Compensação tributária e mandado de segurança: o vácuo analítico no ARE 1.525.254

O Supremo Tribunal Federal voltou a se debruçar sobre um tema sensível no Direito Tributário: os limites da compensação administrativa reconhecida em sede de mandado de segurança. A controvérsia, que há anos desafia a coerência da jurisprudência, foi novamente enfrentada pela 2ª Turma no julgamento do ARE nº 1.525.254, no qual foi assentado que o mandado de segurança não poderia gerar, por si só, o direito à compensação administrativa.

A expressão “por si só” merece especial atenção e será analisada a seguir, por se tratar do ponto fulcral para a correta compreensão do alcance dessa decisão.

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, entendeu pela restrição da compensação, sendo acompanhado pelos ministros Edson Fachin e Nunes Marques, sob o fundamento principal de que a devolução direta de valores pelo Fisco violaria o regime constitucional dos precatórios (artigo 100 da Constituição). Por sua vez, o ministro André Mendonça abriu divergência, acompanhado pelo ministro Dias Toffoli. O placar, portanto, encerrou-se em 3 a 2, prevalecendo a tese restritiva no caso concreto.

Ocorre que o acórdão proferido pelo Supremo não delimita adequadamente pontos essenciais da controvérsia, uma vez que o contexto fático dos autos não é devidamente evidenciado na decisão. Essa lacuna dificulta a distinção do precedente em relação a outros casos de compensação tributária e enfraquece a compreensão de seu alcance prático.

Conforme destacou o ministro André Mendonça em seu voto divergente, os precedentes do STF “reforçam a possibilidade de declaração do direito à compensação tributária, desde que respeitadas as normas infraconstitucionais aplicáveis ao tema, cuja análise não chegou a ser realizada no acórdão recorrido”.

O uso da expressão ‘por si só’

No caso concreto, tratava-se de compensação de ICMS no estado de São Paulo. A Procuradoria do Estado sustentou a inexistência de lei específica na legislação paulista prevendo a compensação tributária, o que violaria o artigo 170 do Código Tributário Nacional.

Embora esse ponto não tenha sido analisado expressamente, tanto nas instâncias superiores quanto inferiores, não parece haver outra justificativa plausível para o emprego da expressão “por si só” no voto condutor.

E é por isso que o mandado de segurança, por si só, não geraria o direito à compensação administrativa, pois dependeria da existência lei específica na legislação tributária do Estado prevendo tal modalidade de extinção do crédito tributário.

Esse ponto, que poderia ter sido esclarecido em embargos de declaração, acabou não sendo, já que a 2ª Turma rejeitou o recurso. Novamente vencido, o ministro André Mendonça reiterou a necessidade de “determinar a devolução dos autos à corte de origem, a fim de que decida a controvérsia quanto à possibilidade de declaração do direito à compensação, suas formas e critérios a partir das normas infraconstitucionais referentes ao tema”.

Nota-se, portanto, que a mera leitura do suporte textual do acórdão não permite compreender integralmente o alcance da decisão, já que a matéria não foi suficientemente delimitada, sobretudo diante da ausência de análise sobre a legislação infraconstitucional aplicável.

O uso da expressão “por si só” indica que o Supremo não afastou a possibilidade de se reconhecer o direito à compensação em sede de mandado de segurança, mas apenas limitou seus efeitos às hipóteses em que exista lei específica disciplinando o instituto.

Pois, na ausência de lei específica, aí sim o mandamus estaria, por si só, gerando o direito à compensação.

Desse modo, o precedente não deve ser lido como uma vedação geral à compensação declarada judicialmente, mas como um alerta à necessidade de compatibilizar a via mandamental com os contornos infraconstitucionais do artigo 170 do CTN.

Em outras palavras, o mandado de segurança permanece como instrumento hábil à declaração do direito à compensação administrativa, desde que observado o regime legal aplicável e afastadas pretensões de devolução direta de valores pela Fazenda Pública, que devem respeitar o regramento dos precatórios.

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Empresas vão indenizar casal por uso de imagem além do prazo contratual

A 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal condenou duas empresas a indenizar um casal pela veiculação da imagem depois do término do contrato, reconhecendo que houve o uso indevido das imagens.

Os autores relatam que, em maio de 2023, eles e os filhos participaram de um trabalho de fotos e vídeos para uma empresa de decoração e paisagismo, intermediado por uma agência. Informam que o contrato tinha vigência de um ano e que eventual prorrogação do uso das imagens dependeria de negociação prévia.

O casal conta que, em novembro de 2024, soube por amigos que suas imagens ainda estavam sendo exibidas em academias do DF. Eles afirmam ter entrado em contato com as rés para comunicar o uso indevido, e que as empresas teriam se comprometido a resolver o problema e a pagar pelo uso indevido das imagens, o que não ocorreu. Por isso, pediram indenização.

Em sua defesa, a agência alegou que apenas atuou como intermediária entre os autores e a empresa responsável pela campanha publicitária. Sustentou ainda que o contrato de cessão de imagem não possuía prazo determinado e que não obteve vantagem econômica com a veiculação posterior.

A decoradora, por sua vez, afirmou desconhecer que as imagens continuavam sendo divulgadas e disse que, depois de ser notificada, propôs pagar um valor justo pelos nove meses excedentes da publicidade. Ambas as rés sustentaram que não houve dano indenizável.

O 1º Juizado Especial Cível de Águas Claras (DF) concluiu pela responsabilidade civil das rés e as condenou ao pagamento de indenização por danos materiais e morais ao casal. As duas empresas recorreram, pedindo a improcedência dos pedidos.

Ao analisar os recursos, a turma observou que, com base nas provas, ficou demonstrada a veiculação da imagem dos autores e de seus filhos menores depois do prazo previsto em contrato. O colegiado manteve a sentença que reconheceu a responsabilidade das rés.

Quanto aos valores, a turma entendeu ser necessária a readequação da indenização por danos materiais. O colegiado observou que o contrato original previa o pagamento de R$ 1.300 pelo período de um ano e que a veiculação indevida durou nove meses.

