Conflito de competência

No mais recente episódio de Entender Direito, a jornalista Fátima Uchôa ouviu os juízes trabalhistas e professores universitários Rodolfo Pamplona Filho e Danilo Gonçalves Gaspar sobre os principais aspectos legais e jurisprudenciais do conflito de competência.

Entre outros pontos, os dois magistrados abordam os motivos que podem levar a um conflito entre juízes ou órgãos judiciais quanto ao julgamento de um caso, bem como explicam quem pode suscitar o incidente processual e qual o papel do Superior Tribunal de Justiça (STJ) na solução de tais controvérsias.

Clique na imagem para assistir:  

Fonte: STJ

Terceira Turma não vê abuso em artigo científico que reproduziu acusação criminal não comprovada

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a reprodução, em artigos científicos, de acusação criminal feita por terceiro em rede social, ainda que não comprovada posteriormente, não configura abuso de direito nem gera direito a indenização, desde que configuradas a boa-fé e a finalidade acadêmica.

O caso analisado teve início quando um professor universitário ingressou com ação judicial contra duas pesquisadoras acadêmicas. Além de indenização, ele requereu que fosse excluída, de dois artigos de autoria da dupla, qualquer referência direta ou indireta ao episódio em que uma ex-aluna e estagiária sua cometeu suicídio após acusá-lo de violência de gênero em rede social. O professor alegou que as acusações não foram comprovadas e que a reprodução do conteúdo configuraria abuso de direito e teria causado danos à sua honra.

A Terceira Turma considerou proporcional a medida adotada pelo tribunal de segunda instância, que apenas determinou a supressão do nome do professor do trecho que reproduzia literalmente a postagem original.

Liberdade de informação encontra limites nos direitos de personalidade

A relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, observou que a jurisprudência do STJ considera que a liberdade de informação, de expressão e de imprensa, embora seja uma garantia essencial ao regime democrático, não autoriza o abuso.

“A proteção ao direito de informação não é absoluta, pois encontra limites no ordenamento civil, especialmente quando seu exercício ultrapassa a função social que lhe é inerente e resulta em violação aos direitos da personalidade de terceiro”, afirmou. No entanto, ela entendeu que, nos artigos científicos em questão, não houve qualquer tipo de externalização de ideias, opiniões, juízos de valor, comentários ou acusações a respeito da conduta ou da pessoa do recorrente.

Interesse público se intensifica quando a divulgação tem fins educativos

Outra questão abordada pela ministra foi a distinção entre atividade jornalística e produção científica. Segundo ela, enquanto a imprensa está submetida a dinâmicas comerciais e equipes profissionais, a produção acadêmica é voltada ao desenvolvimento intelectual e à livre circulação de ideias.

“Nesse sentido, a liberdade acadêmica protege não apenas a livre manifestação de pensamento, mas também o exercício do direito à informação, da crítica teórica e da investigação científica, mesmo quando isso implique questionamentos a instituições, doutrinas ou pessoas”, ponderou a relatora. Ela ressaltou que o interesse público é ainda mais presente quando a divulgação ocorre com fins intelectuais, didáticos e não lucrativos.

Além disso, Nancy Andrighi afirmou que os artigos publicados se limitaram a divulgar um acontecimento real e tiveram o intuito acadêmico de discorrer sobre a violência de gênero. “Mais que presumido, o interesse público é manifesto, porquanto a menção ao suicídio da estudante é realizada em um contexto de obra científica que visa a debater as mais diversas formas de violência contra a mulher”, finalizou.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

Relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticos retrata iniciativas do BC na promoção de sistema financeiro mais inclusivo e sustentável

O Banco Central (BC) lança hoje a quinta edição do Relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticos (RIS), publicação anual da Autarquia. Em capítulos temáticos, o RIS sintetiza o empenho do BC em promover um sistema financeiro mais inclusivo e sustentável, por meio de ações e políticas que buscam estimular as finanças sustentáveis e gerenciar responsabilidades e riscos sociais, ambientais e climáticos. É um esforço de consolidação e de transparência do compromisso do BC com a sustentabilidade, sendo também uma ferramenta de prestação de contas à sociedade.

Nesta quinta edição, o relatório preservou seu formato, estruturado em quatro pilares, acrescidos do capítulo de Perspectivas. O conteúdo, entretanto, foi atualizado para incluir iniciativas recentes, como o engajamento do BC na COP30 e o avanço dos estudos e das medidas relativas ao inventário das emissões de gases de efeito estufa pela Autarquia, diante do reconhecimento da importância de contribuir para o esforço global e de minimizar o impacto de suas atividades sobre o meio ambiente.

De forma ampla, o relatório elenca parcerias, ações e estudos adotados pelo BC relacionados à sustentabilidade, ocorridos entre julho de 2024 e junho de 2025, bem como perspectivas de avanço no curto prazo. Além disso, relata o envolvimento da Instituição em iniciativas lideradas pelo governo federal, como a Taxonomia Sustentável Brasileira.

São diversas as iniciativas que merecem destaque: estudos publicados, como a estimação de impactos na economia e eventuais perdas para as instituições financeiras em um cenário de risco climático de transição; análises de exposições de crédito em risco decorrentes de riscos climáticos físicos; e pesquisa de estabilidade financeira sobre riscos climáticos realizada em 2025. 

Entre os avanços regulatórios estão a obrigatoriedade de as instituições financeiras elaborarem e divulgarem relatório de informações sobre sustentabilidade; a consulta pública sobre ativos e passivos de ações de sustentabilidade; e a ampliação da divulgação de informações por instituições financeiras. No crédito rural, foram aprovadas diversas mudanças no Manual de Crédito Rural, e há em perspectiva o projeto de aprimoramento do Bureau. 

Na supervisão, há destaque para a realização de análises horizontais para aplicação dos requisitos de gerenciamento dos riscos sociais, ambientais e climáticos e para a iniciativa Axis, aplicação que utiliza inteligência artificial para analisar os relatórios das auditorias independentes sobre as demonstrações financeiras das entidades supervisionadas pelo BC.

Na gestão de reservas internacionais, o BC tem aumentado o percentual de títulos com rótulo sustentável – lembrando que, desde 2021, definiu-se pela alocação estratégica em green bonds na carteira de referência.

