Troca equivocada de termos não compromete validade da petição inicial

A 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou o retorno de um processo à primeira instância por entender que um erro material no pedido não inviabiliza seu julgamento.

A ação havia sido rejeitada porque o trabalhador usou a expressão “quebra de caixa” quando, na verdade, se referia a “vantagem pessoal”. Mas o erro foi sanado e, para o colegiado, não prejudicou a parte contrária de exercer seu direito de defesa.

No caso, um empregado da Caixa Econômica Federal pedia a integração de diferenças referentes à vantagem pessoal no saldo da sua previdência privada e indenização por perdas e danos decorrentes disso.

No entanto, na petição inicial, foi utilizado equivocadamente o termo “quebra de caixa”. A confusão levou o banco a alegar a inépcia da inicial, falha que impede o prosseguimento do processo.

O argumento foi aceito na primeira instância e confirmado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA), resultando na extinção do processo sem julgamento do mérito.

Ao analisar o recurso de revista do trabalhador, o relator, ministro José Roberto Pimenta, destacou que a petição inicial continha uma causa de pedir (conjunto de fatos e fundamentos jurídicos que justificam a ação) e um pedido claros, o que afasta a alegação de inépcia.

O erro no termo utilizado foi considerado meramente material e passível de correção sem prejuízo ao contraditório e à ampla defesa.

Princípio da simplicidade

O relator ressaltou ainda que o processo do trabalho segue o princípio da simplicidade e que, em razão do chamado jus postulandi (a capacidade da própria pessoa ajuizar a ação, mesmo sem advogado), não se exige grande rigor técnico na redação da petição inicial.

A seu ver, a exigência de um formalismo excessivo prejudicou o trabalhador na busca do reconhecimento de um direito decorrente do seu contrato de trabalho.

Diante disso, o colegiado deu provimento ao recurso e determinou o retorno do processo à Vara do Trabalho de origem para que o mérito dos pedidos seja devidamente analisado.

A decisão considerou que houve violação ao artigo 840, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho, que trata da forma da reclamação trabalhista, garantindo que seja analisada com menos rigidez formal. Com informações da assessoria de imprensa do TST. 

Clique aqui para ver o acórdão
Processo 157-91.2021.5.05.0027

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Medida cautelar de suspensão do exercício do mandato parlamentar: o primeiro caso

No último 30 de abril, às vésperas do feriado do Dia do Trabalho, a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados entrou com representação em desfavor do deputado Gilvan da Federal (PL-ES), por procedimento incompatível com o decoro parlamentar. Mas diante das várias representações que já tramitaram por aquela Casa Legislativa, o que isso teria de importante?

A resposta não é óbvia, mas tem um aspecto histórico: foi o primeiro caso de aplicação do artigo 15, XXX, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD), que trata da competência da Mesa para propor medida cautelar de suspensão do exercício do mandato parlamentar.

E o motivo desse ineditismo é patente: o dispositivo foi inserido no RICD em junho do ano passado, 2024. A propósito, a esse respeito, interessa ver como se deu sua propositura e tramitação. Lembrando que, como já mencionado em diversas ocasiões nesta coluna Fábrica de Leis, impulsionar uma proposição é algo custoso politicamente falando, necessitando de muita articulação e confluência de interesses.

Em 11/6/2024, foi apresentado o Projeto de Resolução (PRC) nº 32/2024, que alterava o “Regimento Interno da Câmara dos Deputados para dispor sobre medida cautelar de suspensão do exercício do mandato parlamentar”.

Na semana anterior à apresentação do PRC, a Câmara foi palco de diferentes ocorrências. Uma delas aconteceu durante um debate acirrado na Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial (CDHM), ocasião em que a Deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), à época com 89 anos, teve um mal-estar e chegou a ser hospitalizada. Noutro episódio, os deputados André Janones (Avante-MG) e Nikolas Ferreira (PL-MG) discutiram no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar tendo que ser separados pela polícia legislativa, assessores e outros parlamentares. Estes e outros incidentes provocaram manifestações de lideranças de diferentes partidos demandando limites mais rígidos diante do clima de crescente hostilidade, o que teria culminado na apresentação do PRC.

Na justificação do PRC, foi consignado que o objetivo primordial seria “prevenir a ocorrência de confrontos desproporcionalmente acirrados entre parlamentares, que, em algumas ocasiões, têm culminado inclusive em embates físicos” comprometendo “o funcionamento democrático e a imagem institucional do parlamento”, a proposta buscaria, portanto, implementar mecanismos para “coibir comportamentos agressivos e garantir que as discussões […] ocorram dentro de parâmetros aceitáveis de civilidade e respeito”.

Cronologia

Na sessão do mesmo dia, 11/6/2025, tem-se uma sequência de fatos importantes: (1) foi apresentado requerimento de urgência (artigo 155, RICD), pelo deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), do mesmo partido do então presidente, Arthur Lira (PP-AL), subscrito pelo líder do bloco União/PP/Federação PSDB-Cidadania/PDT/Avante/Solidariedade e PRD; pelo líder da federação PT-PCdoB-PV; e pelo líder do bloco MDB/PSD/Republicanos/Podemos, representando, assim, a maioria absoluta da composição da Casa; (2) o requerimento de urgência foi aprovado, retirando a tramitação do PRC da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), para onde o projeto seria encaminhado, e remetendo a matéria diretamente ao Plenário; (3) o deputado Domingos Neto (PSD-CE), corregedor da Câmara, foi designado relator da matéria no Plenário; (4) foi apresentado o parecer preliminar de Plenário pelo relator.

Originalmente, o projeto autorizava a Mesa a suspender liminarmente o mandato, um grande poder para a Mesa Diretora. Neste sentido, alguns movimentos de obstrução indicam que o PRC não era unanimidade (e.g., apresentação de requerimento de retirada de pauta, pelo PL e pelo Novo; de votação nominal da retirada de pauta, pelo Novo; de votação nominal da matéria, também pelo Novo; e de cinco destaques para emendas e para votação em separado).

Após intensas negociações, no dia seguinte, 12/6/2025 o PRC nº 32/2024 foi discutido, votado e aprovado na forma de subemenda substitutiva global (quando o relator apresenta um texto único em substituição ao originalmente apresentado, refletindo o maior consenso a que se chegou após a discussão da matéria). A votação foi quase unânime, 400 votos sim, 29 não, uma abstenção, num total de 430 votos válidos. Ato contínuo, foi aprovada a redação final; apresentado o autógrafo (documento oficial que representa a versão final do projeto aprovado e que, no caso em questão, segue para promulgação); promulgado o texto na forma da Resolução nº 11/2024, publicado no Diário da Câmara dos Deputados (DCD) no dia seguinte, 13/6/2024. Ou seja, testemunhou-se uma tramitação em tempo recorde do PRC nº 32/2024.

O texto final permite à Mesa Diretora propor a suspensão por até seis meses, por medida cautelar, do mandato de deputado federal por quebra de decoro parlamentar. A Mesa tem o prazo de cinco dias úteis do conhecimento do fato para oferecer a proposta de suspensão. A decisão deverá ser deliberada pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar em até três dias úteis, com prioridade sobre demais deliberações. Diferente de outras representações, essa não passa pela CCJC. Da decisão cabe recurso ao Plenário apresentado pelo deputado acusado, no caso da decisão pela suspensão; ou pela Mesa, no caso de decisão pela não suspensão (no texto inicial, havia a previsão de recurso apresentado por um décimo dos parlamentares – 52 deputados – ou líderes que representassem esse número). O Plenário aprecia o recurso na sessão imediatamente subsequente, em votação aberta, sendo necessário o quórum qualificado de maioria absoluta (257 deputados) para manutenção da suspensão. Igualmente, caso o Conselho de Ética não decida no prazo previsto, a matéria é enviada ao Plenário, que sobre ela deliberará na sessão imediatamente subsequente, com prioridade.

Pedagogia

Ainda que a decisão em última instância seja do Plenário da Casa, cumpre mencionar que a medida, mesmo após as modificações promovidas na redação original após a discussão da matéria, concentrou poderes nas mãos da Mesa (ainda que tenha excluído a possibilidade de decisão unilateral do presidente da Câmara sobre o tema, o que acontece para outras matérias de competência da Mesa).

O efeito pedagógico imediato da aprovação da Resolução nº 11/2024 pode ser percebido observando-se um breve histórico quantitativo de representações por conduta atentatória ou incompatível com o decoro parlamentar no âmbito da Câmara dos Deputados, no horizonte recente dos últimos seis anos. Em 2019, foram 21 representações. No ano de 2020, quando foi declarada a pandemia de Covid-19, a interrupção das atividades presenciais no Legislativo e, consequentemente, o início dos trabalhos por meio do Sistema Deliberativo Remoto (tratado aqui), não foi apresentada nenhuma representação. Em 2021, os números começaram a voltar a subir, com 12 representações. Em 2022, foram 27. No ano de 2023, totalizaram 29. Entretanto, no ano de 2024, foram apenas cinco representações, todas no primeiro semestre do ano. A representação contra o deputado Gilvan da Federal é a primeira após a promulgação da Resolução nº 11/2024, e isso em quase um ano!

