Comissão aprova projeto que disciplina despejo extrajudicial por atraso de aluguel

A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que disciplina o despejo extrajudicial de inquilino por atraso no pagamento dos alugueis.

A medida permite a retomada do imóvel sem necessidade de recorrer à justiça. O procedimento será mais rápido, realizado através de cartório de registro de títulos.

Audiência Pública - Microgeração e minigeração de energia elétrica distribuída, Dep, Celso Russomano (REPUBLICANOS - SP)
Russomano: caminhos alternativos para a solução de conflitos são mais céleres e eficazes – Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
 

O Projeto de Lei 3999/20, do deputado Hugo Leal (PSD-RJ), foi aprovado com parecer favorável do relator, deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP).

Passos
O texto, que ainda será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), prevê os passos do despejo extrajudicial. Os principais são:

  • o locador deverá requerer ao cartório a notificação do locatário para desocupar o imóvel ou pagar a dívida no prazo de 15 dias corridos, sob pena de desocupação compulsória;
  • o prazo será contado a partir da certificação da notificação pelo cartório;
  • a notificação deverá ser acompanhada dos alguns documentos, como a planilha dos débitos;
  • a notificação será preferencialmente eletrônica, quando convencionada, ou pessoal;
  • ocorrendo a desocupação, o cartório entregará as chaves ao locador;
  • transcorrido o prazo da notificação sem a desocupação voluntária ou o pagamento total da dívida, o locador poderá requerer na justiça o despejo compulsório;
  • a ordem de desocupação será concedida em caráter liminar para cumprimento em 15 dias, independentemente do tipo de garantia prevista no contrato de aluguel.

A proposta aprovada também disciplina o direito do inquilino de devolver o imóvel, medida que poderá ser feita igualmente por cartório. O locatário poderá usar o expediente, por exemplo, quando houver recusa injustificada do proprietário em receber a casa alugada.

O locador poderá pedir a lavratura de ata notarial para comprovar o estado do imóvel e evitar controvérsias futuras. A devolução do imóvel, no entanto, não afasta eventuais cobranças pelo locador, como contas de água e luz em atraso.

Desjudicialização
O relator elogiou a proposta do deputado Hugo Leal. Segundo Russomanno, o projeto contribui para desafogar a justiça de ações de despejo. “Os caminhos alternativos para a solução de conflitos vêm se mostrando como a forma mais célere e eficaz de se garantir o acesso à Justiça”, disse.

Russomano apresentou um texto substitutivo incorporando sugestões de membros da comissão. Entre outros pontos, reduziu de 30 para 15 dias o prazo para o locatário pagar as dívidas após a notificação. Também permitiu o retorno imediato do imóvel ao locador se o cartório identificar que ele está vazio.

Fonte: Câmara dos Deputados

Ministros Reynaldo Soares da Fonseca e Messod Azulay Neto são empossados no CJF

A sessão aconteceu nesta segunda-feira (27), na sede do CJF, em Brasília

O Conselho da Justiça Federal (CJF) realizou sessão ordinária de julgamento nesta segunda-feira (27) e deu posse aos novos membros do Colegiado. Os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca e Messod Azulay Neto foram empossados como membro efetivo e suplente, respectivamente. A cerimônia foi presidida pela ministra Maria Thereza de Assis Moura, presidente do CJF.

Ao dar as boas-vindas aos novos membros, a ministra Maria Thereza destacou: “Os dois ministros são oriundos da Justiça Federal e, portanto, bem conhecem já o funcionamento do Conselho e a nossa causa. Ambos são magistrados reconhecidos por sua competência, seu compromisso com a jurisdição, com a participação ativa nos trabalhos e projetos do STJ e permanente atualização acadêmica. Temos certeza de que brilharão aqui.”.

Novos conselheiros

Ao ter a palavra, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca registrou a longa trajetória dele na magistratura e a importância da colaboração e do compromisso com a Justiça Federal: “Chego, aos 60 anos, ao Conselho da Justiça Federal, com muita alegria ao lado de tantos amigos queridos, sendo 42 anos dedicados ao serviço público”, pontuou.

O ministro Messod Azulay Neto também expressou gratidão: “É uma satisfação dupla estar aqui nesse Conselho, pois já participei anteriormente como presidente do TRF da 2ª Região. Hoje, retorno como membro do STJ, ainda na gestão da ministra Maria Thereza e reafirmo meu compromisso com este Conselho e com a Justiça Federal”.

Homenagens e continuidade

Ainda na sessão, a ministra Maria Thereza comunicou a última participação, no Pleno, do juiz federal Nelson Alves, que deixará a presidência da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

O magistrado agradeceu a oportunidade de representar a entidade no Conselho: “Neste biênio aprendi muito e espero ter levado aos colegas associados alguma resposta aos anseios que manifestaram desde o início da nossa gestão”.

Nelson Alves será sucedido pelo juiz federal Caio Marinho, eleito para comandar a Ajufe no biênio 2024/2026.

Fonte: CJF

STJ vai definir início dos juros por danos morais a anistiado político

A controvérsia, cadastrada como Tema 1.251 na base de dados do STJ, está em “definir o termo inicial dos juros de mora, nos casos em que reconhecido judicialmente o direito à indenização por danos morais a anistiado político ou seus sucessores, nos termos da Lei 10.559/2002″.

Dinheiro, reais, real, imposto
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça afetou dois recursos especiais de relatoria do ministro Afrânio Vilela para julgamento pelo rito dos repetitivos.

 

O colegiado decidiu suspender o trâmite de todos os processos individuais ou coletivos, na segunda instância ou no STJ, que versem sobre a mesma matéria e nos quais tenha havido a interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial — observada a orientação do artigo 256-L do Regimento Interno do STJ.

