Atualização do banco de dados traz mudança nos critérios de pesquisa de jurisprudência

A partir de 29 de agosto, uma nova base de dados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estará em operação, o que provocará alterações na forma de fazer pesquisa de jurisprudência no site da corte. A mudança atende a necessidades técnicas e representa mais segurança para a informação jurídica, mantendo a confiabilidade e a eficiência que os usuários já conhecem.

Apesar de exigir pequenas adaptações nos critérios de busca, o novo formato trará ganhos significativos ao oferecer resultados mais precisos, além de otimizar o tempo e a qualidade das consultas.

As alterações atingem apenas alguns operadores e símbolos. Por exemplo, o símbolo de pesquisa “com” (utilizado para localizar termos que estão em um mesmo parágrafo, independentemente da ordem ou distância em que apareçam) exigirá a utilização de parênteses. Assim, se o usuário pesquisava por protesto com “dano moral” para achar decisões tanto sobre protesto como sobre dano moral, agora deverá aplicar a seguinte pesquisa: (protesto com “dano moral”).

Modelo está sendo preparado para a inteligência artificial

Outra modificação é a necessidade de utilizar o símbolo $ ao final das palavras para resgatar o plural. Por exemplo: utilizando a pesquisa crianca$, chega-se a resultados com criança e crianças. Além disso, sinônimos não serão apresentados no resultado da busca automaticamente.

Um ponto importante é que o modelo está sendo preparado para o futuro, quando o uso da inteligência artificial permitirá a realização de pesquisas a partir de perguntas em linguagem comum, em substituição aos tradicionais operadores e símbolos.

Fonte: STJ

Avanço digital explica explosão de estelionatos, não exigência de representação

O número de estelionatos explodiu nos últimos anos no Brasil. Porém, isso não se deve à inclusão na lei da necessidade de representação da vítima para o oferecimento da ação penal, segundo especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico. Para eles, o crescimento dos casos se deve ao maior uso de meios digitais pela população.

Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2025 revelou que houve um acréscimo de 408% nos registros do crime de estelionato no país entre 2018 e 2024. Só no ano passado, o Brasil teve aproximadamente 2,2 milhões de casos, o que equivale a quatro golpes por minuto.

Em 2019, com a lei “anticrime” (Lei 13.964/2019), passou a ser exigida a representação da vítima para o Ministério Público mover ação por estelionato. Antes disso, tratava-se de um crime de ação penal pública incondicionada.

Em 2021, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as alterações legais quanto à necessidade de representação devem ser aplicadas aos processos em andamento, mesmo após o oferecimento da denúncia, desde que antes do trânsito em julgado (HC 180.421).

Sem relação

O delegado da Polícia Civil de Santa Catarina Lucas Neuhauser Magalhães, especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que, quando alguém decide cometer o crime de estelionato, não está preocupado se a vítima vai oferecer a representação criminal ou não.

“A grande verdade é que o estelionatário sempre imagina que não vai ser pego. E, ainda que seja pego, após as inúmeras camadas que ele utiliza para disfarçar a sua verdadeira identidade, ele sabe que dificilmente vai enfrentar uma pena privativa de liberdade. Então, geralmente, o crime compensa, porque a chance de ser descoberto é baixa e, se o for, a punição será branda.”

Segundo Magalhães, o notável aumento do número de estelionatos se deve tanto à condição de ser um “crime que vale a pena” quanto às mudanças na dinâmica do delito. Especialmente o maior uso de meios digitais, inclusive para a circulação de dinheiro, o que foi impulsionado pela epidemia de Covid-19.

“Estelionatários passaram a ter a percepção de que o meio digital era mais interessante, porque traz um risco pessoal muito menor para os próprios criminosos. O sujeito não vai ter o risco de puxar uma arma de fogo no meio da rua, tomar um tiro, para, de repente, roubar R$ 200 de alguém que raramente carrega dinheiro vivo hoje em dia. Aplicando um golpe virtual, ele pode obter uma quantia muito maior da vítima sem ter de se expor tanto.”

O sociólogo Daniel Hirata, coordenador do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF), também entende que a exigência de representação da vítima não é o principal fator para o crescimento expressivo dos registros de estelionato no Brasil.

“Esse aumento está muito mais relacionado à maior facilidade de cometimento desses crimes, especialmente pela ausência de instrumentos eficazes na área de segurança pública — em sentido amplo — para investigação, análise criminal e persecução penal que estejam à altura do desafio. A possibilidade de realizar golpes com baixo risco de repressão e alta lucratividade é o que tem atraído cada vez mais criminosos para essa modalidade, sobretudo com o uso de meios digitais. Trata-se de um cenário em que a chance de punição é reduzida, enquanto o retorno financeiro é elevado, incentivando a prática.”

Representação faz sentido

O desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo Marcelo Semer, doutor em Direito Penal e Criminologia pela Universidade de São Paulo (USP), ressalta que a representação é necessária apenas para a propositura da ação penal, o que não necessariamente afeta o registro dos crimes. Portanto, não é isso o que explica o aumento de estelionatos. Semer, inclusive, defende que outros delitos patrimoniais cometidos sem violência estejam sujeitos à representação da vítima.

“Muitas vezes, as situações se resolveram, as partes se compuseram, e as vítimas não têm interesse no prosseguimento da ação. Penso que elas deveriam ser consultadas. Eu apostaria no crescimento das relações e dos negócios virtuais para justificar o aumento de estelionatos, sinal de que ainda falta um aprendizado sobre os cuidados de cada tipo de transação. O Brasil é um país com altíssimo engajamento na internet e pouco conhecimento digital. Isso justifica, por exemplo, o altíssimo índice de fake news e sua influência por aqui, como já se apurou em outras pesquisas.”

Nessa mesma linha, a defensora pública do Rio de Janeiro Lúcia Helena Oliveira, mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá, destaca a necessidade de promover a educação digital para reduzir o número de estelionatos.