O pedido da suspensão cautelar do mandato do deputado Gilvan da Federal se deu por supostas ofensas à ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, proferidas durante reunião da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado (CSPCCO), na qual havia sido convocado o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, realizada em 29/4/2025.

A representação foi assinada pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), pelo segundo vice-presidente, Elmar Nascimento (União-BA); pelo primeiro secretário, Carlos Veras (PT-PE); pelo segundo secretário, Lula da Fonte (PP-PE); e pela terceira secretária, Delegada Katarina (PSD-SE). O primeiro vice-presidente, que é do mesmo partido que Gilvan da Federal, não assinou o documento.

O desfecho, conforme o novo rito prevê, foi célere. O relator no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, deputado Ricardo Maia (MDB-BA), inicialmente apresentou parecer favorável à suspensão por seis meses, mas após discurso em Plenário do representado, comprometendo-se a mudar de comportamento, apresentou novo parecer sugerindo a suspensão cautelar do mandato pelo período de três meses. O parecer foi aprovado no Conselho de Ética, em 6/5/2024, por 15 votos favoráveis e quatro contrários. No mesmo dia, o despacho oficializando a suspensão cautelar foi publicado. O deputado Gilvan da Federal teria manifestado que não recorreria da decisão.

E assim parece ter chegado ao fim a primeira aplicação do artigo 15, XXX, do RICD, não em sua totalidade, uma vez que não se chegou a apresentar recurso que levaria a apreciação ao Plenário, mais ainda sim, histórica.

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Regulação no comércio exterior: até onde deve ir a liberdade contratual?

Em tempos de greve da Receita Federal e seus severos reflexos sobre o comércio exterior, mais do que os tempos de despacho e a preocupação com retenções indevidas, é comum que velhos temas voltem ao debate. É o caso, por exemplo, dos altos custos relacionados a cobranças de armazenagem, demurrage e outras taxas e despesas relacionadas.

Nosso intuito em abordar essas questões não é o de trazer conceitos, tampouco é de reacender disputas sobre a abusividade de certas cobranças. O que se busca é discutir qual seria a perspectiva mais adequada para essas questões. São eles temas de direito privado e, portanto, devem se restringir ao olhar concorrencial e contratual do Direito Marítimo e Portuário? Ou se, no fundo, trata-se de questão aduaneira que, como tal, merece um maior cuidado e limitação por parte dos órgãos governamentais?

Aduaneiro, Marítimo ou Portuário?

Oportuno distinguir, de forma breve e sucinta, as principais diferenças entre esses ramos do Direito. Afinal, eles costumam ser agrupados como disciplinas congêneres no âmbito acadêmico por terem, direta ou indiretamente, o comércio exterior como pano de fundo.

Em que pese o “cenário comum” – principalmente no Brasil, em que aproximadamente 90% do total comercializado com o exterior é escoado pela via marítima [1] – existem diferenças significativas entre essas áreas e cujo desconhecimento não apenas dificulta o aprimoramento do conteúdo técnico, mas acaba também refletindo em vácuos de poder e regulação relevantes.

Partindo-se de uma visão pragmática, cabe iniciar as distinções pelo Direito Aduaneiro, foco principal desta coluna, e que é um ramo do Direito Público que se debruça sobre as regras relativas à operacionalização e regulamentação da importação e da exportação de mercadorias, principalmente sob o ponto de vista do controle e da fiscalização das fronteiras nacionais [2].

Já o Direito Marítimo trata das normas que regem as atividades marítimas, envolvendo o transporte de mercadorias e de pessoas e todas as relações jurídicas que ocorrem nos mares e oceanos e, portanto, possui foco nas relações privadas e comerciais que ocorrem neste contexto.

Por fim, o Direito Portuário disciplina as operações que ocorrem dentro dos portos, como a gestão das atividades portuárias, o trabalho realizado nessas instalações e as atribuições dos operadores portuários.

Esses dois últimos ramos têm seu surgimento e muitas de suas premissas derivadas do Direito Público, mas se tratam de disciplinas jurídicas que se desenvolvem no mundo privado e, portanto, possuem grande proximidade com questões civis e contratuais. Talvez por isso sejam comumente chamados de “primos ricos” do Direito Aduaneiro, visto que a liberdade contratual e a existência de regulamentação menos severa fazem com que as quantias envolvidas em atividades e, consequentemente, nas disputas, costumem ser consideráveis.

Autoridades envolvidas

Em termos práticos, o que se verifica é que os temas considerados como “aduaneiros” ou diretamente relacionados à operacionalização do comércio exterior costumam ser direcionados para a competência da Aduana (RFB) ou da Secex. Por sua vez, assuntos voltados à infraestrutura e logística de comércio exterior são normalmente conduzidos por outras autoridades, com destaque para a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

Essa divisão, que já vem de muito tempo, possui diversas implicações. Mais do que isso: impõe pesos e medidas completamente distintas para a condução de assuntos e políticas que deveriam, em grande parte, andarem juntas e serem abordadas com um olhar comum.

Enquanto o comércio exterior do mundo aduaneiro é discutido e gerido com vistas ao aumento da transparência e de simplificações e reduções de burocracias que tornem as operações compatíveis e previsíveis independentemente do porto de entrada ou saída em que ocorram, o comércio exterior do mundo portuário e marítimo parece possuir uma filosofia distinta.

Não queremos, de maneira nenhuma, insinuar que as autoridades que gerenciam o universo marítimo e portuário não busquem transparência e previsibilidade, assim como não podemos exaltar as autoridades aduaneiras por efetivamente promoverem e aplicarem esses relevantes princípios, já que o caminho rumo ao sucesso é longo e bastante tortuoso.

Mas é fato que o Direito Aduaneiro possui um modelo de aplicação em que as regras devem ser as mesmas para todos os envolvidos, independente de onde estejam e, com isso, tem-se (ao menos em teoria) uma base de equidade em termos de direitos e deveres de cada interveniente ou operador envolvido.

Já o Portuário e Marítimo, por serem pautados no direito privado, acabam priorizando a bandeira da liberdade contratual e da autorregulação do mercado. Além de que foram sendo construídos e revisados gradativamente ao longo das décadas, à medida que o comércio exterior e às necessidades de infraestrutura e logísticas cresciam.

O resultado dessa expansão passiva, por assim dizer, foi a utilização e a coexistência de diferentes modelos, contratos e estruturas de concessão e permissão, fazendo com que as empresas privadas envolvidas na mesma atividade, mas autorizadas em momentos diversos e por contratos específicos, nem sempre tivesses as mesmas obrigações e/ou cobrassem taxas equivalentes em suas atividades.

Essa falta de uniformidade, à longo de prazo, se tornou um problema. Visto que além dos usuários não poderem contar com os mesmos recursos e funcionalidades a depender do ponto de entrada e saída a que estivessem sujeitos, o valor a ser pago pelos serviços essenciais a serem prestados também poderia variar de forma significativa.

O caso da Antaq

Por exemplo, em 2023, a Antaq apresentou resultado de estudo que visava avaliar os custos imputados a importadores certificados no Programa Operador Econômico Autorizado (OEA) e que usufruíam do chamado despacho sobre as águas. O resultado apresentado buscou comparar os preços praticados por 9 diferentes terminais, localizados em diferentes regiões, incluindo AM, BA, PR, SP, SC, RJ e PE.

O que mais chamou a atenção foi a significativa variação dos preços praticados por esses terminais quanto à prestação de serviços análogos, relativos ao desembarque, movimentação e entrega de mercadorias desembaraçadas sobre águas. Enquanto o menor preço avaliado foi o cobrado por um terminal em Manaus, com valor de R$ 1.257,00 o maior preço identificado se deu em Santos, chegando a R$ 4.137,79. Ou seja, dentre terminais e atividades comparados pelo estudo, verificou-se uma variação de 329%.

Em que pese a existência de esforços contínuos da Antaq para buscar coibir práticas abusivas e lesivas à concorrência, existindo inclusive iniciativas em parceria com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), como o Memorando de Entendimentos nº 01/2021 relativo à análise de cobrança sobre Serviços de Segregação e Entrega de Cargas (SSE), é fato que prevalece neste universo regras em prol da livre concorrência e da contratualidade, fazendo com que o lucro de concessionárias e permissionárias – altamente variável e muitas vezes arbitrário – seja um fator de impacto ao custo total da importação.

Sabe-se que o tema de concessão e permissão de serviços públicos é complexo, visto que o Estado espera que os privados assumam função pública de forma muito mais eficiente do que era feito sob a gestão governamental e tragam investimentos e modernizações para o setor, ao passo que os usuários sempre exigirão que a contraprestação seja mínima e controlada.

Trata-se de uma equação delicada, mas que somente pode ser devidamente balanceada se houver, por um lado, preocupação real com os custos envolvidos e com a necessidade de que os prestadores dos serviços sejam remunerados de forma adequada (nem menos, nem mais do que o aceitável) e que os valores cobrados não sejam abusivos ou altos o suficiente para provocarem distorções sobre os preços de importação e exportação efetivamente praticados.