No âmbito social, destacamos os esforços em promover a cidadania financeira, entre eles a gestão de vulnerabilidades, prioridade na agenda da Supervisão de Conduta do BC. A ampliação do Programa Aprender Valor para escolas particulares e para os cidadãos em geral e a participação do BC no fórum brasileiro de educação financeira são outros exemplos.  

No engajamento internacional, na presidência brasileira do G20, foram propostas duas forças-tarefa: uma para a criação de uma “Aliança Global contra a Fome e a Pobreza” e outra voltada à “Mobilização Global contra as Mudanças Climáticas”, além da realização do G20 TechSprint 2024. Durante a presidência brasileira do Brics, foi realizada uma pesquisa com bancos centrais e autoridades supervisoras dos países-membros, com o objetivo de mapear práticas e abordagens de monitoramento e regulação de riscos climáticos, com foco na integração desses riscos aos arcabouços prudenciais e de supervisão. A Autarquia também sediou o workshop temático sobre Finanças Sustentáveis, no âmbito da Data Gaps Initiative (DGI).

Finalmente, ressaltamos que se trata de um documento abrangente, elaborado com o envolvimento de todas as áreas do BC.  Sua publicação reforça a posição da Instituição na vanguarda da agenda sustentável, contribuindo para um sistema financeiro mais seguro e preparado para os desafios climáticos.

Acesse aqui​ a íntegra do RIS.

Fonte: BC

Senado aprimorará contas públicas se limitar dívida federal via PRS 8/25

Às vésperas do 37º aniversário da Constituição de 1988, o Senado tem diante de si, mais uma vez, a oportunidade e o dever histórico de aprimorar a governança fiscal do país. O Projeto de Resolução do Senado (PRS) nº 8, de 2025, de autoria do senador Renan Calheiros, resgata a Mensagem Presidencial nº 154, de 2000, pautando a necessidade incontornável de fixar limite global para o montante da dívida consolidada da União, conforme preceitua o artigo 52, inciso VI, da Carta Magna, desde sua redação originária.

Quase quatro décadas se passaram sem que o Senado tenha se desincumbido da sua competência privativa, por mais que a matéria só demandasse apreciação unicameral da Casa da Federação. Há um quarto de século, a Lei de Responsabilidade Fiscal reiterou o comando constitucional, estabelecendo, em seu artigo 30, o dever de o Executivo remeter proposta de limites para as dívidas de todos os entes da Federação. Todavia, apenas houve balizamento da dívida dos estados, Distrito Federal e municípios no âmbito da Resolução nº 40, de 2001 (disponível aqui).

A ausência de limitação apenas para a dívida pública da União configura uma lacuna normativa que, concomitantemente, enseja assimetria federativa e compromete a transparência, o equilíbrio fiscal e o controle social das finanças públicas do país.

Tamanho vazio regulamentar de dispositivo constitucional tão sensível decorre de interdição promovida por interesses, ora coordenados, ora conflitantes do mercado financeiro e do Executivo federal em torno do limite da dívida pública da União. José Roberto Afonso, em entrevista concedida por ocasião do aniversário de 25 anos da LRF, lucidamente desvendou o impasse em comento:

Embora passados 25 anos [da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal], você tem algumas regras muito importantes da lei que nunca foram regulamentadas. É curioso que nem mesmo aproveitando essa comemoração dos 25 anos não vimos as pessoas se mobilizando, salvo a CAE [Comissão de Assuntos Econômicos] do Senado, que disse que votaria o limite da dívida da União. Mas o governo federal parece não ter maior interesse nisso, nem o atual governo nem o anterior, e muito menos o mercado financeiro, que reclama muito e quer resultado fiscal, mas não fala em limite da dívida. Essa é uma regra que existe no mundo inteiro. No fundo, as pessoas querem restrições de gasto e de renúncia fiscal para os outros, mas não para si. No caso da dívida pública, a preocupação que existe é a de que, em momentos de crise financeira aguda, o governo precisa socorrer o sistema bancário, como já aconteceu em 2008 e na pandemia de Covid, por exemplo. Embora a legislação tenha flexibilidade nesses casos, o que eu sinto é que os credores não querem correr risco. É algo paradoxal: eles reclamam que se deve muito, mas não querem limite da dívida, que é o ponto mais relevante da LRF que falta regulamentar.

[…] O arcabouço é uma lei complementar. O problema é que, no âmbito desta lei complementar, anteciparam metas específicas de sustentabilidade da dívida da União que, na minha opinião, deveriam estar em uma lei ordinária, que muda todo ano. A LRF resolveu isso remetendo à LDO, que é uma lei ordinária. As coisas mudam, você muda. Ora se faz superávit, ora se faz menos superávit ou até déficit. Acho que acabaram deixando o arcabouço muito rígido.”

Idas e vindas no percurso da matéria fizeram com que a precedente tentativa de regulamentar a dívida pública consolidada federal (PRS nº 84, de 2007) fosse arquivada em 21/12/2018. Desde então, a omissão inconstitucional [1] e suas consequências para o agravamento [2] das contas públicas brasileiras têm sido denunciadas, sem que a longa mora legislativa tenha sido, de fato, enfrentada.

Eis o contexto em que o PRS nº 8/2025 (disponível aqui) se apresenta como uma agenda inadiavelmente necessária. Afinal, não é porque um problema é antigo que ele deixa de ser um impasse que reclama solução.

Ao longo dos últimos 37 anos, as contas públicas brasileiras têm se ressentido da falta de balizas sistêmicas, capazes de equalizar a inibição da receita e a escalada das despesas financeiras, ampliando o foco usualmente incidente sobre as despesas primárias, como se sucedeu com a Emenda nº 95, de 2016.

Mesmo após transcorridos exatamente dois anos da edição da Lei Complementar nº 200, de 2023, não foi satisfatoriamente atendida a demanda da Emenda Constitucional nº 109, de 2021, que inseriu inciso VIII no artigo 163 da CF/1988 [3], para que lei complementar explicitasse o que seria a noção de sustentabilidade da dívida pública. Isso ocorre porque o artigo 2º, §§1º e 2º da LC 200/2023 [4] reduziu o foco do que seja dívida pública sustentável apenas ao alcance de metas de resultado primário.