Segurança e transparência

No REsp 2.031.813, a União defende que os juros moratórios incidentes na indenização por danos morais, em caso de anistiado político, devem ser contabilizados a partir do arbitramento da condenação. Subsidiariamente, requer a aplicação dos juros a partir da data da citação. Por outro lado, o indenizado pede a incidência dos juros desde a data do evento danoso.

De acordo com o ministro Afrânio Vilela, a Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ constatou a existência de dois acórdãos e 153 decisões monocráticas sobre o assunto nas turmas que compõem a 1ª Seção.

O relatou verificou ainda que apenas no âmbito do acordo de cooperação entre a Advocacia-Geral da União e o STJ, nos anos de 2021 e 2022, foram distribuídos ao menos 55 processos relacionados à matéria.

“A tese a ser adotada contribuirá para oferecer maior segurança e transparência na solução da questão pelas instâncias de origem e pelos órgãos fracionários desta corte, porquanto o tema ainda não recebeu solução uniformizadora, concentrada e vinculante sob o rito especial dos recursos repetitivos, apesar de ser recorrente na jurisprudência de ambas as turmas que compõem a Primeira Seção do STJ”, disse Afrânio Vilela.

Recursos repetitivos

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 2.031.813
REsp 2.032.021

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STJ reconhece que pagamento direto do FGTS foi eficaz, mas assegura à União cobrança de outras parcelas

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1.176), reconheceu a eficácia dos pagamentos a título de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) feitos diretamente ao empregado após a publicação da Lei 9.491/1997, em decorrência de acordos homologados na Justiça do Trabalho. Embora tais pagamentos diretos contrariem a legislação em vigor, o colegiado entendeu que não há como desconsiderar que eles foram amparados em acordos homologados pelo juízo trabalhista.

No mesmo julgamento, a Primeira Seção garantiu à União e à Caixa Econômica Federal (CEF) a possibilidade de cobrarem do empregador todas as parcelas que deveriam ser incorporadas ao fundo, como multas, correção monetária, juros e contribuições sociais – parcelas que não pertencem ao trabalhador e que ficaram fora do acordo na Justiça do Trabalho.

Com a fixação da tese repetitiva, poderão voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial, no STJ ou na segunda instância, que estavam suspensos à espera da definição do precedente qualificado.

Acordos são homologados na Justiça por decisão irrecorrível

O ministro Teodoro Silva Santos, relator, explicou que a Lei 8.036/1990, em sua redação original, previa o pagamento de algumas parcelas integrantes do FGTS diretamente ao trabalhador, a exemplo do depósito do mês da rescisão e da indenização de 40% do fundo, no caso de demissão sem justa causa. No entanto, a Lei 9.9491/1997 alterou o artigo 18 da Lei 8.036/1990 para determinar que todas as quantias devidas pelo empregador fossem depositadas na conta vinculada do empregado.

Segundo o ministro, ainda que a lei dispusesse claramente sobre a necessidade de depósito de todas as parcelas devidas do FGTS na conta vinculada, houve muitos acordos em processos trabalhistas que estabeleceram o pagamento direto para o trabalhador, e tais acordos muitas vezes não era comunicado à CEF, o que levava à proposição de execução fiscal contra o empregador para cobrança do fundo.

“Embora realizado em termos contrários ao que dispõe a legislação de regência, não se pode desconsiderar que o acordo foi submetido ao crivo do Judiciário”, afirmou o relator, lembrando que a decisão homologatória do acordo é irrecorrível (artigo 831, parágrafo único, da CLT) e faz coisa julgada material, sujeitando-se apenas à ação rescisória (Súmula 259 do Tribunal Superior do Trabalho), cuja apreciação compete à própria Justiça do Trabalho.

Para ele, não cabe à Justiça Federal nem ao STJ, “à míngua de competência jurisdicional para tanto”, no julgamento de embargos à execução fiscal, ação anulatória, ação declaratória da inexistência do débito ou de qualquer outra via processual, adentrar no mérito da decisão homologatória para corrigi-la ou desconsiderá-la e assim reconhecer a ineficácia do pagamento feito em desacordo com a determinação legal.

União e CEF não participaram do acordo trabalhista e não podem ser prejudicadas

O ministro declarou que esse cenário não afasta a obrigatoriedade do pagamento, pelo empregador, das parcelas do FGTS que devem ser incorporadas ao fundo e que não pertencem ao trabalhador, como multas, correção monetária e juros moratórios, além da contribuição social decorrente da demissão sem justa causa – inclusive porque o titular do crédito (União) e o agente operador do fundo (CEF) não participaram da celebração do acordo na Justiça do Trabalho, não podendo ser prejudicados pelo acerto entre patrão e empregado.

“Destarte, embora não se possa negar, no âmbito da Justiça Federal, a eficácia aos pagamentos homologados pelos magistrados trabalhistas sem prévio corte rescisório do decisum pela própria Justiça especializada, ressalva-se a cobrança das parcelas não alcançadas pelo acordo celebrado e, portanto, não acobertadas pela coisa julgada“, concluiu o ministro.

Fonte: STJ

A inconstitucional dupla incidência de ITBI e CIBS na venda de imóveis

Aconteceu na semana passada o 3º Congresso do IAT (Instituto de Aplicação do Tributo), presidido pelo incansável professor Tácio Lacerda Gama. Muitas opiniões surgiram nos diversos painéis do evento em decorrência das inúmeras modificações tributárias ocorridas em nosso ordenamento jurídico, no âmbito da tributação do consumo, da renda e da propriedade, com destaque para a recente EC 132, que ainda ocasionará muitas discussões doutrinárias e jurisprudenciais.