Como resolver?

O discurso parece ser claro, mas e a prática? Sabemos que os problemas do comércio exterior são complexos e não cabem em um mero artigo de coluna.

Dito isso, artigos como o ora publicado podem não possuir extensão e envergadura para “terminar” um tema, mas possuem, certamente, espaço para lançar ideias e provocações que possam abrir debates sérios, relevantes e possíveis.

Na coluna de 09/08/2022, escrevi sobre Onde fica o Direito Aduaneiro na discussão sobre o THC2? e defendi que Antaq, Cade e TCU esqueciam que o tema, embora enquadrado sob o véu marítimo-portuário, possuía significativos aspectos aduaneiros e, portanto, deveria ser avaliado também sob o prisma das regras das regras da OMC, em especial, do Acordo sobre a Facilitação do Comércio (Decreto nº 9.326/2018) no que se referia a proibição de que as taxas relacionadas a importação fossem arbitrárias e não guardassem relação com o custo dos serviços efetivamente prestados.

Passados quase três anos, a sugestão de que a precificação de serviços essenciais ao comércio exterior e sobre os quais não há forma efetiva de ingerência dos usuários na negociação seja balizada pelo custo do que for efetivamente prestado ainda parece válida.

Afinal, o momento atual engloba diversas situações preocupantes: (1) a greve dos auditores da RFB, que contribui para o aumento dos casos de cobrança de demurrage e taxas extras de armazenagem; (2) a existência de mais de 20 mil ações tramitando no Poder Judiciário discutindo a abusividade do modelo vigente de sobrestadia; (3)  a validação de cobranças de demurrage que superam o próprio valor da carga transportada; e (4) o fato do governo ainda defender que não existem fundamentos sólidos para a imposição, regulamentação e monitoramento dos valores, condições e práticas relativas a esses temas[3].

Alguém já se questionou por que a Antaq é convidada para eventos de comércio exterior, aduaneiros inclusive, que vem negociando participação dentro do Programa OEA-Integrado, mas que nunca ocupou assento no Comitê Nacional de Facilitação do Comércio (Confac)? Que embora diversas agências regulatórias façam parte da lista de intervenientes do comércio exterior, como Anvisa, Anatel, Ancine e ANP e que, em tal condição, sejam chamadas a cooperar com as regras e diretrizes voltadas à facilitação do comércio, da transparência e da redução dos custos de fronteiras, isso não ocorre com a Antaq?

O que isso quer dizer?

Esses questionamentos e preocupações não são uma crítica ao modelo de gestão da Antaq e de outros órgãos envolvidos em seu universo. Sabe-se o quanto a Agência trabalha, dialoga e busca construir pontes com o setor privado em prol de um melhor ambiente regulatório – além de contar com equipe técnica e atualizada. O ponto é que isso é feito de forma completamente isolada dos demais órgãos que interferem no comércio exterior e, consequentemente, sob premissas e regras que, muitas vezes, não estão alinhadas ao que o mundo aduaneiro necessita.

Se o foco de qualquer gestão regulatória, independentemente do assunto, é garantir soluções coordenadas, transparentes e voltadas ao interesse público, torna-se indispensável garantir que todos os elos da cadeia, públicos e privados, estejam alinhados e engajados em torno de princípios, estruturas e objetivos comuns.

O que, por que e para que se regula? No caso do comércio exterior, verifica-se que essas respostas estão longe de serem respondidas de forma coerente e uníssona. E, até que todos os entes envolvidos passem se comunicar e a alinhar condutas e objetivos de forma clara, avanços concretos continuarão a ser apenas promessas.


[1] De acordo com dados oficiais do Comextat, em 2024, 88% do valor em USD comercializado com o exterior foi escoado pela via marítima, ao passo que, quando o parâmetro é peso (kg), o total movido pela via marítima sobre para 98% do total do comércio exterior.

[2] Para discussões mais profundas e versem sobre autonomia do Direito Aduaneiro, recomenda-se as seguintes obras: BASALDÚA, Ricardo. Introduccion al Derecho Aduanero. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2008; BERR, Claude. Introduction au Droit Douanier. Paris: Economica, 2008; PONCE, Andrés. Derecho Aduanero Mexicano. Ciudad de Mexico: ISEF, 2002; e COTTER, Juan. Derecho Aduanero y Comercio Internacional. Buenos Aires: IARA, 2018.

[3] A exemplo do que restou decidido no Acórdão ANTAQ n. 120/2023.

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Comprador de imóvel em leilão não deve pagar dívida tributária anterior

O comprador de um imóvel em leilão não é responsável por dívida tributária anterior ao arremate do bem.

Com esse entendimento, a Vara Única de Porangaba (SP) declarou inexigíveis os impostos referentes aos exercícios anteriores ao arremate de um imóvel em hasta pública. A decisão atendeu ao pedido dos compradores em um mandado de segurança.

Segundo o processo, os autores arremataram o bem em fevereiro de 2022. Embora a carta de alienação tenha sido expedida no mesmo dia, foi registrada na matrícula em setembro daquele ano.

Os compradores relatam que pediram a guia para o pagamento dos tributos devidos a partir da data da arrematação. A prefeitura informou, porém, que só emitiria uma guia com o valor total dos débitos, incluindo os exercícios de 2017 a 2022.

A administração municipal invocou o artigo 130 do Código Tributário Nacional (Lei 5.172 /1966), que prevê a sub-rogação de créditos tributários relativos a impostos sobre a propriedade do imóvel ao comprador.

Cobrança indevida

Em sua decisão, o juiz Mário Henrique Gebran Schirmer argumentou que o parágrafo único do próprio artigo 130 do CTN ampara o pedido dos compradores. O dispositivo afirma que “no caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço”, o que isenta o adquirente de responsabilidade por débitos preexistentes.

Conforme lembrou o julgador, o entendimento foi consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 1.134, que fixou a seguinte tese: “Diante do disposto no art. 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação”.

“Portanto, assiste razão ao impetrante, na medida em que o adquirente não pode ser responsabilizado pelo pagamento dos débitos tributários relativos a fatos imponíveis ocorridos em momento anterior à realização da hasta pública”, escreveu o julgador.

Os advogados Paulo Roberto Athie Piccelli e Alessandra Kawamura, do escritório Paulo Piccelli e Advogados Associados, representaram os compradores do imóvel.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 1000971-76.2024.8.26.0470

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Declaração Universal dos Direitos da Humanidade: mudanças climáticas e chamado mudança

Homem passando diante de termômetro de rua indicando temperatura de 40 graus

Paradoxo na civilização: o estado de emergência climática

O mundo atual foi tomado pela mobilização contínua dos termos alarme, urgência, exceção, emergência. Este conjunto de termos é seguido por um outro conjunto de termos: perigo, risco, extremo, epidemia, calamidade, enchente, catástrofe. Aparentemente, está-se diante de um grupo de palavras em circulação no discurso cotidiano. Mas, e o que vem a seguir? Que consequências delas se pode extrair?

Ora, um outro conjunto de palavras: fome, mortes, migrações forçadas, refugiados climáticos. Enfim, diante deste dicionário de termos (da crise climática) e de uma gramática do tempo (da história do presente), forma-se a linguagem e a equação dos de nossos dias. Está-se diante de um conjunto de fatores que esgotam as possibilidades de saída, diante do ponto-de-não-retorno em que nos encontramos. Isto já deveria ter sido suficiente para criar o alarme e, para além dele, tomarem-se as medidas necessárias. O tema tem chamado a atenção, pelas situações extremas enfrentadas pela população e, em artigo recente, o filósofo Vladimir Safatle defendeu a ideia de se decretar um Estado de emergência climática [1].

A ameaça que surge no horizonte (e, não se trata mais de um horizonte distante, mas do horizonte do agora) tem a característica de fazer soar a sirene, na medida em que torna a exceção (catástrofe como acontecimento que escapa ao ordinário) algo duradouro (permanente, constante) [2] e, exatamente por isso, desastroso à capacidade humana de reorganização. Aliás, a qualidade dos eventos excepcionais é exatamente esta, qual seja, o efeito de surpresa provocado pelo caráter não controlado, não previsível e de consequências arriscadas. De certa forma, as “trombetas escatológicas” já soaram e a humanidade não escutou, tendo-se passado a época dos paliativos e medidas de longo prazo. A questão já está posta para o presente (e nem concerne mais, apenas, às futuras gerações).

É por isso que o etnólogo francês Bruno Latour, em sua obra Diante de Gaia, nos convoca a aprender a ouvir, pois o apelo não é desmedido e nem deve ser em vão [3]. O fato é que, debruçados sobre o tempo presente, deveríamos reconhecer que algo deu errado em nossa concepção “civilizatória“. Nada disso é novidade, pois o ambientalismo já vem chamando a atenção para estes riscos desde os anos 1970. A invocação constante do termo “Antropoceno” designa um conjunto de impactos humanos sobre o planeta que não devem ser negligenciados para uma análise mais detida da questão [4]. Em poucas palavras, a transição da ‘civilização do carbono’ a uma ‘civilização de economia verde’ depende de uma severa reversão do estado avançado em que se encontra a degradação ambiental em todo o mundo.