“Os golpes, com utilização de meios digitais, são cada vez mais frequentes e cada vez mais sofisticados. Há, ainda, uma falta de informações de muitas pessoas com relação a práticas digitais e eventuais golpes. Muitos desconhecem as nuances de tais práticas e como a sofisticação pode levar à obtenção de vantagens ilícitas. Penso que, nesse caso, seria necessário fomento à política pública de atualização e esclarecimento para as vítimas em potencial, ou melhor dizendo, esclarecimento de toda a sociedade.”

Na visão de Lúcia Helena, o fim da exigência de representação da vítima não ajudaria a reduzir o número de crimes. Isso porque o tipo penal do estelionato já sofreu algumas alterações que não influíram na quantidade de ocorrências.

“Quando se pensa no sentido de haver a representação para que haja ação penal pelo crime de estelionato, sugere-se algumas observações. A primeira é que não são todos os casos em que se exige representação. O legislador cuidou de preservar várias hipóteses, como, por exemplo, quando a vítima for pessoa criança ou adolescente, ou tiver mais de 70 anos de idade. A segunda é que exigir a representação é dar preferência à vontade da vítima, permitindo que ela possa escolher, mas isso não significa impunidade. O que precisamos é trazer mais esclarecimentos à população sobre seus direitos, de forma que a pessoa possa exercer seu direito de forma segura, evitando até mesmo a revitimização.”

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STF confirma direito de recusar transfusão de sangue por religião

O Supremo Tribuna Federal (STF) formou maioria para reafirmar o direito de negar transfusões de sangue por motivos religiosos, rejeitando recurso do Conselho Federal de Medicina, que buscava reverter a decisão favorável ao grupo Testemunhas de Jeová.

O julgamento dos embargos ocorre no plenário virtual, em sessão prevista para durar até as 23h59 desta segunda-feira (18). Votaram por negar o recurso o relator, ministro Gilmar Mendes, e os ministros Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, André Mendonça e Dias Toffoli. 

A maioria será confirmada caso não haja pedido de vista (mais tempo de análise) ou destaque (remessa ao plenário físico). A decisão tem repercussão geral, devendo ser observada por todos os tribunais do país. 

Em setembro de 2024, o plenário do Supremo decidiu por unanimidade que os cidadãos têm o direito de recusar a realização de procedimentos médicos por motivos religiosos. Esse é o caso, por exemplo, das testemunhas de Jeová, cuja fé não permite as transfusões de sangue. 

“A recusa a tratamento de saúde por razões religiosas é condicionada à decisão inequívoca, livre, informada e esclarecida do paciente, inclusive quando veiculada por meio de diretivas antecipadas de vontade”, diz a tese estabelecida na ocasião. 

A tese vencedora também estabeleceu a possibilidade da realização de procedimento alternativo, sem a transfusão de sangue, “caso haja viabilidade técnico-científica de sucesso, anuência da equipe médica com a sua realização e decisão inequívoca, livre, informada e esclarecida do paciente”.

A CFM recorreu da decisão alegando haver omissões na medida, pois o Supremo não teria esclarecido o que fazer em cenários nos quais o consentimento esclarecido do paciente não seria possível, ou em casos com risco de morte iminente. 

Dois casos concretos serviram de base para a decisão. Um dizia respeito a uma mulher de Maceió que se recusou a fazer uma transfusão para a realização de uma cirurgia cardíaca. O outro tratava de uma paciente do Amazonas que exigia o custeio pela União de uma cirurgia de artroplastia total em outro estado, em que poderia ser feita sem a transfusão de sangue. 

No voto seguido pela maioria, em que rejeitou o recurso da CFM, o relator Gilmar Mendes escreveu que, ao contrário do argumentado, os pontos de omissão foram levantados e esclarecidos no julgamento. 

“Em situações nas quais a vida do paciente esteja em risco, o profissional de saúde deve atuar com zelo, adotando todas as técnicas e procedimentos disponíveis e compatíveis com a crença professada pelo paciente”, reiterou o ministro.

Fonte: EBC

Comissão aprova projeto que proíbe a venda de produtos em presídios

A Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado aprovou, com emenda, projeto de lei que proíbe a venda de produtos dentro de estabelecimentos prisionais. A emenda, que também altera a Lei de Execução Penal, impede que presos controlem o acesso a espaços e serviços nas unidades.

Hoje a legislação permite que produtos autorizados e não fornecidos pelo sistema penitenciário possam ser vendidos em ‘mercadinhos’ ou cantinas dentro dos presídios.

O relator, deputado Coronel Meira (PL-PE), concordou com o Projeto de Lei 385/25, do deputado Coronel Assis (União-MT) e outros 43 parlamentares. Ele argumentou que a comercialização de produtos nas cantinas funciona como um “mercado informal e desregulamentado” que permite que “presos mais influentes” exerçam “relação de dependência, subordinação e extorsão” sobre os demais.

A emenda proposta pelo relator e aprovada pelo colegiado passa também a impedir que qualquer preso seja designado para controlar o acesso a espaços como celas, pátios, refeitórios ou a serviços oferecidos nas unidades prisionais.

Veja a versão completa do relator

“Relatórios revelam que os ‘chaveiros’ recebem as chaves dos pavilhões, exercem controle sobre as atividades cotidianas, vendem espaços para dormir, exploram os mais vulneráveis, coordenam o tráfico de drogas e até influenciam o acesso a serviços jurídicos, médicos e psicológicos”, citou o relator.

