Tesouro Nacional”;

d) existe severa contradição no “discurso oficial recente de que a vinculação prejudica a eficiência e a eficácia da provisão de serviços sociais básicos, porque elas [as vinculações de receitas para a seguridade social e de percentual mínimo de gastos para saúde e educação] foram aprovadas no Congresso justamente com o objetivo inverso”;

e) enquanto “o pretexto [da desvinculação] foi de assegurar a continuidade do financiamento e da despesa com benefícios e serviços sociais básicos, inclusive para permitir a pactuação de uma nova divisão de responsabilidades entre esferas de governo que promovesse a descentralização das ações e também para custear o aumento dos gastos correntes resultantes das novas e maiores inversões esperadas”, efetivamente, “é inegável que a política fiscal do governo federal foi e continuará sendo beneficiada pela desvinculação de 20% de sua receita tributária”, sendo que “o maior efeito prático desta medida era liberar contribuições da seguridade (Cofins, CSLL) para financiar os benefícios dos servidores [públicos] inativos”, o que seria burla à diferenciação dos regimes geral e próprio de previdência social; e, enfim,

f) cumpre lembrar o relevante papel de poupança interna da “[…] vinculação que foi desenhada com um regime especial, visando gerar uma poupança pública no presente que financie o gasto futuro, ou mesmo procure evitá-lo — caso particular da destinação constitucional da contribuição sobre receitas (do PIS/PASEP) para aplicações através do BNDES e para custeio do seguro-desemprego, no âmbito do Fundo de Amparo aos Trabalhadores (o FAT)”.

Em meio a tantas controvérsias e inconsistências, fato é que a desvinculação — que fora criada para durar inicialmente dois anos — já se prolonga por três décadas. O supostamente provisório se perenizou de forma errática em meio a 12 Emendas Constitucionais (ECR nº 1/1994, bem como EC’s nº 10/1996, 17/1997, 27/2000, 42/2003, 56/2007, 59/2009, 68/2011, 93/2016, 103/2019, 126/2022 e 132/2023).

Tamanho redesenho no arranjo constitucional da desvinculação de receitas (independentemente do nome que a veicule: FSE/FEF/DRU/DRE/DRM) contrasta com a manutenção praticamente inalterada do Decreto 3.088, de 1999, que fixou o Sistema de Metas de Inflação.

Passados 25 anos desde sua edição, não houve mudança significativa no Decreto 3.088, nem mesmo em função da edição da Lei Complementar 179, de 24 de fevereiro de 2021, que modificou profundamente o regime jurídico do Banco Central. A autoridade monetária passou a gozar de mandato fixo para seus dirigentes, para que pudesse não só perseguir as metas de inflação, mas também para que devesse institucionalmente “zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego”, na forma do parágrafo único do artigo 1º da LC 179/2021.

Muito embora a institucionalidade do Sistema de Metas de Inflação pareça mais estável, ela é, em essência, lacunosa. A forma como a política monetária tem sido conduzida no Brasil traz consigo severos impactos sociais, econômicos e fiscais, que mereceriam debate mais detido e aprimoramento intertemporal.

Diferentemente do que se sucede com a DRU, há uma interdição temática à reflexão sobre como aprimorar o devido processo da política monetária em que se dá o manejo da taxa básica de juros pelo Banco Central, visando a entregar a inflação dentro dos limites de oscilação da meta projetada pelo Conselho Monetário Nacional.

No Texto para Discussão 2403, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Luís Carlos Magalhães e Carla Rodrigues Costa suscitam que as despesas financeiras decorrentes, majoritariamente, da atuação finalística do Banco Central seriam uma categoria ausente na tematização da agenda de ajuste fiscal do Brasil:

“a elevada despesa com serviços de juros da dívida pública federal é um fator importante que dificulta a obtenção do equilíbrio fiscal, como também o crescimento econômico do país. As evidências apresentadas no trabalho sugerem que a obtenção de equilíbrio fiscal sustentável requer alteração da atual institucionalidade da gestão da dívida pública, herdada do período de alta inflação. Além disso, por diversas regras de funcionamento dos mercados primários e secundários da dívida pública, discutidas no trabalho, este equilíbrio impede que a despesa pública com serviço de juros convirja para padrões internacionais. Ao custo fiscal do arranjo institucional da gestão da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi), somam-se os custos das complementaridades institucionais construídas nas últimas décadas com a política monetária e cambial. Essas complementaridades criam uma rede de arranjos institucionais com atributo de path dependence, o que dificulta sua alteração de forma a reduzir esses custos fiscais.” (Magalhães; Costa, 2018, p. 7)

Larissa Dornelas e Fábio Terra oferecem diagnóstico semelhante sobre o mercado da dívida pública no Brasil, que congrega tanto a gestão de liquidez da política monetária, quanto o resultado da política fiscal no âmbito do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic):

“[…] houve no Brasil uma fusão dos mercados monetário e de dívida pública com a criação do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC), em 1979, de modo que se passou a ter no País um único e grande mercado de dívida pública, chamado de mercado SELIC, no qual se marca a taxa básica de juros no Brasil, a taxa Selic. Nele utilizam-se os mesmos títulos públicos, emitidos pelo Tesouro Nacional (TN), para a realização tanto da política monetária quanto para a gestão da dívida pública. Dessa forma, no mercado SELIC instrumentalizam-se operações de mercado aberto, além de se transacionarem títulos para fins fiscais, já que todas as transações que envolvem títulos públicos se dão em seu âmbito.

