O grande imbróglio das subvenções: o que falta acontecer?

Talvez uma das maiores confusões já criadas em matéria tributária, nos últimos tempos, esteja vinculada às subvenções, instituto desde há muito utilizado pelo Direito brasileiro que se tornou notícia constante de jornal e objeto de muitos debates, tendo o atual governo, como meta, pelo que se depreende de atos normativo recém publicados, alterá-la, no que se refere a seus efeitos para fins de Imposto sobre a Renda (IRPJ)  e de Contribuição Social sobre o Lucro (CSL), impulsionado pelo interesse em aumentar a arrecadação em curto prazo. Para examinar o caos que hoje impera nessa matéria, vale repassar seu histórico, de forma breve, tendo em conta a importância que as subvenções públicas tiveram e seguem tendo no desenvolvimento de certas regiões do país.

Do ponto de vista do poder público, a Lei nº 4.320/64 trata dos orçamentos e balanços dos entes federados, estando as subvenções inseridas na rubrica de despesas, mais especificamente nas transferências de recursos, no caso, para os particulares, observadas as condições dispostas em lei que deve precedê-las. Por oportuno, hoje existe um Projeto de Lei Complementar do Senado, de nº 229/2016, que objetiva revogar a Lei nº 4.320/64, bem como alterar a Lei Complementar nº 101/00, Lei de Responsabilidade Fiscal, que aborda a renúncia fiscal (subvenção) em suas várias formas.

Para fins tributários a Lei nº 4.506/64, lei básica do IRPJ, a despeito de hoje bastante alterada, dispõe  sobre as subvenções para custeio, cuja principal finalidade é gerar capital de giro para os seus beneficiários, as quais, sob o regime desse diploma legal são tributáveis. O Decreto-Lei nº 1.598/77, adaptando a legislação do IRPJ à Lei nº 6.404/76, nova lei societária, excluiu do lucro real, as subvenções concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, bem como as doações do poder público, desde que registradas como reserva de capital que somente poderia ser utilizada para absorver prejuízos ou ser incorporada ao capital social. Essa regra contábil voltada a subvenções, integra o Capítulo XV, da Lei nº 6.404/76, que contempla disposições voltadas às demonstrações financeiras e à escrituração contábil das sociedades.

 A despeito de o tratamento das subvenções estar consolidado para fins de IRPJ e de CSL, certas subvenções estaduais, de ICMS, sempre estiveram sob o crivo do Fisco federal sob o argumento de não atenderem os requisitos mínimos para se enquadrarem como subvenções para investimento e estarem, por isso, submetidas à tributação. Ao mesmo tempo, diversas dessas subvenções estaduais geraram um grande contencioso, que chegou ao Supremo Tribunal Federal, já que haviam sido instituídas pelos Estados e pelo Distrito Federal sem a observância das condições exigidas pela Lei Complementar nº 24/75 que até hoje regula a matéria.

Em fins de 2007, com a edição da Lei nº 11.638/07, comemorou-se a reforma do Capítulo XV, da Lei nº 6.404/76, com a adoção das práticas internacionais de contabilidade, os International Financial Reporting Standards (IFRS), utilizadas nos principais mercados mundiais. Tais práticas foram pensadas para demonstrações financeiras consolidadas de grupos econômicos, diversamente do que ocorreu no Brasil, que as adotou para os balanços individuais.  Os dois grandes pilares dos IFRS são a prevalência da essência econômica sobre a forma, no trato dos negócios, ou o que as partes desejaram do ponto de vista econômico a despeito de sua formulação jurídica, e o valor justo de ativos e passivos, ou seja, o preço que seria recebido pela venda de ativo ou transferência do passivo em transação entre participantes do mercado, na data de mensuração. O fato é que para os contadores brasileiros, especialmente aqueles que sempre incentivaram a adoção dos IFRS, obrigar o uso de tais práticas no balanço individual parecia ser uma decorrência natural do fato de que se tais novos conceitos eram bons para os balanços consolidados, objeto de aplicação dos IFRS em todo o mundo, também o seriam para os balanços individuais, o que se mostrou um grande equívoco.

 Dentre outros frutos da adoção dos novos padrões contábeis, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), entidade não personificada voltada ao seu estudo e divulgação no Brasil, editou o Pronunciamento CPC 07 (R1), para tratar das subvenções, sejam para investimento, sejam para custeio. Ambas são consideradas, contabilmente, como atos benéficos por parte do poder público, razão pela qual devem ser reconhecidas como receitas na demonstração do resultado do exercício e não mais diretamente em patrimônio líquido, como reserva de capital, visto que o patrimônio líquido somente pode contemplar verbas oriundas ou destinadas dos/aos sócios, hipóteses em que a subvenção não se enquadra.

Como no Brasil a apuração do IRPJ e da CSL partem da contabilidade para determinar suas bases, com o fito de evitar que a mudança dos métodos e critérios contábeis afetasse o cálculo desses tributos, a Exposição de Motivos da Lei nº 11.638/07 asseverou que os IFRS seriam neutros, do ponto de vista tributário, visto que não afetariam a carga tributária das empresas a elas submetidas, bem como não afetariam as perspectivas de arrecadação. Nesse sentido foi editada a Leis nº 12.973/14, que adaptou a legislação tributária federal às novas normas contábeis, incorporando, porém, em algumas situações essas práticas, como é o caso das subvenções, quaisquer que sejam, que passaram a ser registradas em conta de resultado.

Em resumo, os IFRS passaram a tratar as subvenções como lucro, já que não decorrem de aportes dos sócios, dispondo a Lei  nº 12.973 que as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não seriam computadas na determinação do lucro real, desde que  registradas em reserva de incentivos fiscais, que tem a natureza de reserva de lucros, permitindo-se seu uso apenas para   absorção de prejuízos e aumento do capital, observadas as demais disposições legais aplicáveis.

 Por fim, o ambiente das subvenções foi novamente atropelado pela Lei Complementar nº 160/17 que, objetivando pôr termo à guerra fiscal entre Estados, foi além, equiparando as subvenções de ICMS enquadradas como subvenções para custeio, a subvenções para investimentos.

A possibilidade de excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSL, já vinha sendo examinada pelo Superior Tribunal de Justiça, que entendeu aplicar-se, dentre todos, apenas aos créditos presumidos outorgados, a não incidência desses tributos sob pena de ofensa ao pacto federativo, por subtrair parcela da competência tributária dos estados (EREsp 1.517.492/PR). Nessa linha, no julgamento do  Tema Repetitivo 1.182,  o STJ  chegou a dois diferentes entendimentos: (1) a concessão de créditos presumidos de ICMS não admite a tributação pelo IRPJ e pela CSL, por ofensa ao pacto federativo, sendo, nesse caso, desnecessário cumprir qualquer outro requisito adicional e (2) outros benefícios de ICMS (isenção, redução de base de cálculo, diferimento, etc.) equiparados pela Lei Complementar nº 160/17 a subvenções para investimentos, para escaparem à incidência  desses tributos, exigiriam o registro dos valores em reserva de incentivos e a sua não distribuição aos sócios.