Um dos debates envolveu a possibilidade de superposição entre a incidência da CBS e do IBS (que, simplificadamente já grafo como CIBS) e o ITBI em operações de compra e venda de imóveis.

A hipótese é simples. Uma construtora vende um imóvel para um indivíduo e as normas municipais preveem a incidência de ITBI, por força do artigo 156, II, CF. Ocorre que também está prevista a incidência de IBS (artigo 156-A, parágrafo 1º, I, CF), embora esteja sujeito a regime específico de tributação (artigo 156-A, parágrafo 6º, II, CF), o que também se aplica à CBS (artigo 195, parágrafo 16).

O PLP 68 prevê a incidência da CIBS sobre a alienação de bens imóveis, inclusive em caso de incorporação imobiliária (artigo 234), tendo por base de cálculo o valor da operação (artigo 239), que é o mesmo utilizado para o ITBI. Observa-se, contudo, que a base de cálculo da CIBS é até mesmo mais ampla do que a do ITBI, pois prevê sua incidência inclusive sobre os juros do financiamento imobiliário (artigo 239, parágrafo 1º, I). Identifica-se um enorme âmbito de superposição, mas a base de cálculo da CIBS é mais ampla que a do ITBI.

Há inconstitucionalidade? Entendo que sim, de forma ainda potencial, pois o PLP 68 é, por ora, apenas um projeto de lei complementar. Caso aprovado tal qual proposto, diversas normas constitucionais e jurisprudência assente do STF ampararão tal arguição de inconstitucionalidade.

Como corrigir isso durante a tramitação do PLP? Uma hipótese é a de abater o que for pago de ITBI do montante de CIBS, uma vez que a base de cálculo desta é mais ampla do que daquela. Existem precedentes nesse sentido no âmbito das taxas ambientais.

Logo, dá para corrigir, pois ainda há tempo

O que não pode ocorrer é o terrorismo verbal que vem grassando, sob o argumento de que “caso alguma coisa seja alterara no PLP, a alíquota será maior do que 26,5%”. Ora, nenhum cálculo  absolutamente nenhum  foi disponibilizado de forma oficial para debate sobre essa alíquota. Da mesma maneira, nenhuma demonstração de impacto econômico foi feito sobre o projeto de reforma  mas, como já foi aprovada e transformada na EC 132, trata-se de página virada.

No mesmo sentido, não dá para se jogar fora toda a doutrina tributária “sob pena de acabar com a reforma aprovada”, como ouvi em um dos painéis. O orador se referia à doutrina sobre competência tributária, dizendo-a ultrapassada, e, se acatada, seria o “fim de tudo”. Puro terrorismo verbal.

Não podemos colocar nos debates técnicos a polarização que se vê na sociedade, criando tributaristas do bem e tributaristas do mal, como muito bem expôs Raquel Preto, no painel em que participei.

Sigo na torcida para que esta reforma tributária dê certo, e estou colaborando, como se vê, na medida do possível.

E parabenizo o Tácio Lacerda Gama e sua equipe pelo evento, sucesso de público e de crítica, que ainda renderá muitos bons debates.

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Lei 14.852/24: marco dos jogos eletrônicos e consumidores hipervulneráveis

O mercado de jogos eletrônicos tem crescido de modo imponente e veloz no Brasil, sobretudo no transcorrer do estado pandêmico experienciado devido à imperiosa reclusão dos indivíduos em seus lares.

De acordo com a Pesquisa Game Brasil 2024, mais de 73% dos brasileiros utilizam videogames e, nos últimos quatro anos, observa-se que, dentre as principais fontes de entretenimento, encontram-se os jogos digitais [1].

O aumento do número de usuários tem acarretado, por conseguinte, o ampliação do campo mercadológico e, segundo levantamento desenvolvido pela USP (Universidade de São Paulo),  em nível mundial, o setor denota-se em expansão, tendo movimentado mais de US$ 196,8 bilhões em 2022.

O crescimento exponencial desta seara contribuiu para que o nosso país ocupasse o primeiro lugar na América Latina e o 13º no ranking mundial, propiciando a movimentação de aproximadamente R$ 12 bilhões por ano [2].

A despeito da relevância para a economia brasileira, inexistia um marco legal sobre a temática, razão pela qual, em 3 de maio de 2024, foi editada a Lei nº 14.852, que engendrou também a alteração das Leis nºs 8.313/91, 8.685/93 e 9.279/96, que tratam, respectivamente, do incentivo à cultura, de questões audiovisuais e da propriedade industrial.

O conjunto normativo encontra-se composto por três capítulos que versam sobre aspectos preliminares, os jogos eletrônicos e a proteção das crianças e dos adolescentes. A segunda parte do diploma legal apresenta seis seções que tangenciam as definições, os princípios e as diretrizes fundamentais, bem como o enquadramento das empresas do setor e os requisitos para o desenvolvimento da atividade.

Há ainda regramento sobre o uso dos produtos/serviços e o fomento para a área, primando-se pela formação de recursos humanos e espaços para que seja incrementada.

Proteção dos usuários

Esta coluna tem o escopo específico de averiguar em que medida a novel legislação avançou na proteção dos usuários, na condição de consumidores, não objetivando abordar os demais aspectos vinculados a outros ramos jurídicos.

Nessa senda, serão tecidos comentários sobre os seguintes pontos: i) âmbito de incidência normativa; ii) requisitos para a exploração da atividade; iii) princípios regentes; e iv) regras protetivas dos destinatários finais. Considera-se jogo eletrônico, nos termos do artigo 5º da Lei nº 14.852/24, a obra audiovisual interativa desenvolvida como programa de computador, em que as imagens são alteradas em tempo real a partir de ações e interações do jogador com a interface. Neste conceito, estão acoplados também o dispositivo central e acessórios, para uso privado ou comercial, especialmente dedicados a executar as tarefas pertinentes.