Esgotamento da natureza e os riscos à humanidade

A questão chama a atenção para o papel da reflexão filosófica em tempos de eventos extremos. A equação arriscada do presente aconselha a uma revisão crítica, profunda e consciente — para a qual, através da ideia de sustentabilidade, o filósofo Leonardo Boff já vem chamando há tempos [5] — de qual é, e de qual tem sido, a nossa relação com a natureza, de qual lugar lhe destinamos, de como a abordamos e de que forma temos retribuído à generosidade com a qual ela nos abrigou durante séculos. Se a tudo que contorna o homem se deve chamar (simplesmente) de coisa, então, tudo o que circunda o homem foi tornado (à imagem e semelhança do mercado) objeto, e é exatamente esta a visão de mundo a ser alterada. Impõe-se pensar que humanos e não-humanos formam uma unidade de vida, onde se um sofre, os demais também sofrem [6].

Mudanças climáticas e o chamado à mudança

As mudanças climáticas vieram para ficar e, com seus impactos, elas alteram tudo. Elas são capazes de colapsar a ordem estabelecida. De fato, não é mais possível continuar a insistir no mesmo modelo. A lógica continuísta do sistema econômico insiste num modelo falido e desastroso, na medida em que exploratório e predatório. Os limites planetários já foram rompidos, e, agora, urge reconhecer que a árdua tarefa de reparação, proteção e cuidado demandará esforços significativos para produzir efeitos concretos (de curto, médio e longo prazo).

Assim, as mudanças climáticas contêm em si uma mensagem, qual seja, o chamado à mudança. O chamado à mudança envolve: 1) mudança de consciência; 2) mudança de concepção; 3) mudança de atitude; 4) mudança de políticas; v.) mudanças econômicas. Nestes termos, a mudança hoje não é uma questão de posição de mundo, ideologia política, ou ainda, de opção moral. Antes, ela deve ser capaz de conclamar a todo(a)s por algo de interesse comum. Sem mudança não há futuro possível! A proteção da natureza é hoje a (própria) proteção do homem, na forma da proteção às presentes gerações e, também, às futuras gerações [7].

Palavra de ordem do momento: desaquecimento ou barbárie

imperativo categórico kantiano de nosso tempo não é outro, senão: “Age de modo a preservar o meio ambiente para garantir a sobrevida planetária da humanidade!”. Trata-se de um imperativo que relaciona o eu ao outro, inequivocamente. É isto, ou barbárie. Mais ainda, ao acompanhar o pensamento da filósofa francesa Corine Pelluchon, é para dizer que a palavra de ordem destes tempos é: “Reparemos o mundo!” [8].

Isto significa que não é necessário aguardar o retorno a um estado de natureza hobbesiano — o que implicaria a guerra de todos contra todos (homo homini lupus) — para ter consciente que diante de recursos escassos e condições limítrofes de sobrevivência, a guerra generalizada seria o tônus da coexistência planetária.

A escassez de alimentos, os prejuízos na agricultura, o desaparecimento de espécies e a perda da subsistência para comunidades tradicionais implicam num risco exasperado para a humanidade. Sem nenhum exagero, os dados da Acnur apontam que dos 120 milhões de deslocados forçados do mundo, ¾ são de pessoas que vivem em países atingidos por fortes consequências decorrentes das mudanças climáticas [9].

Ações globais, esforços concertados, mudanças estruturais e políticas públicas são necessárias, devem estar integradas e são de implementação imediata, para que se possa (ao menos) minorar os efeitos daquilo que já está em curso no mundo. De toda forma, torna-se urgente que um paradigma normativo seja votado pela ONU para representar o locus simbólico desta nova fronteira de luta pelo direito e, também, para apontar no sentido de um consenso global sobrea temática, manifestação de uma baliza normativa comum a todos os povos.

Teor normativo da Declaração e a economia verde

Atualmente, o paradigma normativo que pode servir de baliza normativa comum é a Declaração Universal dos Direitos da Humanidade (Déclaration Universelle des Droits de l´Humanité – Paris, 2015). No dia 13 de maio de 2025 (Genebra – Palácio das Nações Unidas), celebrou-se a data em que a Declaração completou 10 anos de existência (2015-2025), tendo sido confeccionada por ocasião da COP 2015, realizada em Paris (França).

O evento celebrativo tem sentido ambíguo, ao menos do ponto de vista jurídico. E isso porque, de um lado, enaltece a sua existência como intenção normativa, mas, de outro lado, cria um ambiente de pressão por sua adoção pela ONU, pois passados 10 anos, luta-se (ainda) por sua transformação num documento que confere complementação e atualidade à Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), agora sob os desafios diretos das mudanças climáticas.

Em sua tessitura enunciativa, a Declaração Universal dos Direitos da Humanidade está composta por quatro princípios, seis direitos e cinco deveres. Ela inaugura uma visão integrativa entre humanos e não-humanos, em seu artigo 5º [10]. A sua proposta geral está voltada para o estímulo a uma economia verde, de baixo carbono e que valorize a preservação ambiental, o replantio e a conservação dos ecossistemas da biosfera, conectando os interesses das presentes e futuras gerações, bem como as diversas formas de vida que coexistem no planeta. Em verdade, ela é um convite à renovação da esperança em torno da preservação da vida e da integração das diversas formas de vida num único espírito de fraternidade universal. O nosso dever primeiro é o de confirmar a sua importância e suportar a sua aprovação como sendo o documento jurídico símbolo de nossa era.


Bibliografia

ACNUR. Sem escapatória: na linha de frente das mudanças climáticas, conflitos e deslocamento forçado. Novembro, 2024. Disponível em https://www.acnur.org/br/media/sem-escapatoria-na-linha-de-frente-das-mudancas-climaticas-conflitos-e-deslocamento-forcado. Consultado em 28.04.2025.

AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução de Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo, 2004.

ANGUS, Ian. Enfrentando o antropoceno: capitalismo fóssil e a crise do sistema terrestre. Trad. Glenda Vincenzi e Pedro Davoglio. São Paulo: Boitempo, 2023.

BOFF, Leonardo. Sustentabilidade. Petrópolis: Vozes, 2012.

COOKE, Maeve, Reenvisioning freedom : human agency in times of ecological disaster, in Constellations, London, Sage, 30, 2023, p. 119-127.

GORDILHO, Heron José de Santana. Direito ambiental pós-moderno. Curitiba: Juruá, 2009.

KRENAK, Ailton, Ecologia política, in Ethnoscientia, v. 3, n. 2, 2018, ps. 01-02. Disponível em https://periodicos.ufpa.br/index.php/ethnoscientia/article/viewFile/10225/Krenak%202018. Acesso em 01.04.2025.

LATOUR, Bruno. Diante de Gaia: oito conferências sobre a natureza no Antropoceno. Trad. Maryalua Meyer. São Paulo: UBU, 2020.

PELLUCHON, Corine. Reparemos o mundo: humanos, animais, natureza. Trad. Felipe Rodolfo de Carvalho. Porto Alegre: Editora Zouk, 2024.

SAFATLE, Vladimir. Decretar o estado de emergência climática, in Folha de São Paulo, Tendências e Debates, 01 de fevereiro de 2025. Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/02/decretar-o-estado-de-emergencia-climatica.shtml. Acesso em 27/03/2025.


[1] Safatle, Decretar o estado de emergência climática, in Folha de São Paulo, Tendências e Debates, 01.02.2025.

[2] Cf. Agamben, Estado de exceção, 2004, p. 19.

[3] “As advertências de Cassandra só serão levadas em conta se dirigidas a pessoas que têm ouvido para as trombetas escatológicas” (Latour, Diante de Gaia: oito conferências sobre a natureza no Antropoceno, 2020, p. 248).

[4] A respeito, consulte-se Angus, Enfrentando o antropoceno: capitalismo fóssil e a crise do sistema terrestre, 2023.

[5] “Ela é fruto de um processo de educação pela qual o ser humano redefine o feixe de relações que entretém com o universo, com a Terra, com a natureza, com a sociedade e consigo mesmo dentro dos critérios assinalados de equilíbrio ecológico…” (Boff, Sustentabilidade, 2012, p. 149).

[6] “Da mesma forma, a ecologia, a justiça social e a causa animal estão ligadas, porque elas pressupõem igualmente refletir sobre os limites planetários e sobre o lugar que conferimos, no seio da nossa existência, aos outros, humanos e não humanos” (Pelluchon, Reparemos o mundo: humanos, animais, natureza, 2024, p. 39).

[7] Cf. Gordilho, Direito ambiental pós-moderno, 2009, p. 85 e seguintes.

[8] “Pois a hora da reparação é aquela do evitamento do pior e da superação do caos” (Pelluchon, Reparemos o mundo: humanos, animais, natureza, 2024, p. 20).

[9] A este respeito, consulte-se o Relatório da Acnur. Sem escapatória: na linha de frente das mudanças climáticas, conflitos e deslocamento forçado. Novembro, 2024.