“Tem vez a redução do quantum indenizatório para R$ 2 mil , considerando-se o tempo de veiculação e eventuais acréscimos decorrentes da mora em realizar a recomposição aos autores, pois entendo que essa quantia melhor atende aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e vedação ao enriquecimento sem causa”, afirmou o relator.

Em relação aos danos morais, a turma decidiu manter o valor fixado na sentença, destacando que houve “exposição indevida de imagens dos autores e de seus filhos menores em ambiente comercial, o que configura violação aos direitos da personalidade e enseja reparação”.

Assim, a turma deu provimento parcial ao recurso da decoradora para fixar em R$ 2 mil a indenização por danos materiais. As rés deverão, de forma solidária, pagar ao casal também R$ 5 mil a título de danos morais.

A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-DF.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0704221-79.2025.8.07.0020

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TNU fixa tese sobre informações técnicas necessárias ao reconhecimento da atividade especial por exposição ao calor

O pedido de uniformização foi julgado pelo Colegiado na sessão de 12 de novembro

Em sessão ordinária realizada em 12 de novembro, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento, nos termos do relator, ao pedido de uniformização interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em caso envolvendo o reconhecimento de atividade especial por exposição ao agente agressivo calor. O julgamento como representativo de controvérsia foi conduzido pelo relator, juiz federal Rodrigo Rigamonte Fonseca, que apresentou voto fixando a seguinte tese:  

“a) para se apurar o limite de exposição ao agente agressivo calor entre 6/3/1997 e 18/11/2003, em regime de trabalho intermitente com períodos de descanso no próprio local de prestação de serviço (Quadro n. 1 do Anexo n. 3 da NR-15), não se faz necessária a indicação no PPP (ou LTCAT) da taxa de metabolismo (Kcal/h), pois o tipo de atividade (leve, moderada ou pesada), desde que enquadrada em uma mesma categoria, é obtido pela descrição do labor exercido pelo segurado (Quadro n. 3 do Anexo n. 3 da NR-15); 

b) para se apurar o limite de exposição ao agente agressivo calor entre 6/3/1997 e 18/11/2003, em regime de trabalho intermitente com período de descanso em local diverso daquele de prestação de serviço, ou no mesmo ambiente quando os tipos de atividades não se enquadrarem na mesma categoria (leve, moderada ou pesada), é imprescindível a indicação no PPP (ou LTCAT) da taxa de metabolismo média ponderada para uma hora M (Kcal/h), conforme Quadro n. 2 do Anexo no 3 da NR-15; e 

c) para se apurar o limite de exposição ao agente agressivo calor, a partir de 19/1/2004, ou facultativamente, 19/11/2003, é imprescindível a adoção da metodologia e dos procedimentos NHO 06 da FUNDACENTRO, bem como a indicação no PPP (ou LTCAT) da taxa de metabolismo média ponderada para uma hora M (W), conforme Anexo n. 3 da NR-15 (Quadro n. 2 da Portaria SEPRT n. 1.359, de 9/12/2019, e Quadro n. 3 da Portaria MTP n. 426, de 7/10/2021)” – Tema 323. 

O pedido foi apresentado pelo INSS contra acórdão da Turma Recursal da Paraíba (PB), que havia mantido sentença concessiva de aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado, reconhecendo a especialidade dos períodos trabalhados sob exposição a ruído e calor. A discussão central era definir quais informações técnicas devem constar no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) ou no Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT), para permitir a aferição correta da insalubridade decorrente do calor. 

A tese uniformiza o entendimento sobre a documentação e os parâmetros exigidos para o reconhecimento da atividade especial por exposição ao calor, sendo imprescindível a indicação da taxa de metabolismo média ponderada para uma hora de atividade do segurado.  

Leia o representativo completo no Portal do CJF

Processo n. 0510577-41.2020.4.05.8200 

Fonte: CNJ

Quem salva uma vida, salva toda a humanidade: o perigo da indiferença

“Quem salva uma vida, salva toda a Humanidade” — este princípio, nascido da sabedoria talmúdica e reafirmado no coração da tradição judaica, alcança sua dimensão mais dramática quando confrontado com as grandes tragédias históricas em que vidas humanas foram sistematicamente destruídas.

Cada vida é um universo singular, dotado de memória, destino, vocação e dignidade; e quando se atenta contra uma existência, não se elimina apenas um indivíduo: interrompe-se a possibilidade inteira de um mundo.

À luz da “Shoah”, compreende-se que a destruição nazista não visou apenas eliminar corpos, mas aniquilar existência, apagando nomes, culturas, genealogias e futuros. Cada criança assassinada em Auschwitz representava uma futura escola não aberta, um lar que não se formaria , um Shabat que não se celebraria, um futuro que jamais aconteceria.

Mas a lição ética que se extrai dessa tragédia não pertence apenas ao povo judeu: ela se projeta como advertência universal e permanente, pois onde uma vida é destruída, toda a humanidade é ferida.

Essa verdade dolorosa também ressoa nos extermínios, perseguições e massacres vividos por outros povos e nações ao longo da história. Em cada uma dessas tragédias humanas, uma vida eliminada é também um universo destruído; um povo atingido é uma ferida aberta na história do mundo.

A memória da “Shoah” — assim como a memória de todos os genocídios e perseguições humanas — exige um compromisso: não negar, não relativizar, jamais esquecer!

Por isso, a frase “Quem salva uma vida, salva toda a Humanidade” é hoje mais do que sabedoria espiritual ou mandamento religioso: é fundamento ético, político e civilizatório. Ela nos lembra que a humanidade não se destrói apenas quando morre uma multidão. A humanidade começa a morrer quando se permite que uma única vida deixe de ser reconhecida como portadora de infinito valor!

Salvar alguém da morte, da fome, da violência, da escravidão, da miséria, da perseguição, do racismo, da humilhação, do abandono ou do ódio é reafirmar que o ser humano é inviolável, e que nenhum projeto — nacional, ideológico, econômico, étnico ou religioso — pode reivindicar o direito de eliminar o outro.