A referida definição abarca, outrossim, o software, para utilização como aplicativo de celular e/ou página de internet, jogos de console de videogames e em realidade virtual, aumentada, mista e estendida, podendo ser consumidos por download ou streaming. Ressalta-se que o sobredito diploma não se aplica às modalidades lotéricas regulamentadas pelas Lei nºs 13.756/2018 e 14.790/2023, não incidindo em face das apostas esportivas, bem como de qualquer tipo de jogo que envolva resultado aleatório ou de prognóstico, com prêmios em ativos reais ou virtuais. Pressupõe um resultado decorrente do desempenho dos contendores no ambiente virtual e não da mera álea.

Empresários individuais e pessoas jurídicas podem explorar o setor desde que disponham de receita bruta de até R$ 16 milhões, no ano-calendário anterior, ou de R$ 1.333.334, quando se referir a período inferior, multiplicando-se pelo número de meses da atividade [3].

As ferramentas essenciais para o desenvolvimento dos jogos eletrônicos foram elencadas no art. 9º, incisos I a V, e exigem a presença de computadores, programas, licenças e software development kit (SDK).

Dentre os princípios vetores da Lei nº 14.852, previstos no artigo 6º, o inciso V menciona a defesa dos destinatários finais, a educação e a informação destes e dos fornecedores quanto aos seus direitos e deveres.

Sem embargo, nos demais dispositivos, não se vislumbra um detalhamento de como dar-se-á a necessária tutela, principalmente, quando envolver os hipervulneráveis, grupo no qual se enquadram as crianças, os adolescentes, os portadores de deficiência e os idosos. De fato, o inciso VI refere-se ao público infanto-juvenil e os artigos 15 a 17 congregam normas sobre os que não atingiram a maioridade [4], porém, quanto aos demais fragilizados, sob a ótica etária ou psíquica, não há qualquer menção.

Não obstante os incisos IV e VII, do aludido artigo 6º, priorizem o respeito aos direitos fundamentais, aos valores democráticos, à preservação da privacidade e dos dados pessoais, além da autodeterminação informativa, concebe-se que o legislador poderia ter melhor avançado, não olvidando dos mencionados consumidores hipervulneráveis.

Nota-se que o Marco Civil dos Jogos Eletrônicos direcionou-se sobremaneira para o fomento do empreendedorismo inovador, como vetor de evolução econômica, social, ambiental e cultural, mas quedou-se omisso quanto à essencial e premente proteção dos destinatários finais, especialmente, os mais fragilizados.

No artigo 10, incisos I a V, constam regras sobre o uso destes produtos, não o limitando ao entretenimento, mas, sim, admitindo-o para qualquer outra atividade lícita,  para fins artísticos, educacionais, terapêuticos, de treinamento, capacitação, comunicação e propaganda. O § 4º estatui que a sua utilização deverá observar o disposto na Lei nº 8.069/90, porém, o ideal e mais protetivo seria a previsão de que não somente o Estatuto da Criança e do Adolescente seja respeitado, prevendo-se o necessário cumprimento dos microssistemas sobre a juventude, os idosos, as pessoas com deficiência e, obviamente, também o consumerista [5].

Com esteio no artigo 173, da Constituição, o artigo 3º da Lei n.º 14.852/24 preconiza a liberdade de fabricação, desenvolvimento, importação, comercialização e uso comercial dos jogos eletrônicos. Em consonância com os parágrafos 1º e 2º, restou dispensada a prévia autorização estatal para o seu desenvolvimento e a sua exploração, competindo ao Estado realizar a classificação etária indicativa, considerando-se os riscos relacionados ao uso de mecanismos de microtransações [6].

Fiscalização

Crucial será que o poder público atente para a imprescindível fiscalização desta regra, pois, em conformidade com pesquisa empreendida pelo Instituto de Psicologia da USP, 28% dos jovens “fazem uso abusivo de videogames”, configurando-se “média acima da mundial” [7]. Providência assaz relevante será a análise conjunta destes produtos por parte dos órgãos e das entidades voltadas para a proteção dos consumidores e dos hipervulneráveis.

Digna de nota é a salutar preocupação com as crianças e os adolescentes mediante a determinação de que a concepção, o design, a gestão e o funcionamento dos jogos eletrônicos, direcionados para este público devem atender ao parâmetro do superior interesse daqueles. Exigem-se diligências adequadas e proporcionais para mitigar os riscos aos direitos dos infantes e jovens no  ambiente digital, que podem ser agregadas em três principais conjuntos: i) respeito às prerrogativas instituídas em sede constitucional e legal; ii) criação de canais de escuta e diálogo; e iii) salvaguardas que se coadunam com o ordenamento jurídico vigente.

Sob o primeiro ângulo, os fornecedores devem garantir que os serviços  e as estruturas não fomentem ou gerem quaisquer formas de negligência, exploração, violência, crueldade, opressão ou discriminação, providenciando garantir o desenho universal e a acessibilidade, nos moldes do Estatuto da Pessoa com Deficiência [8]. As ferramentas devem assegurar a restrição de compras por menores, de forma a garantir o consentimento dos responsáveis.

A viabilização do contato entre os fornecedores e o público infanto-juvenil, por intermédio de canais, foi objeto de disciplina legal, mas é fundamental que este intercâmbio seja acompanhado pelos órgãos públicos competentes e pelas famílias, com o escopo de se prevenir e debelar abusos.