É sintomático que o Teto de Despesas Primárias, sucedido pelo vulgarmente conhecido Novo Arcabouço Fiscal (NAF), respectivamente EC nº 95/2016 e LC nº 200/2023, sejam ambos regimes fiscais aplicáveis exclusivamente à União, enquanto a LRF (LC nº 101/2000) é a única norma, de fato, nacional, aplicável a todos os entes da federados. Apenas essa última reiterou a necessidade constitucional de fixação de limites de endividamento indistintamente para União, estados, DF e municípios.

Sendo o Senado a Casa da Federação, soa contraditório que a câmara alta do Congresso tenha cumprido seu papel ao fixar limites para a dívida consolidada os governos locais e regionais, por meio da Resolução nº 40/2001, sem que equivalente parâmetro tenha sido estabelecido para o governo central. Essa disparidade federativa amplifica a judicialização entre os entes políticos, em meio a uma guerra fiscal cada vez mais danosa para a sociedade.

O Tribunal de Contas da União já havia manifestado preocupação clara sobre essa omissão legislativa no âmbito do seu Acórdão nº 1.084/2018-Plenário. O TCU destacou que a ausência de limites formais para a dívida pública da União compromete a responsabilidade fiscal e torna inviável a transparência e o controle social esperados em um regime democrático.

No julgamento, o Tribunal salientou que a falta dos limites demandados pelo artigo 48, XIV e pelo artigo 52, VI da Constituição, respectivamente, limites de dívida mobiliária e consolidada, dificulta o exercício do controle externo sobre a dívida pública federal. Sem tal baliza normativa, o acompanhamento da sustentabilidade fiscal da União fica comprometido, abrindo espaço para riscos macroeconômicos significativos.

Em um dos seus trechos mais destacados, o Acórdão TCU 1084/2018 buscou informar ao Senado que a omissão em regulamentar os limites de dívida federal (artigos 48, XIV e 52, VI da CF/1988, bem como artigo 30 da LRF), bem como a falta de instituição do Conselho de Gestão Fiscal (artigo 67 da LRF) constituem-se como “fator[es] crítico[s] para a limitação do endividamento público e para a harmonização e a coordenação entre os entes da Federação”. Ambas são lacunas tão significativas que impedem o ordenamento jurídico brasileiro de consolidar um marco regulatório coerente e eficaz sobre o conjunto das finanças públicas do país

Sob todos os prismas temporais, o cenário que se apresenta é historicamente grave e não se revolverá com o mero decurso negligente dos anos, como se não fosse um problema. Trinta e sete anos desde a previsão originária da Constituição de que deveria haver limites de dívida pública para todos os entes da federação, 25 anos desde que a LRF demandou a imediata edição das normas reclamadas constitucionalmente, quatro anos da Emenda Emergencial que previu a necessidade de fixação do regime de sustentabilidade da dívida pública e dois anos da LC nº 200/2023, sem que haja, de fato e de direito, um arranjo jurídico sistêmico que permita monitorar mais de perto o peso das despesas financeiras e das opções de inibição da receita sobre a dívida pública federal.

Não basta monitorar os fluxos orçamentários, sem que se avalie o estoque acumulado da dívida pública, de modo a correlacionar a sua trajetória com os impactos trazidos pelo conjunto das políticas macroeconômicas ao longo do tempo. Afinal, como bem alertado por José Roberto Afonso, na mesma entrevista anteriormente citada, não cabe apenas pautar o debate pelo prisma da política fiscal a cargo do Tesouro Nacional, sem que sejam explicitadas as suas correlações com as políticas cambial, monetária e creditícia, sob responsabilidade do Banco Central:

“Outro vício antigo difícil de se resolver no Brasil é tratar a política fiscal isolada da política monetária, e a política monetária isolada da política cambial, isolada da política comercial, isolada da política social e assim por diante. Está valendo a regra de que cada um é dono do seu quadradinho e pronto. Nós não temos política macroeconômica no Brasil. Não temos equipe econômica. O Brasil deve ser o país que mais fala em política fiscal, mas trata a política fiscal como se fosse algo independente do resto. Ela é causa e consequência: afeta as demais políticas e também é afetada por elas. Temos de voltar a ter mais debates macroeconômicos, formulação de política macroeconômica, ter um plano estratégico. E, aí sim, a política fiscal se inserir nesse contexto. Isso, inclusive, não se resolve com lei. Muito disso tem a ver com prática, com cultura.”

A ausência de um parâmetro normativo claro para a dívida pública federal permite que ela cresça de forma opaca e potencialmente ilimitada por força da atuação do Banco Central, mesmo que as metas primárias venham a ser rigorosamente cumpridas, comprometendo a sustentabilidade financeira do país. Vale lembrar que, no período de agosto de 2024 a junho de 2025, a expansão da taxa básica de juros, a taxa Selic, em 4,5% equivaleu a praticamente o montante de um piso federal anual em saúde.

Dessa forma, o Novo Arcabouço Fiscal, embora tenha tentado avançar em aspectos relevantes, não supriu integralmente a lacuna normativa que o Senado Federal tem o dever constitucional de preencher, tornando urgente a aprovação do PRS nº 8/2025 para fortalecer o regime de responsabilidade fiscal brasileiro.

Para além de proporções específicas e tempo de recondução a limites que o debate político deve avaliar no curso da tramitação da proposta normativa, o que se busca aqui é defender a oportunidade, a relevância e a viabilidade do PRS nº 8/2025. Ali está previsto o dever de o Executivo federal prestar contas regularmente sobre a dívida pública, apresentando justificativas para eventuais desvios e ações corretivas para o cumprimento dos limites. Assim, o projeto fortalece o papel fiscalizador do Senado e amplia a transparência na gestão da dívida pública.

A fixação de limites para a dívida da União não é mero detalhe ou adereço residual em face do conjunto das finanças públicas brasileiras, mas uma questão central para a responsabilidade fiscal, o pacto federativo e a segurança jurídica das contas públicas.

O PRS nº 8/2025 representa, portanto, uma oportunidade singular para o Senado Federal reafirmar sua relevância institucional, regulando o endividamento da União e fechando uma lacuna normativa que compromete a sustentabilidade das finanças públicas e o federalismo brasileiro.

Ao garantir limites claros, transparência e mecanismos de controle, o projeto favorece a estabilidade econômica e social do Brasil. Assim, na iminência de celebrar 37 anos da Constituição Cidadã, o Senado pode e deve se posicionar com visão de futuro, fortalecendo o pacto federativo, a governança pública e a confiança da sociedade nas instituições, por meio da aprovação do PRS nº 8/2025.