Nesse conjunto de fatos, o primeiro aspecto a ser comentado, é a mudança de procedimento contábil, do registro em reserva de capital em contrapartida de contas de ativo que representam investimentos, para o registro de uma receita oriunda de benefício fiscal, a ser apropriada como lucro. Ao abandonar o registro em reserva de capital exige-se o trânsito em resultado dos recursos, para futura apropriação, retirando a esses recursos a barreira inicialmente criada pela destinação única e exclusiva para aumento de capital, conquanto a lei, ao final, exija prova de tal alocação, para usufruto do benefício. Embora a leitura do fenômeno econômico da subvenção sob as lentes da nova contabilidade possa trazer maior precisão às demonstrações consolidadas, mostrando que os recursos não se originam nos sócios, nada acrescentam às demonstrações individuais, exceto criar obrigações acessórias e aumentar o risco de questionamento.

 A Lei Complementar nº 101/00 trata como renúncia fiscal todos os incentivos, o que inclui, também, créditos presumidos e isenções. Considerando-se esse fato, o que justificaria, sob a ótica do STJ, que créditos presumidos, “grandezas positivas” estejam  submetidos ao chamado pacto federativo, para fins de afastar sua tributação e os demais benefícios não recebam esse tratamento,  sob o argumento de se tratarem de “grandezas negativas”? Destaque-se que a recomendação contábil, CPC 07(R1), é no sentido de os incentivos tributários, sob a forma de isenção ou redução, sejam registrados a partir do registro do imposto total, no resultado, como se devido fosse, em contrapartida à receita de subvenção equivalente, a serem demonstrados um deduzido do outro.

 O uso dessas expressões, não devidamente elaboradas pelo STJ, já foi bastante questionado por muitos autores que o atribuem à Contabilidade, o que não está correto, pois o conceito de “grandeza” é desenvolvido pela Matemática, sendo que para fins matemáticos grandeza é todo o valor ou medida (comprimento, volume, etc.) atribuídos a um objeto matemático e que a grandeza negativa é oposição e não negação ou ausência, como é o caso dos chamados números relativos (positivos e negativos). O tema das “grandezas” é muito complexo, evidenciando-se, apenas, que o seu empréstimo da Matemática pode não ser o melhor caminho para tratar do assunto.

 Na distinção trazida entre créditos presumidos e isenções, pelo STJ, os seguintes aspectos não podem ser olvidados: (1) crédito presumido e isenção são ambos tratados como renúncia fiscal pela Lei Complementar nº 101/00 e (2) créditos presumidos e isenções devem transitar pela conta de resultado/lucro, não submetidos à incidência do IRPJ e da CSL.  Logo, o que justifica a distinção trazida pelo STJ para tratar apenas os créditos presumidos sob o enfoque do pacto federativo? É fato inconteste que esses benefícios são capazes de gerar os mesmos resultados econômicos para os seus beneficiários, riqueza correspondente ao tributo que deixa de onerar a operação ou crédito que protege uma desoneração.

 O Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público [1], baseado nas regras dos IFRS aplicáveis às entidades vinculadas ao Estado, contempla definições que interessam à questão sob debate, como é o caso do crédito presumido tratado como valor que representa o montante do imposto cobrado na operação anterior, objetivando “neutralizar” o efeito de recuperação dos impostos não cumulativos, pelo qual o Estado se apropria do valor da isenção nas etapas subsequentes da circulação da mercadoria. Ainda, de acordo com o manual, é permitido registrar a renúncia representada por reduções e isenções de forma “resumida”, por efeitos líquidos ou desdobrada (receita e despesa com tributos). A contabilidade pública adota a mesma terminologia do CPC 07 (R1) designando a isenção como dispensa de pagamento, adotada nos primórdios de nosso CTN e pelo STF, depois contraposta por novas correntes doutrinárias sem que, até o momento, o STF tenha decidido tal matéria [2].

Muitos atribuem à Contabilidade ter “ressuscitado” esse tema na tentativa de registrar o tributo como despesa e dessa forma, quando não efetivamente liquidado, por força da “dispensa legal”, gerar um crédito a ser tratado como subvenção. Essa afirmativa não nos parece verdadeira, de vez que o artigo 175 do CTN mantém por inteiro seu conteúdo e a expressão “exclusão do crédito tributário” para categorizar a isenção.

Com isso, dados os diversos pontos de identidade entre créditos presumidos e isenções, entendemos que nasce um caminho de debate junto ao STF para isenções/reduções de base de cálculo sob o enfoque do pacto federativo.

Por fim, no imbróglio tributário em que as subvenções acabaram sendo envolvidas, o Poder Executivo editou, à luz do decidido pelo STJ, a Medida Provisória nº 1.185/23, alterando os critérios de aproveitamento das subvenções para investimento. De acordo com essa MP, os beneficiários de subvenções para investimento não mais as excluirão à tributação, mas farão jus a crédito fiscal calculado à razão de 25% sobre as receitas de subvenção relacionadas a tais objetivos, reconhecidas após a conclusão da implantação/expansão do empreendimento, observadas as exigências legais. Ao limitar o crédito tributário a 25% das receitas de subvenção, por óbvio que se está pretendendo que tais receitas sejam tributadas pelas contribuições sociais devidas ao Programa de Integração Social (PIS) e para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), conquanto a receita de subvenção não se caracterize como fruto de atividade operacional, na forma da lei.

Esse tema, ultrapassado desde a edição da Lei 12.973/14, que dispõe que as receitas de subvenções para investimento não se submetem a tais onerações, nesse contexto, pode retornar.  Conquanto a MP ainda esteja sob debate no Congresso, o Poder Executivo encaminhou à Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 5.129/23 que dispõe sobre o crédito fiscal decorrente de subvenção para a implantação/expansão de empreendimento econômico, tratado na já referida MP. Talvez o principal objetivo seja manter a matéria em pauta no Congresso, porque as MPs têm prazo de vigência para exame e ultrapassado esse prazo, o tema seguiria examinado sob a forma de PL. Essa cautela no trato da matéria, por parte do Executivo, evidencia o quão importante ele é do ponto de vista da arrecadação e essa é a mensagem que o ministro da Fazenda, diariamente, nos passa em todos os órgãos de imprensa conclamando o Congresso a aprovar a dita MP, sob pena de um desastre fiscal.

 Esse açodamento com vistas à arrecadação só se presta à elaboração de leis questionáveis, aumentando a litigiosidade e afastando, cada vez mais, o interesse dos investidores. Tenhamos cautela com as subvenções.

[1] https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:41943

[2] Sobre o tema veja-se o lúcido artigo de Sergio André Rocha, “Afinal, isenções tributárias são ‘grandezas negativas’?”, in ConjJur, Justiça Tributária, de 5/6/2023.

Fonte: Conjur

STF reiniciará análise de valor de multa por obrigação acessória

Um pedido de destaque do ministro Luís Roberto Barroso, presidente da corte, interrompeu nesta segunda-feira (6/11) o julgamento de repercussão geral no qual o Plenário do Supremo Tribunal Federal discute o patamar da multa isolada pelo descumprimento de obrigação acessória.

Ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso e presidente do STF, pediu destaqueCarlos Moura/SCO/STF

Com isso, a análise do caso será reiniciada em sessão presencial, ainda sem data marcada. Até o pedido de destaque, o julgamento era virtual, com término previsto para esta sexta-feira (10/11).

No recurso extraordinário, a empresa de energia elétrica Eletronorte, subsidiária da Eletrobrás na Região Amazônica, contestou uma multa isolada aplicada pelo Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) devido ao descumprimento de uma obrigação tributária acessória.

A Eletronorte foi punida pelo governo de Rondônia por um erro no preenchimento de documentos sobre a compra de óleo diesel para geração de energia elétrica e os encargos tributários devidos. O TJ-RO manteve a multa aplicada à empresa, no patamar de 40% sobre a operação.

A porcentagem da multa era prevista por uma lei estadual, já revogada, para casos envolvendo, por exemplo, o transporte de mercadoria desacompanhada de documento fiscal. A Eletronorte alegou que a multa tem caráter confiscatório e não é razoável.

Mais tarde, a empresa pediu desistência do RE. Os ministros que haviam votado antes do pedido de destaque concordaram em homologar a desistência, mas ainda assim analisaram o tema de repercussão geral.

Votos
O próprio Barroso, que é relator do caso, já havia votado por declarar a inconstitucionalidade do trecho da lei estadual que previa a multa de 40%. Para ele, a multa isolada não pode ser superior a 20% do tributo devido.

Segundo o magistrado, existe um consenso de que a multa por descumprimento de uma obrigação principal deve ser mais pesada do que a multa por descumprimento de uma obrigação acessória. Ou seja, esta última não pode exceder o limite fixado para a primeira. E a jurisprudência considera constitucional a multa de até 20% pelo atraso no cumprimento de obrigação principal.

Já o ministro Dias Toffoli divergiu do relator. De acordo com ele, o teto de 20% “é insuficiente para reprimir ou prevenir determinadas condutas ou, ainda, induzir certos contribuintes infratores a entrar em conformidade com a lei”.

Por isso, para os casos em que há tributo ou crédito indevido vinculados, Toffoli votou por um limite de 60% desses respectivos valores — com possibilidade de chegar a 100% caso existam circunstâncias agravantes.

Já para os casos em que não há tributo ou crédito indevido, ele considerou que a multa não pode ultrapassar 20% do valor da operação ou prestação vinculada à penalidade — podendo chegar a 30% caso existam circunstâncias agravantes.

O magistrado também propôs que a multa não pode ultrapassar 1% do valor total da base de cálculo dos últimos 12 meses do tributo pertinente. Em caso de circunstância agravante, a porcentagem deve ser de 0,5% do mesmo valor.

Ainda segundo o voto divergente, na análise das circunstâncias agravantes e atenuantes, a aplicação da multa pode considerar outros parâmetros, como adequação, necessidade, justa medida, insignificância e bis in idem. O Legislativo federal, estadual ou municipal pode ponderar qual deve ser o valor adequado em cada hipótese de descumprimento.

Toffoli ainda sugeriu a modulação dos efeitos da decisão a partir da publicação da ata de julgamento, com ressalva para as ações judiciais pendentes de conclusão até a mesma data. Na sua visão, a aplicação retroativa de sua tese invalidaria muitas multas, abriria espaço para devoluções e afetaria as finanças de diversos entes.

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RE 640.452

Fonte: Conjur

Veto a cobrança de dívida prescrita tem impacto geral incerto

Decisões do Poder Judiciário que vetam a cobrança extrajudicial de dívidas prescritas oferecem ao mercado mais segurança jurídica e aumentam o risco da cessão dos chamados créditos podres, mas há dúvidas sobre o real impacto que podem causar na realidade brasileira.

Esse cenário foi desenhado por especialistas no assunto consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico depois de a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça proibir uma empresa de recuperação de créditos de cobrar uma dívida prescrita de maneira extrajudicial.

A cobrança era feita por meio de telefonemas, e-mails e mensagens de texto de celular (SMS e WhatsApp). Esse é o modo de operação das empresas que trabalham com os créditos podres, ativos que são classificados como de difícil recuperação por parte do credor.

Esses créditos são adquiridos em grandes lotes, em regra cedidos por instituições bancárias, por preços consideravelmente menores do que seus valores nominais. Com eles em mãos, as empresas de cobrança contatam os devedores com ofertas de quitação mediante grandes descontos.

O lucro no negócio dos créditos podres surge da diferença entre o valor de compra e o montante obtido na negociação com o devedor. E não é pouca coisa. Dados divulgados pelo jornal O Estado de S. Paulo no ano passado indicaram que o mercado de oferta de créditos podres poderia alcançar R$ 60 bilhões por ano.

É improvável que decisões como a do STJ desestimulem a cobrança dos créditos podres pelas empresas de recuperação, ainda que essa jurisprudência esteja se consolidando. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), por exemplo, já fixou enunciado para orientar seus juízes sobre o tema.

O impacto real vai depender de cada devedor saber que não precisa pagar dívidas que existem há mais de cinco anos. E é muita gente para saber disso. Neste ano, o Brasil tem 78,3% de suas famílias endividadas, segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

Convencer o devedor
O advogado Ricardo Vicente de Paula explica que as empresas de recuperação de crédito montaram configurações e metodologias de cobrança que não são transparentes, geram confusões para os consumidores e criam pressão psicológica sobre as pessoas, afetando a vida e saúde delas.

O maior exemplo é a plataforma Serasa Limpa Nome, na qual credores conveniados informam dívidas — prescritas ou não — passíveis de transação, com o objetivo de facilitar a negociação e a quitação. Seu uso é discutido em muitos dos precedentes sobre o tema.

O Judiciário tem afastado a ilegalidade desse cadastro porque ele não serve para negativar o nome do devedor, nem tem impacto sobre o score de crédito — a forma como birôs como o SPC ou a própria Serasa calculam o risco da concessão de crédito a partir do histórico do consumidor.

Cobrança extrajudicial vem com ofertas generosas de descontos para dívidas que, na prática, já não poderiam ser cobradas
katemangostar/Freepik

Para o advogado, até o uso do termo Limpa Nome foi pensado para confundir. Ele critica o fato de essas plataformas deixarem as cobranças em destaque, escondendo o campo de consulta de nome limpo ou sujo. E também a forma abusiva como contatam o devedor.

“A maioria esmagadora dos consumidores não tem o conhecimento de que esse tipo de cobrança é ilegal e acaba por firmar acordos para se verem livres das cobranças. É um mercado de bilhões. Como a minoria busca seus direitos, é excessivamente vantajoso para as empresas que cobram.”

Marcelo Tapai, sócio do escritório Tapai Advogados, acrescenta que a pessoa que é alvo da cobrança raramente é informada sobre quem é o real credor. Ele também contesta a suposta falta de impacto de plataformas como o Serasa Limpa Nome no score dos consumidores.

“O sistema bancário é todo interligado. A partir do momento em que há uma plataforma pública, não acho que os bancos não saibam disso e não vão restringir crédito. Da mesma forma, não acredito que, depois de prescrita a dívida, não exista uma lista negra. A forma como se calcula o score é uma caixa preta.”