O artigo 16, incisos I a VIII, da Lei n.º 14.852/24, estabelece salvaguardas para os jogos eletrônicos direcionados a crianças e adolescentes, que possibilitem a interação entre usuários por meio de mensagens de texto, áudio e vídeo, de modo síncrono ou assíncrono. Devem ser garantidos, no mínimo: i) sistema para reclamações; ii) respeito à transparência e à informação; e iii) ferramentas de supervisão e de moderação parental. O recebimento e o processamento das irresignações, diante de abusos e irregularidades cometidos por usuários, assim como os resultados, devem ser publicizados, possibilitando-se a revisão de decisão e a reversão de penalidades impostas.

Os dados, acima mencionados, devem ser registrados mediante o uso da língua portuguesa, de modo simples e facilitador da compreensão. Relembre-se que a Lei nº 8.078/90 determina essa obrigação perante todo e qualquer consumidor e não somente diante das crianças e dos adolescentes, destacando-se também os demais hipervulneráveis.

Do mesmo modo, a transparência social determinada pela Lei, em análise, em prol dos infantes e jovens, não pode limitar-se a este agrupamento. O conhecimento da quantidade de denúncias recebidas, as categorias de violações cometidas, o detalhamento dos métodos empregados para a remoção de conteúdos e o gerenciamento de comunidades são garantias que se aplicam a todos os usuários.

Apesar de presentes na seção que trata dos menores, são aspectos que interessam a todos os destinatários finais, reiterando-se estas mesmas considerações para o detalhamento dos métodos empregados para a mitigação de riscos, as sanções a serem cominadas para os infratores, incluídas as medidas utilizadas para impedir que criem contas adicionais em caso de banimento.

Impõem-se a manutenção e a atualização de ferramentas de supervisão e de moderação parental, que respeitem o desenvolvimento progressivo das capacidades e da autonomia das crianças e dos adolescentes, garantindo-se, ainda, o seu direito à informação sobre a ativação e os parâmetros dos mecanismos de acompanhamento.

Vedou-se que os fornecedores, em seus termos de uso, possibilitem trocas de conteúdos e de interações que violem os direitos destas categorias, respeitando-se a legislação brasileira. Conquanto a Lei nº 14.852/24 consista no inicial esforço de normatizar os jogos eletrônicos no Brasil, urge que seja regulamentada de tal modo a reconhecer o seu inescusável conexão com os microssistemas que protegem os demais consumidores, especialmente, os hipervulneráveis, não se restringindo-se aos menores.

Como é cediço, a sua efetividade dependerá dos esforços conjuntos dos órgãos e das entidades competentes, mas, também, do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e da Autoridade Nacional de Proteção de Dados. O percurso, a ser trilhado, exige integração, organização e eficiência, com vistas à promoção dos direitos de milhares de brasileiros.

* esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Porto, Roma 2 — Tor Vergata, Girona, UFMG, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC, UFMT, UFBA, UFRJ e Ufam).

___________________________________

[1] Desenvolvida pela pelo Sioux Group e Go Gamers, em parceria com Blend New Research e ESPM. Disponível em: https://www.tecmundo.com.br/voxel/281459-73-brasileiros-jogam-videogame-aponta-pesquisa.htm. Acesso em: 19 maio 2024.

[2] Disponível em: https://jornal.usp.br/radio-usp/a-expansao-do-mercado-de-games-brasileiro-se-deve-a-mudancas-no-modo-tradicional-do-trabalho/. Acesso em: 19 maio 2024.

[3] Conferir o art. 8º da Lei n.º 14.853/24

[4] Cf. : KOVESS-MASFETY, Viviane et al. Is time spent playing video games associated with mental health, cognitive and social skills in young children? Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, [s.l.], v. 51, n. 3, p.349-357, 5 fev. 2016. HERN, Alex. Video games are unlocking child gambling. This has to be reined in. Disponível em: <https://www.theguardian.com/commentisfree/2017/dec/28/video-games-unlock-child-gambling-loot-box-addiction>. Acesso em: 17 out. 2018. ZENDLE, David; MEYER, Rachel; OVER, Harriet. Adolescents and loot boxes: links with problem gambling and motivations for purchase. Royal Society Open Science, [s. l.], v.6, p. 1-18, jun. 2019.

[5] Cf.: MARQUES, Claudia Lima. Introdução ao Direito do Consumidor. In: BENJAMIN, Antônio Herman Vasconcellos; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 9. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022, p. 39-64.

[6] Cf.: DRUMMOND, Aaron; SAUER, James D.. Video game loot boxes are psychologically akin to gambling. Nature Human Behaviour, [s.l.], v. 2, n. 8, p.530-532, 18 jun. 2018. Cf.: VAN ROOIJ, Antonius J. et al. A weak scientific basis for gaming disorder: Let us err on the side of caution. Journal of Behavioral Addictions, [s.l.], v. 7, n. 1, p.1-9, mar. 2018.

 [7] Disponível em: https://g1.globo.com/saude/noticia/2022/07/31/uso-excessivo-de-videogames-e-maior-entre-adolescentes-brasileiros-diz-pesquisa.ghtml. Acesso em : 20 maio 2024.

[8] Conferir o parágrafo 3º, incisos I e II, do art. 15, da Lei n.º 14.853/24.

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Delatado pode acessar gravações sobre acordo de colaboração premiada e sua homologação

Não é apenas o conteúdo do depoimento do delator que pode ser questionado pela defesa de quem foi delatado, mas também a validade formal do acordo de colaboração premiada.

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a pessoa delatada em uma colaboração premiada tem o direito de acessar a gravação das negociações do acordo e da audiência em que ele foi homologado pelo juiz. Assim, o terceiro delatado pode verificar a legalidade e a regularidade do acordo de colaboração, bem como a voluntariedade do colaborador ao assiná-lo.

Esse entendimento levou o colegiado a negar provimento ao recurso no qual o Ministério Público Federal (MPF) pedia que fosse impedido o acesso de um delatado a tais gravações.