Assim, a memória de cada tragédia humana nos conclama a uma só tarefa: salvar a vida, proteger a dignidade, honrar o futuro.

Salvar uma vida é restaurar o mundo; proteger um povo é proteger a humanidade.

Entendo que as considerações preliminares ora expostas guardam inteira pertinência com o tema discutido no excelente texto da jornalista DORRIT HARAZIM (“Indiferença ao Mal”), que trata , com grande propriedade, de questão da mais elevada sensibilidade e importância , referente ao grave problema da omissão e indiferença perante o mal !

A respeito desse precioso artigo, corretíssimo em suas observações, pareceu-me oportuno formular , a título de reflexão, algumas considerações de ordem pessoal.

A história da humanidade, em suas páginas mais sombrias, tem nos advertido, de modo eloquente e dramático, que o mal não necessita, para triunfar, apenas da ação dos perversos, dos tiranos ou dos que se deixam dominar pela sedução autoritária do poder. Não. Para que o mal prevaleça — como lúcidamente advertiu Edmund Burke — basta que os homens e as mulheres de bem se omitam, silenciando diante da afronta, acomodando-se à injustiça ou afastando-se, por covardia moral, do dever de resistir.

A indiferença, em sua frieza moral e em sua insidiosa passividade, converte-se na mais grave enfermidade espiritual das sociedades democráticas. Ela representa a falência do compromisso ético que deve animar a vida civilizada, pois, como recordou Hannah Arendt ao tratar da “banalidade do mal”, a tirania não se sustenta apenas pela vontade criminosa dos que mandam, mas pela abdicação intelectual, moral e política daqueles que, podendo erguer a voz, preferem não pensar, não ver e não agir.

O silêncio cúmplice — seja ele motivado pelo medo, pela indolência, pelo cálculo pessoal ou pela apatia — transforma o espectador em coautor moral do agravo à dignidade humana. É por isso que Dante Alighieri, com rigor poético e visão profética, reservou, na “Divina Comédia”, lugar de reprovação não apenas aos ímpios, mas também aos neutros, àqueles que, diante dos conflitos essenciais do espírito humano, se recusaram a tomar posição, tornando-se indignos até mesmo do inferno….

O pensamento republicano, desde Cícero, recorda que a virtude pública consiste na defesa intransigente do justo e do bem. A ética kantiana, por seu turno, ensina que nenhuma conveniência pode suplantar o dever moral. E o testemunho sofrido de Elie Wiesel , Primo Levi e Viktor Frankl , todos sobreviventes do Holocausto , demonstra que o terrível século XX não foi, lamentavelmente, apenas obra dos que oprimiram, exterminaram e degradaram, mas também dos que — vendo — nada fizeram.

A indiferença, pois, constitui perigosa forma de deserção cívica. Ela nega a solidariedade, afronta o princípio da fraternidade humana, despreza o mandamento ético revelado pelo rosto do Outro e compromete, de maneira profunda, o próprio sentido da democracia, regime político que não admite espectadores morais, mas exige participantes responsáveis.

Impõe-se , portanto , proclamar, com firmeza e sem ambiguidades, que não há neutralidade possível diante do mal, seja este exercido contra a pessoa, contra a sociedade, contra as instituições ou contra a ordem constitucional. Quem se omite, colabora; quem desvia o olhar, abdica da condição de sujeito moral da história.

Que jamais nos falte coragem, portanto — essa forma superior de lucidez ética — , para resistir ao mal, denunciá-lo e enfrentá-lo, como imperativo que se impõe à consciência, à Constituição e à dignidade da pessoa humana.

Há a considerar, ainda, a questão pertinente à responsabilização de quem – Estado , sociedade ou indivíduo – se omite perante o mal ou a ele se mostra indiferente.

Ou, em outras palavras, haverá punição para quem se omite e se mostra indiferente ao mal ?

A questão da responsabilidade pela omissão e pela indiferença diante do mal atravessa a história da ética, da filosofia e do Direito. Embora nem sempre o ordenamento jurídico consiga punir, de modo formal, a omissão moral de quem assistiu ao mal sem reagir, a tradição filosófica, a consciência ética das civilizações e determinados sistemas jurídicos afirmam que a omissão pode, sim, configurar culpa , corresponsabilidade ou até mesmo participação indireta no mal praticado.

No plano da Filosofia Moral, desde Aristóteles, já se reconhecia que a virtude não consiste apenas em evitar o mal, mas em praticar o bem, pois a ética é ação, não neutralidade.

Mais tarde, Kant consideraria moralmente reprovável toda conduta que, por comodidade ou interesse próprio, negue o dever de agir: quem pode impedir o mal e não o faz, viola o imperativo categórico, pois trata o próximo como meio descartável, e não como fim.

Hannah Arendt analisou de modo dramático essa omissão em seu conceito de “banalização do mal”, demonstrando que o mal extremo não precisa de monstros, mas de funcionários obedientes e espectadores indiferentes. A ausência de indignação, para ela, é uma forma de derrota ética.

No campo fenomenológico, o filósofo e pensador judeu, naturalizado francês, Emmanuel Lévinas , detido pelos nazistas – e cujos irmãos, além do seu próprio pai, foram vítimas durante a “Shoah”, assassinados pela SS – afirma, ao formular seu pensamento fundado na “ética da alteridade” (“responsabilidade radical do eu para com o “Outro”), que o rosto do “outro” nos convoca moralmente, e negar essa convocação — ou seja, recusar-se a agir quando o outro sofre — é uma transgressão do dever ético fundamental da responsabilidade pelo próximo.

A História , por sua vez, mostra que a omissão coletiva pode conduzir a consequências trágicas, e que a responsabilidade moral recai também sobre os que se calaram.

No Holocausto (“Shoah”) , por exemplo, tanto Elie Wiesel quanto Primo Levi e Viktor Frankl denunciaram que milhões morreram não apenas pela ação monstruosa dos nazistas, mas pela omissão de sociedades inteiras, muitas das quais permaneceram indiferentes à marca do ódio e aos horrores perpetrados pelos totalitários nazistas nos campos de extermínio !!!