Próximas etapas
A proposta será agora analisada, em caráter conclusivo, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Para virar lei, o texto precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados

Conheça mais cobertura de terapias por planos de saúde e teses sobre reconhecimento de pessoas

No primeiro processo em destaque, a Segunda Seção, por maioria, decidiu que a hidroterapia e as terapias multidisciplinares pelos métodos Bobath e PediaSuit, prescritos para o tratamento de beneficiário diagnosticado com paralisia cerebral, devem ser cobertas pela operadora de plano de saúde, seja porque tais técnicas são utilizadas durante as sessões de fisioterapia, terapia ocupacional e fonoaudiologia, procedimentos esses previstos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em número ilimitado e sem quaisquer diretrizes de utilização; seja porque, a partir dos parâmetros delineados pela ANS, os referidos métodos não podem ser considerados experimentais. O processo em questão, sob segredo de justiça, é de relatoria da ministra Nancy Andrighi.

A edição também menciona o Tema 1.258, julgado sob o rito dos repetitivos, no qual a Terceira Seção, por unanimidade, definiu que as regras postas no artigo 226 do Código de Processo Penal (CPP) são de observância obrigatória tanto em sede inquisitorial quanto em juízo, sob pena de invalidade da prova destinada a demonstrar a autoria delitiva, em alinhamento com as normas do Conselho Nacional de Justiça sobre o tema. O reconhecimento fotográfico e/ou pessoal inválido não poderá servir de lastro nem à condenação nem às decisões que exijam menor rigor quanto ao standard probatório, tais como a decretação de prisão preventiva, o recebimento de denúncia ou a pronúncia.

Deverão ser alinhadas pessoas semelhantes ao lado do suspeito para a realização do reconhecimento pessoal. Ainda que a regra do inciso II do art. 226 do CPP admita a mitigação da semelhança entre os suspeitos alinhados quando, justificadamente, não puderem ser encontradas pessoas com o mesmo fenótipo, eventual discrepância acentuada entre as pessoas comparadas poderá esvaziar a confiabilidade probatória do reconhecimento feito nessas condições.

O reconhecimento de pessoas é prova irrepetível, na medida em que um reconhecimento inicialmente falho ou viciado tem o potencial de contaminar a memória do reconhecedor, esvaziando de certeza o procedimento realizado posteriormente com o intuito de demonstrar a autoria delitiva, ainda que o novo procedimento atenda aos ditames do art. 226 do CPP.

Poderá o magistrado se convencer da autoria delitiva a partir do exame de provas ou evidências independentes que não guardem relação de causa e efeito com o ato viciado de reconhecimento. Mesmo o reconhecimento pessoal válido deve guardar congruência com as demais provas existentes nos autos.

É desnecessário realizar o procedimento formal de reconhecimento de pessoas, previsto no art. 226 do CPP, quando não se tratar de apontamento de indivíduo desconhecido com base na memória visual de suas características físicas percebidas no momento do crime, mas, sim, de mera identificação de pessoa que o depoente já conhecia anteriormente.

Os REsps 1.953.602, 1.987.628, 1.986.619 e 1.987.651 tiveram como relator o ministro Reynaldo Soares da Fonseca.

Fonte: STJ

Em 5 anos, Open Finance já conecta 65 milhões de contas e movimenta cerca de R$1,2 bilhão por mês em pagamentos no Brasil

​A LiveBC desta segunda-feira (11/8) celebrou os cinco anos de Open Finance, que já soma mais de 100 milhões de autorizações de compartilhamento de dados e de pagamentos e conecta 65 milhões de contas, movimentando cerca de R$1,2 bilhão por mês em pagamentos no Brasil. Durante cerca de uma hora, o Chefe do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro (Denor) do Banco Central (BC), Mardilson Queiroz, falou sobre a evolução do ecossistema desde seu lançamento em 2020 e dos benefícios que já estão disponíveis.

Veja como foi a LiveBC #44 aqui.

O que é Open Finance?

De forma simples, Mardilson explicou que o Open Finance é um conjunto de padrões técnicos que permite que um banco se comunique com outro. O ecossistema surgiu para viabilizar que o próprio cliente pudesse exercer a autonomia e o controle sobre seus próprios dados, em alinhamento com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

“O Open Finance já é uma realidade e vai continuar crescendo e se expandindo”, destacou.

O chefe do Departamento de Regulação elencou, durante o programa, o que já está em funcionamento quando falamos de Open Finance: “Existe a possibilidade de levar dados de um banco para outro e também é possível realizar pagamentos ou transferências usando a infraestrutura do Open Finance, por exemplo, ao trazer dinheiro de uma conta em outro banco por meio de transferências inteligentes, como quando falta saldo em uma conta; de agendamentos recorrentes, como transferência recorrente de recursos (mensal), com valor fixo; do Pix por aproximação, que vincula a conta bancária à carteira do Google Pay; e do Pix Automático”.

Em breve, segundo ele, também haverá a possibilidade de fazer uma portabilidade de crédito por meio do Open Finance, de forma mais ágil e eficiente.

Benefícios

Mardilson Queiroz listou na live os benefícios do Open Finance até aqui:​

  • melhor gerenciamento financeiro, com a possibilidade de visualização de todas as contas num único lugar;
  • melhor gestão de portifólio (investimentos);
  • maior possibilidade de comprovação de renda, inclusive do trabalho informal;
  • maior customização e eficiência nos processos de crédito, com análise de crédito mais acurada e processo de portabilidade mais eficiente, o que resulta em produtos e serviços mais adequados ao perfil do cliente e até com a possibilidade de taxas mais baixas; e
  • maior conveniência na realização de pagamentos com Pix – pagamentos sem sair do aplicativo; Pix por aproximação em lojas físicas; pagamento com Pix em lojas on-line de forma mais conveniente, sem copia e cola; e Pix Automático para pagar por serviços recorrentes. 

Onde encontrar esses benefícios?

Segundo Mardilson, o BC incentiva a oferta ampla de produtos e serviços baseados no Open Finance, porém a decisão de oferecer esses produtos fica a critério de cada instituição participante, sendo assim o cliente tem que consultar o que o seu banco está oferecendo.