[10] Art. 5º: “L’humanité, comme l’ensemble des espèces vivantes, a droit de vivre dans un environnement sain et écologiquement soutenable”; “A humanidade e todas as espécies vivas têm o direito de viver num ambiente saudável e ecologicamente sustentável”.

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STJ vai fixar tese sobre citação por app de mensagens ou redes sociais em ações civis

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça vai definir tese vinculante sobre a validade da citação em ações cíveis por meio de aplicativo de mensagens ou de redes sociais.

O colegiado afetou dois recursos especiais ao rito dos repetitivos, sob relatoria do ministro Sebastião Reis Júnior. A previsão regimental é de que o julgamento seja feito em até um ano.

O tema não é novo, mas foi pouco explorado na jurisprudência do STJ. Até hoje, só foi decidido colegiadamente três vezes — duas delas pela 3ª Turma, que julga temas de Direito Privado.

Por esse motivo, os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Raul Araújo se opuseram à afetação e ficaram vencidos. Para eles, seria necessário mais acórdãos para amadurecimento do debate.

O ministro Sebastião Reis Júnior citou dados da Comissão Gestora de Precedentes, que identificou 76 decisões monocráticas sobre o tema.

“No contexto apresentado, pode-se ter como madura a matéria submetida ao rito do recurso especial repetitivo, circunstância que possibilita a formação de um precedente judicial dotado de segurança jurídica”, disse.

Citação por WhatsApp

Para a 3ª Turma do STJ, a citação por WhatsApp é nula, mas pode ser validada se cumprir seu papel de dar plena e inequívoca ciência ao destinatário sobre a ação judicial da qual é alvo.

Isso implica que a citação seja feita por meio de conteúdo límpido e inteligível, de modo a não suscitar dúvidas no citado.

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, essa estratégia para citação por vezes causa mais problemas do que soluções, por criar insegurança jurídica e impulsionar nulidades.

De acordo com o Código de Processo Civil, a citação pode ser feita pelo correio, por meio de carta precatória ou rogatória, por oficial de Justiça, em cartório judicial ou por publicação de edital (quando o paradeiro do citando é desconhecido).

Em 2015, foi acoplada ao Código de Processo Civil a hipótese de citação por meio eletrônico (e-mail), mas não existe obrigatoriedade e há uma série de regulamentações que têm de ser cumpridas.

Sinal dos tempos

Fato é que o WhatsApp e aplicativos análogos têm sido cada vez mais incorporados nos atos judiciais — talvez nenhum tão relevante quanto a citação.

O Conselho Nacional de Justiça já autoriza que a intimação seja feita dessa forma — o informe de que houve um novo ou ato em um processo já conhecido e em andamento.

Também têm sido admitidos diversos tipos de notificação, como a feita ao devedor, desde que se comprove o envio e entrega da mensagem — posição recentemente unificada pelo STJ.

A Corte Especial ainda decidiu não suspender os processos ou recursos especiais que tratem sobre o tema enquanto aguarda o julgamento e definição da tese.

Clique aqui para ler o acórdão de afetação
REsp 2.160.946
REsp 2.161.438

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Tributação das altas rendas e miscelânea metódica no cálculo do redutor previsto pelo PL 1.087

O Brasil tem um sistema tributário regressivo e que, portanto, termina por onerar proporcionalmente mais quem tem menos capacidade contributiva. Isso decorre de muitos fatores distintos, mas, fundamentalmente, em razão de termos um sistema majoritariamente baseado na tributação sobre o consumo (que é ínsita e estruturalmente regressiva) em comparação com a tributação da renda e do patrimônio.

Esse efeito regressivo é acentuado no âmbito do imposto de renda das pessoas físicas por um histórico longo de não correção monetária da tabela que prescreve as faixas de tributação e, ainda, pela previsão de poucas e concentradas faixas de alíquotas nominais. Isso gera a tributação de rendas de pessoas com baixa capacidade contributiva, com a fixação de uma progressividade acentuada apenas nas faixas iniciais de renda.

Parece encontrar foros de consenso a ideia de que algum ajuste de rota é necessário. Em que pese esse diagnóstico, a reforma da tributação sobre o consumo, com a criação dos novos Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com uma alíquota combinada que pode girar em torno de 28%, parece desmentir a conclusão de que os últimos movimentos legislativos estão modalizados com esse propósito.

De todo modo, no âmbito da tributação da renda, surge agora o Projeto de Lei nº 1.087/25, que tem por objeto a implantação, no Brasil, de uma espécie de imposto mínimo sobre a renda, destinado a contribuintes que tenham auferido renda superior a R$ 600 mil. O projeto prevê a incidência desse Imposto de Renda das Pessoas Físicas Mínimo (IRPFM) sobre pessoas que aufiram rendas superiores a esse valor, sendo que a aplicação da alíquota máxima de 10% fica reservada para contribuintes que aufiram R$ 1,2 milhão ou mais.

Como começa a ser exposto pela doutrina especializada, o projeto pode ser criticado por diversos fundamentos, a começar pela falta de transparência quanto ao real objetivo da mudança que, ao final e ao cabo, pretende tributar dividendos recebidos por pessoas físicas [1], ainda que a hipótese de incidência prevista seja ligeiramente mais ampla. Além disso, já surgem vozes sustentando que o IRPFM não é propriamente um adicional do imposto de renda das pessoas físicas, tratando-se, em verdade, de um novo imposto que apenas poderia ser criado por meio de lei complementar [2]. Também não faltam críticas quanto ao fato de o IRPFM não distinguir sociedades de capital e sociedades de pessoas, o que gera uma tributação potencialmente injusta e desigual [3].

O objetivo deste pequeno texto é tratar de um ponto específico do projeto: a criação do que foi chamado, no texto do PL, de um “redutor” do IRPFM no caso de pagamento de lucros e dividendos. O redutor deve ser aplicado para evitar que a cobrança do imposto mínimo acarrete uma tributação final que, considerada a carga tributária da pessoa jurídica e da pessoa física segundo parâmetros próprios fixados no projeto, ultrapasse a alíquota nominal do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro (CSL). De modo bastante objetivo, o redutor é aplicado quando a soma das alíquotas efetivas da pessoa jurídica e da pessoa física ultrapassar o limite da alíquota nominal combinada.

A presença desse redutor parece ser uma resposta antecipada do governo a eventuais críticas sobre o fato de que, no final do dia, haverá tributação de dividendos, sem a redução correspondente das alíquotas incidentes na tributação corporativa. A resposta que o redutor parece ofertar é: ninguém pagará mais do 34%, mesmo que venha a ser considerada a carga tributária cumulada da pessoa jurídica e da pessoa física após a incidência do IRPFM. O projeto, portanto, nessa óptica, apenas eliminaria uma situação de subtributação.

O mecanismo, no entanto, merece revisão, especialmente na parte em que prevê a mensuração da carga tributária efetiva das pessoas jurídicas pela razão entre o valor efetivamente pago de IRPJ e CSL e o lucro contábil apurado no exercício pelas pessoas jurídicas.

Não há dúvida de que a apuração das bases de cálculo do IRPJ e da CSL parte do lucro contábil apurado pelas entidades, mas, por uma série de razões jurídicas (razões essas que são sempre tomadas como relevantes pelo legislador) com ele não se confunde. O chamado lucro real é, nos termos da legislação de regência, calculado a partir do lucro contábil com adições e exclusões que o legislador considera pertinentes, para que a renda (tributável do ponto de vista jurídico) do contribuinte possa ser efetivamente onerada.

Isso não deve causar qualquer surpresa, já que a contabilidade é informativa e preparada com propósitos de reconhecimento, mensuração e evidenciação da posição econômica do contribuinte, enquanto a norma tributária, voltada à oneração da renda, não acolhe, de forma direta, a base de cálculo contábil, realizando ajustes, ora para aumentar a base (adições), ora para reduzi-la (exclusões). O lucro contábil e o lucro real, portanto, dificilmente coincidem, pois são grandezas diversas que servem a propósitos absolutamente distintos. No lucro presumido, do mesmo modo, quase sempre existe um descasamento entre o lucro contábil e o lucro fiscal, apurado pela aplicação de um percentual de presunção fixado em lei. A regra simplificadora se aplica para a mensuração da base tributável.

Condão de embaralhar

Se assim o é, a chamada carga tributária efetiva suportada pelas empresas será, em regra, de 34%, já que o imposto pago deveria ser dividido pela base imponível tributária (o lucro real ou o lucro presumido), e não sobre uma base (o lucro contábil) que sequer serve como parâmetro de mensuração da renda auferida pela pessoa jurídica.

De modo singelo: o tributo pago por uma pessoa jurídica, calculado pela aplicação da alíquota de 34% sobre a base legalmente prescrita, conforma uma carga efetiva de 34%. A tentativa de se mensurar a carga efetiva com base em outros parâmetros, como o lucro contábil, é arbitrária, notadamente porque esse dado serve a outro propósito e sequer é juridicamente tributável como renda. Como já decidiu o Supremo Tribunal Federal (RE nº 606.107), conceitos contábeis e jurídicos não se confundem, sendo indevida a subordinação da tributação a critérios contábeis.