Risco do negócio
Eduardo Maciel
, do escritório MFBD Advogados, ressalta que a formação dos créditos podres não decorre de desconhecimento do credor, mas simplesmente do desinteresse em fazer a cobrança pela via judicial, por causa do alto custo do pagamento de advogados, custas judiciais e despesas processuais.

“O impacto dessa posição (do STJ) aumenta a segurança jurídica. Assim, se uma pessoa é devedora, caberá ao credor o efetivo exercício do seu direito, seja na via administrativa ou judicial, e não simplesmente apontar seu nome eternamente num banco de dados que gere score negativo a essa pessoa.”

“O impacto que o mercado sente é o risco do negócio. Tanto o credor inicial quanto a empresa que comprou o crédito sabem disso. Se o direito de fazer a cobrança não foi exercido no prazo legal, o risco é ser impedido de cobrar do devedor”, destaca Marcelo Tapai.

Para Ricardo Vicente de Paula, o veto à cobrança de dívidas prescritas ainda pode ser bom para a economia brasileira, sendo base para a reanálise de diversos pontos econômicos que causam a falta de valor da nossa moeda, além da alta taxa de juros e do baixo poder de compra do brasileiro.

“Isso enfraquece a economia, prejudica a circulação de riquezas e, ao final, gera essa bola de neve de dívidas antigas e não pagas. Vale a reflexão. Quem sabe esses precedentes do STJ podem gerar alterações benéficas à economia”, diz ele.

Dyna Hoffmann, do SGMP Advogados, explica que a dívida, ainda que prescrita, continua a existir. A prescrição não representa a quitação. Logo, ela afetará o histórico de crédito do devedor pelo menos em relação àquela instituição financeira para a qual ficou devendo por mais de cinco anos.

Em sua opinião, posições como a do STJ darão uma nova dinâmica à avaliação e à negociação de créditos podres. “Certamente, o ajuizamento de ações de execução, ações monitórias e ações ordinárias de cobrança vai crescer para que não ocorra a prescrição. Medidas alternativas de solução desse tipo de conflito também serão mais utilizadas.”

Aproveitamento tributário
Para que servem, então, dívidas prescritas? O ex-procurador do município de São Paulo Carlos Mourão, do escritório Nascimento e Mourão Advogados, indica que resta muito pouco a fazer sobre o assunto. Elas não podem ser cobradas, nem servem para fazer a compensação com outros créditos. “Mas nada impede o pagamento voluntário por parte do devedor”, diz ele.

Para o credor, há ainda a possibilidade de impacto tributário na base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IPRJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Essa possibilidade decorre da aplicação do artigo 9º da Lei 9.430/1996, conforme explica a advogada Stephanie Makin, do Machado Associados.

A norma diz que as perdas no recebimento de créditos decorrentes das atividades da pessoa jurídica poderão ser deduzidas como despesas, para determinação do lucro real. O parágrafo 1º indica as hipóteses em que tais créditos podem ser registrados como perdas.

“Em regra, o credor vai ter esse crédito como um ativo, por ser um valor a receber. Quando ocorre a baixa, vira despesa e resultado. Aí pode entrar como despesa dedutível na apuração de IRPJ e CSLL, mas desde que seja analisado o caso a caso”, ressalta a advogada.

REsp 2.088.100

Fonte: Conjur

Reforma tributária e oportunidades perdidas: caso das Cides

Estamos há mais de quatro anos imersos nos debates sobre a última onda de reforma tributária. A esta altura, tudo indica que em breve o Senado votará e — provavelmente — aprovará a sua versão da Proposta de Emenda Constitucional nº 45 (PEC 45). Projetando o momento pós-aprovação das mudanças propostas para a Constituição, provavelmente identificaremos avanços, retrocessos, novos problemas, soluções não antecipadas e oportunidades perdidas. O foco aqui será uma oportunidade perdida.

Um dos tributos mais disfuncionais previstos na Constituição é a chamada Cide (Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico), estabelecidas em seu artigo 149. Dizemos que elas são disfuncionais porque, no cenário atual, as Cides podem ter basicamente qualquer fato gerador e buscar qualquer finalidade.

Ao analisarmos o texto do referido artigo 149, notaremos que ele nada diz sobre os fatos geradores possíveis das Cides. Da mesma forma, este dispositivo é absolutamente silente sobre quais finalidades legitimariam a instituição de tais contribuições.

Sabemos que o Código Tributário Nacional (CTN) foi elaborado tendo como premissa a suficiência do estudo do fato gerador para a definição da natureza do tributo. É o que se infere do artigo 4º do Código, segundo o qual “a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação”.

O critério do fato gerador é completamente inadequado para a caracterização das Cides, já que essas contribuições podem eleger qualquer comportamento como aspecto material de suas hipóteses de incidência.

As Cides são um dos exemplos do que Marco Aurélio Greco chama de “regulação finalística”, como observa este autor, ao examinar as mudanças que colocaram em xeque uma visão causalista da incidência tributária:

“Outra mudança resulta no fato de que passou a ser dada relevância, não tanto à causa dos fenômenos mas, fundamentalmente, aos fins visados com a conduta exigida. Esta é uma característica que afeta diretamente a figura das contribuições. Elas são exigências em que o fim assume relevância maior do que a causa (= fato gerador). Quando a Constituição atribui a competência à União para instituir contribuição de intervenção no domínio econômico, contribuições sociais ou no interesse de categorias profissionais, não está enumerando fatos geradores (materialidades de hipóteses de incidência), mas qualificando fins a serem buscados com a sus instituição.”
(GRECO, Marco Aurélio. Contribuições (uma figura “sui generis”). São Paulo: Dialética, 2000. p. 37-38).

A legitimação finalística demanda dos órgãos de controle, notadamente do Poder Judiciário, critérios de análise de constitucionalidade e legitimidade que eles não estão acostumados a manejar. Afinal, não se trata de debater materialidades conceituais constitucionais, previstas em regras de competência, nem hipóteses de incidência descritas na lei. A análise da compatibilidade constitucional de contribuições interventivas, por exemplo, vai demandar um estudo de meios e fins, sem o qual muito pouco é possível se dizer sobre o tema.

Diante da flexibilidade constitucional das Cides, coube à doutrina elaborar balizas que pautassem a sua instituição. Marco Aurélio Greco, por exemplo, trouxe algumas, ao sustentar que:

  • a intervenção econômica da União deveria circunscrever-se a setores específicos, sendo que os sujeitos passivos da contribuição somente poderiam ser aqueles integrantes de tais setores;
  • os perfis da intervenção econômica devem ser inferidos da própria Constituição;
  • sendo tributos relacionados a um fim, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade deveriam sempre ser considerados;
  • consequentemente, deve haver um motivo para que haja a intervenção pública no domínio econômico;
  • não poderia haver a sobreposição de CIDEs com a mesma finalidade;
  • os valores arrecadados com a contribuição devem ser aplicados na finalidade que legitimou a sua instituição e devem ser proporcionais aos gastos públicos demandados pela mesma;
  • a aplicação de tais receitas deve favorecer o grupo de contribuintes, etc. (GRECO, Marco Aurélio. Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – Parâmetros para sua Criação. In: GRECO, Marco Aurélio (Coord.). Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico e Figuras Afins. São Paulo: Dialética, 2001. p. 11-31.)