Para o MPF, o terceiro delatado não teria legitimidade para questionar a validade do acordo de colaboração premiada. O órgão argumentou ainda que o artigo 4º, parágrafo 7º, da Lei 12.850/2013 estabelece que a audiência judicial de homologação do acordo é sigilosa. Por fim, alegou que a divulgação das tratativas poderia colocar em risco investigações ainda em andamento.

Acordo de colaboração premiada tem natureza híbrida

Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, o artigo 3º-A da Lei 12.850/2013 estabelece que o acordo de colaboração premiada tem natureza híbrida, sendo ao mesmo tempo um negócio jurídico processual e um meio de obtenção de prova.

Apesar dessa natureza jurídica mista, o ministro explicou que o primeiro aspecto prevalecia na jurisprudência quando se discutia a legitimidade do terceiro delatado para impugnar a validade do acordo: uma vez que se tratava de negócio jurídico personalíssimo, cabia ao terceiro apenas confrontar o conteúdo da palavra e das provas apresentadas pelo delator, mas não a validade formal do acordo celebrado.

O relator explicou que esse cenário começou a mudar em recentes julgados da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que passou a entender que, como meio de obtenção de prova, o acordo pode impactar gravemente a esfera jurídica do terceiro delatado, razão pela qual é necessária a observância da legalidade, cujo desrespeito pode ser questionado por quem foi prejudicado.

Ao fazer um paralelo com a colheita de provas contra terceiros na busca e apreensão, o ministro comentou que é natural que esses terceiros tenham interesse e legitimidade para impugnar não apenas o conteúdo de tais provas, mas também a validade da medida que fez com que elas chegassem aos autos.

“Não é apenas o conteúdo da prova colhida que interfere na esfera jurídica do acusado, visto que esse conteúdo só pode ser valorado se a forma pela qual foi obtido for lícita. Daí a impropriedade de se sustentar que são apenas as provas fornecidas pelo delator que atingem o delatado, e não o acordo em si, porquanto foi só por meio do acordo – o qual deve respeitar a lei – que as provas foram obtidas”, disse.

Sigilo das diligências é pontual e não deve restringir publicidade dos atos

Para Schietti, o artigo 4º, parágrafo 7º, da Lei 12.850/2013, ao determinar que o juiz deverá “ouvir sigilosamente o colaborador”, não estabelece uma regra perpétua quanto à restrição da publicidade do ato. Segundo o ministro, trata-se apenas de preservar pontualmente aquele momento da investigação, em que o sigilo é necessário para assegurar a eficácia de diligências em andamento, as quais podem ser frustradas se o indivíduo delatado tiver acesso a elas.

Contudo, ponderou que, oferecida e recebida a denúncia, “a regra volta a ser a que deve imperar em todo Estado Democrático de Direito, isto é, publicidade dos atos estatais e respeito à ampla defesa e ao contraditório, nos termos do artigo 7º, parágrafo 3º, da Lei 12.850/2013“.

De acordo com o relator, a preocupação com as diligências em andamento é legítima, e, havendo alguma medida investigativa pendente, o juízo pode preservar o sigilo sobre ela, “mas sem vedar indefinidamente, em abstrato e de antemão, o acesso da defesa à totalidade das tratativas do acordo e à audiência de homologação”.

Fonte: STJ

O que muda para as entidades do terceiro setor após a reforma tributária?

No dia 20/12/2023 foi promulgada a Emenda Constitucional 132 (PEC 45/2019), mais conhecida como reforma tributária. Aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 15 daquele mês, o novo texto normativo tem como foco a simplificação do sistema tributário nacional. Apesar de não ser o objetivo da normativa, as mudanças trazidas pelo projeto impactam de forma direta e indireta o trabalho das entidades do terceiro setor.

Santa Casa de SP
 

De início, destaca-se que a imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, “c”, da Constituição, permanece: o Estado não pode instituir impostos sobre “patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”. Dessa forma, instituições que possuem o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas) mantêm-se imunes ao pagamento de impostos.

Essa vedação, contudo, não se aplica aos tributos de forma geral. Apesar de não sofrerem a incidência de impostos, as organizações de assistência social ainda devem arcar com outros tributos — tais quais taxas, contribuições de melhoria e contribuições especiais. Essa diferenciação é o que justifica a maior preocupação das instituições beneficentes com a reforma: a perda de isenções fiscais e o aumento da carga tributária.

Unificação de tributos

Uma das principais alterações trazidas pela nova normativa é a unificação dos tributos sobre bens e serviços. Cria-se, portanto, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)  que substitui o ICMS e o ISS — e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) — em substituição ao PIS e Cofins.

Atualmente, as instituições filantrópicas elegíveis possuem isenção tributária quanto ao PIS/Cofins, conforme artigo 195, §7º, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei Complementar 187/2021. Porém tal isenção não foi replicada para os novos tributos no texto constitucional. As exceções já delimitadas dizem respeito apenas a:

  • Redução de 100% da alíquota do CBS para:
    • serviços prestados por entidades de inovação, ciência e tecnologia sem fins lucrativos, e
    • serviços de educação de ensino superior nos termos do Prouni.

 

  • Redução de 60% da alíquota para alguns serviços, dentre eles:
    • serviços de educação;
    • serviços de saúde,
    • produções artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional.

A questão dos incentivos

Outro ponto de atenção é que, até o momento, não há previsão de incentivos fiscais às instituições sem fins lucrativos — incentivos esses que hoje estão previstos nas legislações municipais e estaduais, com a possibilidade de destinação de parte do ICMS e do ISS para o financiamento de projetos de interesse público.

Contudo, tanto os incentivos quanto as isenções fiscais ainda podem ser objeto de regulamentação por meio de leis complementares, as quais serão necessárias para a implementação dos novos tributos. É fundamental, portanto, que as entidades continuem acompanhando e ativamente participando dos debates que seguirão no próximo ano.

Não incidência do ITCMD

Além do exposto, a Reforma Tributária trouxe também uma grande vitória para o terceiro setor: a não incidência do ITCMD (Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações de Quaisquer Bens e Direitos) sobre as doações destinadas às organizações sem fins lucrativos com finalidade de relevância social, organizações assistenciais, beneficentes, religiosas e institutos científicos, observados os requisitos a serem previstos em lei complementar.

Trata-se de um grande avanço para as instituições filantrópicas, uma vez que a medida traz maior segurança jurídica tanto aos doadores quanto aos donatários. Com isso, espera-se um possível aumento de doações e, consequentemente, um aumento na execução de projetos com relevância social.

Considerações finais

As novas regras trazidas pela reforma tributária ocorrerão de forma gradativa, sendo que as primeiras mudanças quanto ao IBS e CBS serão efetivamente iniciadas a partir de 2026. Até 2027 deverá ser implementado de forma integral o CBS, extinguindo o PIS/Cofins. Já o IBS permanece com a alíquota de 0,1% até 2028, substituindo o ICMS e o ISS gradativamente de 2029 a 2032.

Será um período importante para a adaptação das entidades — que, como já dito, deverão participar diretamente na fase das legislações complementares que regulamentarão as previsões tributárias constitucionais. Além disso, os significativos benefícios decorrentes, principalmente, da previsão quanto ao ITCMD, deverão ser considerados nos planejamentos futuros das instituições, para uma atuação consciente e direcionada às novas possibilidades de receita.

 


Referências

https://www.filantropia.ong/informacao/reforma-tributaria-e-os-impactos-no-terceiro-setor-por-ana-carrenho

https://www.migalhas.com.br/depeso/395924/reforma-tributaria-e-impactos-no-terceiro-setor

https://www.gov.br/secretariageral/pt-br/noticias/2023/julho/reforma-isenta-organizacoes-da-sociedade-civil-de-imposto-sobre-doacoes

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Comissão aprova projeto que cria política de proteção a crianças e adolescentes

A Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 5224/23, que institui a Política Nacional de Proteção Institucional à Criança e ao Adolescente.

 
Discussão e votação de propostas legislativas. Dep. Chris Tonietto (PL - RJ)
Chris Tonietto: medida ajuda a garantir uma vida digna a crianças e adolescentes – Vinicius Loures / Câmara dos Deputados

A política, proposta pela deputada Priscila Costa (CE), atualmente na suplência, tem como objetivos:
. a promoção da garantia de direitos fundamentais, tais como: à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao lazer, à convivência familiar e comunitária;
. a prevenção e o enfrentamento de toda forma de violência, exploração, negligência e abuso contra crianças e adolescentes;
. o fortalecimento das instituições e serviços responsáveis pela proteção desses cidadãos; e
. o estabelecimento de diretrizes e ações voltadas para a promoção e efetivação dos direitos da criança e do adolescente.

O texto prevê a criação de um protocolo de comportamento ou código de conduta, além de mecanismos de escuta e participação ativa de crianças e adolescentes nas ações voltadas para sua proteção, entre as medidas de proteção institucional.

Para a relatora, deputada Chris Tonietto (PL-RJ), a proposta funciona como um norte assegurar às crianças e adolescentes uma vida digna. “Iniciativas como essa são essenciais para se buscar uma sociedade mais justa e equilibrada”, disse.

Priscila Costa afirmou que a proposta é essencial para assegurar infância e adolescência livres de todas as formas e manifestações de violência. “É imperativo que o Estado cumpra o seu dever de garantir os direitos fundamentais da criança e do adolescente, bem como promova políticas públicas que efetivamente os concretizem.”

Próximos passos
A proposta ainda será analisada, em caráter conclusivo, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Fonte: Câmara dos Deputados

Licitação, contrato irregular e ’emergência reversa’

Já tivemos a oportunidade  de escrever sobre a “emergência fabricada”, ou seja, situação em que a própria inoperância interna da administração pública é a responsável pela situação de “emergência previsível” ou “emergência fabricada”.

A hipótese do presente texto é o julgamento irregular pelo Tribunal de Contas de determinado contrato como motivo para o reconhecimento de uma situação de emergência. Ou seja, o julgamento irregular de um contrato faz com que o administrador tenha o bem senso elementar de providenciar uma nova contratação.

Pensamos que, nessa hipótese, também haverá uma “emergência fabricada” já que a figura mencionada se refere a situações de necessidade de contratação direta em razão de situações de inércia/inoperância/falta de planejamento criadas pela própria administração.

Ainda que o termo “emergência fabricada” seja utilizado, com mais frequência, para situações de omissão, pensamos que situação comissivas, ou seja, ações/contratações irregulares também se enquadram na figura da “emergência fabricada” e, portanto, nas regras dessa modalidade de emergência.

Há uma emergência que não é propriamente uma decorrência de circunstância naturais tais como calamidades, inundações ou pandemia. Trata-se de uma “calamidade jurídica” que, entretanto, se enquadra nas hipóteses de “emergência fabricada” por atuação errônea da administração pública assim reconhecida pelo respectivo Tribunal de Contas.

Lindb e respeito à autoridade da Corte de Contas

A expressa previsão no artigo 5º da NLLC das regras da Lindb (DL 4657/42), notadamente nos artigos 20 a 22 reforça a necessidade de respeito às consequências que possam atingir bens, pessoas e serviços.

Ainda que não prevista expressamente, as consequências que irão atingir instituições (tal como o Tribunal de Contas) também deverão ser observadas no ato administrativo. Dentre as consequências concretas previstas na Lindb inclui-se o respeito à autoridade do respectivo Tribunal de Contas.