Contudo, ele ressalta que: “Se eu quero levar meus dados do Banco X para o Banco Y, o Banco Y pode ou não ofertar essa possibilidade de receber dados pelo Open Finance, mas o Banco X é obrigado a permitir que o cliente leve seus dados ou seu dinheiro para outra instituição pelo Open Finance”.

Números

Mardilson destacou que o Open Finance é um ecossistema complexo: “Mas estamos mais rápidos que outros países que implementaram modelos similares”.

Ele afirmou que, em termos de chamadas de API (sigla em inglês para interface de programação de aplicações), os números seguem aumentando de forma acelerada: “Chegamos a ter semanas com mais de quatro bilhões de chamadas mais recentemente”.

Somente no mês de julho, segundo Mardilson Queiroz, foram feitos 4,5 milhões de pagamentos pelo Open Finance: “É um dos ecossistemas de maior sucesso no mundo em termos de abrangência, número de instituições participantes e adesão das pessoas”.

Desafios

Ao elencar os desafios superados nos últimos cinco anos de Open Finance, Mardilson destacou o constante crescimento de adesão das pessoas, a maior eficiência dos serviços dos bancos, o amadurecimento do ecossistema e o fato de ele ter se tornado referência mundial.

Futuro

Ao falar do futuro do Open Finance, ele citou a portabilidade de crédito, salário e investimento, bem como o marketplace de crédito, como exemplos da possibilidade do ecossistema dar maior fluidez, eficiência, simplicidade e mobilidade dos serviços e produtos, tendo o cliente no controle.

“Espera-se também uma melhoria do nível de performance das instituições e, para isso, é importante ressaltar o papel do monitoramento do ecossistema, tanto pela Estrutura de Governança quanto pelo Banco Central”, frisou. “Além de uma integração cada vez maior com outras soluções do BC, assim como já ocorre com o Pix e também com outras tecnologias e tendências, caso de inteligência artificial e tokenização”, emendou.

Fonte: BC

Por que reivindicar, reconhecer e assegurar um direito ao cuidado

Ele canta, ele dança, ele pula [1]. Se olharmos para o Luciano de hoje, com 41 anos, talvez não imaginemos as dificuldades que enfrentou primeiro para sobreviver e depois para florescer. Seus primeiros passos sozinhos tardaram a acontecer, e sua fala nunca completamente se desenvolveu, se bem que para todos aqueles que estejam dispostos é possível muito bem compreender seus desejos e estabelecer com ele uma comunicação.

Sua altura miúda, seu obstinado tamanho infantil de roupa, o rosto extraordinariamente moço, de um sorriso inocentemente largo a escancarar uns dentes caídos e outros ainda de leite, contrastam com a idade que aos poucos dá sinais em seu corpo. Uns fios brancos na barba, os cabelos rareando, algumas dores que assomam com mais frequência e uma indisposição para sair de casa, tudo isso nos leva a suspeitar de que Luciano, um rapaz com síndrome de down, esteja chegando à sua velhice.

A vida de Luciano é fecunda e humanamente abastada. Ele tem seus próprios temperamentos e predileções. Cultiva amizades. Gosta de ouvir o rádio, balançar na rede e rezar bem alto. Luciano se preocupa com as outras pessoas. Pergunta a elas se estão bem e diz que sente saudades. Luciano é muito querido. Não é que sua vida seja fácil, tampouco que não esbarre com dificuldades.

O intestino de Luciano contém uma má-formação que o levou diversas ocasiões a hospitalizações duradouras e a cirurgias delicadas. Seu banho tem de ser acompanhado e até mesmo o seu prato tem de ser supervisionado para que coma na quantidade certa os alimentos apropriados. Luciano nunca encontrou uma escola pública que atendesse às suas necessidades. Embora consiga segurar o lápis, ainda não consegue escrever o próprio nome.

Isso não é um problema para ele, que descobriu por si mesmo que há outras tantas formas de ser feliz. Se Luciano é feliz? Tenho certeza de que muito mais do que os que discutem o conceito de felicidade. Sua existência, fadada a não medrar dentro de certas estruturas sociais, prosperou e enriqueceu o mundo. Como isso foi possível?

Para o seu longo e árduo desenvolvimento, Luciano precisou de receber muitos cuidados. Imaginemo-lo bebê. Certamente, um bebê como os outros; ao mesmo tempo, porém, um bebê muito diferente dos outros, com precisões extremamente especiais. Como lidar, entre tantas outras coisas, com a língua saltando para fora, com a propensão para cardiopatias, com as anormalidades gastrointestinais, com os olhinhos enxergando pouco e com o intelecto para sempre comprometido? Como ele se relacionará com outras crianças? Os médicos estarão preparados para tratar da sua saúde? Ele será um dia “normal”? Como cuidar enfim de alguém como Luciano? Luciano teve a sorte de encontrar uma família que o amasse e que o acolhesse. Sua mãe era professora. Dividia o dia entre o trabalho fora de casa e o trabalho dentro de casa. Seu pai compartilhava com ela as obrigações domésticas, repartindo a responsabilidade da criação do filho. E se Luciano, no entanto, tivesse sido abandonado? Ele teria condições de subsistir e crescer? Mais ainda: ao contrário do que aconteceu, seria justo que a divisão do trabalho de cuidar de Luciano fosse reservada exclusivamente à mãe de Luciano? E quem cuida afinal daqueles que cuidam de Luciano?

O exemplo de Luciano é um dentre milhares. Elejo-o porque se trata do meu irmão e porque penso que sirva de mote para discussão a seguir. Em 23 de dezembro de 2024, foi editada no Brasil a Lei nº 15.069, que instituiu a Política Nacional dos Cuidados. Essa lei recebeu recentemente regulamentação por meio do Decreto nº 12.562, de 23 de julho de 2025. Os impactos profundos que tais normas geram no ordenamento jurídico brasileiro parecem depender ainda, no entanto, de uma compreensão dos fundamentos que a embasam. Por que, afinal, reivindicar, reconhecer e assegurar um direito ao cuidado? E o que se quer dizer realmente com ele?