[…] a estrutura do sistema financeiro nacional (SFN) convencionou-se e habitou-se com o perfil da circulação de títulos no tempo da zeragem automática e da alta inflação: a demanda por ativos financeiros centra-se em compor carteira com investimentos de curto prazo, com liquidez elevada, que gere rentabilidade com baixo risco.

[…] por conta da pós-fixação dos títulos públicos componentes da dívida mobiliária (inclusive nos usados nas operações compromissadas), a taxa de juros básica do BCB precisa permanecer em patamares elevados para ter eficácia no controle inflacionário. Porém, como esta taxa é a mínima que remunerará outros ativos no País, inclusive do rendimento dos títulos públicos para fins fiscais, gera-se assim, uma contaminação da política monetária na gestão da dívida pública, cuja volatilidade da taxa Selic, quando ocorre, impregna-se nos juros dos títulos da política fiscal e, dada a elevada taxa básica historicamente praticada, tem-se um alto custo para o financiamento do governo. Como se não bastasse o alto e volátil custo do financiamento da dívida pública, cria-se um ciclo vicioso: cobram-se altos prêmios pela falta de credibilidade de um governo que emite dívida de curto prazo e, com a continuidade desse perfil de dívida, o custo dela aumenta.”

As análises coincidem, mas sequer chegam a ser debatidas amplamente nas arenas públicas mais expressivas de reflexão sobre os rumos das contas públicas, a despeito de as despesas com juros alcançarem cerca de 8% do PIB ao ano. Nesse contexto, soa contraditória, quando não enviesada a preferência por pautar a desvinculação dos gastos sociais (pisos em saúde e educação, garantia de que os benefícios da previdência e da assistência social não sejam inferiores ao salário mínimo etc), antes de qualquer retomada séria desse ajuste ausente sobre as despesas financeiras.

Neste aniversário de 30 anos do Plano Real, desvendar tamanho impasse é ponto de partida e dever de equidade, para que seja possível tanto lhe corrigir os rumos, quanto lhe resguardar sustentabilidade e legitimidade para as próximas décadas.


[1] AFONSO, José Roberto. LRF: por que parou? Rio de Janeiro, 2004, p. 19-21.

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Gestão de precedentes completa 10 anos de transformações silenciosas no Brasil

Na teoria, o caminho para a criação de um precedente à brasileira é simples: identifica-se que determinado tema está gerando muitos recursos e informa-se à corte superior competente, que afeta alguns deles como paradigma para julgamento e definição de uma tese jurídica. Ela vai orientar as instâncias ordinárias e pautar a conduta da sociedade. Não vai mais fazer sentido recorrer para contestar uma posição solidificada. Haverá a pacificação social — ao menos quanto a esse tema.

STJ sede prédio
STJ começou gestão de precedentes para agilizar julgamento de repetitivos – Divulgação/STJ
 
 

 

O problema é que apenas julgar processos e fixar teses não adianta. É preciso definir quais casos serão julgados, quando, como e por quem. É necessário organizá-los, cuidar dos sobrestamentos — as suspensões feitas para todos os demais casos, enquanto aguarda-se uma solução — e dar a devida publicidade, para que todos saibam o que foi decidido. Por fim, é imperioso garantir que estão sendo cumpridos. Em suma, é preciso gerir os precedentes.

Essa percepção surgiu no Brasil há dez anos, quando o ministro Paulo de Tarso Sanseverino pediu ao então presidente do Superior Tribunal de Justiça, Francisco Falcão, a criação de uma comissão temporária com o objetivo de fazer um trabalho de inteligência junto aos outros tribunais. O objetivo era estimular a afetação de recursos especiais como representativos das principais controvérsias.

O pedido foi atendido por meio da Portaria 489/2014. A comissão temporária acabou se tornando definitiva e, hoje, é a mais longeva do STJ. Ela deu início a uma década de transformações silenciosas de dentro do Judiciário para fora, no sistema de Justiça, em uma experiência que foi replicada por todo o país. À exceção daqueles da Justiça Eleitoral, todos os demais tribunais têm comissões responsáveis pela gestão de precedentes.

Há dez anos, no entanto, o objetivo era muito mais modesto.

 
Ministro Paulo de Tarso Sanseverino foi o responsável pela criação da comissão gestora – Sergio Amaral/STJ

 

Melhor assim

A primeira e principal função desse órgão interno foi informar sobre a importância de fixar teses. Em 2014, o STJ trabalhava com recursos repetitivos há seis anos — eles foram criados pela Lei 11.672/2008, que deu ao tribunal a possibilidade de vincular posição. Até então, só o Supremo Tribunal Federal podia fazer isso, por meio da repercussão geral. O Tribunal Superior do Trabalho poderia ter suas decisões vinculantes desde 2001, quando o julgamento sob o critério da transcendência foi inserido na Consolidação das Leis do Trabalho, mas sua regulamentação só veio com a reforma trabalhista de 2017.

O STJ não era eficiente na forma como tratava esse poder. O tribunal até afetava muitos temas — em 2009, foram 332. Mas penava com prazos e, principalmente, com fluxo de julgamento. A prática era escolher um recurso para separar em diversos temas de repetitivo. Se esse processo se mostrasse inviável, seja por questões de admissibilidade ou de mérito, todos os temas seguiriam “pendurados” aguardando a chegada de novos recursos mais propícios.