O mecanismo de tributação mínima, como posto no projeto, tem o condão de embaralhar uma série de subregimes tributários que foram (ou deveriam ter sido) pensados com o objetivo de cumprir certas políticas públicas, já que ele gera um efeito transversal na tributação de todas as espécies de renda. Isso termina gerando uma tributação de rendimentos que, por algum fundamento constitucional, foram desonerados. Ora, ou esses rendimentos foram desonerados com um objetivo nobre e, portanto, não podem ser, depois, onerados (ainda que via um IRPFM). Ou, não, não estão amparados num fundamento constitucional (são “privilégios odiosos”) e, então, o caminho deve ser a revogação da desoneração e não sua tributação sub-reptícia.

Anda mal, portanto, o projeto de lei quando cria essa espécie de redutor, altamente complexo e que dificilmente surtirá efeitos concretos, já que é construído com base em uma miscelânea de critérios distintos, talvez porque moldado apenas para servir de resposta à crítica de que o projeto aumenta a tributação das pessoas físicas sem reduzir, de forma correspondente, a tributação das pessoas jurídicas, embaralhando o atual modelo brasileiro de integração da tributação da renda.


[1] SCAFF, Fernando Facury. Tributação disfarçada de dividendos e distribuição disfarçada de lucros. Conjur, 14/04/2025. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2025-abr-14/tributacao-disfarcada-de-dividendos-e-distribuicao-disfarcada-de-lucros/

[2] BIFANO, Elidie Palma. Projeto de Lei 1.087/25: estamos diante de mais uma confusão tributária? Conjur, 02/04/2025. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2025-abr-02/o-projeto-de-lei-1-087-25-estamos-diante-de-mais-uma-confusao-tributaria/

[3] DERZI, Misabel; e MOURA, Fernando. Isenção de IR até R$ 5.000: atecnias em busca de maior justiça tributária. Conjur, 28/03/2025. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2025-mar-28/pl-1087-2025-atecnias-em-busca-de-maior-justica-tributaria/

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A batalha das inteligências artificiais em que não há vencedores

A pergunta que faço é: pode um Poder do Estado se dar ao luxo de atuar com ferramentas que invariavelmente irão “alucinar”?

 

Há algum tempo venho me dedicando a alertar sobre os perigos da inteligência artificial para o Direito — e para o mundo todo. Aqui mesmo na ConJur já falei sobre os riscos que a inteligência artificial representa em diversos textos. Nas últimas semanas tenho abordado alguns casos específicos, em que nossa vida cotidiana está cada vez mais se aproximando das distopias futuristas (ver aqui e aqui).

Ainda que de minha parte a preocupação com a inteligência artificial e a alta dependência tecnológica devam ser um tema que deve ser tratado com maior seriedade por parte da comunidade jurídica, há setores que abraçam efusivamente a inteligência artificial como solução para os seus problemas.

No Brasil, poucos setores falam tanto em inteligência artificial quanto o Poder Judiciário. Enquanto empresas do setor privado tratam com cautela os processos de automatização por meio de inteligência artificial — sobretudo porque não dispõe do domínio tecnológico necessário para controlar os algoritmos criados por algumas poucas empresas internacionais — no primeiro minuto em que essas tecnologias se apresentaram como viáveis o Judiciário brasileiro se lançou às mãos de robôs, chatbots e quejandos. Todavia, as consequências fáticas da adoção prematura deste tipo de tecnologia começam a pipocar por todos os lados. A pressa do Judiciário gera monstros.

1. O futuro é um tribunal de robôs?

Conforme a “Pesquisa uso de inteligência artificial (IA) no Poder Judiciário: 2023” realizada pelo Conselho Nacional de Justiça, 66% dos tribunais do país fazem uso de inteligência artificial, tendo sido mapeados 140 projetos em desenvolvimento pelos tribunais do país [1]. O campeão de projetos é o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul é campeão com 12 projetos de inteligência artificial em desenvolvimento (!!!).

 

Sem dúvida esses dados já estão obsoletos. Observado que os dados publicados pelo CNJ são referentes ao ano de 2023 e estes já davam conta de que havia um crescimento de 22% em uso de inteligência artificial nos tribunais em relação ao ano de 2022, se for mantida esta proporção de crescimento no uso IA, ao final de 2025 quase 100% dos tribunais do país farão uso de inteligência artificial. Os algoritmos estavam chegando e chegaram.

Claro, tenho plena ciência de que esses números podem perfeitamente desacelerar em face de limitações orçamentarias e técnicas nos mais diversos tribunais do país. No entanto, a cada dia somos bombardeados com notícias sobre os novos robôs e inteligências artificiais que vem sendo desenvolvidos pelos tribunais. A cada semana, um novo robô.

2. E o juiz resolveu usar a inteligência artificial para aumentar a produtividade…

Diante do incentivo à adoção da inteligência artificial como solução para “aumentar a produtividade” e “otimizar recursos” em uma larga escala institucional pelo Poder Judiciário, infelizmente não me causa espanto que essa passe a ser utilizada como forma de resolver questões mais singelas… como a produtividade individual de magistrados.

Em uma recente publicação realizada pelo portal Migalhas, há informação de que um magistrado está sendo investigado pela corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão por uso indevido de inteligência artificial para aumento de sua produtividade (ver aqui).

Conforme a reportagem, o referido magistrado saltou – magistralmente – de uma produtividade média mensal de 80 sentenças, em agosto de 2024, para 969 decisões, muitas delas com padrão textual uniforme. Além disso, nas decisões do magistrado foi identificada ausência de fundamentação ou análise de provas, distribuição indevida de processo por prevenção e, especialmente, o uso inadequado de ferramentas de inteligência artificial, com a criação de “precedentes inexistentes”, gerando insegurança jurídica.

Eis um dos problemas centrais da inteligência artificial generativa que vem se propagando diariamente: o que IA não sabe, ela inventa. Já falei sobre isso anteriormente, inclusive apontando que IA disse que eu disse coisas que nunca falei.

3. Sobre alucinações produzidas pela inteligência artificial

A cada dia mais e mais casos de petições e decisões que resolveram inventar jurisprudência para confirmar os vieses aos quais esses robôs e chatbots foram condicionados desde o princípio.

Nesse sentido, vale mencionar matéria publicada pelo The New York Times, que dá conta exatamente deste que pode ser apontado como o problema central prático — para além dos problemas éticos óbvios — a geração de respostas absolutamente dissociadas dos fatos por parte da inteligência artificial, as chamadas alucinações (ver aqui).

Conforme a reportagem, quanto mais sofisticados ficam os modelos matemáticos utilizados para construir as inteligências artificiais que estão disponíveis ao público se transformam, maior o número de alucinações elas produzem. Nos modelos mais modernos de inteligência artificial testados pelo New York Times, o percentual de alucinações chegou a 79% (!!!) e os desenvolvedores afirmam: essas alucinações podem ser reduzidas, mas nunca deixarão de existir.  O que me dizem os adeptos da IA do Brasil?

A pergunta que faço é: pode um Poder do Estado se dar ao luxo de atuar com ferramentas que invariavelmente irão “alucinar”?

O caso do juiz do Maranhão serve como ilustração daquilo que já afirmei anteriormente, não se trata de uma simples questão de revisão das respostas geradas pela inteligência artificial ou de um defeito de operação do usuário em elaborar corretamente o comando para que a inteligência artificial gere a respostas adequadamente.

Se tais inteligências artificias foram criadas para “solucionar problemas”, se eles não resolverem os de problemas imediatamente, são inúteis. Por essa mesma razão as inteligências artificiais disponíveis no mercado nunca dirão que não tem as respostas que estão sendo buscadas. Pior: tem gente vendendo a produção dos robôs.

4. Venda de petições feitas por IA

De outra parte, em mais uma reportagem recente, temos a notícia de que a Justiça Federal do Rio de Janeiro, atendendo ao pedido de tutela de urgência formulado em ação civil pública ajuizada pela OAB-RJ, determinou a suspensão das atividades de uma plataforma que prometia a criação de petições iniciais para Juizados Especiais, por apenas R$ 19,90 (ver aqui).

A ação civil pública ajuizada pela OAB afirma que a referida plataforma oferecia petições iniciais com argumentação jurídica padronizada, formulada por inteligência artificial, podendo ser protocolada imediatamente nos juizados especiais.

Ainda que o caso concreto da plataforma que oferecia petições para os juizados especiais mediante pagamento de R$ 19,90 demonstre uma camada extra de picaretagem, qual a diferença entre esta plataforma e os chatbots que já estão disponíveis “gratuitamente” na internet? Afinal, ainda que não se tenha que pagar uma soma em dinheiro, o pagamento se dá através de informações que são fornecidas pelo usuário voluntariamente a plataforma.

Todavia, quando observamos o conteúdo daquilo que é “produzido” tanto pela “IA fazedora de petições iniciais para juizados especiais por R$ 19,90” e o Chat GPT — apenas para citar o chatbot mais popular — o resultado é o mesmo e provavelmente tem a origem no mesmo lugar: plágio.