Um direito revolucionário

Do caso exemplar narrado acima, extraímos a lição a respeito da essencialidade do cuidado para a vida humana. Com efeito, sem o cuidado prestado pelo seu entorno, nenhuma criança resiste, aperfeiçoa-se e chega a uma idade tal como a de Luciano. Causa espécie que tenhamos descobertos mais e mais direitos humanos, mas ainda tenhamos dificuldade em reconhecer o cuidado como um deles. Se cada nascimento traz consigo o possível milagre de algo novo, esta natalidade da condição humana de que fala Hannah Arendt não existe sem um cuidado que a geste. Noutras palavras, o novum há sempre que ser concebido, preparado e cultivado. O que existe de mais espontâneo em cada um não desabrocha espontaneamente, mas depende de um caudal de conjunções que a ideia de cuidado materializa.

Se analisados rigorosamente, todos os direitos humanos reconhecidos nos documentos internacionais e nas constituições nacionais não parecem fazer sentido sem pressupor algo de tão fundamental como o cuidado. No que concerne aos direitos liberais, o indivíduo que não recebeu cuidados não poderá circular livremente pelas ruas, expressar suas opiniões nos debates públicos, eleger seus representantes etc., se não tiver sido suficientemente cuidado. Por outro lado, relativamente aos direitos sociais, que noção expressam os direitos à saúde, à alimentação e à moradia, p. ex., senão a de que há um rol mínimo de cuidados materiais que asseguram a própria dignidade de uma vida?

Embora o “cuidado” ainda não conste expressamente do elenco de direitos fundamentais da Constituição de 1988, é fácil concluir que decorre dos princípios por ela adotados. O que a Lei nº 15.069/2024 e o Decreto nº 12.562/2025 fazem é apenas escancarar e minudenciar aquilo que era para ser óbvio: temos um direito fundamental (ou humano) ao cuidado, pois só assim conservamos a nossa existência, recuperamo-nos de danos, ofensas e doenças que sofremos e progredimos de algum modo em direção a um objetivo último que eventualmente escolhemos para nós próprios.

O direito ao cuidado é um direito revolucionário. Ele tem o condão de alterar a percepção de nós mesmos enquanto sujeitos de direitos. Com efeito, enquanto a subjetividade jurídica moderna foi forjada em torno de uma entidade artificial que ostenta atributos dificilmente alcançáveis na realidade (pois, afinal, pressupõe um sujeito hiperracional, desencarnado, fora do tempo e do espaço etc.), o direito ao cuidado só faz sentido se admitirmos que o sujeito que precisa de tal direito é um sujeito de carne e osso, situado e inserido na história, dependente e suscetível a feridas. Para dizer de modo simples, o direito ao cuidado quebra a ficção jurídica do sujeito autônomo e autossuficiente, desde sempre disposto a assumir direitos e contrair obrigações, substituindo-o pela figura mais realista de um sujeito vulnerável. O que está em causa, pois, é uma mudança antropológica radical em torno do homo juris.

Para um tal sujeito vulnerável, o cuidado não é qualquer coisa de prescindível na reprodução das vidas individuais ou dos corpos sociais. Conquanto essa devesse ser uma constatação banal, tem demandado muito trabalho teórico e empenho prático para ser admitido por aqueles que lucram com o seu desmentido ou com a sua ocultação. Joan Tronto foi uma das filósofas que sem dúvida melhor escancarou a centralidade do cuidado não só para pessoas como Luciano (i.e., para aqueles que são usualmente considerados mais frágeis ou menos independentes), mas para todas as pessoas. Mesmo um grande empresário, no auge dos seus 35 anos, gozando da mais excelente saúde, a ponto de se considerar atleta nos finais de semana, precisa de cuidados e os recebe diuturnamente, embora apenas não o perceba ou não o queira abertamente reconhecer.

Basta pensar na sua agenda diária sempre organizada, na sua casa imperceptivelmente limpa e ordenada para receber convidados, nas suas roupas até mesmo as íntimas impecavelmente lavadas e disponíveis para uso. Temos de nos perguntar, portanto: quem realiza todo esse trabalho invisível para que ele possa se sentir e ser glorificado como um self made man? O fato é que, enquanto a consciência social não desanuvia e o ordenamento jurídico por meio de suas normas e dos seus intérpretes-aplicadores não consagra a juridicidade do cuidado, este pode muito bem continuar a ser despejado nas costas de uma parcela desfavorecida da população, ao passo que uma minoria privilegiada continua a usufruir sem culpa sua desigual percepção.

Olhemos para os lares, para os hospitais, para os asilos, enfim: para todos os lugares onde cuidados são dispensados, e reflitamos – quem costuma estar ali não na condição de quem os recebe, mas de quem os presta? Pesquisas diversas confluem no sentido de que o trabalho de cuidado é majoritariamente realizado por mulheres, sobretudo mulheres subalternizadas: mulheres negras, mulheres indígenas, mulheres migrantes etc., fadadas a cuidar não só dos homens, mas também de si mesmas. Uma tal compreensão entreabre uma nova perspectiva para o direito ao cuidado. Este não se contenta com a extensão do sistema de cuidados, de tal modo que seu recebimento não mais seja o apanágio de uns poucos, mas uma prerrogativa universal, alcançável aos mais marginalizados e esquecidos da sociedade, sobre estes ainda com maior incidência.

Com efeito, para além do direito de ser cuidado, o direito ao cuidado conota o direito de cuidar sob condições justas. Concretamente, isso significa que quem já cuida tem o direito de cuidar menos e até mesmo o direito de não cuidar quando este cuidado, v.g., é excessivo, sufocante ou desproporcional, sobretudo em razão de processos históricos ou atuais de exploração e violência. Por outro lado, quem não cuida, porque foi “poupado”, porque “tem outras ocupações”, porque “acha que não é sua função” etc., tem o dever de cuidar, até mesmo de cuidar mais. Ora, não reconhecer essa dimensão do direito ao cuidado seria autorizar que a tarefa de cuidar continuasse a recair naqueles que já cuidam, sem que nenhuma modificação social de fato ocorresse. Noutras palavras, o direito ao cuidado tem uma faceta crítica e emancipatória fundamental, obrando para desfazer a distribuição desigual do trabalho do cuidado que continua a reinar dentro e fora do Brasil.