O caminho até os repetitivos não era centralizado e sua afetação não gerava prevenção — mesmo na espera da definição de uma tese, os demais ministros continuavam recebendo recursos sobre o mesmo tema, pela distribuição livre. Isso acontecia até com os casos escolhidos pelos tribunais de segundo grau para definição do precedente qualificado: definia-se cinco ou seis representativos da controvérsia, que subiam ao STJ e eram pulverizados em diversos gabinetes, à sorte de o relator identificar que poderiam ou não gerar um repetitivo.

O ministro Sanseverino então organizou a comissão temporária com mais dois colegas, sendo um de cada seção do STJ: ele pela seção de Direito Privado (2ª Seção), Assusete Magalhães pela de Direito Público (1ª Seção) e Rogerio Schietti pela de Direito Criminal (3ª Seção). Isso abriu caminho para uma interlocução dentro do tribunal, uma conscientização dos gabinetes sobre a importância de investir tempo e esforço na construção dos precedentes qualificados. O cenário identificado foi demandando novas ações.

Surgiu a página de repetitivos do STJ, como repositório com tudo que foi decidido. O tribunal fez um saneamento dos recursos e identificou que 85 temas de repetitivo estavam sem processos vinculados, parados e gerando sobrestamento nos tribunais de segunda instância. Todos foram cancelados. Em 2015, identificou-se que o STJ tinha 7 mil recursos sobrestados, sem qualquer organização. Descobriu-se que 800 estavam indevidamente parados. Presidente à época, a ministra Laurita Vaz determinou um mutirão para dar cabo desses casos, que foram resolvidos em dois meses.

Tudo isso evoluiu para uma alteração regimental proposta em 2016, fixando um fluxo para o julgamento dos repetitivos: os representativos da controvérsia seriam centralizados na presidência do tribunal, que abriria prazo para manifestação do Ministério Público Federal e depois distribuiria livremente para a seção competente do STJ. O relator sorteado teria 60 dias para propor a afetação ou não. A ministra Laurita Vaz delegou essa competência para a presidência da comissão gestora de precedentes — medida replicada por todos os presidentes seguintes. E foi assim que a comissão tomou a frente, efetivamente, da gestão.

 
Rogerio Schietti é o atual presidente da comissão gestora de precedentes – Lucas Pricken/STJ

 

Deixa comigo

A expectativa era de que os tribunais de segundo grau se tornassem grandes parceiros do tribunal na afetação de recursos repetitivos, o que jamais ocorreu. A partir de 2016, os membros da comissão passaram a visitar as cortes, para repetir a conscientização que vinha dando resultado internamente, no STJ. Ao Anuário da Justiça, em 2019, o ministro Sanseverino comparou a identificação desses temas como uma guerra de guerrilha: “tem que estar constantemente identificando novas demandas e atuando. A questão é atuar rapidamente para evitar que o problema fique crônico”.

A ministra Assusete Magalhães, em 2020, relembrou como, nos primeiros contatos com os desembargadores, não havia nenhuma noção do que era gestão de precedentes. Foi por meio dessas visitas que as cortes de segundo foram, paulatinamente, implementando suas próprias comissões gestoras, para atender a Resolução 235/2016 do Conselho Nacional de Justiça. A norma promoveu uma padronização dos procedimentos usados para definição de precedentes qualificados e emprestou muito da experiência adquirida pelo STJ na gestão interna.

Como o fluxo de afetações a partir das sugestões dos tribunais ao STJ continuou fraco, a partir de 2018 a própria comissão gestora de precedentes começou a identificar quais temas poderiam gerar definição de tese vinculante. E fazia isso no olho: os servidores acessavam um sistema com o resumo indicativo dos recursos recebidos e, filtrando por tribunais, conseguiam identificar a repetição de termos ou palavras-chave. Com isso, selecionavam processos como representativos da controvérsia e enviavam para a presidência da comissão.

Para a sorte do tribunal, o servidor Amilar Domingos Moreira Martins estava fazendo mestrado em administração pública e desenvolvendo uma ferramenta de agrupamento de documentos jurídicos. Essas planilhas passaram a ajudar a identificação dos temas repetitivos pela comissão. O trabalho de Amilar, publicado em 2018, resultou num modelo de inteligência artificial que hoje é conhecido por Sistema Athos, usado de forma ampla em diversos setores do STJ, com bastante sucesso.

Para auxiliar a gestão de precedentes, o Athos funciona num sistema de banco de teses. Os servidores da secretaria de jurisprudência identificam temas muito julgados e cadastram no sistema. O mesmo ocorre na secretaria judiciaria, responsável pela autuação dos recursos. Com isso, o Athos passa a identificar todos os recursos recebidos com a mesma temática, o que gera uma indicação de tema repetitivo passível de afetação.

Com isso, a comissão gestora de precedentes hoje é a principal responsável pela identificação de temas para formação de precedentes qualificados. Mesmo os gabinetes dos ministros preferem esperar pela atuação da unidade. Em 2023, 73% das afetações foram feitas após indicação da comissão (39 ao todo). Apenas 12 vieram enviadas pelos tribunais de apelação. E somente duas foram feitas de ofício pelos próprios ministros do STJ.

 
Marcelo Marchiori 2024
Marcelo Marchiori é o assessor-chefe do Núcleo de Gerenciamento de Precedentes – Pedro França/STJ

 

Precedentes

Dez anos depois da criação da comissão gestora de precedentes do STJ, todos os tribunais de apelação têm sua própria unidade. O Tribunal de Justiça de São Paulo, maior corte de segundo grau do mundo, tem cinco núcleos: um de cada seção, um da vice-presidência e outro da presidência. Os TJs de Minas Gerais, Pará e Amapá também são reconhecidos como grandes exemplos de boa gestão de precedentes atualmente.