Eis mais uma evidência concreta daquilo que já afirmei por diversas vezes: aquilo que se chama de inteligência artificial generativa é apenas uma máquina de plágio.

5. Petições geradas por IA v. decisões por IA: a batalha final ou a crônica de um desastre anunciado?

Diante desse quadro temos uma situação distópica que cada dia parece mais real: de um lado petições iniciais criadas por inteligência artificial, de outro lado decisões geradas por inteligência artificial para responder as petições. E o que a IA não sabe? Ela inventa. Ah! E claro, tudo isso supervisionado por um dos 14 robôs desenvolvidos pelo tribunal…

Vejam que o quadro caótico que estou apontando não está ligado à forma de que a ferramenta está sendo usada pelos usuários — como os entusiastas da IA costumam acusar aqueles apontam seus perigos — a questão é que própria IA esteja na equação, porque ela está fazendo aquilo que foi programada: gerar solução para um problema.

Eis o busílis. Se a inteligência artificial é a apontada como solução para os problemas humanos de um dos Poderes do Estado, o problema está na solução ofertada.

Nesse sentido, o próximo grande mote dos tribunais no Brasil já está decidido: litigância predatória. O Superior Tribunal de Justiça formulou uma tese ao julgar o Tema 1.198, possibilitando que o magistrado determine que a parte autora emende a petição inicial para demonstrar o interesse de agir e autenticidade da postulação. Ciente de que a tese — fixada pela Corte Especial do STJ e, portanto, “precedente qualificado” — poderia gerar problemas de abusos por parte do próprio Judiciário, o relator do caso afirmou que essas poderiam ser controladas pontualmente. Como isso será feito, ninguém sabe.

Pois bem, conforme o relatório do CNJ, dos 140 projetos de inteligência artificial que estão em desenvolvimento pelos tribunais do país, 15 deles estão vinculados à litigância predatória. E se robô alucinar e identificar uma demanda equivocadamente? Em um país em que impera o realismo jurídico, quantos terão seus direitos solapados?

De fato, deve ser observado que a principal queixa efetuada pelos magistrados no Brasil é a de excesso de processos. Afirmam que em lugar algum no mundo há tantos processos quanto no Brasil. É necessário simplificar, automatizar, diminuir a quantidade de recursos etc. Todavia, a pergunta sobre as razões pelas quais o número de demandas não para de crescer, raramente é feita. Há uma ampla negligência acerca da razão pela qual a vida brasileira vem sendo tão judicializada. De novo: por que será que há tantas demandas e tantos recursos? Há muitas respostas circulando. Mas, são lidas? Compreendidas?

Fazendo uma analogia com a medicina, estamos apenas tratando os sintomas de uma doença mais profunda que está matando o paciente. Pior, para tratar a doença do paciente estamos implementado um tratamento que pode matar todos os outros pacientes que estão em tratamento.

Na distopia futurista Duna, de Frank Herbert, o fim do mundo como conhecemos foi gerado por uma guerra entre os seres humanos e os computadores e robôs conscientes. Apesar da vitória humana sobre as máquinas e sua consequente destruição total, um mandamento foi fundamental foi estabelecido: “não farás máquina à semelhança da mente humana”.

Sempre digo que a literatura chega antes. Ainda é tempo de aprendermos com ela antes que o nosso mundo se torne efetivamente uma distopia. Até porque, no nosso mundo, corremos o sério risco de perder a guerra… Ou já a perdemos? Quando nos deparamos com um caso como o do juiz do Maranhão, parece improvável que possamos vencer.

 


[1] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Pesquisa uso de inteligência artificial (IA) no Poder Judiciário: 2023. Brasília, 2023. Disponível em: https://bibliotecadigital.cnj.jus.br/jspui/handle/123456789/858

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Boas práticas e diretrizes internacionais para o processo legislativo democrático

Há uma crescente atenção de diversas organizações internacionais para a necessidade de democratizar o processo legislativo. Como destaca Tímea Drinóczi, para além da expansão da realização de análises de impacto legislativo ex ante em diversos países, organizações internacionais passaram a se dedicar à disseminação de boas práticas e diretrizes (guidelines) democráticas para o processo legislativo como estabelecimento de padrões de legística, fortalecimento da participação social e aumento da transparência das atividades parlamentares [1].

O presente artigo apresenta em visão panorâmica iniciativas recentes de algumas organizações internacionais que têm apontado boas práticas e diretrizes para o processo legislativo democrático, fazendo-se, quando possível, vinculações com o cenário brasileiro. Apresentam-se, em breves linhas, essas iniciativas com algumas conclusões gerais ao final.

Uma das organizações mais tradicionais é a União Interparlamentar – Inter-Paliamentary Union (IPU). Fundada em 1889, é sediada em Genebra e congrega mais de 180 Parlamentos nacionais, inclusive o Brasil. Sua atuação é destinada a promover a cooperação entre os Parlamentos para fortalecimento de suas capacidades institucionais e suas democracias. Alguns de seus temas de maior atenção são a resiliência democrática e os parlamentos, participação feminina na política, transformação digital e combate à crise climática.

Entre suas iniciativas, destacam-se os World e-Parliament Reports, sendo o mais recente de 2024, em que são apontadas as principais tendências de transição digital dos Parlamentos [2]. Como o Report demonstra, há uma tendência acentuada no período pós-Covid 19 de que as inovações digitais sejam permanentemente incorporadas às práticas parlamentares, gerando desafios de transparência, segurança e inclusão digital e oportunidades de aumento da participação social e resiliência democrática em contextos de crise. Há também o robusto “Indicadores para os Parlamentos Democráticos”, lançado em 202 [3], em que há 25 indicadores do caráter democrático dos parlamentos, já com estudos de casos em que países os utilizaram para avaliar suas instituições e práticas.

Outra instituição que tem se destacado é a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na qual é o Brasil é um país associado com possível ingresso pleno futuro. Na OCDE, há dois principais órgãos que trabalham o tema das boas práticas e diretrizes em processo legislativo e democracia.

O primeiro deles é o Comitê de Política Regulatória, cuja missão é fortalecer a produção de normas jurídicas – legislativas e administrativas – com base em evidências empíricas de forma estratégica e inovadora. Em 2012, foi adotada a importante Recomendação para a Política Regulatória e Governança [4], que sugeriu a seus membros a adoção de uma política regulatória ampla (whole-of-government) fundada em princípios de transparência e participação social, bem como a adoção de boas práticas como a análise de impacto ex ante e avaliação constante de estoque regulatório. O Comitê também faz regularmente a avaliação de políticas regulatórias de determinados países (Regulatory Police Outlook [5]). O Brasil é um dos países regularmente avaliados, sendo que o Relatório de 2022 (Regulatory Reform in Brazil [6]) ressalta, dentre outras sugestões, a necessidade de criação de uma política nacional de melhoria da qualidade regulatória, inclusive envolvendo o Poder Legislativo. No plano do Poder Executivo federal, a retomada do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG – Decreto 11.738/2023) e os Decretos 10.411/2020 e 11.243/2022 dialogam diretamente com essas recomendações.

Destaque e conclusões

Ainda no âmbito da OCDE, em 2022 foi criada a “Iniciativa Reforçando a Democracia” coordenada pelo Comitê de Governança Pública, tendo cinco pilares-chave: 1) combate à desinformação, 2) ampliação da participação social, 3) representação política, transparência na vida pública e igualdade de gênero, 4) práticas de sustentabilidade e 5) democracia digital. Um relatório de 2024 sobre a implementação desses pilares por diversos países retrata, entre outros, a necessidade de repensar respostas estatais lentas em face da desinformação digital e formas inovadoras e criativas de ampliar a participação social nas atividades do poder público no geral e dos parlamentos, em específico [7].

Outra instituição que tem ganhado destaque na atuação internacional a respeito da democratização do processo legislativo é o Escritório para Instituições Democráticas e Direitos Humanos – Office for Democratic Institutions and Human Rights (ODIHR) –, da Organização para Segurança e Cooperação na Europa). Atualmente com 57 países membros da Europa, Ásia Central e América do Norte, a Organização tem uma atuação destacada na cooperação com países de transição democrática mais recente na avaliação e produção de sugestões para o fortalecimento de eleições transparente e justas e do caráter democrático das normas jurídicas que regem o processo legislativo.

Uma publicação recente que se destaca é o Guidelines on Democratic Lawmaking for Better Laws [8], em que são apresentados 17 princípios para o legislar democrático, entre eles os pré-requisitos do processo legislativo: respeito aos princípios democráticos, aderência ao Estado de Direito e respeito aos direitos humanos. Como já destacado em outra oportunidade [9], trata-se de um documento pioneiro focado especialmente na produção legislativo do direito, do seu potencial democrático, boas práticas parlamentares e desafios contemporâneos. Embora produzido por uma organização com atuação mais regionalizada, podem servir de inspiração para outros países, inclusive o Brasil, uma vez que apresentam rica experiência prática de problemas e soluções enfrentadas por parlamentos.