[1] Como esta colunista, José Roberto Afonso e Lais Khaled Porto debatemos aqui

[2] No item 9.2 da parte dispositiva do Acórdão 1084/2018-Plenário (cujo inteiro teor está disponível aqui), o Tribunal de Contas da União informou “ao Presidente do Senado Federal que a não edição da Lei prevista no art. 48, inciso XIV, e da Resolução de que trata o art. 52, inciso VI, ambos da Constituição da República, para o estabelecimento de limites para os montantes das dívidas mobiliária federal e consolidada da União, assim como da lei que prevê a instituição do conselho de gestão fiscal, constitui fator crítico para a limitação do endividamento público e para a harmonização e a coordenação entre os entes da Federação, comprometendo, notadamente, a efetividade do controle realizado pelo Tribunal de Contas da União com base no art. 59, § 1º, inciso IV, da Lei Complementar 101/2000, e o exercício do controle social sobre o endividamento público e demais limites fiscais”.

[3] Que assim dispõe: “Art. 163.  Lei complementar disporá sobre:

[…] VIII – sustentabilidade da dívida, especificando:

a) indicadores de sua apuração;

b) níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida;

c) trajetória de convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação;

d) medidas de ajuste, suspensões e vedações;

e) planejamento de alienação de ativos com vistas à redução do montante da dívida.

Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso VIII do caput deste artigo pode autorizar a aplicação das vedações previstas no art. 167-A desta Constituição.”

[4] Cujo inteiro teor é o seguinte: “Art. 2º […]

§1º. Considera-se compatível com a sustentabilidade da dívida pública o estabelecimento de metas de resultados primários, nos termos das leis de diretrizes orçamentárias, até a estabilização da relação entre a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) e o Produto Interno Bruto (PIB), conforme o Anexo de Metas Fiscais de que trata o § 5º do art. 4º da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000(Lei de Responsabilidade Fiscal).

§2º. A trajetória de convergência do montante da dívida, os indicadores de sua apuração e os níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a sustentabilidade da dívida constarão do Anexo de Metas Fiscais da lei de diretrizes orçamentárias.”

O post Senado aprimorará contas públicas se limitar dívida federal via PRS 8/25 apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

OEA e o Trust and Check Trader na União Europeia

O comércio internacional está vivenciando um período de muitas mudanças, incertezas e grandes desafios. O período pós-Segunda Guerra Mundial, dos acordos de Bretton Woods e da assinatura do Gatt, em 1947, pelos 23 países signatários, foi marcado pela busca dos países por promoverem regras para o comércio internacional, estimulando-o. A ideia predominante era de liberalismo, neutralidade e livre concorrência, que se fizeram presentes nos princípios regentes do Gatt, como o da não discriminação, por sua vez estabelecido nas cláusulas da nação mais favorecida e do tratamento nacional [1]. Esse compromisso inicial foi reforçado ao longo das décadas que se seguiram, com maior ou menor intensidade, culminando com a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1995.

Nesse período e nos anos que se seguiram, o mundo assistiu ao crescimento do fluxo global de comércio, do liberalismo, do multilateralismo e do deslocamento das unidades de produção para locais onde os custos fossem menores, com alocação de unidades de grandes corporações internacionais em países asiáticos e do leste europeu, permitindo o desmembramento da fabricação dos produtos e a formação das cadeias globais de valor. Cada etapa de um produto final passou a ser produzida em uma jurisdição distinta, sendo reunidas para montagem e exportação. Esse fenômeno ficou conhecido como offshoring, seguindo a lógica de produção e distribuição do just in time. Os anos que se seguiram à criação da OMC foram marcados pela globalização e o crescimento vertiginoso do comércio global, promovendo, entre outros efeitos, a retirada de milhares de pessoas da linha da pobreza [2].

Não obstante, uma série de acontecimentos tem impactado esse modelo e o cenário global de comércio, promovendo significativas alterações. A Covid-19 e a suspensão do fluxo global de pessoas e mercadorias  foram exemplos disso. Esse evento provocou a reflexão das empresas multinacionais e dos governos quanto à necessidade de terem suas fontes de produção mais próximas. Destacou também que, em situações de ameaça e necessidade, cada país defende o seu interesse, e que a dependência de produção de um só país eleva o nível de risco e subordinação, o que ameaça a soberania e autonomia das nações. Surgem os conceitos do nearshoringreshoring e do just in case, como reação à realidade vivenciada na pandemia. A guerra da Rússia com a Ucrânia e os conflitos no Oriente Médio são outros eventos que provocam grandes inseguranças e incertezas, instabilidade e divisão, pressionando a redefinição do comércio internacional.

Nos EUA, desde o período do primeiro governo de Trump, o discurso protecionista defendido sob o slogan “American First” levou à adoção de medidas contrárias aos princípios da OMC, outrora defendidos por esse mesmo país. Nessa linha, os EUA, desde 2017, vêm bloqueando a nomeação de juízes para o Órgão de Apelação da OMC, o que culminou com a paralisação do órgão em dezembro de 2019. A situação retirou da OMC a capacidade de analisar e julgar, em grau de recurso, conflitos comerciais entre os países membros, consequentemente, de aplicar sanções, reduzindo seu poder e representatividade no comércio global. O retorno de Trump à Casa Branca culminou em medidas contrárias e de ruptura com as regras da OMC, deflagrando verdadeira guerra tarifária em todo o mundo. As medidas de 2 de abril e de 1º de agosto marcaram flagrante desrespeito dos EUA com o sistema multilateral de comércio e o confronto com os princípios e regras de comércio estabelecidas no âmbito da OMC. Por mais que se tente, de certa forma, envernizar tais medidas de alguma sustentação de legitimidade, na exceção ao princípio de não discriminação por segurança nacional, elas carecem de base legal para se sustentarem.

Tudo isso impacta os custos de produção pelo mundo, especialmente em países como o Brasil, que tiveram definidas contra si pelos EUA, tarifas de 50% para 35,9% dos produtos de suas exportações para importadores americanos [3]. O Brasil adotou medidas para mitigar os enormes impactos [4]. O Plano Brasil Soberano [5] prevê, entre outras medidas:

  • prorrogação de prazos do drawback suspensão, inclusive do drawback intermediário (por mais um ano), medida essa aplicada também ao Recof, através da IN RFB n2276/2025;
  • diferimento do vencimento dos tributos federais (por dois meses);
  • prioridade na restituição e ressarcimento de tributos (PER/DCOMP);
  • novo Reintegra: 3,1% (grandes e médias empresas); 6% (micro e pequenas empresas).