O Supremo Tribunal Federal, que desde 2012 tinha o seu núcleo de apoio à repercussão geral, em 2020 criou o núcleo de gerenciamento de precedentes, uma unidade separada da estrutura da presidência e que ficou responsável por ampliar as afetações, a comunicação com os tribunais e a interlocução interna.

Isso é necessário porque, apesar da previsão de repercussão geral como um requisito para julgamento de recurso extraordinário, o Supremo tem circuitos que permitem a apreciação colegiada fora dessa hipótese. Em 2023, o tribunal proferiu 95,1 mil decisões recursais, mas julgou apenas 52 temas de repercussão geral. O excedente é absorvido pelas turmas. Daí a importância de selecionar casos para afetação e fazer a gestão adequada desses precedentes.

No STJ, a comissão gestora de precedentes hoje é presidida pelo ministro Rogerio Schietti, seu último membro original — o ministro Paulo de Tarso Sanseverino morreu em 2023 e a ministra Assusete Magalhães se aposentou em janeiro de 2024. Schietti atesta que a gestão de precedentes já mostra resultados positivos, uma década mais tarde. Ele avalia que os problemas são tópicos, de um ou outro desembargador que insiste em ignorar a vinculação garantida aos precedentes qualificados pelo Código de Processo Civil de 2012. A questão, portanto, é de coerência sistêmica.

“Se você tem um entendimento que é consolidado e todo mundo respeita, de que adianta recorrer? Você vai perder. Eu acho até que, no âmbito criminal, mesmo assim vale a pena, muitas vezes, recorrer para evitar trânsito em julgado ou algum tipo de satisfação para o cliente. Porque no âmbito criminal você não pode punir uma litigância de má-fé, digamos. No processo penal, o máximo que nós podemos fazer é enviar para um órgão correcional. Mas assim, se você tiver um sistema em que todas as decisões, já pacificadas, em julgamento qualificado, são seguidas pelos Tribunais, o número de recursos vai cair muito”, diz.

Marcelo Marchiori, assessor-chefe do Núcleo de Gerenciamento de Precedentes do STJ, diz que, de forma geral, que os repetitivos são, sim, obedecidos por todos os tribunais. O problema é a jurisprudência pacificada, em todo seu conceito vago. Uma das funções da gestão de precedentes, inclusive, é transformar jurisprudência em precedente qualificado para evitar esse tipo de questionamento.

“Quando estamos no campo da jurisprudência, os juízes e tribunais escolhem aquela que acham correta. O juiz, se quiser, acha um acórdão aqui do STJ e, mesmo que tenham outros 30 acórdãos posteriores com outra posição, ele define aquele primeiro como jurisprudência e coloca na decisão”, pontua. Esse é uma questão a ser trabalhada internamente no STJ, no futuro próximo: o tribunal não tem meios efetivos de indicar quando um precedente foi superado.

A presidência tem, desde 2019, uma proposta de emenda regimental para criar a classe recursal chamada “proposta de revisão de tema (PRT)”, o que pode ajudar na visibilidade dessa transformação jurisprudencial. Essa funcionalidade seria interessante especialmente porque, como já mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o STJ é seriamente afetado pela “zona de penumbra” que existe com o Supremo Tribunal Federal.

Segundo o ministro Rogerio Schietti, ainda há muito o que trabalhar na gestão de precedentes. Mesmo dentro do STJ. Hoje, a 2ª Seção é a que menos utiliza desse instrumento, apesar de ser a única que tem o luxo de, efetivamente, dar a última palavra, já que temas de Direito Privado são pouco tutelados pela Constituição e, portanto, raramente chegam ao STF. Talvez por isso, o colegiado mantém a prática de só firmar tese quando o tema foi enfrentando e pacificado pelas 3ª e 4ª Turmas.

Na 3ª Seção, de Direito Criminal, o interesse é crescente em construir precedentes qualificados, devido à explosão do número de processos recebidos — embora a maioria venha em Habeas Corpus. A constante no STJ é a excelência como a 1ª Seção, de Direito Público, trabalha com os repetitivos. É a única que faz uma sessão de julgamento por mês dedicada à definição de teses. Dos 934 temas julgados até dezembro de 2023, 537 são da 1ª Seção (57,4% do total).

O impacto disso não pode ser desprezado. Há 10 anos, quando a gestão de precedentes foi iniciada no tribunal, a 1ª Seção recebia 41,8% dos recursos distribuídos. Hoje, essa distribuição corresponde a 23,8% do total. A redução percentual não pode ser unicamente creditada às teses firmadas, já que isso passa, por exemplo, pela explosão de HCs na 3ª Seção. Mas ministros da 1ª Seção entendem que a situação seria muito pior se o colegiado não tivesse se devotado tanto à construção dos precedentes qualificados.

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CJF aprova propostas de anteprojetos de lei para criação de turma recursal e varas federais em Seções Judiciárias

Os processos foram analisados durante a sessão de julgamento desta segunda-feira (24) no TRF6

O Colegiado do Conselho da Justiça Federal (CJF) aprovou, por unanimidade, duas propostas de anteprojetos de lei para criação de varas federais e de turma recursal em Seções Judiciárias das 1ª e 4ª Regiões. Os processos foram relatados pela presidente do CJF, ministra Maria Thereza de Assis Moura, durante a sessão de julgamento desta segunda-feira (24), na sede do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), em Minas Gerais (MG).