No âmbito das Américas, há o Parlamericas, entidade instalada em 2001, no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), como fórum de compartilhamento de experiências e cooperação entre os parlamentos americanos. Atualmente 35 parlamentos nacionais participam do Parlamericas, inclusive o Brasil. Entre suas publicações, se destacam o Mapa para Abertura Legisaltiva 2.0, de 2021 [10], em que há a descrição de diretrizes e iniciativas para o fortalecimento transparência, accountability, participação social e ética na condução das atividades parlamentares.

Diante desse cenário de multiplicidade de documentos, apontam-se quatro conclusões.

É no mínimo curioso perceber que o debate sobre os princípios – aqui não em sentido jurídico, mas de diretrizes políticas – do processo legislativo seja objeto de maior atenção internacional relativamente a pouco tempo. Desde as revoluções liberais do século 17 e 18, entende-se que os parlamentos são órgãos centrais dos governos representativos e, mais recentemente, das democracias representativas, com suas regras e formalidades.

Contudo, é nas últimas décadas, com as transições democráticas especialmente em países da América Latina, leste Europeu, África e Ásia e as constantes crises da democracia representativa, que se aprofundam as demandas por maior qualidade e democraticidade dos trabalhos parlamentares. Como Elsa Pilichowski, diretora de Governança Pública da OCDE e responsável pelo programa Reforçando a Democracia, destaca: “(..) não é que nossas democracias não estão funcionando como elas costumavam funcionar – são as expectativas dos cidadãos que mudaram” [11]. Há, portanto, novas demandas de transformação democrática do processo legislativo e não apenas um retorno a um idealizado modelo de deliberação do passado.

Em segundo lugar, é possível notar alguns pontos largamente comuns nos diversos documentos e diretrizes sobre o legislar democrático. Diretrizes como respeito à democracia e aos direitos humanos, aumento da participação social e de minorias políticas, legislação com base em evidências e análise de impacto legislativo, igualdade de gênero na política e aumento do uso de ferramentas digitais nas atividades parlamentares, apenas para mencionar alguns, são contemplados nos diversos documentos e apontam para aspectos da transformação dos parlamentos no século 21.

Esses pontos comuns podem oferecer o substrato político para justificar e oferecer alternativas para reformas do arcabouço jurídico a respeito da produção legislativa do direito. Como aponta Edoardo Celeste em relação à grandes declarações de direito do século 18 e, mais recentemente, às diversas declarações de direitos digitais produzidas inclusive por entidades do terceiro setor, há um movimento histórico de que pautas inicialmente políticas do constitucionalismo expressadas em documentos esparsos e não vinculantes sejam incorporadas ao discurso jurídico e, posteriormente, transformadas em direito vigente nos planos nacionais [12]. Essa pode ser justamente a tendência no caso da democratização do processo legislativo a partir dessas diretrizes internacionalmente compartilhadas.

Em terceiro lugar, há uma percepção compartilhada de que a transformação dos parlamentos depende, de um lado, de estável compromisso político dos representantes parlamentares e, de outro, institucionalização por meio de regras e instituições dedicadas a essas atividades. Embora a produção legislativa não seja uma atividade meramente técnica, mas essencialmente política na qual diversas visões de mundo e ideologias são apresentadas para o debate público antes da tomada de decisão, há uma dimensão crescente da incorporação de boas práticas regulatórias para o processo legislativo, que requerem pessoal e instituições com algum grau de independência para produzirem informações para subsídio dos parlamentares. Além disso, a participação social por meio de canais institucionalizados cada vez mais é percebida como um elemento central do processo legislativo e não apenas algo que pode ou não ocorrer a critério exclusivo da maioria parlamentar.

Por fim, e a título de conclusão, abre-se amplo campo para estudos e pesquisas. Para mencionaram-se apenas alguns deles: 1) comparação entre os documentos e perspectivas das organizações internacionais sobre o caráter democrático do processo legislativo, 2) ) análise da colaboração entre essas instituições entre si e os parlamentos nacionais e regionais, 3) estudos de caso para a incorporação dessas diretrizes aos diferentes parlamentos nacionais e regionais, 4) relação dessas diretrizes com o direito positivo vigente de diversos países, com destaque para sua tradução em normas jurídicas constitucionais, legais e regimentais, bem como a prática de sua revisão judicial, e 5) estudos de caso do impacto dessas diretrizes sobre o processo legislativo de leis em concreto para avaliar suas potencialidades e desafios. Como é fácil perceber, trata-se de empreitada que mobiliza diversas áreas do conhecimento entre elas a teoria política, ciência política, política comparada, direito constitucional, direito parlamentar e direito regulatório. Fica, portanto, o convite.


[1] Tímea Drinóczi, “Quality Control and Management in Legislation: a Theoretical Framework”, KLRI Journal of Law and Legislation 7 (2017), p. 73.

[2] https://www.ipu.org/resources/publications/reports/2024-10/world-e-parliament-report-2024

[3] https://www.parliamentaryindicators.org/

[4] https://www.oecd.org/en/publications/2012/11/recommendation-of-the-council-on-regulatory-policy-and-governance_g1g3fce5.html

[5] https://www.oecd.org/en/publications/oecd-regulatory-policy-outlook-2025_56b60e39-en.html#:~:text=Adopt%20regulatory%20reviews%20to%20revise,potential%20for%20risk%2Dbased%20enforcement.

[6] https://www.oecd.org/en/publications/2022/06/regulatory-reform-in-brazil_da75f3f8.html

[7] https://www.oecd.org/en/publications/2024/10/the-oecd-reinforcing-democracy-initiative_458501ab.html

[8] https://www.osce.org/odihr/558321

[9] Victor Marcel Pinheiro, “Review: ODIHR Guidelines on Democratic Lawmaking for Better Laws”, Theory and Practice of Legislation 12 (2024), pp. 344-357.

[10] https://www.parlamericas.org/uploads/documents/Road_map_2.0_ENG.pdf

[11]  Entrevista, “Time to act: Nurturing our democracies for the 21st century”, OECD Podcasts, 2022.

[12] Edoardo Celeste, “Digital Constitutionalism: The Role of Internet Bill of Rights”, London, Routledge, 2023, pp. 116-7.

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Nova regra de supervisão judicial não se aplica a recuperação concedida antes da lei

Embora a nova Lei de Recuperação Judicial e Falências, de 2020, tenha entrado em vigor com aplicação imediata aos processos pendentes, foram mantidos os “atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas” sob a vigência da norma anterior. As novas regras sobre supervisão judicial, portanto, não se aplicam aos planos de recuperação que foram aprovados e homologados antes de lei entrar em vigor.

Relógio e martelo de juiz sobre calendário

Com base nessa interpretação, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o prazo de carência para início dos pagamentos da recuperação da rede Hotéis Othon não afeta o início do prazo de supervisão judicial.

Quando o plano foi aprovado e a recuperação judicial da rede hoteleira foi concedida, a nova lei ainda não havia entrado em vigor. O artigo 61 da lei original, de 2005, previa apenas que, a partir da decisão de concessão, o devedor permaneceria em recuperação até cumprir todas as obrigações previstas no plano que vencessem até dois anos depois.

Após a mudança na legislação, o mesmo artigo passou a prever que o juiz pode ordenar a manutenção do devedor em recuperação judicial até o cumprimento dessas mesmas obrigações, “independentemente do eventual período de carência”.

No plano aprovado e na decisão que concedeu a recuperação à Hotéis Othon, havia a previsão de um prazo de carência de quatro anos para o início do pagamento da maior parte dos débitos.

Após a nova lei entrar em vigor, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou que o prazo de supervisão judicial começasse “independentemente do prazo de carência”.

Em recurso ao STJ, a Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), uma das credoras da rede hoteleira, alegou que a regra não se aplicava ao caso, já que a recuperação foi concedida antes de a nova lei entrar em vigor. O TJ-RJ, porém, decidiu aplicar o entendimento da nova norma.

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do caso, acatou os argumentos da Cedae. Ele lembrou que a nova Lei de Recuperação Judicial faz menção ao artigo 14 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”.

Recurso negado

Apesar de ter concordado com os argumentos da Cedae sobre a supervisão judicial, a 3ª Turma do STJ negou o recurso e manteve a decisão tomada pelo TJ-RJ. Isso porque a estatal pediu a nulidade do prazo de carência de quatro anos concedido à Hotéis Othon, e o relator considerou que esse prazo não pode ser alterado devido à teoria do isolamento dos atos processuais.

Ele ressaltou que o TJ-RJ não poderia decidir sobre o início do prazo de supervisão judicial ou do prazo máximo de carência previsto no plano de recuperação, pois são temas reservados à deliberação dos credores.

“Assim, ainda que não se possa aplicar a nova redação do art. 61 da Lei nº 11.101/2005 ao caso, observado o disposto no art. 14 do Código de Processo Civil e a teoria do isolamento dos atos processuais, a hipótese é de manutenção do resultado do julgado, que reflete a vontade dos credores ao aprovarem os termos do plano de recuperação judicial, com a previsão de carência de 48 (quarenta e oito) meses para início dos pagamentos, sem nenhuma ressalva quanto à prorrogação do termo inicial do prazo de supervisão judicial”, escreveu o relator.

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REsp 2.181.080

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