Em meio a tudo isso, as empresas e os países que se veem prejudicados pelos efeitos da guerra tarifária foram compelidos a buscar soluções e alternativas, como identificar novos mercados, avaliar a possibilidade de mudarem a sede de sua planta produtiva para países não atingidos pelo tarifaço, utilizarem regimes aduaneiros especiais, como o depósito alfandegado certificado (DAC), que lhes dê prazo para a remessa física das mercadorias para os EUA, permitindo negociações e redirecionamentos para outros mercados.

Aduana e seus desafios

Nesse cenário, e a Aduana, como fica? Cada vez com mais funções e responsabilidades, e maior pressão para cumprir as normas internas nas fronteiras, como tem acontecido ao longo das décadas que se seguiram à criação da Conselho de Cooperação Aduaneira (CCA), em 1953. De um órgão responsável por cuidar principalmente da arrecadação de tributos, passou à função de grande guardião e protetor da sociedade, com um leque de temas expressivamente ampliado.

Nesse sentido, a Organização Mundial das Aduanas (OMA) e de resto as aduanas globais têm dois objetivos principais: (1) assegurar um ambiente favorável ao comércio legítimo, facilitando o fluxo de mercadorias, e (2) exercer o controle das operações, com foco no cumprimento das normas aduaneiras e na segurança da sociedade. À arrecadação dos tributos, somaram-se diversos outros temas para a fiscalização aduaneira se ocupar. Para citar alguns: a segurança contra o terrorismo, em face do tráfico, de drogas, de armas, de pessoas, as ameaças químicas, à saúde, ao meio ambiente, as novas demandas de controle de operações de empresas que poluem mais, ou menos, o controle de entradas de mercadorias cuja origem seja fruto de trabalho em condições escravas, controle de mercadorias que descumprem regras sanitárias e ameaçam a saúde da sociedade, que não seguem os padrões de qualidade, produtos falsificados, grandes ameaças no e-commerce cross-border, dado seu volume e riscos de fraude nas declarações de valores e pagamento de tributos. Diante de tudo isso, continuamente, as aduanas se veem desafiadas, a ampliar sua capacidade, reinventar-se e desenvolver mecanismos que lhe permitam cumprir sua missão.

Reforma aduaneira europeia

Para enfrentar esses desafios e se preparar para o futuro, a União Europeia publicou, em maio de 2023, normas para realizar uma reforma aduaneira, com visão de futuro, promovendo a sua preparação para atuar em 2040. Nesse pacote, os pilares são o estabelecimento de uma Autoridade Aduaneira da União Europeia para centralizar informações e dar suporte às autoridades aduaneiras de cada país membro; a criação de uma plataforma de dados aduaneiros da UE – Customs Data Hub – que permitirá, de um lado, a melhoria nos controles e, de outro, a simplificação dos procedimentos; um novo regime normativo para o e-commerce indicando as plataformas como importadores e devedores – deemed importers (importadores considerados), ampliando a capacidade de análise e gestão de risco dessas transações; criação da figura do Trust and Check Trader (TCT)que deverá conceder a aduana um amplo acesso aos seus sistemas e dados, em tempo real, tendo em contrapartida benefícios, como liberar suas importações no seu próprio estabelecimento, apurando si mesmo, os valores a recolher [6].

Em relação ao TCT, o reconhecimento será possível somente para importadores e exportadores, diversamente do que hoje permite o Operador Econômico Autorizado (OEA) vigente na União Europeia [7], na medida que são elegíveis também agentes de carga, despachantes aduaneiros, transportadores, depositários, terminais portuários e aeroportuários. Para ser reconhecido TCT, não basta ser AEO, há requisitos adicionais que deverão ser atendidos. Lado outro, os benefícios serão mais atrativos e palpáveis do que aqueles atualmente assegurados aos OEA, permitindo entrever um modelo mais avançado e atrativo. O OEA se manterá, para novos pedidos até 1/3/2032, valendo a certificação até 31/12/2037, quando passa a valer o TCT.

Nesse quadro de conformidades e segurança, de facilitação e controle, a figura de um operador que se aproxima da aduana e se posiciona como seu parceiro, que declara e promove ações para comprovar seu desejo de conformidade, de cumprimento espontâneo das normas e adoção de critérios de procedimentos que contribuem com a segurança nas cadeias globais de valor, tem se comprovado, desde a sua idealização, como essencial e indispensável. É preciso ter elementos objetivos para separar “o joio do trigo”. Nesse sentido, os programas operadores confiáveis têm que ser difundidos e propagados visando amplo reconhecimento de sua importância. Outrossim, é imprescindível que as administrações aduaneiras concedam os benefícios mais amplos e tangíveis possíveis a fim de se manter o estímulo e o resultado positivo na equação de investimentos/custos versus benefícios.

OEA, Brasil

No Brasil, segundo dados atualizados até 30/5/2025, publicados em 1/9/2025 [8], 683 CNPJs são certificados, sendo que cerca de 30% dos valores importados, seja em número de declarações registradas, ou valor CIF, estão sendo realizados por empresas OEA. Certamente o estoque de pedidos de certificação, sendo analisado, permitirá que esses volumes se ampliem. No entanto, para que se atinja o objetivo original do programa, de se ter 50% das declarações registradas por OEA, algumas medidas precisam avançar:

a) diferimento dos tributos na importação: está prevista no artigo 76, 3º, da LC 214/2025, a possibilidade de ocorrer, nos termos de regulamento, em relação ao IBS e à CBS. Também está previsto nos artigos 19 e 20 do PL 15/2024, para todos os tributos federais, podendo ser estendido ao AFRMM, à Taxa da Marinha Mercante e aos direitos antidumping. Essa medida deve ser implementada o quanto antes para todas as empresas OEA em relação a todos os tributos incidentes na importação, sejam federais ou estaduais;

b) ampliação do programa às tradings: notadamente com a migração das operações para o Portal Único e para a DUIMP, a ampliação da capacidade de gerenciar os riscos é notória e permitirá que essas empresas que desejem ser parceiras da RFB também estejam no rol daquelas elegíveis;