O labor de cuidar

Por óbvio, o cuidado dentro da expressão “direito ao cuidado” não é entendido de maneira romântica ou idealizada. O cuidado mantém e perpetua o nosso mundo ordinário. Enquanto tal, não se trata de uma atividade sem fadiga, que se faz apenas por amor. Por mais prazeroso que possa ser, o cuidado é um trabalho. É preciso então pensar naqueles que cuidam, i.e., naqueles que realizam o labor de cuidar. O cuidado tem sido associado nas nossas sociedades a uma tarefa eminentemente doméstica, realizada predominantemente pelas mulheres da casa, sobretudo as mães e as empregadas. Esse trabalho não costuma ser remunerado nem considerado uma atividade econômica, ao menos não prestigiada.

Se o cuidado é tão central para a existência humana e social, nada mais justo que cuidemos daqueles que cuidam. Uma tal ideia recebeu em Eva Kittay a denominação de “princípio de doulia”. Talqualmente a doula que cuida da mãe após o parto enquanto esta cuida do seu filho, todos que cuidam deveriam contar com alguém que lhes proporcione cuidados. Com isso, endossa-se um ideal de reciprocidade, de modo que aqueles que cuidam não se percebam desamparados em suas carestias. O “princípio de doulia”, se posto em execução, concorreria para desmontar o operante quadro iníquo dos cuidados: precisamente aquele em que os que mais precisam de cuidados são os que menos o recebem e mais o prestam.

Retomemos a Luciano. Proclamar o direito ao cuidado implica conceder que outras crianças com síndrome de down (e tantas outras crianças, independentemente dessa qualidade) possam ter o direito de sobreviver e florescer, e mesmo chegar aos seus 41 anos, como Luciano, sem contar com o acaso do destino de nascer numa família dotada de provisões para acolhê-lo. Dizer que se trata de um direito significa que o Estado deve garanti-lo e que qualquer um pode reivindicá-lo quando negado ou não ministrado a contento.

Proclamar o direito ao cuidado implica também que o cuidado que alguém como Luciano ou diferente do Luciano receberá não será prestado exclusiva ou prevalentemente por mulheres mães, avós, irmãs, entrecortadas por critérios de raça, classe e origem. Proclamar o direito ao cuidado implica que quem cuida de crianças, de idosos, de enfermos, de pessoas com deficiência, de todas e quaisquer pessoas (já que não há ninguém que não dependa dos cuidados de outrem) será reconhecido e bem remunerado, tendo ainda suas necessidades adequadamente atendidas. Proclamar o direito ao cuidado não é conferir tal direito apenas a pessoas como Luciano, embora pessoas como Luciano mereçam gozá-lo de modo acentuado, em razão de sua situação pessoal ou social.

Por certo, há um hiato entre a proclamação formal de um direito e o seu usufruto particular na realidade. Esse é um problema que nenhuma legislação resolve, embora ao menos o suscite. Nesse sentido, tanto a Lei nº 15.069/2024 quanto o Decreto nº 12.562/2025, ao apregoarem o direito ao cuidado, desencadeiam um processo amplo de transformação do estado de coisas, cuja efetividade está a depender, contudo, de um esforço político enérgico e duradouro. Se alterações profundas ainda estão por ser implementadas, o direito ao cuidado, em todo caso, pelo mero fato da sua sagração jurídica, provoca uma ruptura no modo como concebemos a nós próprios e os nossos direitos, permitindo-nos escapar ligeiramente dos simulacros que arquitetam nossas representações e impedem que seres humanos parecidos com Luciano ou distintos dele possam encontrar determinações propícias não só para existir com dignidade, mas também para ser feliz.

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Tributação das instituições de pagamento: impactos da MP 1.303/2025 e da reforma tributária

Desde a criação de seu regime jurídico com a Lei nº 12.865/2013, a figura das instituições de pagamento (IP) gerou relevante controvérsia a respeito de sua natureza, em especial por conta de discussões a respeito de seu potencial enquadramento como instituição financeira, com impactos diretos na tributação de suas operações.

Embora o rol de atividades permitidas às IP seja relativamente amplo, na prática essas entidades concentram-se na oferta de serviços de processamento de pagamentos — tais como transações via QR code, terminais de captura (maquininhas), emissão de boletos, códigos para Pix, entre outros, bem como no credenciamento de estabelecimentos para aceitação de instrumentos de pagamento.

Apesar da semelhança funcional com serviços tradicionalmente prestados por bancos (como transferências financeiras, emissão de boletos, código para Pix, etc.), as IPs não podem conceder empréstimos ou financiamentos a seus clientes, limitando-se a serviços de gestão e controle de pagamentos.

O que são as instituições de pagamento

De acordo com o Banco Central, instituição de pagamento é “a pessoa jurídica que viabiliza serviços de compra e venda e de movimentação de recursos, no âmbito de um arranjo de pagamento, sem a possibilidade de conceder empréstimos e financiamentos a seus clientes”.

Em complemento, atualmente, o BC expressamente exclui as instituições de pagamento do enquadramento como instituições financeiras, asseverando que estas “não podem realizar atividades privativas destas instituições, como empréstimos e financiamentos. Ainda assim, estão sujeitas à supervisão do Banco Central”. Ou seja, as IPs não compõem o Sistema Financeiro Nacional, mas são reguladas e fiscalizadas pelo BC, conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

No cenário fiscal vigente, as instituições de pagamento não sofrem a mesma carga tributária das instituições financeiras, que, historicamente, se depararam com intensos debates e controvérsias a respeito da composição de suas receitas. A despeito disso, as instituições de pagamento não estão dispensadas de apresentar determinadas obrigações acessórias específicas do setor, como “E-Financeira”.