Durante os regimes totalitários do século XX, como o nazismo, o stalinismo e o franquismo, grande parte das violências se perpetuou pela passividade e pelo medo social.

Nelson Mandela, refletindo sobre o “apartheid”, afirmou que não é o ódio do opressor que mais prolonga a injustiça, mas o silêncio dos que dizem amar a justiça.

A punição histórica, nesses casos, manifesta-se como vergonha coletiva e legado moral condenatório, que se perpetuam por gerações.

Alguns sistemas jurídicos, de outro lado, reconhecem expressamente a responsabilidade por omissão. No Direito Penal contemporâneo, existe a figura da “comissão por omissão”, quando o agente, podendo e devendo agir, não impede o resultado ilícito.

Tribunais internacionais também reconheceram, no pós-guerra, que governantes e autoridades não podem alegar neutralidade ou obediência burocrática. Exemplo emblemático foi o Tribunal de Nuremberg, que fixou o princípio de que “obedecer não é desculpa moral nem jurídica”.

Hoje, a jurisprudência internacional discute a responsabilidade por omissão estatal diante de genocídios, limpeza étnica, desastres humanitários e violações massivas de direitos.

A indiferença , desse modo , pode – e deve – ser moralmente punida, filosoficamente condenada, historicamente lembrada e juridicamente responsabilizada !!!

Em suma : a omissão perante o mal não pode escapar ilesa.
Mesmo quando não alcançada pelo castigo penal, ela é julgada pela consciência, pela história, pela filosofia e pela memória dos povos.

O mal precisa da neutralidade para prosperar; a omissão, portanto, não é ausência de ação — é uma forma disfarçada de participação!!!

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Banco Central detalha regras sobre ativos virtuais

Para proporcionar ainda mais segurança e eficiência ao Sistema Financeiro Nacional (SFN), o Banco Central (BC) regulamentou a autorização e a prestação de serviços de ativos virtuais, e criou as sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais (SPSVAs). Além disso, normatizou quais atividades ou operações com ativos virtuais se inserem no mercado de câmbio e quais situações estão sujeitas à regulamentação de capitais internacionais. 

Ativos virtuais, como criptomoedas, são representações digitais de valor que podem ser negociadas, transferidas ou utilizadas em transações eletrônicas. Eles existem apenas em formato digital, não têm uma forma física, não são tangíveis (existem apenas em sistemas eletrônicos) e podem ser usados como meio de troca, reserva de valor ou para acessar serviços.  

Clique para assistir à entrevista coletiva que detalhou as Resoluções BCB 519, 520 e 521.

“As normas tratam basicamente da prestação de serviços de ativos virtuais, o processo de autorização para prestar o serviço de ativos virtuais e como que isso será tratado, tanto no mercado de câmbio quanto nas informações relativas a capitais internacionais”, disse

Gilneu Vivan, Diretor de Regulação do BC

Prestação de Serviços  

A Resolução BCB 520 disciplina a prestação de serviços de ativos virtuais, quem poderá prestar esse serviço e a constituição e o funcionamento das SPSAVs. 

A regulação estende às entidades que prestarem serviços de ativos virtuais exigências que já são cobradas de outras instituições integrantes do SFN, tais como: proteção e transparência nas relações com os clientes; prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo; requisitos de governança; segurança; controles internos; prestação de informação; entre outras obrigações e responsabilidades. 

Esses serviços poderão ser prestados por algumas das instituições autorizadas a funcionar pelo BC e pelas SPSAVs criadas exclusivamente para essa finalidade. As SPSAVs atuarão conforme sua classificação: intermediária, custodiante e corretora de ativos virtuais. 

“As novas regulamentações vão trazer mais segurança para quem investe em ativos virtuais no Brasil, já que essas empresas passam a estar dentro do perímetro regulatório do BC e sujeitas ao nosso processo de autorização, supervisão e acompanhamento. O objetivo é trazer mais confiança e proteção ao usuário desses ativos”, reforçou o Diretor de Regulação. 

A Resolução BCB 520 entra em vigor em 2 de fevereiro de 2026.

Autorização 

A Resolução BCB 519, por sua vez, estabelece as regras para a autorização de funcionamento das SPSAVs. A norma também atualiza os processos de autorização relacionados a alguns segmentos antes regulados pelo CMN, como sociedades corretoras de câmbio, corretoras de títulos e valores mobiliários, e distribuidoras de títulos e valores mobiliários. A norma traz ainda regras gerais comuns a todos esses segmentos e regras específicas para assegurar uma transição segura e organizada para o segmento das SPSAVs. 

Vivan ressaltou que as sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais devem seguir padrões rígidos de proteção de dados e ativos digitais, além de realizar testes de estresse e responder por falhas e perdas causadas por eventuais negligências nessa área 

Segundo ele, a estrutura que está sendo criada vai permitir a rastreabilidade adequada dos ativos virtuais negociados no país, sendo possível saber quem negociou determinado ativo virtual, por onde ele passou e para onde ele foi. 

A Resolução BCB 519 entra em vigor em 2 de fevereiro de 2026.  

Câmbio e capitais internacionais  

Já a Resolução BCB 521 estabelece regras para algumas atividades das prestadoras de serviço de ativos virtuais (PSAVs), que passam a ser tratadas como operações do mercado de câmbio e capitais internacionais.

Passam a ser consideradas operações no mercado de câmbio as seguintes atividades realizadas com ativos virtuais: 

– pagamento ou transferência internacional usando ativos virtuais;  

– transferência de ativo virtual para cumprir obrigações decorrente do uso internacional de cartão ou outro meio de pagamento eletrônico;  

– transferência de ativo virtual para ou a partir de carteira autocustodiada, que não envolva pagamento ou transferência internacional com ativos virtuais, observando que a PSAV deve identificar o proprietário da carteira autocustodiada e manter processos documentados para verificar a origem e o destino dos ativos virtuais; 

– compra, venda ou troca de ativos virtuais referenciados em moeda fiduciária. 

Desde que autorizadas a operar no mercado de câmbio, as PSAVs podem prestar serviços de ativos virtuais nesse mercado.  

Para instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio que possuem limites de valor por operação de câmbio com clientes, tais como corretoras e distribuidoras, os pagamentos e as transferências internacionais com ativos virtuais passam a observar os mesmos limites quando a contraparte não for instituição autorizada a operar nesse mercado. 

A norma está de acordo com as melhores práticas internacionais sobre o assunto, recomendadas pelo Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro (Gafi) e pelo Financial Stability Board (FSB), e também aborda questões relacionadas a transparência e combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo (PLD/FT). 

A Resolução BCB 521 entra em vigor em 2 de fevereiro de 2026.  

Marco  

“São regras muito relevantes para a segurança do SFN. Trazemos normas explícitas para que as prestadoras de serviço tenham mecanismos para identificar o mau uso e práticas espúrias desse mercado, evitando prejuízos para os clientes. O grande desafio foi equilibrar o incentivo à inovação com a segurança da negociação de ativos virtuais para o sistema financeiro”, concluiu o Diretor de Regulação. 

Saiba mais sobre o assunto aqui. A coletiva de imprensa que detalhou todas essas regras pode ser conferida aqui​

Fonte: BC

Mantida indenização para autor que teve obra publicada com pseudônimos escolhidos pela editora

O autor de uma obra literária, artística ou científica, na condição de titular dos direitos morais sobre sua criação, tem o direito de escolher o pseudônimo pelo qual quer ser identificado. Com base nisso, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou ilícita e passível de indenização a conduta de uma editora que publicou um livro como sendo de dois autores – pseudônimos criados por ela própria –, sem autorização do verdadeiro autor e sem mencionar o pseudônimo escolhido por ele.

O colegiado seguiu por unanimidade o voto do relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que negou provimento ao recurso especial da editora, condenada a pagar R$ 264 mil de danos materiais e R$ 20 mil de danos morais por ter publicado um livro didático de ciências sem aviso prévio ao autor e sem citar seu nome ou pseudônimo.

Ao propor a ação, o autor afirmou que o livro foi lançado no mercado tendo na capa dois nomes inventados pela própria editora, como se fossem dos autores, sem o seu prévio consentimento. Além de condenar a editora ao pagamento das indenizações, o juízo de primeiro grau determinou que o nome do autor fosse inserido em todas as futuras edições da obra, bem como em erratas dos exemplares ainda não distribuídos. O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) manteve a sentença.

Direitos morais do autor são personalíssimos, inalienáveis e irrenunciáveis

Ao STJ, a editora argumentou ter havido julgamento extra petita e violação da Lei dos Direitos Autorais (Lei 9.610/1998), sustentando que o TJPE teria anulado indevidamente cláusulas contratuais sobre a alienação dos direitos morais do autor. Alegou que o contrato previa a cessão total dos direitos autorais e a possibilidade de uso de pseudônimo, inexistindo, portanto, publicação não autorizada.

Em seu voto, Ricardo Villas Bôas Cueva enfatizou que a Lei 9.610/1998 estabelece que os negócios sobre direitos autorais devem ser interpretados de forma restritiva, devendo ser reconhecidos limites para a cessão desses direitos – os quais se dividem em patrimoniais e morais.

Segundo o magistrado, os direitos morais são personalíssimos, inalienáveis e irrenunciáveis, enquanto os direitos patrimoniais podem ser objeto de alienação, conforme os artigos 27 e 28 da norma. Embora a lei permita a transferência total ou parcial dos direitos patrimoniais a terceiros, por meio de cessão, licenciamento, concessão ou outros instrumentos jurídicos, tal transferência nunca alcança os direitos morais e os expressamente excluídos pela lei – explicou.

Alienação de direitos patrimoniais não afeta titularidade dos direitos morais

O ministro afirmou que a alienação dos direitos patrimoniais não compromete a titularidade dos direitos morais do autor, sendo-lhe garantida a prerrogativa de decidir sobre a forma de identificação de sua obra – direito que não pode ser transferido ou alienado ao cessionário de seus direitos patrimoniais – e assegurada a proteção de sua personalidade criativa.

“O criador da obra literária, artística ou científica poderá usar de seu nome civil, completo ou abreviado até por suas iniciais, de pseudônimo ou qualquer outro sinal convencional. Na mesma linha, é direito moral do autor de obra intelectual ter divulgado em cada exemplar seu nome ou pseudônimo”, declarou Cueva, citando o artigo 24, inciso II, da Lei 9.610/1998. “Cabe ao autor intelectual da obra, como titular de direito moral, a escolha do pseudônimo que possa identificá-lo”, acrescentou. 

No caso em julgamento, segundo o ministro, a editora incorreu em ilegalidade ao publicar o livro utilizando pseudônimos criados por ela própria, sem mencionar o pseudônimo escolhido pelo autor e sem qualquer autorização ou participação deste, “de modo que são devidos os danos morais e materiais aplicados pelas instâncias ordinárias”.

Leia o acórdão no REsp 2.219.796

Fonte: STJ

Marcado pelo risco de manipulação, espelhamento de WhatsApp divide turmas do STJ

O Superior Tribunal de Justiça vai estabelecer uma tese vinculante sobre a validade de provas obtidas a partir de espelhamento de aplicativos de mensagens, como o WhatsApp. Enquanto isso não acontece, o cenário atual sobre o tema é de precedentes conflitantes entre si nas turmas criminais da corte. Criminalistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico veem a prática com receio e defendem sua restrição, devido ao risco de manipulação de mensagens.

O espelhamento ocorre no WhatsApp Web (versão do aplicativo para navegador do computador). A partir da leitura de um código QR, um dispositivo da polícia é pareado com o do investigado. Sem que essa pessoa saiba, os investigadores ganham acesso às conversas já armazenadas e também às futuras, assim como a possibilidade de enviar mensagens, editá-las e apagá-las sem deixar vestígios.

Em 2018, a 6ª Turma do STJ anulou provas obtidas por meio desse método (RHC 99.735). Os ministros ressaltaram que o espelhamento permite às autoridades o envio de novas mensagens e a exclusão de mensagens antigas ou recentes com total liberdade, sem deixar rastros no aplicativo, no dispositivo ou nos servidores da empresa.

Com isso, para se defender, o acusado precisa provar que determinada mensagem existiu e foi apagada pela polícia — algo impossível, enquadrado no conceito de “prova diabólica”.

Essa tese foi reafirmada em 2021, quando a mesma turma anulou provas obtidas por espelhamento em um caso no qual havia autorização judicial prévia para tal medida.

Já no último ano, a 5ª Turma do STJ teve um entendimento diferente e validou o espelhamento como técnica especial de investigação, desde que amparado por autorização judicial e outros requisitos.

O colegiado considerou que as provas obtidas por meio de espelhamento do WhatsApp Web devem ser presumidas como válidas. Ou seja, é desnecessário fazer uma perícia para comprovar a autenticidade do material, devido à fé pública dos policiais.

De acordo com esse precedente, o espelhamento também precisa ser proporcional e subsidiário, bem como estar fundamentado e sujeito ao controle judicial.

Risco de abusos

Na visão de Dellano Sousa, advogado criminalista e perito em computação forense, o espelhamento do WhatsApp é um método “tecnicamente inseguro, pois cria um acesso remoto contínuo ao aplicativo sem gerar hasheslogs, metadados ou qualquer outro registro que permita validar a autenticidade do conteúdo”.

Hashes são como “impressões digitais” de um arquivo eletrônico, que permitem saber se o conteúdo foi alterado. Já os logs são registros das ações feitas em um sistema, que indicam quem o acessou e quando.

O problema, portanto, é a “falta de garantia de integridade”. Sem uma “extração forense formal”, com ferramentas certificadas, não há como verificar se mensagens foram alteradas, inseridas ou removidas.

Sousa também aponta que o método não segue os padrões técnicos do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), da Organização Internacional para Padronização (ISO) e da Comissão Eletrotécnica Internacional (IEC).

De acordo com ele, provas digitais precisam ser íntegras (sem alterações desde sua coleta), auditáveis, justificáveis e repetíveis (se outra pessoa seguir o mesmo procedimento, deve conseguir obter o mesmo resultado).

O espelhamento não atende a nenhum desses requisitos. Por isso, tecnicamente, o material não é confiável. O ideal, segundo o advogado, seria que essa técnica não fosse utilizada.

Para Andréa D’Angelo, “é necessário impor limitações” às provas decorrentes de espelhamento de WhatsApp, pois elas têm “caráter volátil” e são “facilmente manipuláveis”. A advogada destaca que é inviável “a constatação de autenticidade, integridade e origem” das mensagens.

Entre os critérios propostos por D’Angelo para o procedimento estão: autorização judicial fundamentada; demonstração de que é impossível produzir a prova por outros meios; prazo determinado; preservação da cadeia de custódia da prova; e imposição de um controle judicial rígido e contínuo.

Por outro lado, ela considera difícil proibir a prática, já que o artigo 10-A da Lei de Organizações Criminosas permite a “ação de agentes de polícia infiltrados virtuais”.

Em recente texto na coluna “Justo Processo”, da ConJur, os juízes Daniel Avelar e Valdir Ricardo Lima Pompeo Marinho avaliaram que o espelhamento é um meio de obtenção de prova “atípico e híbrido”. Portanto, exige regulamentação legal para mitigar eventuais abusos na investigação.

Eles acreditam que o precedente de 2024 da 5ª Turma “não estabelece limites temporais claros” e “implicitamente atribui ao investigado o encargo de demonstrar algo tecnicamente inverificável”. A cadeia de custódia, explicam, deve ser preservada pelo Estado, e “não compete ao acusado demonstrar a violação”.

Por isso, Avelar e Marinho sugerem alguns requisitos mínimos para uma legislação sobre o tema, entre eles a autorização judicial fundamentada, específica e delimitada no tempo; a cadeia de custódia digital com certificação técnica; e o contraditório, com acesso efetivo do acusado aos dados técnicos.

Pela proposta, a autorização judicial deve dizer se o espelhamento se limitará ao acompanhamento passivo das mensagens ou se haverá também intervenção ativa dos investigadores. “Toda intervenção ativa deve ser previamente autorizada judicialmente e documentada, sob pena de nulidade”, indicam.

Essa autorização deve abranger somente conversas com “pertinência temática direta”. Conversas protegidas por sigilo profissional devem ser segregadas e dados irrelevantes devem ser destruídos. Também deve ser proibido o compartilhamento das conversas para outros fins.

Os dois juízes entendem que é preciso demonstrar quais outros meios de obtenção de prova foram considerados, por que eles se revelaram inadequados e em que medida o espelhamento contorna essa inadequação. Para eles, não basta a mera menção à criptografia, nem a alegação genérica de que a segurança pública deve prevalecer sobre a privacidade individual.

Ainda segundo os magistrados, o espelhamento só é legítimo para crimes graves, especialmente aqueles praticados por organizações criminosas.

Muito além do grampo

A discussão sobre o espelhamento surge porque ele é diferente da interceptação telefônica tradicional — o chamado “grampo”, medida prevista na Lei 9.296/1996.

Na interceptação, a polícia “captura comunicações no instante em que ocorrem, sem interferência no conteúdo”, como explicam Avelar e Marinho. Já o espelhamento dá acesso às mensagens já armazenadas no dispositivo e permite o acompanhamento de novos diálogos.

“A interceptação é um procedimento regulado, com início e fim definidos, restrita a comunicações em trânsito e acompanhada de registros mínimos de auditoria”, explica Dellano Sousa. “Ela opera dentro de um ambiente tecnicamente controlável: há logs, delimitação temporal e alguma rastreabilidade sobre o que foi captado.”

Já o espelhamento, segundo ele, é o oposto disso: um acesso remoto permanente ao aplicativo, sem hash, metadados, trilha de auditoria ou qualquer mecanismo que permita comprovar “integridade, autenticidade ou cadeia de custódia”.

O advogado também destaca que o espelhamento permite acesso não só ao histórico de mensagens, mas também a outros arquivos, documentos, fotos e contatos armazenados. Trata-se de “um universo de dados que jamais seria alcançado por uma interceptação em sentido estrito”.

Devido a todo esse acesso, à captação de comunicações “no exato momento em que elas acontecem” e à possibilidade de que as autoridades enviem mensagens como se fossem o investigado ou ainda apaguem diálogos, D’Angelo enxerga o espelhamento como algo “extremamente perigoso” do ponto de vista da legalidade e da cadeia de custódia. Por isso, ela defende que as regras para o espelhamento sejam mais rigorosas do que aquelas voltadas à interceptação telefônica.

REsp 2.052.194

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Relator nega pedido para revogar ordem de prisão contra empresário condenado pela morte de ciclista

O ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou o habeas corpus requerido pela defesa do empresário José Maria da Costa Júnior, que buscava revogar a ordem de prisão expedida contra ele. Condenado pelo atropelamento que resultou na morte da socióloga e ciclista Marina Harkot, ocorrido em 2020, o empresário está foragido.

Marina foi atropelada enquanto pedalava pela Avenida Paulo VI, em Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo. Sua bicicleta foi atingida na traseira pelo carro conduzido pelo empresário. As investigações apontaram que o veículo trafegava a 93 km/h, quase o dobro da velocidade permitida no trecho, que era de 50 km/h.

O motorista foi julgado e condenado pelo tribunal do júri a 12 anos de reclusão pelos crimes de homicídio com dolo eventual – quando se assume o risco de matar –, embriaguez ao volante e omissão de socorro. Como respondia ao processo em liberdade, permaneceu solto após o julgamento.

O Ministério Público, porém, recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que, por maioria, determinou o imediato recolhimento do réu à prisão. Com a expedição do mandado, policiais foram até o endereço onde ele havia informado que estaria, mas não o encontraram. Como o condenado tampouco se apresentou espontaneamente, ele passou a ser considerado foragido.

Soberania dos veredictos autoriza a imediata execução da condenação

Ao STJ, defesa alegou constrangimento ilegal, afirmando que o mandado de prisão carece de fundamentação concreta. Sustentou que a execução imediata da condenação não é automática, não implica prisão preventiva, exige motivação específica e não pode funcionar como antecipação de pena. Invocou, ao final, o princípio da presunção de inocência e a necessidade de uma decisão individualizada.

O ministro Sebastião Reis Júnior, relator do pedido, ressaltou que o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Tema 1.068 de repercussão geral, fixou que a soberania dos veredictos do tribunal do júri autoriza a imediata execução da condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada. Assim – afirmou –, não cabe ao STJ decidir em sentido contrário, sob pena de violar a segurança jurídica.

“Destaco que o STF tem decidido, em relação à aplicação do Tema 1.068, que, nos termos do artigo 2º do Código de Processo Penal, a lei processual penal tem eficácia imediata, preservando-se os atos praticados anteriormente à sua vigência, porque vigora, no processo penal, o princípio tempus regit actum, segundo o qual são plenamente válidos os atos processuais praticados sob a vigência de lei anterior, uma vez que as normas processuais penais não possuem efeito retroativo”, concluiu ao indeferir o pedido de habeas corpus.

Fonte: STJ

100 anos do Carf, o desconhecido do tributário

O Carf completou 100 anos em 14 de setembro de 2025. Do primeiro Conselho de Contribuintes do Imposto de Renda no Distrito Federal até a versão atual instalada em 2009, é este colegiado o responsável pela interpretação técnica da legislação tributária brasileira.

A entrada no segundo século brindou o conselho com uma nova sede, menor e mais funcional. “O prédio antigo é de uma época em que tínhamos muitos processos em papel”, diz o presidente do órgão, Carlos Higino Ribeiro de Alencar. “O novo espaço é mais adequado às questões do Carf.”

O conselho mexeu, também, no seu regimento interno, ampliou o número de turmas ordinárias e conselheiros e planeja lançar uma solução de inteligência artificial para auxiliar no julgamento dos 73 mil recursos em tramitação, que totalizam R$ 1 trilhão em disputa.

página 124 - Anuário da Justiça Direito Empresarial 2025

O Carf é dividido em três seções: a primeira trata principalmente de rendimentos da pessoa jurídica; a segunda analisa rendimentos de pessoas físicas; e a terceira trata de tributos sobre a receita, industrialização e atividade aduaneira. A mudança regimental de 2025 aumentou o número de turmas ordinárias, de 15 para 24, e reduziu as extraordinárias, de 15 para seis. Desde 1931, a estrutura do Conselho é paritária, com igual número de conselheiros representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes. Em caso de empate, o presidente, sempre um representante da Fazenda, dá o voto de qualidade.

No dia a dia das turmas, estão temas de repercussão na sociedade: fusões, como as que ocorreram no setor bancário nos anos 2000, já foram quase todas analisadas pelo Carf; a contratação de embarcações para a exploração de petróleo levou a Petrobras a ser uma das maiores litigantes na casa; e se o Sonho de Valsa tem aparência diferente hoje da que tinha em sua infância, em parte é por decisão do Carf que não o definiu como um bombom para fins de recolhimento do IPI.

página 125 - Anuário da Justiça Direito Empresarial 2025

Na contabilidade do acervo de processos em tramitação, tão importante quanto o número de ações (que caiu 50% em cinco anos) é o valor em disputa – em fevereiro de 2024 este valor atingiu um pico de R$ 1,188 trilhão.

O volume do estoque está duas vezes maior do que em 2020. Nos últimos anos uma combinação de fatores internos (greves e mudanças de turma) e externos (a pandemia) acabou por represar casos de grande valor. De acordo com o próprio Carf, apenas 156 processos concentram R$ 478 bilhões em disputa tributária, enquanto 65 mil (91% do total) têm valor de até R$ 15 milhões.

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A corte sofre com a inconstância da sua composição, que impede a sua perfeita operação. Pelo regimento interno, a troca de um membro resulta em uma nova relatoria, assim como novas sustentações orais das partes. “A turma ideal é aquela que consegue resolver casos de pequena complexidade rapidamente e que dedica mais tempo a casos de maior complexidade”, diz Carlos Augusto Daniel Neto, sócio da Daniel, Diniz e Branco Advocacia Tributária e Aduaneira e ex-conselheiro do Carf. “Com as mudanças de composição e de direção, e com as paralisações, perde-se muito tempo com casos grandes e não se julgam casos menores.”

Para o advogado Wesley Rocha, conselheiro do Carf por oito anos, a morosidade nem sempre é defeito. “Quando há mais julgadores debatendo, irá demorar mais para julgar o processo. Mas essa demora não pode ser vista como prejudicial.”

Em entrevista ao Anuário da Justiça, o presidente Carlos Higino aponta três causas para o aumento do valor do estoque: a greve dos auditores fiscais, que paralisou parte dos julgamentos por meses; a impossibilidade de julgamentos presenciais na pandemia; e as sucessivas mudanças na aplicação do voto de qualidade em quatro anos.

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Por isso, Carlos Higino se vale de uma terceira métrica que, em sua visão, é a mais relevante: fluxo. “A legislação determina que cada recurso deve ser julgado em até 360 dias”, diz. “Já alcançamos essa média na Câmara Superior, onde um caso leva 330 dias para ser julgado. Nosso grande desafio está nas turmas ordinárias, onde o prazo é de três anos. Se houver um estoque de R$ 1 trilhão, mas que gire rápido, estaremos cumprindo a lei e nossa função.”

A litigância no Carf é vista como estratégica e positiva para os contribuintes. A corte não obriga ao pagamento de honorários de sucumbência, os custos processuais são pequenos e não envolvem depósito judicial da causa. Se a empresa ganha, o direito é garantido; se perde, pode optar pela disputa na Justiça Federal, valendo-se do arcabouço técnico da discussão ali travado, com votos favoráveis à sua visão.

Em 2024, pela primeira vez em quatro anos, o número de decisões pró-contribuinte superaram as decisões pró-Fazenda no Carf.

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Saiba mais: projeto aprovado prevê duplo grau de julgamento administrativo em questões fiscais

 

Aprovado pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 124/22 cria a obrigatoriedade de duplo grau de julgamento administrativo em questões fiscais. O texto seguirá para nova votação no Senado.

De acordo com o substitutivo do relator, deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), as regras do texto serão aplicáveis aos entes federativos com mais de 100 mil habitantes, segundo o último censo.

Após o tributo ser exigido pelo Fisco, o contribuinte terá direito de recorrer por meio de uma impugnação, que suspenderá a exigência do tributo enquanto correr o processo administrativo.

De decisão desfavorável em 1ª instância, caberá recurso à 2ª, tanto para o Fisco quanto para o contribuinte. Se a 2ª instância der decisão diferente sobre o mesmo assunto que outro órgão de 2ª instância, caberá recurso a instância superior, se houver.

Em todos os casos, não poderá haver recurso para secretário de estado, ministro ou qualquer outro integrante do Executivo por causa de decisão definitiva favorável ao contribuinte no processo administrativo fiscal.

Outro tipo de recurso, o embargo de declaração, também será permitido para esclarecer o conteúdo da decisão, preencher omissão ou eliminar contradição ou erro material.

Ação na Justiça
Caberá ao contribuinte informar no processo se o assunto é motivo de ação na Justiça. Caso exista, ele deve renunciar ao poder de recorrer na esfera administrativa.

Efeito vinculante
Com o projeto, passam a produzir efeitos no processo administrativo fiscal (efeito vinculante) pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) com efeito vinculante no âmbito judicial.

Assim, isso se aplica a súmulas vinculantes do STF; a decisões transitadas em julgado no Supremo ou no STJ com repercussão geral ou por recursos repetitivos; e a decisões transitadas em julgado no STF por causa do controle concentrado de constitucionalidade nesse tribunal.

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Brasília - monumentos e prédios públicos - Fachada do Supremo Tribunal Federal - STF - Justiça
Decisões do STF terão efeito vinculante no processo administrativo fiscal

Também deverão ser seguidas nos processos administrativos resoluções do Senado Federal que suspenderem a execução de lei ou dispositivo legal considerados inconstitucionais pelo Supremo; e decisões repetidas e uniformes dos tribunais administrativos no âmbito dos entes federados quando compiladas em súmulas.

A fim de não negar pedidos de restituição ou autuar o contribuinte, por exemplo, o tribunal administrativo deve manter banco eletrônico de dados atualizado com informações sobre os fundamentos determinantes da decisão consolidada em súmula a partir dessas decisões reiteradas.

Suspensão automática
Quando o Supremo ou o STJ tiver determinado a suspensão coletiva de processos judiciais para a resolução da mesma questão jurídica, processos administrativos fiscais sobre essa questão também serão suspensos até a decisão final.

Para simplificar o processo administrativo fiscal, seu trâmite e julgamento poderão ser diferenciados em função do valor do crédito tributário discutido, da devolução do pagamento indevido a pedido do contribuinte ou do porte da pessoa jurídica.

Outros pontos
Confira outros pontos do PLP 124/22:

  • a sentença arbitral favorável ao contribuinte e o cumprimento de acordo de mediação extinguem o crédito tributário;
  • a transação, a mediação e a arbitragem especial não caracterizam renúncia de receita para fins da [[g Lei de Responsabilidade Fiscal]];
  • a indicação de corresponsáveis por dívida ativa dependerá de apuração prévia em processo administrativo ou judicial;
  • prazo de validade de certidão negativa de débitos tributários será de 180 dias, o prazo de emissão passa de 10 dias para 5 dias úteis e valerá para acesso a benefícios fiscais, inclusive se tratar de tributos com exigibilidade suspensa;
  • União, estados e municípios terão dois anos para adotar os critérios sobre processo administrativo com duplo grau de jurisdição;
  • Distrito Federal, estados e municípios terão dois anos para adotar descontos de multas listados no projeto a título de moderação sancionatória e dosimetria de penalidade.

Saiba mais sobre a tramitação de projetos de lei complementar

Fonte: Câmara dos Deputados