Essa construção doutrinária, que daria maior racionalidade às Cides, nem sempre é seguida pelo Poder Judiciário, identificando-se uma certa leniência com a instituição de contribuições interventivas com fins obscuros, ou descasados o fato gerador e grupo de contribuintes respectivo.

Falta às Cides, bem como a outras contribuições, um marco legal bem definido. Como à época em que o CTN foi editado as contribuições não tinham a mesma relevância que possuem hoje no Sistema Tributário Nacional, o código simplesmente não as disciplinou. Essa falta de normas gerais tem reflexos negativos não apenas sobre as contribuições de intervenção, mas em relação às contribuições em geral.

Por outro lado, a falta de um regime jurídico bem definido na Constituição ou no CTN para as contribuições, aliada ao planejamento financeiro da União para frustrar as regras de repartição de receitas tributárias, turbinado pela patologia que é a Desvinculação de Receitas da União (DRU) —artigo 76 do ADCT — levou à proliferação das contribuições em geral, inclusive das Cides.

No auge da pandemia, por exemplo, muitas das iniciativas voltadas ao incremento de receitas tributárias referiram-se à criação de novas contribuições de intervenção, a maioria voltada para o setor de tecnologia.

Atualmente, o Supremo Tribunal Federal tem uma grande chance de colocar alguma ordem nessa matéria, no julgamento do Tema 914 da Repercussão Geral, que trata da “constitucionalidade da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico — Cide sobre remessas ao exterior, instituída pela Lei 10.168/2000, posteriormente alterada pela Lei 10.332/2001”. Esta contribuição, se em sua formatação original poderia até ser constitucional, certamente se tornou inconstitucional com as alterações promovidas pela Lei nº 10.332/2001. (Ver: GRECO, Marco Aurélio; ROCHA, Sergio André et. al. Manual de Direito Tributário Internacional. São Paulo: Dialética, 2012. p. 421-422).

É assustador que, em 2023, estejamos debatendo sobre a (in)constitucionalidade de um tributo instituído em 2000 e alterado em 2001, mais de 20 anos atrás.

Feitos esses breves comentários, voltamos ao título deste artigo. Tanto tem se falado sobre simplicidade e segurança jurídica e, ainda assim, a reforma tributária, em sua atual versão, mantém na Constituição uma porta aberta para a instituição de uma espécie tributária que traduz tudo, menos previsibilidade e estabilidade.

Nesse sentido, poderiam ser adotados dois caminhos para aumentar a segurança jurídica no caso das Cides. Um primeiro, mais radical, seria simplesmente a eliminação da competência da União Federal para a instituição dessas contribuições.

Com efeito, a União já possui a competência residual para a instituição de novos impostos que integrariam o esquema de repartição de receitas tributárias, e não nos parece que este verdadeiro “cheque em branco”, que são as contribuições interventivas, seja necessário como uma forma de financiamento do gasto público federal. O que se perde com a falta de regime jurídico é mais do que o que se ganha atribuindo esta competência à União.

Uma alternativa moderada para se lidar com a insegurança trazida pelas Cides seria mantê-las no sistema, mas estabelecendo na Constituição ou mesmo no CTN um marco legal para essas contribuições.

Ao não lidar com as Cides, o Congresso permite que a União siga se valendo deste instrumento que, na falta de uma regulação mais detalhada, pode facilmente ser instituído com desvio de finalidade e tornar-se uma espécie de “imposto” com finalidade específica, atropelando o modelo constitucional de federalismo fiscal.

Fonte: Conjur

Crime de poluição exige lei complementar com parâmetros e critérios

A acusação baseada uma norma penal em branco, como é a do crime de poluição, depende da indicação de leis complementares que estabeleçam critérios e parâmetros para a tipificação, de modo a possibilitar a defesa adequada e a eficiência da produção probatória.

Denúncia não especificou quais substâncias foram liberadas pela empresa, nem o dano
Reprodução

Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a um recurso em mandado de segurança para trancar uma ação penal por poluição ajuizada contra a White Martins, empresa fabricante de gases industriais.

A denúncia do Ministério Público do Pará enquadrou a empresa no artigo 54 da Lei 9.605/1998, por poluição sonora e atmosférica. Trata-se de norma penal em branco, pois se baseia em preceito genérico, indeterminado e incompleto.

Com isso, a jurisprudência do STJ se fixou no sentido de que sua aplicação depende da indicação, na denúncia, de legislação complementar ao tipo penal em branco, de modo a possibilitar à defesa a correta compreensão da acusação.

Seria preciso definir pontos como o que é poluição, com quais materiais ou substâncias ela ocorre, em quais quantidades e em quais ambientes, por exemplo. Apesar disso, as instâncias ordinárias receberam a denúncia e rejeitaram o pedido de trancamento da ação feito pela empresa.

“Verifica-se que a denúncia não indicou qualquer ato regulatório extrapenal emitido pelo poder público destinado à concreta tipificação do ato praticado, que aponte parâmetros e critérios para a criminalização das condutas ali expostas, o que consubstancia a inépcia da denúncia”, analisou a ministra Laurita Vaz, relatora da matéria.

Ela ainda apontou que a denúncia é genérica por afirmar que a White Martins “emite para a atmosfera substâncias odoríferas desagradáveis, que causam dor de cabeça e dificuldade de respirar, prejudicando, assim, a saúde das pessoas que residem nas circunvizinhanças do estabelecimento”.

Segundo a relatora, não há especificação dessas substâncias odoríferas, nem a comprovação de sua relação com eventuais danos causados à saúde humana. Assim, fica impossibilitada a defesa da pessoa jurídica.

“Nesse contexto, observa-se que a denúncia não traz, quanto ao crime do art. 54, caput, da Lei 9.605/1998, todas as nuances necessárias à tipificação do delito, o que torna inepta a inicial acusatória”, concluiu a ministra. A votação na 6ª Turma foi unânime.

Clique aqui para ler o acórdão
RMS 71.208

Fonte: Conjur

STJ admite sustentações de amici curiae em bloco separado das partes

Com o objetivo de zelar pela igualdade entre as partes no processo, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu isolar as sustentações orais das entidades admitidas como amici curiae (amigas da corte) no julgamento de um tema de recursos repetitivos, nesta quarta-feira (25/10).

A definição foi feita em dois recursos especiais julgados em conjunto com o objetivo de decidir se o limite de 20 salários mínimos é aplicável para apurar a base de cálculo de contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros e destinadas ao custeio do Sistema S.

O caso contava com dois recorrentes, um recorrido (a Fazenda Nacional), dois assistentes (integrantes do Sistema S) e seis entidades atuando como amici curiae, admitidas no processo pela possibilidade de trazer informações importantes para a definição da causa.