Sem adentrar em outras controvérsias e os impactos arrecadatórios trazidos por outros pontos da medida provisória 1.303/2025, esta norma trouxe, de forma mais imediata, importante majoração na tributação voltada às instituições de pagamento.

Carga tributária mais alta em relação a outros setores

A tributação das instituições financeiras reflete uma carga mais elevada em comparação a outros setores, em virtude da majoração da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro (CSL) implementada em 2008. A Medida Provisória nº 1.303/2025 introduz um importante desdobramento nesse cenário ao estender esse tratamento fiscal mais gravoso a outros entes, incluindo as instituições de pagamento e promovendo, assim, uma aproximação tributária que até então não existia.

Dentre as medidas de elevação da alíquota trazidas pela referida norma, há o considerável aumento da CSL de 9% para 15%, que deve passar a valer a partir de outubro deste ano.

Em um primeiro momento, o principal reflexo da MP 1.303/2025, portanto, parece residir na diminuição da assimetria tributária que historicamente beneficiava fintechs e IP em relação aos grandes bancos.

Ainda que o impacto imediato sobre os bancos seja limitado — uma vez que muitos detêm controladas que operam como IP, cujos resultados têm efeito moderado em seus balanços consolidados —, a medida tem o efeito de reduzir a vantagem tributária de que gozavam as fintechs e IP em relação aos bancos tradicionais.

Com isso, observa-se um possível redesenho do cenário concorrencial, com ganho de competitividade para as grandes instituições financeiras, sobretudo nos segmentos de crédito e de pagamentos.

Regime específico para tributar serviços financeiros

Além das medidas advindas da MP, a reforma tributária, consubstanciada na Emenda Constitucional 132/2023, e posteriormente regulamentada pela Lei Complementar 214/2025, reforça essa tendência ao instituir um regime específico para a tributação de serviços financeiros, aplicável tanto à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) quanto ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Ao contrário da situação atual, em que as instituições financeiras são tratadas de maneira diferenciada, sob o texto atual da Lei, a IP passará a ser tributada da mesma forma que as instituições financeiras.

A Emenda Constitucional 132/2023 estabeleceu que os serviços financeiros estarão sujeitos a regime específico de tributação e delegou competência ao legislador complementar para dispor sobre regras diferenciadas a respeito de alíquota, base de cálculo, não-cumulatividade, creditamento etc.

A Lei Complementar 214/2025, por sua vez, determinou, em rol taxativo, que diversas atividades estarão sujeitas ao regime específico, incluindo, entre elas, os arranjos de pagamento, incluídas as operações dos instituidores e das instituições de pagamentos e a liquidação antecipada de recebíveis.

Diferença entre bancos e IPs

Além da diferenciação de alíquota, o regime tributário atualmente aplicável a tais instituições apresenta uma segmentação relevante: enquanto bancos comerciais e seguradoras estão obrigatoriamente submetidas ao regime cumulativo de apuração das contribuições ao PIS e à Cofins, as IP e gestoras de recursos operam sob o regime não cumulativo. Essa distinção implica tratamentos fiscais diferenciados para atividades concorrentes, modelando a carga para cada contribuinte.

Partindo-se desta equiparação de tratamento entre instituições financeiras e instituições de pagamento trazida pela Reforma, além da mudança na carga tributária do setor, o modelo de tributação também será profundamente alterado.

O regime específico de tributação dos serviços financeiros previsto na reforma estabelece, por exemplo, que a incidência da CBS e do IBS no spread das instituições financeirasgere crédito para a empresa tomadora do serviço.

Como se vê, a reforma tributária visa a amplificar o rol de atividades econômicas e contribuintes sujeitos a regime diferenciado. A intenção do legislador fica evidente a partir dos artigos 182 e 183, que abarcam no rol de fornecedores sujeitos ao regime específico de incidência da IBS e da CBS, entidades que não estejam sob supervisão do Sistema Financeiro Nacional quando da prestação de qualquer atividade considerada “serviço financeiro”.

Assimetrias tributárias

Em uma análise conjunta das novas normas que foram publicadas, nota-se um movimento jurídico de reconfiguração do tratamento fiscal das IP, aproximando-as do regime aplicado às instituições financeiras tradicionais.

A reestruturação de assimetrias tributárias que favoreciam as IP pode ser vista, em um primeiro momento, como reflexo do objetivo do legislador de promover tratamento isonômico no setor, especialmente marcado pela disrupção tecnológica e pelo ingresso de novos investidores no mercado financeiro.

No entanto, essa aproximação tributária exige uma análise crítica do cenário econômico do setor de pagamentos, sob pena de comprometer sua dinâmica concorrencial. A extensão de encargos fiscais mais gravosos às IP não pode prescindir da consideração de que essas entidades — especialmente as fintechs e instituições de pagamento autônomas, que operam de forma independente de conglomerados financeiros — não compartilham da mesma estrutura ou acesso a fontes de financiamento que caracterizam os bancos.

Hoje, sua carga tributária mais amena se justifica como instrumento de estímulo à competitividade e à inovação, neste mercado já tão dominado pelas grandes instituições. O risco, portanto, é que a equiparação indiscriminada ao regime tributário dos grandes bancos acabe por sufocar justamente os agentes que promovem maior diversidade no sistema financeiro.

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Mulheres indígenas fazem apelo para veto ao projeto que altera licenciamento ambiental

 

Durante sessão solene em homenagem à 4ª Marcha das Mulheres Indígenas, nesta quinta-feira (7), na Câmara dos Deputados, lideranças indígenas fizeram apelo para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vete o projeto que estabelece regras gerais de licenciamento ambiental. O chefe do Executivo tem até o dia 8 de agosto para sancionar a lei.