Nesse diapasão prevê a Lindb:

“Art. 20.  Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. (grifo do articulista)

Qual seria a consequência prática de PRORROGAR um contrato expressamente julgado irregular pelo Tribunal de Contas, sob a égide da Lei 14.133/2.021?

Evidente que seria o desrespeito à autoridade da mencionada Corte de Contas. Particularmente, pensamos que seria até mesmo o caso de suspeita de corrupção já que ninguém pode ser tido por diligente quando ignora solenemente uma decisão do Tribunal de Contas. A relevância maior está no cumprimento de uma decisão de determinado TCU/TCE/TCM, salvo a hipótese de efetiva reserva do possível.

O pressuposto lógico transcendental para o ato administrativo seguinte ao reconhecimento da irregularidade é a contratação de OUTRA empresa de maneira a adequar a irregularidade com nova licitação sem as máculas apontadas no julgamento pela irregularidade daquele contrato.

A adequação à decisão de irregularidade de um contrato é o pressuposto mais relevante para o ato administrativo daí nossa metáfora com a norma fundamental prevista por Kelsen como fundamento de todo o sistema jurídico.

O julgamento pela Corte de Contas da irregularidade de um contrato acarreta duas consequências incontornáveis: o serviço deve ser mantido e o atual contrato deve se adequar aos parâmetros expressamente indicados pela Corte de Contas e, ainda, pelo atendimento do serviço público que não pode ser paralisado em razão da atividade atabalhoada (ou até mesmo criminosa) da administração pública.

‘Calamidade jurídica’ e ’emergência às avessas’

A “emergência às avessas”  ou “emergência reversa” é aquela contratação direta surgida com urgência em razão de um contrato formalmente licitado mas substancialmente “direto” diante da pecha de irregular imputada pela Corte de Contas.  A contratação de urgência surge para a fiel observância da Corte de Contas e tem as mesmas regras do contrato de urgência fabricada, com a diferença que o seu reconhecimento é feito posteriormente pela Corte de Contas.

Uma maneira de conter os ímpetos dos “fabricantes de emergências” (inclusive no gênero “calamidade jurídica”) é a limitação temporal e a vedação de prosseguimento com o mesmo contratado que presta serviços em razão do reconhecimento da “calamidade jurídica” pela Corte de Contas.

O termo inicial do período de emergência também mudou. É a própria situação de emergência e NÃO a assinatura do contrato. Assim:

“VIII – nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a continuidade dos serviços públicos ou a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para aquisição dos bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 1 (um) ano, contado da data de ocorrência da emergência ou da calamidade, vedadas a prorrogação dos respectivos contratos e a recontratação de empresa já contratada com base no disposto neste inciso;” (grifo do articulista)

Ou seja, o lapso temporal do contrato de emergência surge da própria emergência e não da assinatura do contrato ou de qualquer ato burocrático da administração pública.

Como a emergência (na modalidade calamidade jurídica) não estava escancarada às fuças do administrador público, pensamos que o termo inicial é a data da ciência da decisão que julgou o contrato irregular.

Logo, havendo decretação pelo TCU/TCE/TCM da “calamidade jurídica”, pode haver contratação direta vedada a participação do atual contratado, nos exatos termos de uma contratação originada por uma emergência.

Assim, como a prorrogação de uma contratação direta proíbe a contratação do mesmo contratado para evitar a fraude e a perenização de uma “emergência”, o reconhecimento pela Corte de Contas de uma contratação irregular também acarreta a proibição de contratação daquela que participou dessa irregularidade. A regra proíbe a participação da empresa do contrato irregular numa dispensa mas não numa licitação regular.

A finalidade da norma é a proteção do erário e a criação de obstáculo aos “esquemas” corruptos. Nesse sentido o artigo 75, VIII parte final menciona “….vedadas a prorrogação dos respectivos contratos e a recontratação de empresa já contratada com base no disposto neste inciso;”

Portanto, a interpretação teleológica da norma nos faz entender que um contrato licitado, porém, julgado irregular, tem o mesmo patamar axiológico de um contrato por dispensa de licitação.

A lógica é simples: contratar de forma irregular como se regular fosse equivale a não licitar. A licitação tem que ser substancial e não meramente formal. A “licitação” meramente formal mas conspurcada de irregularidades assim reconhecidas pelo TCU/TCE/TCM transforma o contrato num equivalente jurídico ao contrato por dispensa de licitação. Apenas a emergência (ou calamidade jurídica) teve a inversão temporal. Mas a inversão temporal decorre de um ocultamento provisório do ilícito e, portanto, não tem maior relevância para seu enquadramento legal.

Além disso, devem ser apuradas as responsabilidades pelo desleixo contumaz que obrigou a contratação de emergência na modalidade “calamidade jurídica”. Nesse diapasão, prevê o §6º do artigo 75 da Lei Federal nº 14.133/2.021:

“§ 6º Para os fins do inciso VIII do caput deste artigo, considera-se emergencial a contratação por dispensa com objetivo de manter a continuidade do serviço público, e deverão ser observados os valores praticados pelo mercado na forma do art. 23 desta Lei e adotadas as providências” necessárias para a conclusão do processo licitatório, sem prejuízo de apuração de responsabilidade dos agentes públicos que deram causa à situação emergencial.”

Conclusão

Em síntese: a “calamidade jurídica” reconhecida pela Corte de Contas é um contrato equivalente à “emergência fabricada”  na modalidade “emergência reversa” não podendo ser prorrogado com o mesmo licitante, já que apesar de formalmente licitado é substancialmente uma “contratação direta” aplicando-se as regras do artigo 75, VIII da Lei Federal 14.133/2.021, salvo na hipótese de licitação regular.

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