O escopo de atuação do amicus curiae vem sendo delineado pelas cortes brasileiras. O Código de Processo Civil traz poucas definições sobre o tema. Nem mesmo o direito à sustentação oral é garantido. A Corte Especial do STJ já estabeleceu que essa é uma possibilidade a ser definida pelo relator.

No caso julgado pela 1ª Seção, os ministros decidiram que os amici curiae deveriam falar em separado das partes. Aos dois recorrentes foi dado o prazo de 30 minutos. Já a Fazenda e as entidades assistentes (Sesc/Senac e Sesi) dividiram outros 30 minutos.

Por último, falaram as entidades que atuaram como amigas da corte, que teriam outros 30 minutos para dividir entre elas. Duas abriram mão da prerrogativa — assim, as quatro restantes puderam se manifestar durante sete minutos e 30 segundos cada.

Durante o debate, o ministro Herman Benjamin destacou a importância de tratar o tema com cuidado, uma vez que os amigos da corte têm se comportado no STJ como amigos da parte, transformando um instituto criado para auxiliar os julgadores em mecanismo de desequiparação.

“Hoje a causa é da Fazenda Pública, mas amanhã pode ser de algum sujeito vulnerável ou de representante de uma coletividade. É dever do juiz zelar pela igualdade no processo, e isso inclui as sustentação orais. Que separemos a parte dos amici curiae“, disse ele.

REsp 1.898.532
REsp 1.905.870

Fonte: Conjur

Absolvição no júri por quesito genérico não pode ser impugnada

A absolvição pelo Tribunal do Júri em razão do quesito genérico é soberana e não pode ser impugnada — nem reformada por novo julgamento — com a justificativa de que os jurados decidiram de forma contrária às provas dos autos.

Mendonça lembrou que a Constituição assegura a soberania dos veredictos do júri
Carlos Moura/SCO/STF

Seguindo esse entendimento, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, restabeleceu veredicto do Tribunal do Júri de Florianópolis que absolveu uma mulher acusada de cometer assassinato.

De acordo com os autos, a ré foi submetida ao Tribunal do Júri em 2021, com a acusação de ter matado o marido, um coronel aposentado da Polícia Militar. Ao fim do julgamento, ela foi absolvida, mas o Ministério Público recorreu da decisão. Posteriormente, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) entendeu que o resultado do julgamento foi contrário às provas dos autos e anulou a absolvição.

Sustentando a soberania do veredicto do júri, a defesa impetrou Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça e, por fim, o caso chegou ao Supremo. Nesse intervalo, contudo, o juízo de Florianópolis não esperou a definição do caso pelo STF e marcou um novo júri. Resultado: a mulher foi condenada a oito anos de prisão por homicídio privilegiado.

A palavra final sobre o caso, porém, veio na segunda-feira (23/10), no encerramento da sessão virtual em que o STF julgou o agravo regimental em Habeas Corpus da defesa. Na decisão, prevaleceu o entendimento do ministro André Mendonça.

Divergindo do ministro relator, Dias Toffoli, que negou seguimento ao HC, Mendonça ressaltou que a Constituição assegura, entre os princípios da instituição do júri, a soberania dos veredictos.

Assim, prosseguiu o ministro, dessa garantia decorre a conclusão de que a decisão coletiva proferida pelos jurados não pode, no mérito, ser modificada por juízo ou tribunal. “De outra forma, estaria sendo afastada a competência do Tribunal do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida”, explicou Mendonça.

Sobre o caso concreto, o magistrado disse que a acusada confessou ter praticado o crime devido às “constantes práticas de violência doméstica e ameaça de morte por parte da vítima”. Diante disso, acrescentou o ministro, a defesa pleiteou o “reconhecimento do homicídio privilegiado, ao argumento de que a acusada cometeu o delito sob o domínio de violenta emoção”, além da absolvição por clemência.

Por fim, Mendonça lembrou que ambas as turmas do STF “já decidiram ser incabível determinar a realização de novo julgamento, partindo-se da premissa segundo a qual estaria a decisão de absolvição dos jurados, com base no quesito genérico, contrária aos elementos probatórios”. Dessa forma, ele concluiu pelo restabelecimento da absolvição. Acompanharam o voto os ministros Kassio Nunes Marques e Gilmar Mendes.

A defesa foi patrocinada pelo advogado Caio Fortes de Matheus, do escritório Dalledone e Advogados Associados.

Clique aqui para ler o voto do ministro André Mendonça
HC 231.024

Fonte: Conjur

Carf desconhece seu papel em um modelo de stare decisis

Em sessão realizada no dia 19/9/2023, a CSRF da 3ª Seção decidiu pela incidência de PIS/Cofins para as cooperativas de crédito em contraposição a entendimento vinculante do STJ (Tema 363), ao fundamento que a questão teria sido afetada pelo STF (Tema 536) e que o próprio STJ estaria sobrestando casos análogos em trâmite naquela tribunal, o que afastaria a imposição trazida pela regra do artigo 62, § 1º, inciso II, alínea “b” do Ricarf [1], que vincula o Tribunal Administrativo à precedentes judiciais definitivos, veiculados sob o rito da repetitividade.

De fora muito sumária, por ser de pouca valia para o raciocínio que será desenvolvido adiante, a questão de fundo diz respeito a incidência ou não de PIS e Cofins sobre as receitas de cooperativas de créditos. Em sede de julgamento de recursos repetitivos (REsp nº 1.164.716 e nº 1.141.667) o STJ havia consolidado o entendimento no sentido de que não incide a contribuição destinada ao PIS/Cofins sobre os atos cooperativos típicos realizados pelas cooperativas. Trata-se, portanto, de precedente vinculante, nos exatos termos do artigo 927, inciso III do CPC [2].

Acontece que, após a consolidação da sobredita decisão, o STF resolveu, sob a perspectiva constitucional, submeter a questão à repercussão geral, o que está retratado no RE nº 672.215, oportunidade em que o Tribunal definirá se há ou não incidência de PIS, Cofins e CSLL sobre o produto de ato cooperado ou cooperativo em face dos conceitos constitucionais relativos ao cooperativismo, mais precisamente no caso das expressões constitucionais: “ato cooperativo”, “receita da atividade cooperativa” e “cooperado”.

Após a afetação do sobredito recurso extraordinário à condição de leading case por parte do STF, o próprio STJ passou a sobrestar casos análogos em trâmite naquele tribunal, aguardando o desfecho dessa discussão na Corte Constitucional.

Essas breves considerações são feitas aqui apenas para situar a discussão, uma vez que o objetivo do presente texto é outro: o de analisar a validade ou não de o Carf seguir com o julgamento dos seus processos para a questão de fundo em oposição ao precedente vinculante do STJ [3]. Foi o que aconteceu no âmbito do processo nº 13826.000171/2005-90, de relatoria da conselheira Semíramis Duro, cujo acórdão encontra-se pendente de publicação.

Acompanhando o julgamento do caso, o que se viu foi a posição da relatora no sentido de negar provimento ao recurso especial da Fazenda por aplicar o precedente vinculante do STJ. Tal posição, todavia, foi contraposta pelo conselheiro Rosaldo Trevisan, que deu provimento ao recurso fazendário em oposição ao referido precedente ao fundamento que se o próprio STJ está sobrestando casos que tramitam naquela corte é sinal de que o precedente do STJ teria perdido o status de vinculante e, por conseguinte, o Carf não estaria mais obrigado a segui-lo. Essa posição foi seguida pela maioria dos julgadores, resultando em um placar de 5×3 pelo provimento do recurso especial fazendário.

Antes, todavia, de analisar o que fora decidido pela CSRF, mister se faz dar um passo atrás para repisar quais são os propósitos de um modelo de stare decisis [4] ou, em outros termos, quais os valores jurídicos que se pretende tutelar nesse sistema.

De forma muito suscinta, até porque o tema aqui analisado é riquíssimo [5], o objetivo de um modelo metodologicamente adequado de valorização de precedentes é, em última análise, valorizar uma segurança jurídica de índole material, de modo que as decisões dos tribunais sejam previsíveis, até porque no Common Law tais decisões são tratadas como fonte material do direito e, por conseguinte, são fontes legítimas para fins de orientação de condutas dos seus destinatários.

Ademais, ao perseguir uma segurança jurídica de caráter substancial, esse modelo também tutela o valor justiça [6], com especial ênfase para uma das suas expressões, o valor igualdade, na medida em que evita decisões arbitrárias por serem contrapostas à jurisdicionados que se encontram em situações análogas.

No âmbito da realização prática do direito por intermédio das decisões de caráter jurisdicional, a preocupação com tais valores se afunila para a ideia de integridade do direito (artigo 926 do CPC [7]), segundo o qual as diferentes decisões dos diferentes órgãos de caráter jurisdicional conformam um mesmo continuum prático ou, como prefere Dworkin [8], um mesmo “romance em cadeia” (chain novel). Logo, aquele autor que acresce uma nova página a esse romance não pode simplesmente ignorar os capítulos pretéritos dessa história, já que o respeito aos precedentes envolve o ato de segui-los, distingui-los ou revogá-los, jamais ignorá-los [9].

É bem verdade que em modelo jurisdicional em que diferentes tribunais possuem diferentes parcelas de competência para a resolução de um mesmíssimo problema jurídico, essa busca pela integridade torna-se mais complexa. É o que acontece, v.g., em matéria tributária, onde uma mesma lide pode ser objeto de decisão tanto do STJ quanto do STF. Soma-se a isso o fato de que no Brasil, no plano federal, existe ainda a figura do Carf, que também decide questões tributárias passíveis de resolução pelos tribunais judiciais, o que na prática potencializa o problema de integração das decisões.

Foi exatamente por reconhecer esse problema que o legislador previu institutos como o do sobrestamento de casos passíveis de afetação por um leading case, da modulação de efeitos e, ainda, para também fomentar a integração de decisões judiciais e administrativas, a aplicação subsidiária do CPC em processos administrativos, nos exatos termos do art. 15 do referido Código [10]. Aliás, o já citado artigo 62, § 1º, inciso II, alínea “b” do Ricarf, é um reflexo, ainda que tímido, da necessidade dessa integração entre decisões judiciais e administrativas.

Tecidas tais considerações, já é possível retornar ao caso sob análise na coluna de hoje.

Diferentemente do que fora alegado pelo Carf no voto vencedor proferido no processo administrativo nº 13826.000171/2005-90, ao determinar o sobrestamento dos casos que lá tramitam e que tratam da (não) incidência de PIS/Cofins para as cooperativas de crédito, o STJ não reconhece a perda do status de vinculante do seu precedente (Tema 363), condição essa que, em verdade, poderá até ser potencializada, a depender do resultado do julgamento do leading case com trâmite no STF (Tema 536).

Em verdade, ao determinar tais sobrestamentos, o STJ antevê a possibilidade — e aqui, de fato, se trata de uma hipótese possível — de existir um overruling por parte do STF para a matéria de fundo, o que, se ocorrer, poderá ainda ser objeto de modulação de efeitos, exatamente como se discute, v.g., no Tema 985 do Pretório Excelso [11]. Será apenas nesse momento que haverá a superação do entendimento por parte do STF e que o precedente do STJ deixará ser vinculante.

Em verdade, ao já determinar o sobrestamento dos seus casos, o STJ, com elogiosa prudência, entende perfeitamente seu papel nesse cipoal de órgãos jurisdicionais que, embora fracionados em razão de diferentes competências, exercem uma única função: jurisdicional. Ao assim fazer, portanto, o STJ se antecede a futuros problemas na hipótese de eventual posição contraposta a sua por parte do STF, já antecipadamente prestigiando a necessidade de integridade das decisões.

Era exatamente esse o papel que também se esperava do Carf e que não foi cumprido em concreto. Ao promover o julgamento do caso aqui analisado, independentemente do seu resultado favorecer o fisco ou o contribuinte, o Carf antecipadamente atenta contra a ideia de integridade do direito. Em outros termos, o órgão que deveria ser parte na solução pela busca de decisões íntegras, acaba por ser um dos problemas para se prestigiar esse importante valor jurídico.

Essa postura temerária, por sua vez, redundará em mais processos judiciais, a ser conduzido com um notório custo econômico pela já assoberbada Procuradoria da Fazenda Nacional, perante um também sobrecarregado Poder Judiciário, o que também causa um impacto econômico para esse Poder. E, a depender do resultado do tema no STF, tudo isso podendo implicar em imposição de verbas sucumbenciais em prejuízo do Erário público, o que nos remete a pergunta-título do presente texto: quem ganha com um Carf que desconhece o seu papel em um modelo de stare decisis?

[1] Art. 62. Fica vedado aos membros das turmas de julgamento do Carf afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade.

  • 1º. O disposto no caput não se aplica aos casos de tratado, acordo internacional, lei ou ato normativo:

(…).

II – que fundamente crédito tributário objeto de:

(…).

  1. b) Decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento realizado nos termos dos arts. 543-B e 543-C da Lei nº 5.869, de 1973, ou dos arts. 1.036 a 1.041 da Lei nº 13.105, de 2015 – Código de Processo Civil, na forma disciplinada pela Administração Tributária;

[2] Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

(…).

III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

(…).

[3] De forma reflexa também se pretende promover uma análise crítica a forma como o modelo de precedentes vem sendo tratado pelo CARF, o que não é uma novidade nesse espaço. Nesse sentido, vide: ConJur – A jurisprudência do Carf e a inexistência de modelo de precedentes

[4] Termo esse que provém da expressão latina stare decisis et non quieta movere, i.e., respeitar as coisas decididas e não alterar o que está estabelecido.

[5] Por todos: DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

[6] […] neste caso a certeza é de todo compatível com a “justiça”, pois não é mais do que a estabilização histórico-cultural, em termos de vigência, de uma intenção normativa material – a objectivação sincrónica dessa intenção, e que sempre poderá existir, e que existirá mesmo, num direito exclusiva ou predominantemente intencionado à justiça. (NEVES, Antonio Castanheira. Instituto dos assentos. Coimbra: Coimbra Editora, 2014. p. 38.).

[7] Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. (grifos nosso)

[8] DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 221 e ss.

[9] BRAGA, Paulo Sarno; DIDIER JÚNIOR, Fredie; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil. v. 2, 10. ed. Salvador: Juspodivm, 2015. p. 480.

[10] Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.

[11] Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos arts. 97, 103-A, 150, § 6º, 194, 195, inc. I, al. a e 201, caput e § 11, da Constituição da República, a natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas, para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal e no qual, no mérito, se fixou a seguinte tese: é legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias.

Fonte: Conjur

MP pode usar ACP para pedidos com consequências tributárias, diz STJ

O Ministério Público é parte legítima para ajuizar ação civil pública com o objetivo de contestar atos lesivos ao patrimônio público, ainda que as consequências almejadas com o pedido sejam tributárias, como a anulação da concessão de benefícios fiscais.

Para ministra Regina Helena Costa,
ação tem consequências tributárias, mas pedido é de anulação de ato administrativo
Lucas Pricken/STJ

Essa conclusão é da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que nesta terça-feira (24/10) deu provimento a um recurso especial ajuizado pelo Ministério Público Federal, autorizando-o a litigar contra a Fundação CSN Para o Desenvolvimento Social e a Construção da Cidadania.

A instituição é o braço social da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e foi agraciada com a Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social (Cebas), concedida pelo governo federal para organizações sem fins lucrativos que prestam serviços assistenciais.

Com o Cebas, a Fundação CSN garantiu uma série de benefícios, sendo o principal deles a imunidade de contribuição para a seguridade social. A entidade não paga PIS, Cofins, contribuição previdenciária patronal ou Risco Ambiental do Trabalho (RAT).

O Ministério Público Federal ajuizou ação contra a Fundação CSN por entender que ela não faz jus à isenção fiscal, já que não se enquadra como instituição de assistência social ou de educação. A ação civil pública contém o pedido de pagamento das contribuições e dos impostos correlatos.

Para esse fim, pediu a anulação do ato administrativo concessivo do Cebas. As instâncias ordinárias extinguiram o processo sem resolução do mérito porque, conforme a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), a ACP não pode ser usada para veicular pretensões que envolvam tributos.

Essa posição foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 645 da repercussão geral. E a 1ª Seção do STJ já vetou tentativa de relativização da vedação, em casos em que a ACP é usada para discutir temas tributários com o objetivo de concretizar direitos fundamentais.

Por maioria apertada de 3 votos a 2, o STJ reformou o acórdão e autorizou o MPF a litigar pela anulação da concessão do Cebas. Venceu o voto divergente da ministra Regina Helena Costa, acompanhada dos ministros Sérgio Kukina e Paulo Sérgio Domingues.

Relator, ministro Benedito Gonçalves entendeu que MPF não poderia ajuizar ação civil pública porque o objetivo é tributário
Lucas Pricken/STJ

Foco é o ato administrativo
Para a ministra, o pedido principal é o de anulação do Cebas. A causa tributária é dependente da higidez do ato de concessão do certificado. Assim, a invalidação da concessão é o que se busca primordialmente, sendo o tema tributário um desdobramento.

“Se negarmos (essa possibilidade), estaremos inibindo o Ministério Público de questionar um ato administrativo que tem, dentre outras consequências, reflexos tributários. A discussão não é só a imunidade tributária. Aqui, o Cebas não poderia ter sido concedido”, destacou a ministra.

O ponto foi igualmente destacado pelo ministro Kukina. Já o ministro Paulo Domingues destacou que a vedação ao uso da ação civil pública para temas tributários deriva do cenário da década de 1990, em que ela era usada para discutir a constitucionalidade de determinados tributos então criados.

“É possível identificar a presença do pedido de anulação do Cebas, com a consequência da perda dessa isenção da imunidade para seguridade social”, concluiu ele ao desempatar a votação a favor da divergência.

Pedido tributário
Ficaram vencidos os ministros Benedito Gonçalves, relator da matéria, que votou por manter a conclusão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), e Gurgel de Faria, que nesta terça-feira retomou o julgamento com a apresentação do voto-vista.

Para eles, o pedido é de índole tributária, sendo a anulação do Cebas apenas o meio para obter o fim buscado: a declaração de que a Fundação CSN deve pagar as contribuições sociais. “Sendo o pedido de ordem tributária, não verifico possibilidade de o Ministério Público ser parte legítima”, disse Gurgel de Faria.

REsp 2.033.159

Fonte: Conjur

STF define alcance de decisão sobre devoluções relativas ao ICMS

O Supremo Tribunal Federal reiterou o entendimento de que não cabe pedido de devolução de valores ou de compensação tributária referente à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins depois de 15 de março de 2017 se o fato gerador ocorreu antes dessa data. A decisão foi tomada no julgamento do recurso extraordinário (RE) com repercussão geral (Tema 1.279).

Ministra aposentada Rosa Weber defendeu a reafirmação da jurisprudência no caso
Carlos Moura/STF

A data diz respeito ao julgamento de mérito de outro recurso (RE 574.706), também com repercussão geral (Tema 69), em que o STF decidiu que o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins. Já em 2021, ao acolher em parte embargos de declaração, ficou decidido que essa decisão só teria efeitos a partir do dia do julgamento.

Agora, no RE 1.452.421, a União questionou decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) que estabeleceu que a data a ser considerada para a exclusão do tributo era a do pagamento. Mas, segundo a União, a inclusão do valor do ICMS no cálculo das contribuições permaneceu válida até 15 de março de 2017, fazendo surgir as obrigações tributárias a fatos geradores anteriores.

O colegiado acompanhou a manifestação da ministra Rosa Weber (hoje aposentada) no sentido de que a matéria tem repercussão geral, pois trata da delimitação do sentido e do alcance de precedente obrigatório do Supremo, afetando inúmeros outros casos.

Em relação ao mérito, a ministra explicou que o recurso questiona a aplicação da tese na hipótese de lançamento, recolhimento ou pagamento de PIS/Cofins com o ICMS na sua base de cálculo após 15 de março de 2017, mas relativo a fato gerador anterior.

Segundo Rosa Weber, a análise do acórdão do primeiro julgado não deixa dúvidas de que a tese firmada somente produz efeitos sobre fatos geradores ocorridos após 15 de março de 2017, ressalvadas ações judiciais e procedimentos administrativos protocolados até aquela data.

Nesse sentido, ela citou inúmeras decisões da corte em recursos extraordinários com pedidos análogos. Assim, Rosa se manifestou pela reafirmação da jurisprudência da corte e, no caso concreto, pelo provimento do recurso da União.

Por unanimidade, o Plenário Virtual reconheceu a repercussão geral da matéria, objeto do recurso extraordinário, e reafirmou sua jurisprudência dominante. A tese fixada foi a seguinte:

Em vista da modulação de efeitos no RE 574.706/PR, não se viabiliza o pedido de repetição do indébito ou de compensação do tributo declarado inconstitucional, se o fato gerador do tributo ocorreu antes do marco temporal fixado pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as ações judiciais e os procedimentos administrativos protocolados até 15.3.2017″.

Com informações da assessoria de imprensa do STF.

RE 1.452.421

Fonte: Conjur