As propostas preveem a criação de oito varas federais na Seção Judiciária de Santa Catarina (SC), sob jurisdição do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), e da 2ª Turma Recursal na Seção Judiciária do Piauí (PI), que compõe o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). Com a aprovação, os anteprojetos serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para apreciação.

Os estudos sobre o impacto orçamentário e financeiro oriundo das ampliações foram realizados pelos respectivos TRFs e tiveram a viabilidade confirmada pelas áreas de orçamento do CJF, com base nos critérios estabelecidos pela Resolução CNJ n. 184/2013 do Conselho Nacional de Justiça, considerando a produtividade comparada da Justiça e a distribuição de casos novos.

Processos n. 0008882-86.2022.4.04.8000 e n. 0000854-54.2024.4.90.8000.

Fonte: CJF

STF vai reiniciar análise sobre multa de 150% por sonegação fiscal

Um pedido de destaque do ministro Flávio Dino interrompeu, na última sexta-feira (21/6), o julgamento de repercussão geral no qual o Plenário do Supremo Tribunal Federal discute a validade da multa de 150% aplicada pela Receita Federal em casos de sonegação, fraude ou conluio.

Com isso, a análise do caso será reiniciada em sessão presencial, ainda sem data marcada. Antes do pedido de destaque, o julgamento era virtual, com término previsto para a próxima sexta-feira (28/6).

Até então, apenas dois ministros haviam se manifestado. Ambos consideraram legítima a aplicação da multa de até 150% do débito tributário em casos de reincidência.

Multa de 150% é aplicada pela Receita em casos de sonegação, fraude ou conluio

 

Contexto

O recurso em questão contesta uma multa de 150% aplicada com base na antiga redação do inciso II do artigo 44 da Lei 9.430/1996, que previa tal sanção nos lançamentos de ofício em casos de sonegação, fraude ou conluio.

 

No último ano, essa lei foi alterada. Na redação atual, a multa para tais casos é de 100% do débito tributário. Se houver reincidência, a taxa sobe para 150%.

No caso concreto, a Receita multou um posto de combustível em 150%, por entender que o estabelecimento fazia parte de um grupo econômico, mas se separava das demais empresas com o intuito de não pagar impostos.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região validou a multa. Em recurso extraordinário, o posto alegou que o percentual tinha caráter confiscatório e argumentou que o inciso IV do artigo 150 da Constituição proíbe o uso de tributo com efeito de confisco.

Voto do relator

Antes do pedido de destaque de Dino, o ministro Dias Toffoli, relator do caso, já havia depositado seu voto, acompanhado por Alexandre de Moraes.

Para os dois ministros, até que seja aprovada uma lei complementar sobre o tema, os percentuais definidos em 2023 (100% para primeiras ocasiões e 150% em caso de reincidência) são os tetos para multas tributárias por sonegação, fraude ou conluio.

Eles propuseram que o entendimento tenha validade a partir da data da publicação da ata do julgamento e não seja aplicado a ações judiciais pendentes de conclusão até essa data.

Além disso, sugeriram que os entes federados ainda tenham competência para criar regras diferentes, desde que mais favoráveis ao contribuinte.

No voto, Toffoli considerou que a gravidade das condutas justifica o percentual elevado da multa, proporcional ao ilícito cometido.

De acordo com ele, não é justo penalizar no mesmo patamar um contribuinte que deixa de pagar ou de declarar um tributo sem intenção e outro contribuinte que sonega, frauda ou age em conluio.

Neste último caso, a punição deve ser mais severa. Para o relator, o percentual de 150% é razoável, porque reprime tais condutas.

O magistrado ainda destacou que a ideia de confisco envolve atingir uma parcela significativa do patrimônio ou da renda do contribuinte, capaz de ameaçar sua sobrevivência.

Em casos de sonegação, fraude ou conluio, há enriquecimento ilícito. Por isso, é difícil diferenciar a riqueza lícita da ilícita, e consequentemente saber se a multa ultrapassa as possibilidades do contribuinte.

Toffoli ainda ressaltou a necessidade de gradação da multa até o teto de 150%, “levando-se em conta a individualização da conduta do agente”.

No caso concreto, como o TRF-4 não mencionou reincidência do posto, o ministro considerou necessário reduzir a multa para 100% do débito tributário.

Clique aqui para ler o voto de Toffoli
RE 736.090

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Processo na ARP: conheça a função da Assessoria de Admissibilidade, Recursos Repetitivos e Relevância do STJ

Depois de verem seu processo chegar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), muitos advogados podem estranhar que os autos não sejam distribuídos diretamente ao ministro relator, mas, em vez disso, sejam encaminhados à Assessoria de Admissibilidade, Recursos Repetitivos e Relevância (ARP). Afinal, o que faz esse departamento que vez ou outra aparece no andamento processual? Criada em 2007 com o nome de Núcleo de Agravos da Presidência (Napre), a ARP é o órgão vinculado à Presidência do STJ que, na função de assessoramento, elabora minutas de decisões e despachos nos processos originários e recursais ainda não distribuídos. Antes mesmo da distribuição do processo ao relator, a ARP auxilia a Presidência no cumprimento de uma série de atribuições previstas no artigo 21-E do Regimento Interno do STJ, entre elas: a) analisar pedidos de desistência, autocomposição e habilitação em razão de falecimento de uma das partes; b) decidir pedido de gratuidade de justiça; c) determinar o cancelamento do registro do feito se a parte, após intimação, não realizar o pagamento das custas e despesas processuais; d) apreciar habeas corpus e revisões criminais inadmissíveis por incompetência manifesta, enviando os autos ao juízo competente; e e) não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não apresentar impugnação específica aos fundamentos da decisão recorrida.