c) imediata inclusão do despachante aduaneiro: como elo presente em quase todas as declarações registradas no país, o despachante aduaneiro precisa ser inserido e poder demonstrar seu compromisso com a conformidade e a segurança, auxiliando a aduana no seu dever de gerenciar riscos de maneira inteligente e eficaz;

d) desembaraço no domicílio do importador: permitir que os operadores OEA nas modalidades segurança e conformidade possam receber suas cargas e transportá-las de imediato para seus estabelecimentos, e lá promoverem a sua liberação;

e) dispensa de garantia para entrega de mercadorias em caso de exigências no curso de um despacho de importação, separando o fluxo físico da carga, das questões discutidas em termos de aplicação de normas, exceto se o caso for de proibição daquela importação. Nesse sentido, destacam-se a norma 5.4 da CQR/OMA e o artigo 3.1 do AFC/OMC;

f) Priorização na compensação de créditos decorrentes de retificação e cancelamento de declarações, quando aplicável: priorização ou a definição de um prazo para a compensação de créditos decorrentes da retificação ou cancelamento de declarações;

g) autorregularização: possibilidade prevista no artigo 21 do PL 15/2024, de forma que o interveniente OEA seja comunicado quanto à identificação de alguma infração, permitindo-lhe realizar sua autodenúncia. Essa realidade afastaria a aplicação das penalidades de ofício impróprias a um interveniente que preza por boas práticas já avaliadas e convalidadas pela administração aduaneira. Se incorre em eventuais erros, são escusáveis. Seria o caso de lhe assegurar a regularização sem aplicação de nenhuma penalidade, ou multa de mora, tão somente exigindo-lhe a atualização do crédito, se devido.

Tais medidas, inclusive, ampliariam a capacidade competitiva das empresas brasileiras, notadamente daquelas OEA e exportadoras para os EUA, que precisam de todos os reforços possíveis nesse momento de grandes desafios. Essas alterações poderiam ser incluídas, ainda que de modo excepcional, para auxiliá-las nesse momento, em conjunto com as demais medidas já adotadas pelo Governo Federal.

Congresso

Sobre o tema Trust and Check Trader, na sexta-feira, dia 05/09,  participaremos da XVII Reunião Mundial de Direito Aduaneiro, promovido pela ICLA – International Customs Law Academy [9], na cidade do Porto, em Portugal, em painel sob o título Padrões para cadeias logísticas seguras e a redefinição do OEA para o T&C Trader”. Antecedendo esse painel, Rosaldo Trevisan, colega dessa coluna, moderará o painel em que o Subsecretário de Administração Aduaneira, dr. Fabiano Coelho, fará conferência sobre “Riscos para segurança, proteção do cidadão e comércio internacional legítimo. O Congresso iniciará amanhã com a participação de congressistas de mais de 30 países, prosseguindo com dois dias de intensas atividades.

Em um cenário tão incerto e desafiador no comércio internacional, a reunião de tantos estudiosos e especialistas, certamente, propiciará, pela permuta de experiências, novas ideias, reflexões, e oxalá, alternativas e soluções para uma atividade aduaneira eficiente que possa auxiliar na promoção do comércio global legítimo e seguro.


[1] TREVISAN, Rosaldo. O imposto de importação e o direito aduaneiro internacional. São Paulo: Aduaneiras, 2017, p. 86-89.

[2] Há estudos do Banco Mundial e da OMC sobre os efeitos positivos da globalização para redução da pobreza. Disponível em linklink . Acesso: 29/8/2025.

[3] Disponível em: link . Acesso em 29/08/2025.

[4] Segundo estudos realizados pela CNI, a queda no PIB brasileiro será de R$ 19,2 bilhões (0,16%), a redução nas exportações de R$ 52 bilhões e a deve ocorrer a perda de 110 mil postos de trabalho. Disponível em: link . Acesso em 29/08/2025.

[5] Disponível em: link . Acesso em 29/08/2025.

[6] PICKETT, Eric and WOLFFANG, Hans-Michael. The European Commission’s Proposal for a Modernised Union Customs Code: A Brief IntroductionWorld Customs Journal, vol. 17, Issue 02, 2023, September 30, 2023. Disponível em: link. Acesso em 29/8/2025.

[7] LEONARDO, Fernando Pieri. O AEO no direito aduaneiro europeu. In: PEREIRA, Tania Carvalhais (ed.). Direito Aduaneiro: coletânea de textos. Lisboa: Universidade Católica, 2022.

[8] Disponível em: link. Acesso em 29/8/2025.

[9] https://www.iclaweb.org/porto-portugal2025

O post OEA e o Trust and Check Trader na União Europeia apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

‘Gentileza e compaixão’: Frank Caprio viralizou com julgamentos humanos e bem-humorados

“Onde pessoas e casos são atendidos com gentileza e compaixão”. A sinopse do reality show norte-americano Caught in Providence descreve dessa forma a sala do Tribunal Municipal de Providence (Rhode Island) devido aos quase 40 anos de atuação de Francesco Caprio (1936 – 2025) no juízo.

Filho de imigrantes italianos, o juiz Frank Caprio, como ficou conhecido, conquistou o público com sua forma humanizada e bem-humorada de conduzir julgamentos e apreciar infrações de trânsito na capital do estado de Rhode Island, nos EUA.

As sessões eram gravadas e exibidas no programa que, segundo informação da ABC News, foi ao ar por mais de duas décadas na televisão local, até ser transmitido nacionalmente a partir de 2018. Por ocasião da aposentadoria do magistrado em 2023, a última temporada do show foi lançada no ano seguinte.

canal oficial do Caught in Providence no YouTube conta com 2,9 milhões de inscritos e reúne mais de 1.900 vídeos. E foi a publicação de trechos do programa na internet que contribuiu para a disseminação global da fama de Frank Caprio como “o juiz mais gentil dos Estados Unidos” e, depois, do mundo.

Justiça de verdade

É difícil considerar a alcunha indevida após assistir ao julgamento de Victor Coella, cuja gravação viralizou em 2019. O vídeo mostra a ida do homem, à época com 96 anos, ao tribunal. Ele havia sido multado por ultrapassar o limite de velocidade em uma área escolar.

Caprio permite ao réu apresentar sua versão do fato. Então o réu conta que estava levando seu filho ao hospital. Explica que o filho era pessoa com deficiência, tinha 63 anos e lutava contra um câncer.