O Projeto de Lei 2159/21, que é chamado de “PL da Devastação” por ambientalistas, foi aprovado pelo Congresso em julho deste ano. O texto é criticado principalmente por prever um licenciamento ambiental simplificado por adesão e compromisso (LAC), que poderá ser pedido pelo interessado sem necessidade de estudos de impacto.

A presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, ressaltou que, ao tirar o poder do Estado de fazer avaliações sobre impacto ambiental, o projeto de licenciamento traz insegurança territorial. “O ‘projeto da devastação’ flexibiliza a proteção das terras indígenas, inviabiliza os nossos direitos, faz com que as invasões se concretizem, além de acabar com a obrigação do Estado em relação ao procedimento de licenciamentos ambientais”, frisou.

A presidente da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga), Jozileia Kaingang, também defendeu o veto às novas regras. “Queremos que esta Casa volte a respeitar os povos indígenas, como na Constituição Federal de 1988, quando nos foram garantidos nossos direitos que hoje estão sendo retirados, a cada movimento que se faz com essas bancadas extremistas de extrema direita”, afirmou.

Marcha das Mulheres Indígenas
Segundo Jozileia Kaingang, junto à marcha, que reuniu 5 mil mulheres representando mais de 130 povos, foi realizada a 1ª Conferência Nacional das Mulheres Indígenas, com o tema “Mulheres Guardiãs do Planeta pela Cura da Terra”.

Como resultado desse evento, foram encaminhadas ao governo federal 50 propostas com o objetivo de articular uma política nacional para mulheres indígenas abordando temas como desenvolvimento sustentável, conservação ambiental e protagonismo feminino.

Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados
Homenagem da IV Marcha das Mulheres Indígenas. Diretora-Executiva da ANMIGA, Jozileia Kaingang
Jozileia Kaingang: “Queremos que esta Casa volte a respeitar os povos indígenas”

Nesse ponto, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, afirmou o compromisso de fazer avançar as políticas públicas voltadas às lideranças femininas indígenas. Ela também ressaltou a importância de combater a violência contra os povos tradicionais, relatando que, nos últimos dois meses, cinco indígenas foram decapitados. “Nós não podemos aceitar tamanha violência, o Estado brasileiro não pode fechar os olhos a isso”, alertou.

Marco temporal
Sobre o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG) defendeu a busca por acordo que privilegie o direito dos povos ancestrais e acabe com os conflitos em terras indígenas. Ela disse que vai levar o tema à COP 30. “Iremos levar como uma denúncia de que a aprovação do marco temporal nesta Casa precisa ser reconhecida como um crime climático”, disse.

O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou junho a última reunião da comissão de conciliação sobre o tema, sem que houvesse consenso para alterar o marco temporal. Também não houve consenso entre os ministros sobre o procedimento de indenização dos proprietários de terras após o reconhecimento de que eles ocupam uma terra indígena.

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Fonte: Câmara dos Deputados

O necessário combate às organizações criminosas

As organizações criminosas têm se fortalecido no Brasil ao longo dos últimos 30 anos. O PCC paulista e o Comando Vermelho no Rio de Janeiro detêm uma capacidade financeira sem precedentes na América Latina.

Estes recursos lhes permitem interferir nas eleições e financiar campanhas políticas. O PCC se especializou no roubo a bancos desde o início dos anos 1990, enquanto o Comando Vermelho atuava fortemente no tráfico de armas e entorpecentes desde os anos 1980.

A Lei de Organizações Criminosas — Lei 12.850 de 2013 — estabeleceu o conceito de organização criminosa de forma muito ampla. Essa amplitude em matéria penal levou à banalização do conceito. Basta que se reúnam mais de quatro pessoas para o cometimento de crimes graves para que sejam considerados uma organização criminosa.

E a banalização acaba por tornar ineficaz um sistema jurídico criado para tratar de um gravíssimo problema. Não é segredo que PCC e CV dominam as principais penitenciárias estaduais no Brasil. Trabalhei diretamente com processos envolvendo líderes do PCC e recebi, como juiz federal, a segurança e carro blindado solicitados junto ao TRF-4.

Eficiência

Considero que as policias estaduais não estão preparadas para investigar essas facções criminosas. Apesar das boas intenções dos estados, todos sabemos que somente uma agência federal poderia atuar, com eficiência, na investigação das duas maiores organizações criminosas do país. Tais investigações demandam um contato frequente com o Coaf, Banco Central e a Receita Federal, além de juízes e procuradores treinados para estas funções e com as garantias de segurança indispensáveis à função.

A Polícia Federal precisa receber os recursos necessários para ampliar as investigações e eficiência dos serviços de inteligência, centralizando se em Brasília, junto ao Ministério da Justiça, o combate ao PCC e ao Comando Vermelho.

Ainda que a experiência com a criação de varas federais especializadas em lavagem de dinheiro tenha se mostrado mal sucedida — especialmente em Curitiba e no Rio de Janeiro, por conta de ilegal politização dos juízes —, a ideia de uma ou mais varas federais centralizadas em Brasília seria uma alternativa importante para os casos envolvendo as investigações dessas duas grandes organizações.

Não se pode confundir, todavia, organizações criminosas com organizações terroristas. Temos, hoje, problemas de terrorismo doméstico e político que podem ser investigados e prevenidos pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência).

A Polícia Federal, por outro lado, atua na investigação e combate do PCC e Comando Vermelho, buscando sinergia com a administração das penitenciárias estaduais.

Somente através de um grande pacto nacional contra o crime organizado, o qual demanda cooperação entre os secretários estaduais de justiça e o Ministério da Justiça em Brasília, será possível resistir ou mesmo retardar o avanço do PCC e Comando Vermelho nas próximas eleições.

A política partidária deve ser deixada de lado em nome de uma política mais eficiente e centralizada em Brasília.

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