ARP não analisa mérito de processos

No âmbito da ARP, não há análise de mérito dos processos: a função principal da unidade é verificar a admissibilidade dos casos que aportam no STJ. Conforme explica o assessor-chefe da ARP, Rodrigo Duarte Campos, essa análise de admissibilidade, na verdade, tem início na Seção de Triagem de Pressupostos Recursais, vinculada à Secretaria Judiciária. Nessa fase, os recursos especiais que cumpram os requisitos de admissibilidade (como tempestividade, existência de procuração, exaurimento da instância anterior e preparo recursal) são distribuídos aos relatores. Já os agravos em recurso especial, ainda que preencham esses requisitos, são registrados à Presidência e remetidos à ARP para verificação. Ainda de acordo com Rodrigo Campos, uma dúvida recorrente entre os operadores do direito é sobre o envio à Presidência (e, por consequência, à ARP) de um processo que, devido ao instituto da prevenção, deveria ser atribuído ao ministro do STJ que já tomou conhecimento daquela causa. Contudo, o assessor-chefe da ARP explica que a prevenção é analisada apenas se o processo supera a fase de admissibilidade. Rodrigo Campos informa que os agravos em recurso especial (AREsps) constituem a classe processual mais analisada pela ARP, porém outras classes também podem ser objeto de exame na unidade, como recursos especiais (REsps), embargos de divergência em recurso especial (EREsps) e em agravo em recurso especial (EAREsp), recursos em mandado de segurança (RMSs) e habeas corpus (HCs). No caso dos HCs, explica Campos, a análise da ARP é restrita às hipóteses de aplicação da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal (STF) e de algumas matérias específicas de execução penal.

Pressupostos, admissibilidade cotejada e suficiência: os filtros da ARP

Para análise dos REsps e AREsps que chegam via Presidência, a ARP desenvolveu uma série de filtros e protocolos, baseados principalmente na legislação e na jurisprudência. Em relação aos filtros, os AREsps submetidos à unidade passam, conforme o caso, por três fases: a) pressupostos objetivos; b) admissibilidade cotejada; c) suficiência. São filtros sucessivos, ou seja, o processo só é examinado sob o filtro seguinte se ultrapassar a etapa anterior. Caso o processo ultrapasse essas três etapas, a Presidência do STJ determina a sua distribuição. O regimento interno também prevê a distribuição quando a parte apresenta recurso (agravo interno) contra a decisão da Presidência nas hipóteses do artigo 21-E e não há retratação. Conforme ressalta o assessor-chefe da ARP, os filtros se destinam apenas às classes processuais REsp e AREsp. As demais classes analisadas na ARP não passam por esses três filtros porque têm critérios próprios de admissibilidade.

Mais de 95% das decisões da Presidência com origem na ARP são mantidas

A efetividade dos procedimentos adotados pela ARP é demonstrada pelas estatísticas mais recentes da unidade: entre janeiro e dezembro de 2023, nos casos em que houve recurso contra decisão da Presidência baseada em análise da ARP, a taxa de provimento foi de apenas 4,54%, ou seja, mais de 95% dos julgados da Presidência foram mantidos. Saiba o significado de termos publicados nesta notícia:
  • 1º termo – Repetitivos: Recurso repetitivo é um recurso escolhido para ser julgado como representativo de uma questão jurídica presente em muitos outros processos, para que a tese fixada pelo tribunal seja aplicada na solução dos casos semelhantes em todo o país.
  • 2º termo – Intimação: A comunicação escrita para dar ciência de atos e termos de um processo.
  • 3º termo – Habeas Corpus: Habeas corpus (sigla HC) é uma ação para assegurar a liberdade de locomoção, quando violada ou ameaçada de violação por ilegalidade ou abuso de poder. Também é o nome da ordem dada pela Justiça para corrigir a ilegalidade.
  • 4º termo – Incompetência: Falta de capacidade legal para julgar um processo ou tomar uma decisão.
  • 5º termo – Não conhecer: Ao “não conhecer” do recurso (ou de qualquer pedido), o tribunal está decidindo, por alguma razão preliminar, que ele não será admitido para o exame do mérito. Assim, o tribunal deixa de analisar os argumentos do recorrente, sem acolher nem rejeitá-los.
  • 6º termo – Prejudicado: Recurso que perdeu seu objeto, que não é mais julgado.
  • 7º termo – Mérito: A questão principal (ou o conjunto das questões principais) do processo, na qual se baseia o pedido do autor.
  • 8º termo – recursos especiais: O recurso especial (sigla REsp) é dirigido ao STJ para contestar possível má aplicação da lei federal por um tribunal de segundo grau. Assim, o REsp serve para que o STJ uniformize a interpretação da legislação federal em todo o país.
  • 9º termo – Preparo: Despesas que compreendem custas processuais e gastos com o envio do processo pelo correio (no caso de processo físico).
  • 10º termo – agravos em recurso especial: Agravo em recurso especial (sigla AREsp) é o recurso contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal de origem que não admitiu a subida do recurso especial para o STJ. Seu objetivo é convencer o STJ a aceitar o recurso especial para julgamento do mérito.
  • 11º termo – Prevenção: Concorrendo dois juízes igualmente competentes para um caso, fica prevento, ou seja, responsável pelo caso o primeiro a decidir sobre a matéria.
  • 12º termo – Embargos de divergência: Embargos de divergência são um recurso contra decisão de órgão fracionário que divergiu do entendimento de outro órgão fracionário do mesmo tribunal. No STJ, as siglas são EREsp (embargos de divergência em recurso especial) e EAREsp (embargos de divergência em agravo em recurso especial).
  • 13º termo – Mandado de Segurança: Ação prevista constitucionalmente para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público.
  • 14º termo – Agravo interno: Agravo interno (sigla AgInt) é o recurso contra decisão individual do relator no processo civil.
  • 15º termo – Provimento: Ato de prover. Dar provimento a recurso significa acolher o pedido para reformar ou anular decisão judicial anterior. No direito administrativo, é o ato de preencher vaga no serviço público.
— Fonte: STJ

Risco de crises ronda tese de dívida de condomínio de imóvel financiado

Ao definir se o banco que concede o financiamento para a compra de um imóvel pode ser arrastado para arcar com a dívida de condomínio feita pelo comprador, o Superior Tribunal de Justiça  pode estar incentivando uma crise quase tão grave quanto a da hipoteca, que arrasou o mercado imobiliário em 1980.

O impacto negativo do julgamento sobre a possibilidade de penhorar um imóvel comprado com contrato com alienação fiduciária para quitar a taxa de condomínio é o principal fator levantado até agora pelo mercado. O tema será apreciado pela 2ª Seção.

Na alienação fiduciária, o banco dá o crédito para a compra do bem e se torna o proprietário. O comprador fica na posse e pode usufruir do imóvel, mas só recebe a propriedade depois de quitar as parcelas.

O imóvel, portanto, é a garantia real do financiamento. Se o devedor fiduciante não honrar as parcelas, a propriedade se consolida em favor do credor fiduciário (banco), que leva o bem a leilão para quitar a dívida e os encargos. O que sobrar — se sobrar — volta para o devedor.

Esse sistema, inaugurado pela Lei 9.514/1997, certamente será impactado se o STJ entender que o imóvel pode ser penhorado para quitar uma dívida em favor de quem não faz parte dessa relação: o condomínio.

A obrigação de pagar condomínio é propter rem (da própria coisa). A discussão é se o banco, que é proprietário da coisa, mas não usufrui dela, pode ser arrastado para essa relação.

Se isso não for possível, como ficam os condomínios, responsáveis pelo rateio das despesas e por garantir a manutenção e operação do próprio imóvel, em favor da valorização e preservação do bem?

Tamanho do problema

Essas crises são tão reais que o Judiciário ora pende para um lado, ora para outro. O STJ, responsável por uniformizar a interpretação do direito federal, também passou a divergir.

A 3ª Turma entende que não é possível penhorar o imóvel, mas apenas seu direito real de aquisição — ou seja, o direito de assumir a propriedade do bem, uma vez que a dívida seja quitada com o banco credor fiduciário.

Já a 4ª Turma diz que é possível a penhora do imóvel que originou a dívida, em razão da natureza propter rem da dívida condominial, a qual alcança tanto aquele que tem a posse (o devedor) como aquele que tem a propriedade (o banco).

Pedro França/STJ

Antonio Carlos Ferreira 2024
Antonio Carlos Ferreira é o relator do recurso que será julgado na 2ª Seção

A 2ª Seção do STJ tem um recurso especial afetado para pacificar a questão. Relator, o ministro Antonio Carlos Ferreira promoveu audiência pública sobre o tema, ocasião em que ficou claro que caberá à corte observar bem a chance de crises.

A discussão se insere em um mercado de crédito imobiliário que, em fevereiro de 2024, tinha mais de R$ 1 trilhão de saldo, segundo dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Esse valor representa cerca de 10% do produto interno bruto (PIB) brasileiro.

Há um evidente impacto social, já que 40% dos tomadores de crédito estão em famílias com renda de até três salários-mínimos. E afeta principalmente a Caixa Econômica Federal, hoje a principal agente do Sistema de Financiamento Habitacional (SFH), responsável por 70% do crédito imobiliário no Brasil.

Por outro lado, os condomínios por todo o país reúnem cerca de 23,5 milhões de pessoas, com faturamento anual de R$ 46 bilhões em taxas condominiais, segundo dados da Confederação Nacional do Comércio.

Levantamento da administradora BrCondos divulgado pelo Estadão mostrou que, entre janeiro de 2023 a janeiro de 2024, a média de inadimplência dessas obrigações ultrapassou 11%. Há um universo de casos em que a penhora pode ser a saída para evitar a ruína condominial.

A experiência da hipoteca

Independentemente de como o STJ definir a questão, sistema nenhum vai ruir — nem o de financiamento da habitação, muito menos o de rateio de despesas dos condomínios. Mas haverá impacto e, possivelmente, crises. E a resposta a essas crises é o mais importante.

Para os que defendem a impenhorabilidade do imóvel alienado fiduciariamente, o melhor exemplo vem da crise da hipoteca, instrumento que, até o surgimento da alienação fiduciária, era a principal garantia para o financiamento imobiliário.

Lucas Pricken/STJ

Audiência Pública STJ 2ª Seção
2ª Seção do STJ promoveu audiência pública sobre o tema

Na hipoteca, o comprador dá o imóvel como garantia do financiamento, com o registro na matrícula junto ao cartório. Se houver inadimplência, o banco pode ajuizar a ação para requerer a propriedade do bem.

Além de ser um instrumento mais moroso e burocrático, a hipoteca ruiu no Brasil na década de 1980, em decorrência da hiperinflação e da crise que levou à extinção do Banco Nacional da Habitação (BNH), então o responsável por financiar empreendimentos imobiliários.

Em 1984, quando a inflação atingiu inimagináveis 246%, a ditadura militar percebeu que os tomadores de financiamento não conseguiriam arcar com os reajustes das parcelas e do saldo devedor. Por meio de decreto-lei, limitou a correção a 112%.

A diferença ficou para ser paga pelo Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS), criado em 1967 justamente para quitar saldos remanescentes de financiamentos imobiliários concedidos pelos mutuários do Sistema Financeiro de Habitação.

O resultado foi um rombo no FCVS que persiste até hoje. Em 1994, quando o Plano Real foi criado, era de R$ 1 bilhões. Em 2023, o jornal Valor Econômico noticiou que o governo federal buscava soluções para honrar créditos que já alcançavam R$ 92 bilhões.

Nesse cenário, a criação da garantia por alienação fiduciária renovou o financiamento imobiliário, viabilizando o retorno do capital ao mercado habitacional, tudo baseado em uma grande segurança: a garantia real representada no próprio imóvel.

Lucas Pricken/STJ

Melhim Namem Chalhub
Melhim Namem Chalhub participa de audiência pública no STJ

Crédito mais caro

Anselmo Moreira Gonzalez, pela Febraban, destacou na audiência pública no STJ que a taxa de juros do crédito imobiliário é menor hoje porque há 20 anos a lei e o Judiciário vêm dando segurança a esse sistema. Quanto melhor é a garantia, menor o custo do capital.

“Não queremos atrair para ambiente de crédito imobiliário os problemas que vimos com a hipoteca”, disse. José Carlos Baptista Puoli, que falou pelo Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de São Paulo (Secovi-SP) seguiu a mesma linha.

“A penhora que venha a atingir o patrimônio de quem não é devedor ou detentor da responsabilidade pelo condomínio trará problemas creditórios importantes, com a diminuição do volume de relações creditícias”, disse.

Na análise de Melhim Namem Chalhub, que representou a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), o temor é que decisões equivocadas hoje, como as da década de 1980, causem impacto negativo duradouro nesse sistema.

“Vai aumentar o custo do financiamento, porque o credor vai colocar na conta a eventualidade de ele ter que desembolsar o custo do condomínio. E, ao permitir-se isso, abre-se a porta para amanhã ou depois colocar também o IPTU ou o IPVA. E tem gente que defende isso”, disse, à revista eletrônica Consultor Jurídico.

Regina Céli Silveira Martins, pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), apontou que o banco financiador tem apenas uma forma de garantir a operação: usufruindo do imóvel como garantia real. Já os condomínios têm à disposição diversas ferramentas autorizadas pelo Judiciário e pela jurisprudência para cobrar a dívida.

Na prática, o banco sequer sabe que o devedor fiduciante está endividado, principalmente se ele estiver em dia com as parcelas do financiamento. “É justo o credor fiduciário perder sua garantia em razão de um condomínio não diligente?”, indagou. “É justo responder por um débito de condomínio de um imóvel que ele não pode usar e dispor?”, complementou.

Lucas Pricken/STJ

Marco Aurélio Bellizze e Antonio Carlos Ferreira 2024
Marco Aurélio Bellizze participou da audiência pública organizad por Antonio Carlos Ferreira 2024

A última chance

Para os condomínios, a penhora do próprio imóvel é mesmo a última chance, diante de devedores recalcitrantes. Principalmente porque a outra opção, de penhorar os direitos aquisitivos, é muito menos atrativa.

Roberto Garcia Merçon, que representou o Sindicato Patronal de Condomínios do Espírito Santo (Sipces), alertou que a possibilidade de penhora do bem é uma condição fundamental para evitar a inadimplência dos condôminos.

“Uma vez sabido dentro dessas comunidades de que o imóvel alienado fiduciariamente não vai ser mais passível de penhora, essa inadimplência vai crescer e muito”, disse.

O comprador em crise, ao perceber que terá que escolher para quem dever, perceberá que melhor será sacrificar o condomínio — justamente a entidade que faz o rateio das despesas, que é responsável pela imediata conservação do bem.

A melhor aposta é confiar no argumento vencedor na 4ª Turma: a obrigação de pagar o condomínio é ligada ao imóvel. Se há dois titulares de direito sobre a coisa — um com a propriedade, outro com a posse — ambos podem ser responsabilizados.

“O que é obrigação propter rem?”, indagou Marcus Vinicius Kikunaga, pela Academia Nacional de Direito Notarial e Registral (Ad Notare). “É uma obrigação de natureza mista. É aquela que surge da coisa e obriga seu titular, seja quem for. Na alienação fiduciária, temos dois titulares de direitos reais sobre a coisa”, seguiu.

Rubens Carmo Elias Filho, por sua vez, destacou que, quando o artigo 1.368-B do Código Civil diz que o credor fiduciário só responde pela taxa condominial a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem, isso não se aplica ao condomínio.

“Ela é aplicada no acertamento de contas entre credor fiduciário e devedor fiduciante. É uma regra prevista para que, no momento em que o credor consolidar a propriedade, se defina quando ele passa a pagar ou não, inclusive para consolidação da dívida.”

Rubens falou na audiência pública em nome de três entidades: Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC-SP), a Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (ABADI) e Associação Brasileira de Empresas do Mercado Imobiliário (ABMI).

REsp 1.929.926

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