“Você é um bom homem, representa tudo aquilo que são os Estados Unidos: aqui está, aos noventa, e continuar tomando conta da sua família… É algo maravilhoso. Senhor, eu te desejo tudo de bom, desejo o melhor para o seu filho. O seu caso está encerrado. Boa sorte, que Deus te abençoe”, diz o julgador depois de ouvir a história.

Frank Caprio morreu na quarta-feira (20/8), aos 88 anos, ao tratar um câncer no pâncreas. Deixou a esposa, Joyce E. Caprio, com quem foi casado por mais de 50 anos e teve cinco filhos, sete netos e dois bisnetos.

Assista ao julgamento de Victor Coella:

O post ‘Gentileza e compaixão’: Frank Caprio viralizou com julgamentos humanos e bem-humorados apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Reforma tributária: governos devem incluir IBS e CBS no ICMS, ISS e IPI

Com o início da transição da reforma tributária, a inclusão do IBS e da CBS na base de cálculo do ISS, do ICMS e do IPI é dada como certa pelos entes federativos e apresenta um debate fadado à judicialização durante e após a transição para o novo sistema. Fontes das três esferas de governo ouvidas pelo JOTA confirmaram que interpretam que o silêncio sobre o tema na Emenda Constitucional 132/2023, que implementou a reforma, e na Lei Complementar 214/2025, que regulamenta os novos tributos, autoriza a tributação.

Além disso, para os entes federativos, afastar essa cobrança seria uma “anomalia” contrária à proposta de carga tributária neutra, uma vez que no sistema atual há várias hipóteses de incidência de tributo sobre tributo. Haveria assim uma perda de arrecadação na comparação com o sistema atual. Por outro lado, juristas alegam que a “tributação em cascata” feriria os princípios do novo sistema tributário, em especial a simplicidade e a transparência, e que a judicialização será um caminho inevitável.

A reforma tributária criou dois tributos: a CBS substitui o IPI, o PIS e a Cofins no âmbito federal. O IBS, por sua vez, substitui o ICMS e o ISS nos estados e municípios. Também foi criado o Imposto Seletivo, que incidirá sobre a “produção, extração, comercialização ou importação” de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Haverá uma transição gradual entre 2026 e 2033, quando os atuais tributos serão extintos. Apenas o IPI será mantido para produtos industrializados na Zona Franca de Manaus.

Texto original da reforma tributária vedava inclusão do IBS/CBS no ICMS, ISS e IPI

O advogado Pedro Grillo, do escritório Brigagão, Duque Estrada, explica que, inicialmente, havia previsão na PEC 45/2019, uma das origens da EC 132/2023, que vedava a inclusão dos novos tributos na base de cálculo do ICMS e do ISS.

A previsão foi suprimida, e não apenas a EC 132/2023 como a LC 214/2025 são silentes sobre o assunto e também sobre a inclusão dos novos tributos na base de cálculo do IPI. “Foi mantida apenas a vedação quanto à inclusão do IBS e da CBS em suas próprias bases e nas bases do Imposto Seletivo, do PIS e da Cofins”, afirma Grillo.

A lacuna acendeu um alerta e levou à proposição, no Congresso Nacional, do PLP 16/2025. O projeto busca justamente garantir que o IBS e a CBS sejam excluídos da base de cálculo do ICMS, do IPI e do ISS. No entanto, ainda não há perspectiva para a sua aprovação.

Reforma tributária: entes devem incluir IBS e CBS na base dos antigos tributos

Fontes das três esferas da federação confirmaram ao JOTA que a tendência é de incluir IBS e a CBS na base de cálculo do ICMS, do ISS e do IPI. Uma fonte do governo federal disse que, uma vez que a EC 132/2023 não determina expressamente a exclusão, ela interpreta que os novos tributos da reforma tributária compõem, sim, a base de cálculo ICMS e do ISS, durante a transição da reforma tributária, e do IPI, durante e após a transição.

O diretor institucional do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), André Horta, ressalta que a reforma tributária garante “a transição neutra em termos de arrecadação dos tributos reformados”. “Intentar alguma manobra de texto de redução de recurso público de estados e municípios nesta altura das discussões seria supor a própria sabotagem dos princípios e do esforço da reforma”, diz o diretor institucional.

Em nota, a Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP) afirma que excluir o IBS e a CBS da base de cálculo dos tributos antigos “levaria a uma erosão imediata das receitas subnacionais”. A entidade calcula que, apenas com o ISS, a perda em arrecadação seria de 10,8% em 2029 e cresceria progressivamente até atingir 16,2% em 2032. A frente ressalta que essa redução não possui um mecanismo de compensação previsto e que a alteração “resultaria em perdas líquidas e irreversíveis para os entes subnacionais”. “A consequência disso é clara: redução da capacidade de estados e municípios de financiar serviços públicos essenciais, como saúde, educação e segurança pública”, diz.

Efeito cascata contraria princípio da reforma tributária

Para Pedro Grillo, a cobrança de tributo sobre tributo vai na contramão do propósito declarado da reforma, de não cumulatividade, simplicidade e transparência. “Quando olhamos para a finalidade da EC 132/2023, que inseriu esses princípios para guiar a tributação, vemos que incluir tributos na base de cálculo de outros não é nada simples e também não traz transparência. É o que se chama de ilusionismo fiscal”, afirma.

Ana Helena Souza, advogada da área tributária do Gaia Silva Gaede Advogados, afirma ainda que a cobrança em cascata vai em sentido oposto ao objetivo de neutralidade da reforma tributária e de redução das distorções econômicas. Pelo princípio da neutralidade, o sistema tributário não deve interferir nas decisões dos agentes econômicos. “Tributar quando não há autorização expressa não atende a esses princípios, pois isso alimenta um ciclo de ‘efeito cascata’”, analisa Souza.

A tributarista enxerga um aumento da litigiosidade dos moldes da “tese do século” (Tema 69), por meio da qual o Supremo Tribunal Federal (STF) excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Souza destaca que o IBS e a CBS não compõem o valor da operação, que é, por definição, a base de cálculo do ICMS e do IPI, por exemplo. O problema é que, mesmo após esse julgamento, em 2017, a Corte decidiu outros casos envolvendo tributos sobre tributos de modo distinto. Em 30 de maio de 2025, por exemplo, o Supremo validou a inclusão do PIS e da Cofins na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB).

A advogada Nina Pencak, do Mannrich e Vasconcelos, também considera que os princípios da simplicidade e da transparência podem servir como fundamento para questionar judicialmente a incidência de tributo sobre tributo. Pencak ressalta que a discussão não é nova e que, agora, o Judiciário pode entender a reforma tributária como uma forma de “estancar esses debates, uma vez que o ideal seria a simplificação do sistema”.

Tributação gera volume substancial de contencioso, diz CCiF

Em nota técnica, o Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), que elaborou a proposta inicial da PEC 45/2019, afirma que a inclusão do IBS e da CBS na base de cálculo do ICMS e do ISS tem o potencial de gerar “um volume substancial de contencioso administrativo e tributário”. Para o CCiF, que também cita o caso da “tese do século”, isso aumentaria, consequentemente, a insegurança jurídica e a instabilidade do sistema tributário.

Como efeitos negativos para a economia, o CCiF argumenta que a inclusão dos novos tributos na base dos antigos gera efeito cascata e resíduo tributário, “o que aumenta indevidamente a carga tributária efetiva da cadeia produtiva e encarece o valor dos bens e serviços de forma artificial, comprometendo a neutralidade”. Além disso, dificulta a apuração dos tributos, aumenta o custo de conformidade dos contribuintes e dificulta a fiscalização por parte da administração tributária, entre outros problemas.

Fonte: Jota

Bancos e lojistas criticam exigência de aviso antes de negativar devedores

Representantes de bancos e do comércio criticaram, em audiência pública da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara, a proposta que prevê a necessidade de notificação do devedor — com aviso de recebimento (AR) — para que seu nome possa ser incluído em cadastros de proteção ao crédito.

Segundo eles, a exigência pode atrasar os registros e elevar o custo geral dos empréstimos.

A proposta é do deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP), relator do Projeto de Lei 7733/17, que regulamenta a inscrição de locatários inadimplentes nos serviços de proteção ao crédito. Russomanno incluiu no texto a obrigatoriedade de notificação com AR antes da inscrição de qualquer tipo de dívida nesses cadastros.

De acordo com Rubens Sardenberg, da Federação Brasileira de Bancos, a inadimplência corresponde hoje a 40% do custo de captação do dinheiro. Ele acrescentou que a recuperação de garantias no Brasil é de apenas 18,2%, enquanto no Chile chega a 41,9%.

“O aviso de recebimento depende de muitas variáveis para ser efetivado, porque o consumidor pode não ser encontrado. Isso vai retirar o crédito de pessoas que teriam condições de ter crédito, mas acabam sendo prejudicadas. O concessor não sabe se a pessoa não deve nada ou se apenas não recebeu a notificação.”

O deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB), que pediu a audiência, afirmou não ser favorável às medidas sugeridas por Russomanno. “Isso é um dado aterrorizante para o povo brasileiro. A situação já está crítica, e, se o projeto for aprovado da forma que está, esse número vai piorar.”

Vivian Moraes, da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas, lembrou que uma medida semelhante foi testada em São Paulo, mas só 30% dos AR foram efetivados.

O deputado Gilson Marques (Novo-SC) apresentou voto em separado para sugerir que a comunicação aos devedores seja feita por meio eletrônico.

Fonte: Câmara dos Deputados

Justiça Penal precisa focar na macrocriminalidade

As estatísticas referentes à Justiça Criminal reforçam a ideia de que o melhor caminho a ser tomado é o da despenalização (substituição, legislativa ou judicial, da pena de prisão por sanções de outra natureza), sobretudo dos delitos de menor potencial ofensivo, para que o Poder Judiciário possa cuidar daquilo que realmente interessa, que é o combate aos crimes de grande repercussão social.

Essa foi a análise feita pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça, em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito, na qual a revista eletrônica Consultor Jurídico ouve alguns dos nomes mais importantes do Direito sobre as questões mais relevantes da atualidade.

Na visão do ministro, o Poder Judiciário tem processado um volume impressionante de casos criminais, dos quais uma parte significativa corresponde a processos de menor importância, o que acaba tornando o trabalho dos magistrados inviável.

“Nós chegamos a ter 109 milhões de processos no território brasileiro, numa população de 210, 215 milhões. Desse percentual, uma parte assustadora corre na esfera penal, o que, evidentemente, nos leva a ‘enxugar gelo’ ou trabalhar com aquilo que não é tão importante. Daí porque essas estatísticas reforçam que o caminho é a Justiça Penal negociada”, diz Fonseca.

Segundo o ministro, a aplicação dos institutos despenalizadores — como a transação penal, a suspensão condicional do processo e a composição civil — aos casos de menor gravidade ajuda a reduzir a superlotação dos presídios, ao evitar condenações ao regime fechado.

Além disso, diz o ministro, permite que casos de grande impacto na sociedade possam ser solucionados com mais rapidez.

“Nós temos o fenômeno da macrocriminalidade, que não pode ser esquecido, pois se não tratarmos disso, vai campear a impunidade”, disse Fonseca. “Temos que estimular a Justiça Penal negociada para evitar, inclusive, a prescrição dos processos na fase da investigação”, disse ele em conversa sobre o painel “Desafios atuais da Justiça Criminal”, durante o XIII Fórum de Lisboa, promovido em julho na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Clique aqui ou assista abaixo a entrevista:

O post Justiça Penal precisa focar na macrocriminalidade, diz ministro apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Comissão aprova acessibilidade como critério de desempate em licitações

A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que inclui como critério de desempate nos processos licitatórios a adoção, pelo licitante, de ações que promovam a acessibilidade para pessoas com deficiência.

Os parlamentares acolheram a recomendação do relator, deputado Geraldo Resende (PSDB-MS), pela aprovação do Projeto de Lei 4256/24, da deputada Dayany Bittencourt (União-CE).

De acordo com o relator, a mudança na Lei de Licitações e Contratos Administrativos pode assegurar a inclusão de 14,4 milhões de cidadãos que convivem com alguma deficiência. “O projeto tem o potencial de transformar a vida de milhões, promovendo uma cultura organizacional que valoriza a inclusão social”, disse Resende.

Próximos passos
O texto tramita em caráter conclusivo e ainda será analisado pelas comissões de Finanças e Tributação, e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados